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Atuacao Do Psi No Neoliberalismo
Atuacao Do Psi No Neoliberalismo
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90 Euzébios e Gradella
Introdução
O
s tempos são sombrios para aqueles que vislumbram a
humanização das relações sociais e de produção. Torna-se
corriqueiro observar situações que favorecem, concretamente, a
construção de um cenário econômico e socialmente predatório, que
combina repressão com desigualdade social. Legado de um neoliberalismo
que se revelou eficiente em sua tarefa de tornar todas as esferas da vida
objetos de consumo (Euzébios Filho e Guzzo, 2018). Trata-se, contudo, de
uma etapa do capitalismo que não apenas vem triunfando na esfera
econômica – com as privatizações, financeirização do capital e
maximização das grandes fortunas – mas também na dimensão mesmo da
sociabilidade humana (Parker, 2007). Basta observar os modelos
tecnicistas de educação, a construção dos afetos por redes sociais voltadas
a aprimorar o consumo de massa, as fábricas de produzir cultura
reciclável (os hits do verão são um exemplo disso), a violência social, a
relação predatória com a cidade e com o meio ambiente, etc. (Harvey,
2014).
No neoliberalismo, qualquer parâmetro ético passa a se dissolver na
capacidade individual de consumo de um sujeito atomizado, vítima do
modo de vida mercantilista. Tudo se torna mercadoria possível de venda.
Porém, nem tudo se resolve quando se vende e nem tudo se vende
facilmente. Mesmo sendo a exploração econômica o elemento fundante do
modo de sociabilidade capitalista, permanecem vivos os embates morais
sobre justiça e liberdade humana. Temos como exemplo desse ponto de
inflexão moral e político a lutas sociais travadas, atualmente, em torno da
liberdade sexual.
A temática da sexualidade vem ancorando importantes pontos de
inflexão na conjuntura brasileira, e nesse particular incluem as entidades
e campos representativos da Psicologia no Brasil (Anjos e Lima, 2016). De
um lado, é sabido que o grande capital se baseia no lucro e no consumo,
inclusive, da sexualidade. Por outro lado, o conservadorismo social se
expressa, em uma de suas dimensões, pela “defesa da família”. São setores
conservadores e religiosos (particularmente despontando os
neopentecostais) que compõem a base de governo federal eleito na última
eleição (2018), tornando-se agentes políticos ainda mais importantes no
país e se fortalecendo pelo conservadorismo de uma sociedade machista e
monogâmica. Paralelamente, movimentos LGBT-s tornam explícitas suas
reivindicações e causam reação dos mesmos setores que, cada vez mais,
passam a se organizar também para disputa de importantes entidades
Considerações finais
Os desafios da conjuntura atual colocam à prova o lema do “compromisso
social” em um contexto em que a “esquerda” assume por décadas a linha
de frente das entidades representativas da Psicologia no Brasil. Trata-se de
um movimento crítico, caracterizado, majoritariamente, por ideais
democráticos que não ultrapassam o campo da cidadania, mas que
reivindicam, por exemplo, a ampliação das políticas públicas e direitos
sociais para os mais pobres. É esse conjunto de bandeiras que representou
a ascensão de partidos e entidades como o PT e a Central Única dos
Trabalhadores (CUT) (Euzébios Filho, 2016). São estas entidades que
lideraram avanços sociais no Brasil nos últimos anos e influenciaram
parte importante da Psicologia Crítica brasileira.
Porém, foi também o PT e a CUT que ajudaram, paradoxalmente, a
desconstruir os direitos sociais e as políticas públicas que eles próprios
ajudaram a conquistar no Brasil. Em parceria com outros partidos,
sindicatos e Movimentos Sociais, aprovaram “reformas” que
comprometeram os avanços anteriormente conquistados. Podemos citar
como exemplo: (i) reforma da previdência, que amplia a idade para
aposentadoria de funcionários públicos federais; (ii) reforma universitária,
que trouxe mais recursos públicos para o setor privado da educação; (iii)
ações que favorecem o que foi denominado de Parceria Público-Privada
(PPP), culminando no desmonte do Sistema Único de Saúde, por exemplo
(Euzébios Filho, 2016).
Poderíamos citar outras ações que mostram o comprometimento da
outrora esquerda democrática (Tonet, 2005) com a agenda neoliberal –
comprometimento não necessariamente questionado pelo “compromisso
social”, até pela ligação histórica deste setor com os governos petistas
(Euzébios Filho, 2016). São ações que agravaram, ainda, o cenário de
Referencias
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Psicologia & Sociedade. Edição especial, 46-56.
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