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Aguinaldo Gomes
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RESUMO
O presente estudo parte da pressuposição de que a técnica informática, no curso de
seu desenvolvimento histórico, tenha possibilitado o aparecimento da memória
metálica a qual é responsável pelas atualizações das memórias discursivas e das
memórias institucionais (os arquivos) no ambiente digital. Sustentamos que o tempo
histórico, no qual se inscrevem os discursos da técnica informática, tenha um caráter
ôntico, visto estar relacionado ao fenômeno do histórico, ou seja, daquilo que já está
dado e cronologicamente datado; mas que também seja ontológico, se considerarmos
que tais discursos circulam necessariamente na facticidade da vida, estando, portanto,
sujeitos ao processo de mudanças e de transformações temporais inerentes à
historicidade.
1- INTRODUÇÃO
Como é sabido, o problema da memória metálica foi proposto pela
primeira vez nos estudos da análise de discurso, no Brasil, por Eni Orlandi
(2001; 2010) dentro da perspectiva da análise de discurso projetada pelo
filósofo francês Michel Pêcheux (1938-1983). Para Orlandi (2010) a memória
metálica possibilita outra materialidade formal bem distinta da histórica, pois a
1
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memória metálica "lineariza, por assim dizer, o interdiscurso, reduzindo o saber
discursivo a um pacote de informações, ideologicamente equivalentes, sem
distinguir posições" (p.16). Tal proposição foi retomada pela teórica (Op. cit.) no
texto: "A contrapelo: incursão teórica na tecnologia - discurso eletrônico,
escola, cidade", nele a autora defende que a memória metálica, memória da
máquina, não se produz pela historicidade mas por um constructo técnico,
sendo marcada pela quantidade e não historicidade, pela produtividade na
repetição e variedade sem ruptura.
Dessa perspectiva a memória metálica seria então um simulacro em que
tudo se passa no nível do dizer acumulado em que a constituição dos sentidos
se perde. Nessa direção, Schimitt (2003, p.18) retoma Orlandi (2001, p.181)
quando afirma que "a memória metálica trabalharia para que nossa memória
discursiva não trabalhasse, para que, quando titubeamos, à beira do sem-
sentido, discursos disponíveis com seus 'conteúdos' já lá, nos estejam à mão".
A noção esboçada até aqui está na confluência dos estudos da Análise
de Discurso em que a memória discursiva (ou interdiscurso) e a memória
institucional são pensadas. O conceito de memória discursiva foi formulado por
Pêcheux (1975; 1980) e pode ser encontrado em estado mais apurado nos
textos: "Por uma Análise Automática do Discurso”, “Semântica e Discurso" e o
texto "Papel da Memória e Discurso – estrutura ou acontecimento" sendo
integralizado na terceira fase dos estudos pecheutianos. Diferente de uma
memória pessoal, a memória discursiva pertence a uma esfera coletiva e
social, assim “a memória seria aquilo que, face a um texto que surge como
acontecimento a ler, vem restabelecer os implícitos". (PÊCHEUX, 2010, p.52).
Outra noção que foi trabalhada por Pêcheux (1994) diz respeito ao
conceito de arquivo, o qual se relaciona diretamente com o conceito de
memória discursiva, para o teórico (Op. cit. p.56) o arquivo "é entendido em
sentido amplo como campo de documentos pertinentes e disponíveis sobre
uma questão”, trata-se, pois, de uma memória institucional e sobre isso Orlandi
(2010, p. 09) vai ponderar que a memória institucional é aquela que não
esquece, ou seja, a que as “instituições praticam, alimentam, normatizando o
processo de significação, sustentando-o em uma textualidade documental,
contribuindo na individualização dos sujeitos pelo Estado, através dos
discursos disponíveis, à mão, e que mantêm os sujeitos em certa
circularidade”. É dentro desta episteme que o conceito de memória metálica
emerge e se desvincula do conceito de memória discursiva e memória
institucional. Nessa direção, Orlandi (2010) argumenta que a memória da
máquina (memória metálica) não se produz pela historicidade, mas antes é
produzida por um constructo técnico (televisão, computador, etc.). Além disso,
essa memória possui a especificidade de ser horizontal (e não vertical), não
havendo assim estratificação em seu processo, mas distribuição em série.
