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Visão da Empresa Baseada em Recursos

HAMEL, Gary; PRAHALAD, C. K. Competindo pelo Futuro: Estratégias inovadoras para obter o controle
do seu setor e criar os mercados de amanhã - Estratégia como Alavancagem. Tradução: Outras
Palavras. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1995. p. 180-203.

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Visão da Empresa Baseada em Recursos

Gary Hamel e C. K. Prahalad

(1) Antes de considerar as avenidas específicas para a alavancagem de recursos abertas às


empresas, vamos examinar nossas premissas iniciais. A primeira é que a empresa pode ser
concebida como um portfólio de recursos (técnicos, financeiros, humanos etc.), bem como
um portfólio de unidades de negócio concentradas em produtos ou mercados. Um número
crescente de pesquisas e relatórios acadêmicos assumem essa "visão da empresa
baseada em recursos".

(2) A segunda premissa é que as limitações de recursos não são necessariamente um


obstáculo à conquista da liderança global, nem tampouco a abundância de recursos é
garantia da continuidade da liderança. Se não fosse assim, não teríamos testemunhado as

mudanças drásticas nas posições competitivas que colocaram empresas aparentemente


invencíveis, como a GM, Volkswagen, Westinghouse, IBM, Xerox e Texas Instruments, na

defensiva.

(3) A terceira premissa é que existem grandes diferenças entre as empresas no mercado e o
impacto competitivo que elas são capazes de gerar com uma determinada quantidade de
recursos. A Honda estabeleceu-se como líder na área de motores e transmissão, as áreas
de competências essenciais, a despeito de ter um orçamento para P&D muito mais
reduzido do que o da General Motors. A NEC conseguiu ganhar participação no mercado
em relação à Siemens (equipamentos de telecomunicações), à Texas Instruments
(semicondutores) e à IBM (computadores) a despeito de um orçamento para P&D
substancialmente inferior ao de suas rivais durante a maior parte de sua história. A Chrysler
desenvolveu seu carro pequeno, o Neon, por uma fração dos recursos normalmente

necessários em Detroit. A IBM desafiou a Xerox no negócio de copiadoras e fracassou,


enquanto a Canon, uma empresa com apenas 10% do tamanho da Xerox em meados da
década de 70, acabou desbancando a Xerox como o fabricante de copiadoras mais prolífico
do mundo. Em sua adolescência, a CNN conseguiu oferecer 24 horas de notícias por dia
com um orçamento estimado em um quinto do necessário à CBS para a produção do
noticiário noturno, com duração de uma hora. Essas diferenças clamam por uma
explicação.

(4) A quarta premissa é que os ganhos em eficiência baseados na alavancagem provêm


principalmente do aumento do numerador nos índices de produtividade (faturamento e

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lucros líquidos), e não da redução do denominador (investimento e número de
funcionários). Com o objetivo de reduzir o volume de capital para um determinado
empreendimento ao invés de aumentar o escopo do empreendimento para um determinado
volume de capital, os programas de reestruturação de empresas voltados para o deno-
minador lidam mais com a redução de recursos do que com a alavancagem de recursos.
Uma firma ineficiente que parte para o downsizing sem melhorar sua capacidade de
alavancagem de recursos descobrirá que a produtividade aumenta - mas só durante um
tempo. A liderança tecnológica, a fidelidade à marca, o alcance da distribuição e o serviço
ao cliente não se deterioram imediatamente, mas a não ser que encontre novas
abordagens para a alavancagem de recursos (por exemplo, formas de preservar sua
liderança tecnológica com um orçamento para P&D mais apertado, o desenvolvimento de
fidelidade à marca com menores investimentos em propaganda, o aprofundamento do
alcance da distribuição mais eficaz em relação aos custos e o aperfeiçoamento do serviço
ao cliente mais rápido do que a taxa de comprometimento de um volume maior de recursos
a essa tarefa), a empresa descobrirá, em alguns meses ou em alguns anos, que o
numerador encolheu e que será necessário recorrer a outra rodada de cirurgias não
eletivas. Nesses casos, a empresa continuará a apertar sua base de recursos até que os
investidores encontrem um novo proprietário com uma capacidade comprovada de
alavancagem de recursos.

(5) O que isso também sugere é que embora o corte de recursos não seja uma atividade
essencialmente criativa, a alavancagem de recursos é. Trata-se da busca contínua de
novas formas, que façam uso menos intensivo de recursos, de se alcançar os objetivos
estratégicos. Reduzir a força de trabalho e cortar os investimentos demandam menos
intelectualmente da alta gerência do que descobrir formas de aumentar a produção com
uma base de recursos estática ou de crescimento lento. Reduzir os gastos é mais fácil do
que aumentar o escopo do empreendimento; portanto, as organizações preferem o primeiro
ao segundo. Os gerentes e os consultores da área de melhoria operacional precisam se
questionar exatamente quanto do problema da eficiência estão tentando resolver. Se sua
visão de "eficiência" englobar apenas o denominador, se eles não tiverem uma visão de
alavancagem de recursos que aborde o numerador, terão muito pouca chance de alcançar
e sustentar uma eficiência classe mundial.

(6) Nossa quinta premissa é que a tarefa de alocação de recursos da alta gerência recebeu
atenção excessiva quando comparada à tarefa da alavancagem de recursos. Enquanto
inúmeros livros, cursos e consultores buscaram aumentar a eficiência alocativa
(sustentanto as oportunidades mais promissoras com os recursos certos através de
técnicas de planejamento de portfólio e definição de orçamento de capital), houve

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relativamente pouca ênfase no papel desempenhado pela alta gerência no acúmulo e
orquestração dos recursos da empresa, principalmente quando o foco se afasta dos
recursos financeiros. Se a alta gerência dedicar mais esforço à avaliação da viabilidade
estratégica dos projetos em seu papel alocativo do que com a tarefa de multiplicar a
eficácia dos recursos, seu valor agregado realmente será modesto.

(7) Quaisquer que sejam as vantagens iniciais em termos de recursos dos líderes do setor,
mais cedo ou mais tarde, em todos os setores, a batalha evolui em torno da capacidade de

alavancar recursos, e não da capacidade de gastar mais do que os rivais. Uma medida
aproximada da capacidade de uma empresa de alavancar recursos é a proporção de
ganhos (ou perdas) relativos(as) de participação no mercado em relação a sua fatia relativa
de investimento ou faturamento; o crescimento do faturamento em relação aos recursos
seria outra medida. Portanto, embora a IBM e a General Motors sejam altamente bem
classificadas em termos de sua habilidade, e até disponibilidade, em fazer investimentos
estratégicos (onde a capacidade estratégica do investimento é medida pelo número de
zeros que se seguem a um número inteiro), sua classificação não passa de “ruim" em
termos de alavancagem de recursos. Historicamente, a Philips fez tantos investimentos
“estratégicos" e sua capacidade de alavancagem de recursos era tão ruim que, a despeito
da abundância de seus recursos, chegou à beira da catástrofe financeira.

