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Universidade de São Paulo

Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto


Departamento de Química

Físico-Química Experimental

Experimento 1 – Espectro roto-vibracional do HCl

Gabriel Spadotto (9787575)


Renato Alexandre Polins Junior (7148196)

Ribeirão Preto/SP
04/09/2020
1. Objetivo

Através da análise do espectro roto-vibracional da molécula de HCl, atribuir os


ramos P, Q e R e obter a constante de rotação (Be), a constante de acoplamento roto-vibracional
(αe), o momento de inércia (Ie) bem como o comprimento da ligação (r) desta molécula e o
número de onda da transição puramente vibracional ( ̅ ).
.

2. Descrição do experimento

Este experimento consistiu na obtenção e análise do espectro roto-vibracional da


molécula de HCl no estado gasoso. Para realização do experimento, foi preparada uma amostra
gasosa em uma célula de vidro Pyrex com vácuo acoplado, para receber a incidência de radiação
infravermelha. O procedimento experimental foi realizado previamente, e apenas o espectro foi
fornecido aos estudantes para análise.
A espectroscopia roto-vibracional é uma técnica que mede a interação da radiação
eletromagnética com os movimentos vibracionais e rotacionais de uma molécula. O espectro
roto-vibracional foi obtido a partir da absorção da radiação infravermelha incidida sobre uma
amostra, provocando transições que ocorrem entre níveis rotacionais definidos que pertencem a
níveis vibracionais definidos.
Qualquer sistema que contenha átomos ligados entre si apresenta movimentos
vibracionais e rotacionais, desde as moléculas diatômicas até sistemas mais complexos.
Considerando uma associação de átomos em fase gasosa, isolada e livre de restrições externas, é
possível observar transições em que se alteram simultaneamente o estado vibracional e o estado
rotacional, o que se abrevia para “transições roto-vibracionais”.
O modelo do oscilador harmônico diatômico é o modelo mais simples para descrever
vibrações moleculares, em que dois átomos de massa m1 e m2 estão ligados em uma mola
perfeitamente elástica. Na resolução da equação de Schröedinger para este modelo, obtém-se a
seguinte expressão que indica os níveis de energia permitidos para o oscilador harmônico:

( ) (Equação 1)

Onde v é o número quântico vibracional (v = 0, 1, 2, 3, ...), h é a constante de Planck e ν


é a frequência de vibração do oscilador harmônico. Nos valores de cm-1, a Equação 1 pode ser
reescrita como:

̅ ̅ ( ) (Equação 2)

Como o experimento foi realizado em baixa temperatura, a maior parte das moléculas
ocupa o estado vibracional fundamental, e apenas a transição para o primeiro estado excitado é
verificada. Apesar disto, diversas transições entre os níveis rotacionais podem ser observadas,
pois diferentes níveis rotacionais excitados podem ser atingidos.
O modelo do rotor rígido é o modelo mais simples para descrever as rotações em
moléculas diatômicas, no qual a expressão de energia, obtida pela resolução da equação de
Schröedinger para este modelo, pode ser descrita como:

(Equação 3)

Onde J é o número quântico rotacional (J = 0, 1, 2, 3, ...), h é a constante de Planck e Ie


é o momento de inércia. Em cm-1 a Equação 3 pode ser reescrita como:

(Equação 4)

Onde Be é a constante rotacional, descrita pela expressão:

(Equação 5)

O momento de inércia também pode ser descrito pela expressão:

(Equação 6)

Onde μ é a massa reduzida da molécula e r é o comprimento de ligação. Através das


massas dos átomos envolvidos na molécula de HCl (H = 1,67.10-27 kg e Cl = 5,89.10-26 kg) é
possível calcular a massa reduzida desta molécula:

( )