Trata-se, conforme Orlandi (2012, p.15), de uma memória formada por adição e
acúmulo "que ‘lineariza’, por assim dizer, o interdiscurso, reduzindo o saber
discursivo a um pacote de informações, ideologicamente equivalentes, sem
distinguir posições".
2. A QUESTÃO DO ÔNTICO E DO ONTOLÓGICO NA CRIAÇÃO DA
MEMÓRIA METÁLICA
A noção de memória metálica surge, como evidenciamos, com as
reflexões que se iniciaram no âmago da Análise de Discurso francesa
encabeçada no Brasil por Orlandi (2001; 2010). Trata-se de um conceito em
elaboração e que vem sendo trabalhado por alguns pesquisadores dentro do
que chamam de análise de discurso digital. Entre os que pensam a memória
metálica (técnica), estão: Dias (2004) para quem a memória metálica é uma
memória já-dada; Schmidt (2005) que considera o ciberespaço como um
contexto de produção da linguagem em que a memória metálica surge como
oposição à memória discursiva e Mendonça (2004) que estabelece uma
diferenciação entre memória metálica (a que produz sempre o mesmo) e a
memória histórica (a que é sujeita a falha). Entretanto, é sintomático o fato de
que a realidade primária (o desconsiderar o histórico) da construção inicial do
conceito permanece em todas as formulações. Tal realidade gnoseológica
parece ser decisiva para um embasamento do conceito inicial. O que não é de
surpreender quando da desfiguração da proposição expressa para uma análise
de discurso na esfera digital, o que inevitavelmente vai reverberar no ontológico
e no fazer da técnica que deu origem ao que hoje chamam de memória
metálica.
Assim, é fácil perceber que a problemática da memória metálica
(técnica) foi pensada dentro de uma perspectiva discursiva em que o ôntico2, o
ontológico, o fazer da técnica e o fenômeno histórico foram desconsiderados.
Ainda assim é imperioso reconhecer que a proposição inicial formulada por
Orlandi (op.cit) constitui-se como um estímulo considerável para o trabalho que
nos propomos a realizar. Entretanto, os pressupostos, o modo de considerar o
fenômeno, o modo de vislumbrar a realização do evento e a meta assinalada
na conjectura inicial são radicalmente diferentes das que nos guiamos.
Consideramos que a redução proposta no bojo da formulação primária, ao
modo de conceber o objeto histórico, é também uma redução fenomenal da
ideia expressa. Parece evidente para nós que essa redução faz parte de um
ideal de ciência que embora tente construir proposições válidas peca no julgo
da elucubração quando desconsidera o fenômeno do histórico e sua correlação
com a técnica e sua construção.
Desse modo, embora tenhamos compreensão de que as conjecturas
desenvolvidas até aqui pelos cientistas da linguagem tenham nos levado ao
desvelar de algo a respeito da essência da técnica, isto ainda não nos conduz
para a natureza dessa manifestação nem tão pouco nos leva para o discurso,
Ainda assim, o predicado ‘histórico’ não pode ser pensado aqui como
redução temporal do fenômeno histórico, mas como vigor que evoca para si um
conceito prévio, a saber, a objetualidade. É o fenômeno histórico que nos
permitirá pensar o tempo presente e a propriedade fenomenal da técnica
informática. Afirmar isto é deixar de assumir muitas determinações objetuais
3
Claro que aqui estamos nos afastando do materialismo histórico e dialético por entendermos
que o modo que esta filosofia concebe o fenômeno do histórico não permite avançar com
precisão na problemática esboçada
4 Essa é uma questão interessante que foi detalhadamente mostrada por Souza(2010), para o
autor, o software possui duas naturezas que se entrecruzam e que juntas formam o todo
perceptível: uma natureza arquitetônica que poderia ser evidenciada como a parte mais visível
como o é a interface com os ícones, menus, enunciados etc na qual o sujeito interage e
mantém relações com outros sujeitos discursivos e com uma infinidades de gêneros de
discurso e outra pouco perceptível pelo sujeito que é a natureza mecânica que permite ao
software processar funções como enviar e-mail, rodar um vídeo, fazer login em algum site etc.