(8) Isso aponta para uma sexta e última premissa: a capacidade de alavancagem de recursos
é o mecanismo de seleção definitivo, separando vencedores de perdedores nas
prolongadas batalhas pela liderança no setor. Não basta chegar ao futuro primeiro,
precisamos também chegar lá por menos.

A Obtenção da Alavancagem de Recursos

(9) A alavancagem de recursos pode ser obtida de cinco formas fundamentais: através da
concentração mais eficaz dos recursos nos principais objetivos estratégicos, através do
acúmulo mais eficaz de recursos, através da complementação de um tipo de recurso com
outro a fim de criar uma ordem de maior valor, através da conservação de recursos, quando
possível, e através da recuperação de recursos, minimizando-se o tempo entre o
investimento e as recompensas. Vamos considerar alguns dos componentes específicos da
alavancagem de recursos dentro de cada uma dessas amplas categorias.

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Concentração de Recursos

(10) Convergência A busca de uma única intenção estratégica ao longo de um período


extenso garante que os esforços dos indivíduos, departamentos funcionais e da empresa

inteira convergirão para o mesmo objetivo. Em muitas empresas que conhecemos, não
existe essa convergência de objetivos a longo prazo. Solicitamos freqüentemente aos
gerentes que analisem os seis ou sete últimos planos estratégicos e testem sua
consistência na orientação a longo prazo. O que esses gerentes normalmente descobrem é
que as trajetórias de desenvolvimento, as definições dos mercados servidos, os programas
de investimento e até a definição das competências e negócios específicos da organização
são alterados com maior freqüência do que as mudanças nas circunstâncias competitivas
poderiam justificar. O objetivo da intenção estratégica é garantir que haja alguma
comulatividade nas decisões mês a mês e ano a ano.

(11) Quase tão ruim quanto não ter um objetivo aspiracional nítido é ter vários objetivos
competindo entre si. Nas empresas onde não há prioridades compartilhadas para
crescimento e desenvolvimento de novos negócios, o provável resultado será a

fragmentação e subotimização de recursos. Não queremos dizer com isso que toda
empresa composta de várias divisões possa, ou deva, ter uma aspiração que englobe a

organização como um todo. No entanto, nas empresas com diversas divisões que
competem com uma faixa setorial única e ampla, freqüentemente concluímos que os
gerentes das unidades de negócios têm crenças radicalmente diferentes e às vezes
mutuamente excludentes sobre a estrutura do setor no futuro e a intenção estratégica
adequada da empresa. Muito freqüentemente, os gerentes de divisão parecem mais inte-
ressados em "lutar por seus objetivos” do que em compartilhar de uma visão geral. Os
gerentes tornam-se defensores de qualquer ponto de vista sobre o futuro que ameace
menos a sustentação de seus negócios individuais. Em um ambiente como esse, não é
surpresa alguma que os esforços dos gerentes de nível médio e baixo sejam
descoordenados e muitas vezes tenham propósitos divergentes.

(12) A convergência exige uma compreensão de como todos os recursos da empresa


podem ser orquestrados de modo a se alcançar um objetivo amplo, objetivo esse que as
empresas com uma noção mais fragmentada das prioridades empresariais não podem
esperar obter. A alavancagem de recursos ocorre apenas se os esforços dos indivíduos,
equipes, funções e negócios forem acumulados ao longo das unidades organizacionais,
bem como ao longo do tempo. O princípio é bastante simples: não se consegue obter a
alavancagem de recursos andando em círculos.

(13) Este fato sugere também que pode haver um custo oculto quando os gerentes

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seniores pulam de cargo em cargo a cada dois ou três anos. O que geralmente estimula
uma mudança na estratégia em uma grande empresa não é o surgimento de um novo
concorrente, uma nova tecnologia ou uma mudança na regulamentação. É muito fácil uma
sucessão de executivos com mandatos curtos lançar o leme da corporação para um lado e
depois para o outro, confundindo os funcionários quanto ao rumo da empresa e retardando
o progresso. Não conhecemos nenhuma empresa que tenha conquistado uma intenção
estratégica de dez ou quinze anos com uma sucessão de executivos no comando a cada
dois anos. Quando se trata de alavancagem de recursos, a consistência conta. Uma porta
giratória no escritório dos executivos frustra o acúmulo constante de insights sobre onde
está o futuro. Obviamente, não há grande mérito na continuidade gerencial se os gerentes

que comandarem a empresa pegarem no sono ao volante, mas presumindo-se que uma
empresa tenha investido no desenvolvimento da previsão do futuro e almeje chegar ao
futuro primeiro, ela precisa dar duro para garantir que os principais executivos fiquem no

comando durante um período razoável de tempo.

(14) Foco Se a convergência protege contra a divergência de objetivos ao longo do tempo,


o foco protege contra a diluição dos recursos em um ponto específico no tempo.
Acreditamos que muitas empresas, vendo-se em posição desvantajosa em termos de
custos, qualidade, tempo de ciclo, serviço ao cliente e outros parâmetros, tentam consertar
tudo ao mesmo tempo, e depois ficam se perguntando por que o progresso é tão
dolorosamente lento. Nenhum negócio, equipe funcional ou departamento pode atingir
todos esses objetivos de melhoria ao mesmo tempo, principalmente se houver uma lacuna
razoável a ser preenchida em cada área. Como regra geral, nenhum grupo de funcionários
pode cumprir mais de dois objetivos de melhoria operacional importante ao mesmo tempo.