A regra de seleção para as transições rotacionais é ΔJ= ± 1. As transições observadas no


espectro podem ser agrupadas em dois conjuntos: o Ramo P, que corresponde às transições que
partem do estado (v = 0, J) para o estado (v = 1, J’ = J+1); e o Ramo R, com as transições que
partem do estado (v = 0, J) para o estado (v = 1, J’ = J-1).
A primeira transição do Ramo P (ΔJ = -1), por exemplo, apenas pode ocorrer do nível
(v = 0, J = 1) para o nível (v = 1, J’ = 0), já a primeira transição do ramo R (ΔJ = 1) ocorre do
nível (v = 0, J = 0) para (v = 1, J’ = 1). Ao conhecer J, determina-se o parâmetro m para ambos
os ramos da seguinte maneira:
Ramo P → m = -J

Ramo R → m = J + 1

Entre os Ramos P e R há uma região com ausência de picos, definida como Ramo Q,
que é observada devido às regras de seleção para as transições roto-vibracionais, uma vez que a
transição (v = 0, J= 0) → (v = 1, J = 0) não é permitida por apresentar ΔJ = 0. Esta transição é
conhecida como puramente vibracional, pois se ocorresse, envolveria apenas mudança entre os
níveis vibracionais, sem mudança nos níveis rotacionais. Apesar de não ser observada, uma
extrapolação por análise gráfica pode obter qual seria seu valor, que corresponde ao valor do
número de onda associado à frequência de vibração dos núcleos da molécula ( ̅ ).
Uma molécula real está submetida a rotação e vibração de forma simultânea. Desta
maneira, os movimentos são acoplados, e novas equações mais complexas para os níveis de
energia devem ser consideradas, a partir das expressões das energias vibracionais e rotacionais,
com a adição de um termo de acoplamento entre a vibração e a rotação (αe). Uma destas
equações expressa os valores em cm-1 em função do parâmetro m, e pode ser descrita pela
expressão:

̅ ̅ (Equação 7)

A utilização desta equação na análise do espectro roto-vibracional permite a obtenção


de alguns parâmetros da molécula de HCl, como o número de onda da transição puramente
vibracional ( ̅ ), a constante de rotação (Be), a constante de acoplamento roto-vibracional (αe), o
momento de inércia (Ie) e o comprimento da ligação (r).

3. Resultados e Discussão

A Figura 1 registra o espectro roto-vibracional obtido para a molécula do HCl, com a


indicação dos ramos P, Q e R, e a atribuição dos valores de J. Observa-se a presença de dubletos
em cada um dos picos, devido a presença de isótopos em abundância apreciável, o 35Cl e 37Cl. O
37
isótopo Cl está em menor abundância e possui uma massa maior, que implica em uma
frequência de vibração menor da ligação H-Cl e em picos que apresentam intensidades relativas
mais baixas.
O número de onda referente a cada transição foi identificado no espectro, e relacionado com
seus respectivos valores de J e m. Os resultados obtidos foram registrados na Tabela 1 para o
Ramo P e na Tabela 2 para o Ramo R.

Figura 1. Espectro roto-vibracional da molécula de HCl, com indicação dos ramos P, Q e R.


Tabela 1. Dados de número de onda do espectro roto-vibracional do HCl para o Ramo P.

Ramo P
J m Numero de onda Numero de onda
H-35Cl (cm-1) H-37Cl (cm-1)
1 -1 2865,00 2863,11
2 -2 2843,33 2841,94
3 -3 2819,70 2821,60
4 -4 2798,86 2796,94
5 -5 2775,82 2773,92
6 -6 2752,17 2750,20
7 -7 2727,59 2726,09
8 -8 2703,00 2701,11
9 -9 2677,89 2675,99
10 -10 2651,85 2650,38
11 -11 2625,78 2623,91
12 -12 2598,93 2597,83

Tabela 2. Dados de número de onda do espectro roto-vibracional do HCl para o Ramo R.

