Você está na página 1de 8

.

ECONOMIA DE ÁGUA E COMBUSTÍVEL


ATRAVÉS DO CONTROLE DE DESCARGA DE FUNDO DA CALDEIRA

AUTOR : REGINALDO DE MATTOS ONOFRE


Técnico de Instrumentação - Petrobrás – Santos SP
Instrutor de Automação e Controle – SENAI – Santos SP
Sócio Diretor da Standher & Associados Cursos e Treinamentos

Resumo:

A medida que a caldeira produz vapor, acumulam-se os sais minerais que penetram no seu interior
com a água de reposição. A concentração excessiva desses sais e consequente formação de
incrustações nas instalações a jusante da caldeira comprometem o funcionamento eficiente de todo
o sistema.

Em muitas caldeiras, principalmente as de menor porte, é suficiente instalar uma válvula de


descarga rápida ( válvula de fundo de caldeira ) para se obter a extração de lodo e sais. Mas as
caldeiras de maior porte requerem, um dispositivo adicional para a dessalinização contínua e a
automatização da válvula de descarga periódica

VÁLVULA DESCARGA DE FUNDO

A extração periódica de lodo e a dessalinização contínua


são de importância vital para o funcionamento perfeito
de caldeiras de vapor.
A dessalinização contínua mantém a densidade da água
na caldeira dentro dos limites admissíveis. Já a extração
periódica do lodo, serve para conservar o fundo da
caldeira livre do lodo, microorganismos e outras
impurezas que aí se acumulam. Na maioria dos casos, é
necessário adotar ambos os sistemas para se obter, a
otimização de rendimento e segurança das instalações.
Mesmo quando a água de alimentação da caldeira for
inteiramente abrandada e desmineralizada, é
recomendável instalar válvulas de descarga periódica e
de dessalinização contínua, pois qualquer falha nos
equipamentos de tratamento da água ou em seus
acessórios pode provocar a entrada de água não tratada na caldeira.

1
.

A continuidade dos processos de vaporização e reposição de água, acarreta o aumento de


concentração de impurezas na caldeira. Para evitar a conseqüente formação de incrustações nas suas
paredes, adicionam determinados produtos químicos a água que modificam a constituição de certas
impurezas, dando origem a partículas que se depositam no fundo da caldeira em forma de lodo. A
mistura desse lodo com o oxigênio e gás carbônicos exerce ação corrosiva, danificando as paredes
dos tubos da caldeira ou destruindo-os. O acúmulo progressivo das incrustações pode provocar
tensões térmicas capazes de fender as paredes da caldeira ou rachar os rebites, Se as camadas de
lodo atingir os tubos, as tensões térmicas ainda podem ser agravadas pela conseqüente retenção de
calor, causando a destruição do tubo.
Para evitar estes problemas, cuja gravidade nem sempre é previsível, efetua-se a extração periódica
do lodo através de válvulas instaladas no fundo das caldeiras.

REQUISITOS TÉCNICOS PARA UMA VÁLVULA DE DESCARGA


Obtém-se melhor efeito na extração de lodo utilizando-se válvulas que abrem instantaneamente e
liberam a seção plena da passagem. Somente assim se consegue a aceleração brusca da descarga de
água no fundo da caldeira, necessária para arrastar consigo o lodo, assim como bolhas de gases e
outros corpos estranhos. A duração de descarga, normalmente não deve exceder a 3 segundos, para
garantir por um lado, o máximo efeito de arraste e, por outro lado, minimizar as perdas de água.
Além disso, as válvulas devem fechar automaticamente com a mesma instantaneidade da abertura, a
fim de minimizar as perdas de pressão e água, e garantir o funcionamento normal de toda
instalação, independente de eventual falha do operador.
Outro fator importante, é a força de fechamento, que deve ser suficiente para fragmentar corpos
estranhos e mesmo as mais duras incrustações existentes no meio efluente. Isto significa que, sejam
quais forem as condições de serviços, a válvula deve sempre assegurar vedação estanque. Portanto,
a dureza e a resistência do material empregado no obturador e na sede, deve corresponder a essas
exigências.