(15) O esforço necessário para transmitir a disciplina da qualidade e mudar os hábitos de


trabalho, processos e atitudes gerenciais profundamente enraizados que são obstáculos à
qualidade é monumental. O esforço necessário para estabelecer a produção just-in-time
também é imenso, na medida em que exige uma reviravolta total nos fluxos de trabalho,
logística, sistemas de informação, mudanças radicais no layout da fábrica e o treinamento
dos funcionários e dos fornecedores. Além disso, é impossível construir as vantagens da
produção just-in-time sem antes ter o alicerce sólido da gestão da qualidade total. Reduzir
em 50% ou mais o tempo de desenvolvimento do produto ou aumentarem cinco ou dez
vezes a satisfação do cliente também são tarefas heróicas. Sem a atenção concentrada em
alguns objetivos operacionais essenciais em um dado momento, os esforços para melhoria
provavelmente ficarão tão diluídos que a empresa acabará sendo uma eterna retardatária
em cada área critica de desempenho.

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(16) Consideremos mais uma vez a busca da qualidade empreendida pela Komatsu.
Muitas empresas estão lutando com a questão da qualidade há uma década ou mais e
ainda não podem pretender ter chegado aos padrões da qualidade classe mundial; a
Komatsu saiu do nada e conquistou o prêmio Deming em trás anos. Onde está a diferença?
Quando a Komatsu iniciou seu programa de TQC, todos os gerentes receberam instruções
explícitas: Quando se tratar de uma opção entre custo e qualidade, opte pela qualidade.
Embora a qualidade possa acabar vindo de graça, os gerentes da Komatsu perceberam
que a busca da qualidade certamente não é de graça no curto prazo. Envolve tempo de
paralisação de máquinas, investimentos em melhor equipamento de produção, despesas
com treinamento e assim por diante. Por isso, a Komatsu concentrou-se quase que
exclusivamente na qualidade durante um período; depois de alcançar os níveis mundiais,
continuou a manter-se atenta à qualidade e, ao mesmo tempo, concentrou-se
sucessivamente na engenharia do valor, racionalização da produção, velocidade de
desenvolvimento do produto e obtenção de variedade a baixo custo. Cada novo nível de
vantagem era o alicerce para o próximo.

(17) O foco não é desculpa para ignorar todos os outros aspectos - isso seria ingênuo e
perigoso. Ao contrário, ao fornecer o foco operacional, a alta gerência simplesmente
predetermina as negociações que espera dos funcionários operacionais quando, inevi-
tavelmente, tiverem que alocar tempo e recursos escassos. O foco proporcionou à Motorola
um sucesso tão impressionante quanto o da Komatsu. Em 1987, a Motorola estabeleceu a
qualidade sigma seis (3,4 defeitos de produção por milhão) como meta corporativa suprema
- tudo mais vinha em segundo lugar. De lá para cá, o número de defeitos caiu de 6.000 por
milhão para 40 por milhão e a empresa espera alcançar o sigma seis nos próximos anos.

(18) Assim como as capacidades estratégicas, custos e qualidade se sustentam

mutuamente, as metas de melhoria operacional, redução de custos e melhoria da qualidade


competem pelo tempo escasso da gerência e pela atenção dos funcionários. Há algum
tempo, pressupunha-se que a variedade de produtos e a liderança de custos eram
mutuamente exclusivas. Não são: Quando se compreende realmente o que impulsiona os
custos, é possível buscar formas de acomodar eficazmente, em termos de custos, uma
maior variedade de produtos. Contudo, uma empresa que está longe de alcançar a
liderança de custos e variedade deve desenvolver as capacidades em seqüência.

(19) A divisão de recursos minguados em uma ampla gama de metas operacionais de


médio prazo é uma receita para a mediocridade em larga escala. Veja um exemplo simples.
Suponhamos que uma pessoa a três metros de distância de você jogue três bolas de golfe
na sua cabeça. Qual é sua reação imediata? A não ser que você seja um malabarista, seu
primeiro instinto é esquivar-se das bolas. Os gerentes de nível médio têm essa mesma

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reação quando a alta gerência tenta forçar cinco ou seis metas fundamentais de melhoria
com prioridade indiferenciada. Agora, imagine alguém jogando uma única bola de golfe em
sua direção, esperando alguns segundos até você pegá-la e então jogando mais uma, outra
e outra. Em cerca de meio minuto, você pegará todas as bolas.

(20) Os gerentes de nível médio são constantemente apontados como culpados por não
conseguirem traduzir diligentemente as iniciativas da alta gerência em ação. Por outro lado,
a gerência de nível médio freqüentemente se surpreende tentando compensar a falha da
alta gerência de classificar as melhorias operacionais em termos de prioridade. Mensagens
confusas e sinais conflitantes impedem um avanço no desenvolvimento das tarefas de me-
lhoria. Evidentemente, quando a maioria dos parâmetros operacionais de uma empresa
estão próximos do padrão mundial e a empresa compreende bem a interação de custos,
qualidade, variedade, tempo do ciclo e assim por diante, ela pode avançar em todas as
frentes. Contudo, um desafio em uma área fundamentalmente nova exige um foco claro,
negociações predeterminadas e uma massa crítica de esforços. Em termos simples, quanto
maior a tarefa de melhoria e menor a base de recursos, mais crítico é o foco operacional.

(21) O foco é tão importante na pesquisa e desenvolvimento de produtos quanto na


definição de metas de melhoria operacional. A maioria das empresas espalha uma camada
tão fina do fertilizante do apoio corporativo que o crescimento das novas áreas de negócios
é prematuramente interrompido. A 3M, com mais de 60.000 produtos independentes, há

muito se orgulha da amplitude de seus esforços inovadores. Contudo, reconhecendo que


sem um foco maior as grandes oportunidades poderiam permanecer como pequenos

projetos, a empresa lançou um “programa de velocidade” no qual cada negócio escolhe um


ou dois produtos que, acredita ele, irá oferecer à 3M a chance de uma grande vitória. A 3M
espera que o resultado seja um menu de talvez 50 futuros projetos fundamentais que
servirão como ímãs para os recursos de P&D. Seguindo uma lógica semelhante, a
SmithKline Beechman, gigante da indústria farmacêutica sediada na Inglaterra, cortou em
26% o número de drogas do seu canal de produtos e reduziu o número de doenças-alvo de
seus tratamentos de 100 para 58.

(22) Onde existe convergência e foco, a mediocridade individual pode perfeitamente


transformar-se em inteligência coletiva. Na sua ausência, a inteligência individual pode

perfeitamente transformar-se em mediocridade coletiva.