Forçando uma metáfora com a biologia seria o mesmo que dizer que a parte arquitetônica é o
corpo humano visto de fora (cor da pele, olhos, cor do cabelo, traços corporais etc) e a parte
mecânica seria aquilo que não vemos, mas que permite o funcionamento desse corpo, como:
os órgãos internos, a circulação sanguínea, as células, o processamento do sistema digestivo
etc.
inerentes ao fazer científico. É dar um passo a trás para entender como um
dado momento no histórico produziu algo que no tempo presente é tão caro
para a Análise de Discurso como é o conceito de memória metálica. Não
considerar tal importância do objeto histórico é desconsiderar de maneira
radical o caráter interdisciplinar da própria Análise de Discurso.
Mas é importante aclarar os termos nomeados: quando falamos em
história, em tempo histórico, em fenômeno histórico e objeto histórico não
estamos dizendo a mesma coisa. Essa quadratura invoca para si significações
outras, e ao mesmo tempo clama para si uma unidade imediata que se anuncia
em algumas determinações. Entendemos por história a "realidade histórica"
como a sua possível ciência, desse modo para uma sustentação do fenômeno
histórico deve-se afastar, provisoriamente, o sentido de "história" como ciência
histórica (historiografia), como bem já mostrou Heidegger (2005).
De igual modo o tempo histórico é para nós aquilo que é dado e
cronologicamente datado o que difere radicalmente do fenômeno histórico cuja
característica primeira é um se mostrar em si mesmo ou o que se deixa mostrar
na temporalidade, tal temporalidade abre a possibilidade própria do acontecer
originário que se desdobra em um dado instante, o que para nós é
compreendido como o objeto histórico. É somente a partir da compreensão
dessa quadratura, desse modo de ser da história, que podemos fazer um
retorno ao ôntico e ao ontológico. Ora, fazer um retorno ao ôntico e ao
ontológico, em sua natureza, significa buscar as marcas da presença de um
Outro. O problema primeiro nasce na medida em que pensamos essa
presença, não podemos atribuir a este ou aquele tempo histórico um dado
próprio da presença. A presença que procuramos desvelar aqui não percorre
um trajeto singular nem se constitui simplesmente no dado e no mostrado da
técnica.
É preciso percorrer mais detalhadamente esse contexto característico da
causa da presença e suas determinações ontológicas e factuais na vida e nas
vivências, a presença desse ponto de vista atravessa o espaço e o tempo. Mas
para entendermos a presença na técnica que deu origem à memória metálica,
é preciso pensá-la em um dado fragmento de tempo, isto é, se for possível
circunscrever a presença em dado espaço temporal. Isto nos força mais uma
vez a dar um passo à trás, nos força a circunscrever o fenômeno histórico
dentro da temporalidade. É nessa circunscrição temporal que o objeto histórico
se deixa desvelar, essa circunscrição é abertura para a interpretação.
Analisar a origem desse tempo histórico só pode ser feito a partir da
temporalidade, assim a primeira meta é encontrar o ponto originário da questão
da técnica e reconstituir a partir das determinações originárias seu lugar na
história como um lugar do fenômeno histórico. Nessa direção é possível dizer
que “o problema do histórico não corresponde a uma aporia conceptual ou a
uma indeterminação teórica. Se assim fosse, a sua resolução dependeria
exclusivamente de um levantamento sucessivo de incógnitas, alimentado pela
miragem científica de um significado total”, como já mostrou Dias (2011, p.40).
A título de adiantamento, é possível dizer que o objeto histórico carece de uma
explicação hermenêutica, nas palavras de Heidegger (2012, p.47) "a única
coisa que importa é fazer aqui esta indagação hermenêutica. Não se trata,
entretanto, de discutir tal filosofia nem tampouco de fundá-la novamente". Se
fizemos a opção por considerar a hermenêutica fazemos isto com um propósito
ímpar: investigar o objeto histórico e sua objetualidade. Heidegger (op.cit) vai
mostrar que a hermenêutica indica um ser capacitado para interpretação e
necessitado dela. A hermenêutica não pode ser tomada nesse estudo no seu
sentido limitado e restrito, ao contrário, ela é a chave para que possamos nos
aproximar da faticidade do Ser-aí e o caráter ontológico da presença.
Contudo, é preciso tomar o objeto histórico em sua objetualidade e isto
só pode ser na medida em que nos demoramos no caráter histórico da técnica.