Ramo R
J m Numero de onda Número de onda
H-35Cl (cm-1) H-37Cl (cm-1)
0 1 2906,04 2904,13
1 2 2925,80 2923,81
2 3 2944,59 2942,60
3 4 2963,40 2961,38
4 5 2980,69 2978,82
5 6 2998,10 2995,71
6 7 3014,49 3012,11
7 8 3029,91 3028,00
8 9 3044,81 3042,88
9 10 3059,29 3056,91
10 11 3072,80 3070,40
11 12 3085,39 3083,41
A partir dos dados das tabelas 1 e 2, construíram-se duas curvas do número de onda em
função de m, uma para a molécula com o isótopo 35Cl (Figura 2) e outra para a molécula com o
37
isótopo Cl (Figura 3). Em cada gráfico foram aplicadas curvas de tendência polinomiais de
ordem 2, de modo a obter uma equação para a curva de tendência, que apresentaram alto valor
de r² (0,99997 e 0,99998 respectivamente).

Figura 2. Curva do número de onda em função de m para a molécula de HCl com o isótopo 35Cl

Figura 3. Curva do número de onda em função de m para a molécula de HCl com o isótopo 37Cl
Tendo em vista que o número de onda em função de m está relacionado à equação 7,
comparando com a equação das curvas de tendências obtidas, verifica-se que o intercepto
corresponde ao valor de ̅ , o parâmetro B1 corresponde a (2Be – 2αe), e o parâmetro B2
corresponde a αe. Portanto, através dos coeficientes da curva de tendência foi possível obter o
valor destes três parâmetros ( ̅ , Be e αe).
A partir do valor da constante de rotação (Be) foi possível calcular o valor do momento
de inércia (Ie) utilizando a equação 5, bem como o valor do comprimento de ligação (r) a partir
da equação 6. Realizando o cálculo de cada um destes parâmetros, e comparando-os com os
valores encontrados na literatura [1], construiu-se a Tabela 3 a seguir:

Tabela 3. Dados dos parâmetros obtidos a partir das curvas de tendência e comparação com os
valores identificados na literatura

Desvio Desvio
Parâmetro H-35Cl H-37Cl Valor da Literatura 35
H- Cl H-37Cl
̅ (cm-1) 2885,702 2884,102 2990,496 -3,50 % -3,56 %
αe (cm-1) 0,3012 0,3040 0,3072 -1,95 % -1,04 %
Be (cm-1) 10,4910 10,4755 10,5934 -0,967 % -1,04 %
-47 -47 -47
Ie (kg.m²) 2,667 x 10 2,670 x 10 2,632 x 10 1,33 % 1,44 %
r (pm) 128,31 128,38 127,46 0,667 % 0,722 %

Verifica-se que os valores determinados por este experimento se aproxima dos valores
reportados pela literatura, apresentando desvios menores que 4%, o que reforça a eficiência do
procedimento realizado para esta análise.

4. Conclusão

O experimento realizado permitiu a determinação da constante de rotação (Be), a


constante de acoplamento roto-vibracional (αe), o momento de inércia (Ie) bem como o
comprimento da ligação (r) da molécula de HCl e o número de onda da transição puramente
vibracional ( ̅ ), através da análise de seu espectro roto-vibracional.
O valores determinados para a molécula de HCl com isótopo 35
Cl foram de ̅ =
2885,702 cm-1, Be = 10,4910 cm-1, αe = 0,3012 cm-1, Ie = 2,667 x 10-47 kg.m² e r = 128,31 pm.
Para a molécula com isótopo 37Cl foram determinados os valores de ̅ = 2884,102 cm-1, Be =
10,4755 cm-1, αe = 0,3040 cm-1, Ie = 2,670 x 10-47 kg.m² e r = 128,38 pm. Estes valores se
mostraram próximos aos valores reportados na literatura para esta molécula, com desvios
menores que 4%.
5. Referências

[1] BASSI, A. B. M. S. Conceitos Fundamentais em Espectroscopia. Chemkeys, v. único, p. 1-


14, set. 2001.

[2] CLARO, P. R. Espectroscopia Vibracional. Revista de Ciência Elementar, v. 6, n. 2, p. 1-


5, jun. 2018.

[3] ATKINS, P.; DE PAULA, J. Físico-Química. 10. ed. v. 1. Rio de Janeiro, LTC, 2018. p.
329-339.

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