(23) Direcionamento A meta não é apenas concentrar-se em algumas coisas de cada vez,
mas concentrar-se nas corsas certas; concentrar-se nas atividades que causarão o maior
impacto em termos do valor percebido pelo cliente. O truque aqui é identificar as áreas
onde a razão entre o valor percebido pelo cliente e o custo de criação deste valor é a mais

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alta possível. A Microsoft direcionou seus recursos para as atividades que causam o maior
impacto no valor adquirido pelas pessoas através do uso de um computador pessoal (por
exemplo, o sistema operacional, a interface com o usuário e os principais aplicativos). Da
mesma forma, a British Airways trabalhou para proteger suas margens e evitar os grandes
descontos, direcionando-se aos aspectos da experiência de vôo que dão a maior
contribuição ao valor atribuído pelo cliente em vôos internacionais de longa distância. Uma
das inovações da British Airways foi o excelente salão de desembarque em Heath-row,
onde passageiros que desembarcavam de vôos noturnos poderiam tomar banho, passar
suas roupas e tomar um café da manhã rápido antes de sair para reuniões importantes
.Para qualquer pessoa que já tenha cruzado o Atlântico e entrado diretamente em uma
reunião de negócios, com os olhos ainda vermelhos e inchados, a sala de desembarque é
uma dádiva celestial. Em termos simples, os recursos são alavancados quando são direcio-
nados às áreas que fazem a maior diferença para os clientes.

Acúmulo de Recursos

(24) Extração Uma empresa é um reservatório de experiências. Todos os dias, os


funcionários entram em contato com novos clientes, aprendem mais sobre os concorrentes,
refletem sobre novas formas de solucionar os problemas e assim por diante. O que
diferencia uma empresa da outra talvez seja menos a qualidade relativa e o detalhamento
de seu arsenal de experiências do que sua capacidade relativa de extrair o aprendizado
desse arsenal. Em termos simples, algumas empresas são capazes de aprender mais com
cada nova experiência do que outras. A capacidade de extrair idéias de cada nova
experiência para melhoria e inovação é um componente crítico da alavancagem de
recursos.

(25) Por exemplo, a Honda lançou uma fração do número de novos modelos de
automóveis lançado pela Ford ou pela GM. Como é possível, então, explicar o fato de que,
a despeito de sua base de experiências relativamente escassa, a Honda sempre pareceu
capaz de desenvolver novos modelos de automóveis em uma fração do tempo e gastando
uma fração dos custos da Ford ou da GM? A Honda zomba da curva de experiência. Não
existe uma relação fechada entre o volume acumulado e a melhoria de produtividade; é a
eficiência relativa com a qual a empresa aprende com cada experiência nova que
determinará a taxa de melhorias. Quanto menor a base relativa de experiências de uma
empresa, mais sistemática ela deve ser na extração de suas experiências para perceber os
indícios de onde e como as melhorias podem ser efetuadas. Há um ditado comum no
Japão: Um problema identificado é uma bênção, pois representa uma oportunidade de me-
lhoria. Essa atitude é diferente da observada em muitas empresas, onde os problemas são

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camuflados ou repassados para outras pessoas. O ponto fundamental é que cada nova
experiência, cada sucesso ou fracasso tem que ser visto como uma oportunidade de
aprendizado.

(26) Aqui estão alguns dados sólidos. O professor Hermann Simon, um professor de
administração alemão, participou de um estudo realizado pelo Instituto de Economia da
Alemanha que comparou operários japoneses e alemães em termos de sua contribuição

para a melhoria da produtividade. Estudando o número de sugestões feitas pelos operários


japoneses e alemães e o impacto dessas sugestões, o professor Simon avaliou o
desempenho dos operários japoneses como 514 vezes melhor do que o dos operários
alemães. Em uma empresa do porte da Siemens, essa diferença poderia significar abrir
mão de uma economia de 2,2 bilhões de marcos alemães por ano. Essa abordagem à
produtividade é orientada pelo numerador - aumento do número de idéias por operário - e
não pelo denominador - redução do número de operários.

(27) A capacidade de aprender com a experiência depende de muitos fatores: ter


funcionários bem instruídos na arte da resolução de problemas, possuir um centro de
debates onde os funcionários possam identificar os problemas comuns e buscar juntos
melhores soluções, estar disposto a consertar as coisas antes que surjam os problemas e
fazer o benchmark constante em relação às melhores práticas mundiais. O desaprendizado
deve ocorrer para que o aprendizado possa ter início. O que determina a capacidade de
uma empresa de extrair o aprendizado da experiência é, tanto quanto qualquer outra coisa,
a inclinação de sua curva de esquecimento. O potencial de alavancagem das experiências
de cada funcionário na luta pela vantagem competitiva existe apenas quando a alta
gerência declara aberta a estação de caça aos precedentes e à ortodoxia.

(28) Empréstimo O “empréstimo” de recursos de outras empresas é uma outra forma de


alcançar a alavancagem de recursos. Através de alianças, joint ventures, licenciamento

interno e o uso de subcontratantes, uma empresa pode tirar proveito de habilidades e


recursos residentes fora da empresa. Em uma situação extrema, o empréstimo envolve não
apenas adquirir acesso às habilidades de um parceiro, mas realmente internalizar essas
habilidades, aprendendo com o parceiro. Freqüentemente, a internalização é uma forma de
adquirir novas habilidades mais eficiente do que a aquisição da própria empresa. Ao
adquirir uma empresa, o comprador tem que pagar pelas habilidades críticas desejadas,
bem como pelas habilidades que já possui ou as que têm menor valor estratégico. Da

mesma forma, os problemas de integração cultural e harmonização de políticas são muito


maiores em uma aquisição do que em uma aliança.

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(29) Um gerente sênior de uma empresa japonesa manifestou a lógica simples do
empréstimo. As empresas ocidentais, observou ele, “cortam as árvores e nós construímos
as casas". Em outras palavras, nossos parceiros fazem o trabalho de descoberta científica,
mais difícil e mais exigente em termos de recursos, e nós exploramos essas descobertas
para criar novos mercados. É interessante lembrar que foi a Sony a primeira empresa a
comercializar o transistor e o dispositivo de carga acoplado, ambas tecnologias descobertas
pela Bell Labs. Cada vez mais, a tecnologia está perdendo a nacionalidade: Ela atravessa
rapidamente as fronteiras sob a forma de documentos científicos, patrocínio estrangeiro de
pesquisas universitárias, investimentos de capital em líderes da alta tecnologia,
conferências acadêmicas internacionais etc. A extração da tecnologia do mercado global é
uma fonte potencialmente importante de alavancagem de recursos. Em uma amostra de 74
empresas de alta tecnologia da Califórnia beneficiadas por investimentos estrangeiros, uma

empresa japonesa era responsável por 58% desses investimentos. Colher as sementes da
tecnologia plantadas em um outro país é um método de alavancagem de recursos.