A abordagem interpretativa do que seria a memória metálica é desse modo
conduzido pelo próprio objeto temático (o nascimento do primeiro software) e o
histórico, e é ao tomar o histórico como domínio fenomenal que podemos
caminhar para o caráter ontológico da técnica. Essa questão é óbvia mais por
muito foi desconsiderada. No que segue, é preciso dizer que neste trabalho
não temos por missão oferecer uma historiografia do objeto, mas de pensar o
histórico como marca da vida fática que possibilitou a abertura necessária para
o surgimento da chamada memória metálica. Assim, embora demasiadamente
longa mas a fim de elucidarmos essa questão do histórico, trazemos as
palavras de Heidegger (2010, p.33) a respeito desse tema:
9 Para Orlandi (1996) o dado não tem memória, enquanto o fato possui a característica de ser
carregado de memória linguística.
10 Nessa conjectura está imbuída a ideia de discurso em uma perspectiva francesa, embora
não estejamos filiados a essa corrente teórica, formulamos assim o raciocínio, pois, a noção
primeira sobre a memória metálica nasce no seio dessa teoria.
11 Termo cunhado por Heidegger: o Dasein ou o ser existente.
altera e diversifica, a eternidade se mantém simples12”. O histórico, ou melhor,
os desdobramentos desse dado evento no histórico, é o fenômeno que nos
permitirá vislumbrar e ter acesso a uma compreensão da época atual. É desta
compreensão própria pensada fenomenologicamente que parece ser possível
verificar as presenças na técnica informática.
A presença que evocamos aqui é uma proposição geral que está
arraigada no sujeito-histórico e é também uma de suas propriedades. Como
enunciou Heidegger (2005), a presença se determina como ente sempre a
partir de uma possibilidade que ela é e, de algum modo, isso também significa
que ela se compreende em seu ser. A indicação formal aqui é de que não há a
possibilidade de desvelar a constituição existencial da presença13 nos usos.
Isto é, revelar a presença dos sujeitos que desenvolveram o software na
cotidianidade do uso dessas máquinas digitais14.
Esse aceno é importante e nos remete de imediato ao tempo histórico
da origem da técnica que permitiu o limiar da memória metálica, se hoje os
estudos de discursos encontram-se diante da dificuldade de um novo conceito,
esse desabrochou em uma etapa da história da humanidade anterior ao tempo
presente, com um jovem cientista, Alan Mathison Turing, na II Grande Guerra.
Foi ele que desenvolveu o conceito da primeira máquina capaz de fazer
operações computacionais, mais precisamente quando da publicação em 1937
do artigo “On Computable Numbers” no qual descrevia um computador
universal. A máquina que Turing descrevia era capaz de manipular símbolos,
isto é, através de um sistema formal essa máquina poderia fazer operações
computacionais.
Com essa finalidade a máquina abriu possibilidades para que no curso
da história outros cientistas desenvolvessem o que hoje chamamos de
computadores, desenvolvessem inteligências artificiais como os sistemas de
autoatendimento bancário e telefônico ou os assistentes pessoais como a Siri
(Apple) ou Cortana (Microsoft) ou mesmo softwares complexos de
processamento de voz baseados na interação homem-máquina. Todas essas
questões que nos movem para o desvelar da presença nas máquinas toma
forma quando da estruturação do objeto que permitiu a uma grande parte da
população mundial manusear tais máquinas, tais computadores. Trata-se de
outro acontecimento no histórico que, como veremos, irá mudar a relação dos
homens com as máquinas. Estamos nos referindo ao fenômeno histórico do
desenvolvimento da técnica que gerou as interfaces das máquinas, o desvelar
12 “Zeit ist das, was sich wandelt und mannigfaltigt, Ewigkeit hält sich einfach”. In. Heidegger
(Fenomenologia da vida religiosa) cf. O conceito de tempo na ciência histórica (Der Zeitbegriff
in der Geschichtswissenschaft), aula de habilitação proferida por Heidegger no dia 27 de julho
de 1915, em Friburgo.
13 O outro.
14 Dito de outra forma: não é possível verificar a historicidade da memória metálica do ponto de
16O princípio fundante da memória metálica: a apropriação pelo sujeito de uma memória que
está alocada na máquina para uma atualização discursiva
produzir da técnica na era da informática tem que ser vivenciado como os
gregos compreendiam esta palavra, ou seja, como levar à frente. Todo levar à
frente leva algo do ocultamento ao descobrimento. Mas o que se oculta no
produzir das interfaces de software? Não precisamos fazer muito esforço para
responder isto. Assim, é possível dizer que para uma compreensão da
constituição da memória metálica, devemos ter em mente que o ponto central
reside não em Turing, mas em Engelbart que é considerado o pai da interface
gráfica. Foi somente a partir da introdução da interface (GUI) no computador
moderno que os primeiros linguistas começaram a olhar para este como um
elemento transformador das relações que as pessoas mantinham com a língua
e com os discursos.