(30) O empréstimo pode ser usado para multiplicar recursos em qualquer estágio da cadeia
de valor. Empresas como a Canon, Matsushita e Sharp, todas fabricantes de equipamentos
originais, vendem componentes e produtos acabados para a Hewlett-Packard, Eastman
Kodak, Thomson, Philips e outras como uma forma de financiar sua pesquisa avançada nas
áreas de imagens, tecnologia de vídeo e telas planas. A participação de quase todas as
empresas japonesas que conhecemos nos gastos mundiais com desenvolvimento nas
principais áreas de competência e com a produção dos principais componentes em nível
mundial é maior do que a participação de suas marcas nos mercados finais. Mesmo
atualmente, a empresa coreana de eletrônica Samsung vende cerca de metade de sua
produção para parceiros de estágios posteriores da cadeia de produção. Isso pode ser
considerado como um empréstimo da fatia de mercado de parceiros de estágios posteriores
da cadeia de produção para alavancar os esforços internos de desenvolvimento da
Samsung. A meta é captar a iniciativa de investimento de empresas que não estão
dispostas ou não são capazes de investir na liderança das principais competências, a fim
de conquistar o controle da próxima geração de competências.

(31) Nesses casos, pode-se esperar que os parceiros de estágios anteriores da cadeia de
produção trabalhem arduamente para internalizar a compreensão das necessidades do
cliente, padrões de compra e canais de distribuição de parceiros dos estágios posteriores
da cadeia. Nesse sentido, as alianças freqüentemente representam uma corrida para o
aprendizado. Se um parceiro de um estágio anterior da cadeia de produção internaliza
habilidades únicas do parceiro de um estágio posterior mais rapidamente do que o inverso,

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o poder de barganha inevitavelmente passa para o parceiro do estágio anterior da cadeia
de produção. De modo mais geral, sempre que existe uma assimetria entre os parceiros no
que se refere à sua capacidade de aprender com o outro, o poder de barganha cabe ao
parceiro que está digerindo mais rapidamente as habilidades do outro. Eventualmente, este
parceiro pode ser capaz de sair do relacionamento e readquirir sua liberdade ou pode
preferir explorar seu controle cada vez maior sobre o parceiro.

(32) Se a meta é alavancar recursos através do empréstimo, a capacidade de absorção da


empresa é tão importante quanto sua capacidade inventiva. Em nossa pesquisa sobre
alianças estratégicas, ficou óbvio que algumas empresas eram sistematicamente melhores
do que outras no que se refere aos empréstimos. Em termos simples, algumas empresas
abordaram as alianças e joint ventures com a atitude de um professor; outras abordaram-
nas com a atitude de um aluno. Basta dizer que a arrogância e a plenitude não foram tão
úteis aos empréstimos quanto a humildade e a disposição. Portanto, para algumas
empresas, a razão entre os recursos totais e os recursos desenvolvidos internamente era
muito maior do que 1; para outras empresas, essa razão era menor do que 1. Algumas
empresas tinham uma propensão maior a entregar inadvertidamente suas habilidades a
seus parceiros do que a internalizar as habilidades desses parceiros. Pode-se chamar isso
de alavancagem negativa!

(33) O empréstimo pode assumir uma miríade de outras formas: consolidação de elos
fortes com os fornecedores para explorar melhor sua inovação, compartilhamento dos
riscos de desenvolvimento com clientes críticos, empréstimo de recursos de mercados mais
atraentes (por exemplo, quando a Texas Instruments emprega programadores a custo
relativamente baixo na Índia ligados com os Estados Unidos via satélite) ou participação em
consórcios internacionais de pesquisa (por exemplo, tomar emprestado o dinheiro de
contribuintes estrangeiros). Independente da forma, o motivo é o mesmo - suplementar os
recursos internos com recursos que estão fora das fronteiras formais da empresa.

Complementação de Recursos

(34) Mistura Uma outra forma de alavancagem é a capacidade da empresa de misturar


tipos diferentes de recursos de modo a multiplicar o valor de cada um deles. Esta é a
essência do processo de transformação de recursos. A mistura envolve várias habilidades:
integração tecnológica, integração funcional e criação de novas oportunidades. Vamos
considerar cada uma delas. Tanto a GM quanto a Ford poderiam perfeitamente gastar muito
mais do que a Honda para obter a liderança em um conjunto de tecnologias distintas e
relacionadas a motores como engenharia de combustão, controles eletrônicos, tempo de

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válvula variável, materiais avançados, injeção de combustível e talvez até alcançassem a

liderança científica nessas áreas mas, ainda assim, continuariam atrás da Honda em
termos de desempenho geral do motor.

(35) O essencial não é apenas possuir as habilidades distintas, mas ter a capacidade de
misturar essas tecnologias para criar um motor classe mundial. Isso exige conhecimentos
genéricos de tecnologia, reflexão sobre os sistemas e otimização de negociações

tecnológicas complexas. A liderança absoluta em uma estreita faixa de tecnologias pode


valer pouco e os recursos empregados nessa luta podem permanecer substancialmente
sub-alavancados se a empresa não for tão competente na arte sutil de misturar quanto no
pioneirismo da força bruta. Quando se trata de recursos de alavancagem, a capacidade de
integração e harmonização tecnológica pode ser tão importante quanto a capacidade de
invenção e pode representar uma rota mais eficiente em termos de recursos para o melhor
desempenho do produto.

(36) Uma segunda forma de mistura é a capacidade de integrar com sucesso diversas
habilidades funcionais - P&D, produção, marketing e vendas - para fabricar um produto
bem-sucedido. Em empresas onde a especialização funcional limitada e as chaminés
organizacionais impedem essa integração, a excelência funcional raramente consegue ser
totalmente traduzida em excelência do produto. Nesses casos, a empresa pode investir
muito mais do que seus concorrentes em todas as áreas funcionais, mas obter
recompensas menores no mercado.

(37) Algumas vezes, a questão não é tanto a capacidade da empresa de integrar


habilidades díspares, mas sua criatividade na invenção de novas permutações das

habilidades existentes. A Sony demonstrou com freqüência grande imaginação na mistura


inovadora das principais tecnologias. O walkman da Sony - produto da mistura de suas
habilidades em headphones e gravadores - criou um imenso mercado novo. A Yamaha
combinou um pequeno teclado, um microfone e cartões magneticamente codificados para
criar um piano karaoke para as crianças que toca sozinho. A alavancagem de recursos não
resulta apenas da melhor amortização dos investimentos passados ou de um conjunto
específico de habilidades, mas da criação de formas inteiramente novas de funcionalidade
e, consequentemente, de valor agregado.

(38) Equilíbrio A mistura e o equilíbrio são diferentes - uma envolve a combinação criativa

de habilidades díspares e o outro envolve a propriedade de recursos que multiplicam o


valor das competências únicas de uma empresa. Contudo, ambos são formas de
complementação de recursos.

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(39) Vamos começar com um exemplo. No início da década de 70, a empresa britânica EMI
inventou a tomografia axial computadorizada. Independente de possuir um produto
inovador, a EMI carecia de uma rede internacional forte de vendas e serviços e de
habilidades de produção adequadas. Com um perfil de recursos tão desequilibrado, a EMI
era como um banco de uma perna só — rica em tecnologia mas pobre em distribuição e
produção. Por isso, a EMI não era capaz de captar e manter o que, segundo ela, era sua

fatia justa do mercado de exames auxiliados por computador. Grande parte da riqueza
financeira criada pela inovação da EMI terminou nos bolsos da General Electric e de outros
concorrentes que, depois de encontrarem uma saída para contornar ou adquirir as patentes
da EMI, usaram seu poder de distribuição e excelência de produção para expulsar a EMI do
mercado.

(40) Para ser equilibrada, uma empresa, como um banco, precisa ter no mínimo três
pernas: uma forte capacidade de desenvolvimento de produtos, uma capacidade de fabricar
seus produtos ou fornecer seus serviços em níveis de custo e qualidade classe mundial e
uma infra-estrutura suficientemente ampla de distribuição, marketing e serviços; em suma,
a capacidade de inventar, fabricar e entregar. Se uma das pernas for mais curta do que a
outra, a empresa não será capaz de explorar totalmente o investimento feito em suas áreas
fortes. O impacto na alavancagem surge quando, ao adquirir controle sobre os recursos
complementares, a empresa torna-se capaz de multiplicar os lucros extraídos de seus
próprios recursos únicos.

(41) Muitas pequenas empresas de alta tecnologia estão tão desequilibradas quanto a EMI.
Uma empresa que possui uma forte capacidade de desenvolvimento de produtos, mas é
relativamente fraca em termos de marca ou distribuição ou carece das disciplinas de custo
e qualidade, provavelmente não captará uma grande parte do fluxo de lucratividade
resultante de sua inovação. Embora possa fazer parcerias com empresas que possuem os
recursos complementares críticos, a empresa inovadora provavelmente se encontrará em
uma má posição de barganha com essas empresas quando chegar a hora de dividir os
lucros. Isso explica porque todas as empresas japonesas que conhecemos, embora

dispostas a tomar emprestado temporariamente os recursos de parceiros estrangeiros,


também trabalharam diligentemente para estabelecer sua própria franquia global de marca
e uma infra-estrutura de distribuição em nível mundial. Essas empresas percebem que não
podem captar totalmente os benefícios econômicos de suas inovações se confiarem
inteiramente em outras empresas para ter acesso ao mercado. Portanto, procuraram
controlar os recursos complementares críticos. Uma lógica semelhante impulsionou a
compra da CBS e Columbia Pictures pela Sony. O software da Sony aumenta o valor que o
cliente atribui ao seu hardware e vice-versa.

14
(42) Na indústria internacional de bebidas, a IDV, a Seagrams e a Guiness se
consideravam as principais criadoras e gerentes de marcas. Contudo, hoje, elas percebem
que para alavancar totalmente o patrimônio de marcas como a Smirnoff, a Johnny Walker e
a Chivas Reagal, precisam controlar os distribuidores no mundo inteiro. Essa percepção
iniciou uma competição frenética pela compra e consolidação de distribuidores no mundo
todo.

(43) Independente da natureza do desequilíbrio - forte em distribuição e fraco em


desenvolvimento de produtos, forte em produção e fraco em distribuição ou qualquer outra
combinação - a lógica é a mesma. Uma empresa não pode alavancar totalmente seu
investimento acumulado em uma dimensão se não controlar, de forma significativa, as

outras duas dimensões. Controle não significa necessariamente propriedade, mas


normalmente exige algo mais do que um contrato temporário e à distância. A recuperação
do equilíbrio leva à alavancagem quando os lucros adicionais captados com a aquisição do
controle sobre os ativos complementares críticos supera o custo de aquisição desses
recursos.

(44) Reciclagem Quanto maior a freqüência de reutilização de uma habilidade ou


competência, maior a alavancagem de recursos. A Canon utiliza seu domínio técnico em
ótica de câmeras, copiadoras, equipamento de exame oftalmológico, equipamento de
produção de semicondutores, filmadoras e outras áreas. O sistema de imagens baseado

em cartuchos da Canon, que surgiu pela primeira vez nas copiadoras pessoais, migrou
para as impressoras a laser e fax. A Sharp explora sua competência em monitores de cristal
líquido (LCD) em calculadoras, agendas de bolso eletrônicas, mini TVs, TVs de projeção
em telões e laptops. A Honda reciclou inovações relacionadas a motores em motocicletas,
automóveis, motores de popa, geradores e tratores de jardinagem. Não é surpreendente
que essas empresas tenham uma eficiência inigualável em P&D. Disse que no Japão uma
tecnologia nunca é abandonada, é guardada para uso futuro. Essas empresas são a prova
dessa máxima.

(45) A não ser que os gerentes seniores de toda empresa cheguem a um acordo sobre as
principais prioridades de desenvolvimento, o potencial de reciclagem será gravemente
limitado. Os gerentes de divisão estarão mais propensos a ocultar os recursos escassos do
que a emprestá-los a empresas irmãs. Às vezes pedimos aos vice-presidentes de divisão
que classifiquem o que acreditam ser as dez principais oportunidades da empresa. Quando
essas classificações diferem substancialmente de uma divisão para outra, não existe uma
base consensual para reciclagem de recursos escassos além das fronteiras das unidades.

(46) Evidentemente, a reciclagem não se limita a competências baseadas em tecnologia.