Entretanto as primeiras formulações desenvolvidas a respeito disso, em
sua maioria, assumem um modo de vivenciar esse fenômeno desvinculado da
questão técnica e dos desdobramentos que isto acarretou no modo como as
pessoas passaram a se apropriar da técnica. As formulações dos primeiros
linguísticas, portanto, não conseguiram sair da manifestação ôntica do ente.
Ainda assim, ninguém ousaria considerar erronias as análises que foram
inicialmente formuladas. Entretanto, é justo dizer que colocar as questões
ônticas como objeto de análise e esquecer-se que em sua maioria essas
questões dizem respeito apenas aos entes e suas objetualidades, é
compreender apenas metade do problema que se investiga.
O traço distintivo desse carácter, desse modo de compreender é
justamente desconsiderar o sujeito, desconsiderar a essência da técnica. Tratá-
lo como mero objeto. A abertura que gostaríamos de introduzir aqui diz
respeito ao ocasionar. A interface ocasiona, ou seja, é o que deixa vir à
presença o que ainda não é presente. Mas o que se oculta quando olhamos
para uma interface gráfica de software? Essa pergunta é perigosa e não
devemos deixar os pensamentos se apressarem.
De fato, os primeiros analistas estavam mais preocupados com as
linguagens que eram produzidas nos ambientes de interação digital (chat, e-
mail, fórum etc) que com a linguagem que essas interfaces carregam. É preciso
fazer um retorno para a questão primária do produzir. É o produzir que
ocasiona no software uma não-presença que se antecipa em uma presença.
Tudo reside na questão não verificada do pensar o produzir. Produzir como os
gregos entendiam: levar à frente.
Todo produzir ocasiona algo, todo produzir leva algo do ocultamento ao
descobrimento. Este surgir, diria Heidegger (2007), repousa e vibra naquilo que
denominamos desabrigar. Quando voltamos para a questão da técnica
observamos que ela não é apenas e meramente um meio de fazer, é antes um
modo de desabrigar. Um modo de levar a presença àquilo que se oculta. Essa
formulação que esboçamos aqui assume um caráter paradigmático,
paradigmático é aquilo que de alguma forma influência o modo como vemos
algo ou como algo se manifesta. Mas o caminho do pensamento que
começamos a trilhar é inverso. No primeiro plano, quando dizemos que a
interface ocasiona estamos dizendo como dissemos que ela deixa vir uma
presença. Essa presença se apresenta por meios das inúmeras formas de
linguagens que se deixam mostrar em uma interface de software (ícones,
menus, cores, formas, enunciados, isto é, linguagem), Heidegger (2003, p.
127) vai dizer que "a linguagem é a casa do ser".
O questionamento que estamos nos propondo nesse trabalho, porém,
necessita ser encaminhado para uma tarefa primeira. Uma tarefa que desvie o
‘pensar a linguagem’ nesses ambientes como um pensar ôntico17 e se volte
para a questão primeira de investigação. Por muito tempo o fazer científico,
desde Saussure, esteve arraigado em uma forma positivista de ciência. Seria
ingênuo permanecer neste fazer ou ter por base apenas esse fazer
principalmente quando questões ontológicas que são questões fundamentais
para determinar o estágio tecnológico em que nos encontramos se fazem tão
gritantes e clamam para si um fio condutor. E é nessa volta ao ontológico que a
categoria do histórico emerge como possibilidade de interpretação fenomenal.
Na medida em que avançamos e passamos a compreender a existência destas
tecnologias que são criadas e movimentadas por linguagem, como
possibilidades de uma presença e não apenas como um ente, nos movemos
em direção aos discursos. A má observância por parte dos analistas, neste
fato, os levou para uma análise em que se primava apenas os objetos e suas
objetualidades, os entes. Aquilo que denominamos de memória metálica só se
revela quando experiênciamos a técnica.
4. REFERÊNCIAS