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Uma marca também pode ser reciclada. Mais uma vez, não é surpreendente que as
empresas japonesas, limitadas em termos de recursos, tenham eleito quase universalmente
o uso de banner brands,*1 em vez de marcas isoladas de produtos isolados, para captar as
economias do escopo das banner brands. A familiaridade com uma banner brand de alta
qualidade cria uma forte predisposição por parte do cliente de pelo menos considerar a
compra de novos produtos que levam a "marca do fabricante”. Pense na alavancagem
obtida pela Sony quando ela lança um novo produto; considere o custo relativamente baixo
da Sony em dar credibilidade a um novo produto junto a varejistas e consumidores;
considere a quantidade de boa vontade de que um produto é imbuído simplesmente porque
carrega a marca da Sony.

(47) A capacidade de trocar rapidamente a linha de produção de um produto para outro,


conhecida como produção flexível, é uma outra forma de reciclagem de recursos. Algumas
indústrias automobilísticas japonesas são capazes de fabricar até sete modelos em uma
única linha de produção; as indústrias norte-americanas mal administram mais do que um
modelo por linha. Essa flexibilidade significa menos tempo de paralisação quando a
produção passa de um modelo para outro e, portanto, melhor utilização de recursos.

(48) As oportunidades de reciclagem dos conhecimentos e recursos adquiridos com


dificuldade são múltiplas: compartilhamento de idéias de comercialização entre subsidiárias
nacionais de vendas; migração de melhorias operacionais de uma fábrica para outra,
reutilização de um subsistema em uma variedade de produtos, disseminação rápida de
idéias para melhorar o serviço ao cliente e empréstimo de executivos experientes aos
principais fornecedores. O ganho de alavancagem através da reciclagem exige uma visão
da corporação como um conjunto de habilidades e recursos amplamente acessíveis; exige
que os gerentes de unidades percebam que são administradores, e não “proprietários" dos
recursos humanos fundamentais; exige padrões detalhadamente definidos de comunicação
lateral em relação a que recursos estão alocados e aonde estão alocados e exige um
espírito de cooperação entre os gerentes das unidades. Essas são as bases operacionais
para a reciclagem de recursos.

(49) Cooptação Às vezes é possível atiçar um possível concorrente a lutar contra um


inimigo comum. Às vezes é possível trabalhar coletivamente para estabelecer um novo
padrão ou desenvolver uma nova tecnologia. Às vezes um grupo de empresas pode formar
uma coalizão em torno de uma determinada questão legislativa. Nesses casos e em outros,
a meta é a cooptação de recursos de outras empresas e a conseqüente ampliação da
influência e poder sobre um setor. A cooptação de recursos permite o alistamento de outras

1
* Marca genérica (por exemplo, Sony, GM) que abriga uma série de marcas específicas, por exemplo,
Walkman, Handycam, Saturn e Buick. (N.E.)

16
empresas na busca de um objetivo comum.

(50) Uma empresa que busca a cooptação de outros participantes do setor precisa primeiro
identificar um objetivo comum - esse é o elemento de sedução. O processo de cooptação
começa com uma pergunta: Como posso convencer outras empresas de que elas têm
interesse no meu sucesso? A cooptação é freqüentemente impulsionada pela lógica de que
o inimigo de meu inimigo é meu amigo. Isso pode sugerir que um pouco de maquiavelismo
não é desvantajoso quando se trata de cooptar recursos. O interesse comum na
reconstrução de um setor de equipamentos de produção de semicondutores baseado nos
Estados Unidos motivou um grupo de empresas norte-americanas de semicondutores a
formar a Sematech com a ajuda do governo.

(51) Às vezes a cooptação exige uma certa firmeza, além da sedução. Normalmente, a
firmeza é o controle sobre alguns recursos críticos com os quais os outros participantes do
setor são forçados a contar. A idéia implícita é: “Ou você joga o jogo do meu jeito ou eu
pego minha bola e levo para casa.” Um bom exemplo de cooptação foi o relacionamento da
Fujitsu com seus parceiros no negócio de computadores: A ICM na Inglaterra, a Siemens na
Alemanha e a Amdahl nos Estados Unidos. Todos os parceiros compartilhavam um objetivo
comum - desafiar o domínio da IBM. Este é o elemento de sedução. A firmeza da Fujitsu é a
dependência substancial e, em alguns casos, quase total de seus parceiros em relação aos
semicondutores, processadores centrais, unidades de disco, impressoras, terminais e
componentes da Fujitsu.

(52) A cooptação não exige necessariamente a compra da empresa. Embora tivesse


adquirido o controle acionário da ICL, a Fujitsu não estava disposta a assumir a empresa.
Foi forçada a comprar a empresa para não correr o risco de a empresa-mãe da ICL, STC,
vender a antiga parceira da Fujitsu para um concorrente. De muitas formas, a Fujitsu já
controlava a ICL através da dependência tecnológica. A compra da empresa foi, até certo
ponto, redundante. Isso não é um argumento para provar que a Fujitsu tinha um plano
detalhado e escuso para minar a independência da ICL. Foi a ICL que, no início da década
de 80, instigou a parceria com a Fujitsu. A ICL, mais do que a Fujitsu, reconheceu que não

poderia ter esperanças de vencer os gigantes do setor sem um amigo poderoso.

(53) Proteção Um general sábio garante que suas tropas não sejam expostas a riscos
desnecessários: Ninguém ataca uma posição solidamente protegida, mas dissimula suas
verdadeiras intenções, reconhece cuidadosamente o território antes de avançar, estuda
diligentemente os pontos fracos do inimigo, cria um estratagema para afastar as forças
inimigas do ponto de ataque desejado, explora o elemento surpresa e assim por diante.
Quanto maior a vantagem numérica de um inimigo, maior o incentivo para evitar um
confronto direto. A meta é maximizar as perdas impostas ao inimigo e, ao mesmo tempo,

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minimizar os riscos às suas próprias forças. Esta é a noção de “proteção”.

(54) O ataque a um concorrente no seu mercado interno, a tentativa de igualar suas forças
às do concorrente, a aceitação da definição de estrutura de mercado do líder do setor ou a
rendição à posição de prisioneiro da “prática aceita no setor” são atitudes semelhantes à de
John Wayne, que combatia todos os malfeitores sem a ajuda de ninguém. Isso funciona
melhor em Hollywood do que na competição global. O judô talvez seja uma abordagem
melhor para alavancar recursos do que a queda de braço. O primeiro princípio do judô é
usar o peso e a energia do oponente em seu próprio benefício: Desviar ao invés de
absorver a energia do ataque de seu oponente, desequilibrá-lo e então deixar que o
impulso e a gravidade façam o resto.

(55) A Dell Computer, uma das empresas de computação de crescimento mais rápido dos

Estados Unidos, nunca poderia esperar igualar-se à rede de revenda da Compaq ou à força
de vendas direta da IBM. Em vez disso, a Dell preferiu vender seus computadores pelo
correio. Os líderes do setor, com grande interesse nos arranjos de distribuição existentes,
encontraram dificuldade em alcançar rapidamente a Dell - não porque não tivessem os
recursos, mas porque enfrentaram elementos poderosos (por exemplo, os revendedores)
que tinham um grande interesse na manutenção do status quo. Os fatores críticos ao
sucesso tornam-se ortodoxos quando um concorrente muda com sucesso as regras de
engajamento competitivo. Essa inovação competitiva é uma forma importante de proteger
recursos.

(56) A busca de um território mal defendido ou um “ponto fraco" é uma outra abordagem à
proteção de recursos. O sucesso da Honda com as motocicletas pequenas, as primeiras
incursões da Komatsu na Europa Oridental e a entrada da Canon no segmento de
copiadoras de “conveniência” não chamaram a atenção dos líderes do setor, que estava
voltada para outros problemas. A compreensão da maneira como o concorrente define seu
mercado servido é o primeiro passo na busca de um espaço competitivo mal defendido. A
meta é reunir forças fora do campo de visão dos concorrentes mais fortes.

Recuperação de Recursos

(57) Expedição do Sucesso Outro determinante importante da alavancagem de recursos é


o lapso de tempo entre a utilização de recursos e a sua recuperação, sob a forma de
receita, através do mercado. Um processo de recuperação rápido atua como multiplicador

de recursos. Uma empresa capaz de fazer qualquer coisa duas vezes mais rápido do que
seus concorrentes, com o mesmo comprometimento de recursos, desfruta de uma

vantagem de alavancagem duas vezes maior. Essa aritmética rudimentar explica, em parte,

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por que as empresas japonesas buscaram com tanta diligência a aceleração dos tempos de
desenvolvimento de produtos.

(58) No início da década de 90, estimava-se que as Três Grandes de Detroit precisavam de
uma média de oito anos para desenvolver uma linha inteira de um novo modelo; no Japão,
o valor era quatro anos e meio, com alguns modelos específicos desenvolvidos em metade
desse tempo. Isso permitiu às indústrias automobilísticas japonesas recuperar seus
investimentos mais rapidamente, dispor de mais produtos atualizados e proporcionar aos
clientes maiores oportunidades de assumir compromissos de fidelidade. Uma abordagem
disciplinada no que se refere a chegar a um acordo em relação às prioridades de
desenvolvimento de produtos (foco), uma integração funcional sem emendas (mistura) e
uma forte integração com uma rede de fornecedores capazes (empréstimo e cooptação)
também explica por que as indústrias automobilísticas japonesas foram capazes de
desenvolver um novo modelo com 1,7 milhão de homens-hora de esforço, ao invés dos 3
milhões de homens-hora típicos das indústrias norte-americanas. As empresas japonesas
não só recuperam mais rapidamente seu investimento como precisam de um retorno menor
para colocar a contabilidade de um determinado modelo na azul.

(59) Não estamos fazendo nenhuma tentativa de apresentar uma lista exaustiva de
possíveis estratégias para alavancagem de recursos. A meta é simplesmente desafiar os
gerentes a serem mais criativos ao refletir sobre formas de obter o máximo com o mínimo.
A Tabela 7-1 resume os aspectos da alavancagem de recursos que acabamos de discutir. A
capacidade de alavancagem de recursos de uma empresa pode ser calculada, pelo menos
em parte, em termos do seu estoque. Desafiamos nossos leitores a descobrir outras rotas
de alavancagem de recursos. Entretanto, acreditamos que as cinco arenas amplas de
alavancagem de recursos delineadas na Figura 7-6 abrangem a gama de oportunidades
potenciais de alavancagem. Através de concentração suficiente, acúmulo eficaz,
complementação criativa, conservação cuidadosa e recuperação rápida de recursos, as
empresas podem eliminar a defasagem entre onde estão e onde querem estar.

Tabela 7-1 Aspectos da Alavancagem de Recursos


Convergência Criação de um consenso sobre as metas estratégicas
Foco Especificação de metas de melhoria precisas
Direcionamento Ênfase nas atividades mais valorizadas
Aprendizado Uso total do cérebro de cada funcionário
Empréstimo Acesso aos recursos de parceiros
Mistura Combinação de habilidades de formas inovadoras
Equilíbrio Garantia de ativos complementares críticos

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Reciclagem Reutilização de habilidades e recursos
Cooptação Descoberta de uma causa comum a outras empresas
Proteção Proteção de recursos contra o ataque dos concorrentes
Expedição Minimização do tempo de retorno

Figura 7-6 Categorias de Alavancagem de Recursos

Concentração

Acúmulo Conservação Complementação

Recuperação

Ampliação da Estrutura Estratégica


(60) A estrutura estratégica dominante presta bastante atenção à tarefa de alocação de
recursos. É correto pressupor que os recursos são escassos; a alta gerência deve distribuí-
los com cuidado. Mas não seria também tarefa da alta gerência multiplicar eficazmente a
base de recursos da empresa através de abordagens criativas à alavancagem de recursos?
A alavancagem é menos importante do que a alocação? Se não é, por que a preocupação
quase exclusiva dos gerentes e pesquisadores da área de estratégia com a tarefa de
alocação?

(61) “Se nós tivéssemos mais recursos, poderíamos ser mais estratégicos” é uma opinião
expressa com freqüência pelos gerentes. Contudo, com uma visão de estratégia como
expansão e alavancagem, é evidente que a verdadeira questão para a maioria desses
gerentes não é a falta de recursos, mas o excesso de prioridades e a escassez capacidade
de expansão e de pensamento criativo sobre como alavancar recursos. Não é
surpreendente que muitos desses gerentes sintam-se limitados em termos de recursos: Em
certo sentido, eles realmente estão limitados. Mas cobri-los de novos recursos, na falta de
uma melhoria fundamental em sua capacidade de alavancar recursos, não proporcionaria
mais do que um alívio temporário às suas frustrações.

(62) A previsão e a arquitetura estratégica fornecem o mapa e a expansão e a


alavancagem fornecem o combustível. Contudo, mesmo com esses ingredientes críticos, a
viagem para o futuro pode ser longa e tortuosa. Nos próximos capítulos, analisamos o que

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a gerência sênior precisa fazer para navegar entre os mercados de hoje e os mercados de
amanhã.

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