VÁLVULAS COMUNS

São dotadas de haste roscada, não podem ser


abertas e fechadas complemente em tão curto
espaço de tempo. Conforme o tipo, estas
válvulas levam de 35 a 57 segundos para efetuar
a drenagem. Portanto, a perda de água e queda
da pressão são inteiramente
desproporcionais em relação a duração de apenas
3 segundos de abertura total. Além disso, a
conseqüente ausência de aceleração do fluxo (
efeito da ação rápida) compromete o
resultado desejado. A quantidade de lodo
descarregado é insignificante. Além de não
fecharem automaticamente, a força de
fechamento destas válvulas depende da
própria força física do operador.

2
.

VÁLVULAS ESPECIAIS
Válvula com mecanismo de ação rápida, abre instantaneamente a seção plena de passagem,
conservando-a livre durante o breve período de 3 segundos para a descarga e imprime ao fluxo a
aceleração necessária para arrastar a máxima quantidade de lodo, com perdas mínimas de água e
pressão. Ver. Fig. Abaixo.

De adicionamento manual ou de pedal, são de manuseio simples, o que significa economia de


tempo e mão de obra. Além disso, são de fechamento automático com dispositivo que fornecem
uma força de até 4000 Kgf, capaz de fragmentar incrustações e outros corpos estranhos,
assegurando desta forma vedação estanque nas condições mais difíceis. A figura a seguir, mostra
um gráfico com acionamento rápido.

COMPARAÇÃO DA EFICIÊNCIA ENTRE AS VÁLVULAS ESPECIAL E COMUM


a- O mecanismo de ação rápida abre instantaneamente toda a
passagem, conservando-a livre durante todo o período de
descarga do lodo, e imprime ao fluxo a aceleração
necessária para arrastar a máxima quantidade de lodo. As
perdas de água e de pressão são mínimas.

b- Se abrimos válvulas do tipo convencional apenas durante 3


segundos para evitar as perdas acima descritas, elas não
alcançam o seu curso completo. Por isso, ocorrem apenas
perdas de água e pressão. Não há purga de lodo.

c- As válvulas comum levam 35 a 57 segundos para efetuar a


drenagem, e quase todo este tempo é consumido para abrir e
fechar a válvula. O desperdício de água e a queda de pressão, devido a lentidão do processo de
abertura e fechamento, é desproporcional em relação ao breve período de abertura plena,
apenas 3 segundos. Além disso, devido a ausência de aceleração brusca do fluxo, a eliminação
do lodo é demasiadamente restrita. (Vide fig. Abaixo):

3
.

COMPARAÇÃO DE CUSTOS

A diferença entre as válvulas de descarga rápida e as válvulas de descarga comuns é notada


principalmente na economia que proporcionam.
Ao observarmos a figura a seguir, constatamos que as áreas totais dos gráficos representam as
quantidades de água quente consumidas a cada descarga das válvulas. Como as vazões
nominais são idênticas, todas as alturas são
iguais.
Isso significa que para o tipo (1) teremos o
mínimo consumo possível, tomado como
padrão.
Para o tipo (2), a quantidade é mais de 6 vezes
para maior e para os tipos (3) e (4), 10 vezes
maior.
Considerando que uma caldeira de médio porte
(10 toneladas\hora de vapor), trabalhe a pressão
de 10 Kg/cm2 e descarregue 4% de sua
produção horária como condição necessária
para manter os níveis lodo e sais dentro do
tolerável, e sabendo-se ainda que 1 tonelada de
óleo combustível gera, aproximadamente, 13
toneladas de vapor saturado nesta pressão,
teremos um consumo de aproximadamente 31
Kg de óleo, apenas para suprir o consumo
horário das descargas normais de uma válvula
de descarga rápida.
Chegamos, então, à conclusão de que
desperdiçaríamos mais de 155 Kg de óleo por
hora se usássemos uma válvula tipo (2) ou ainda 280 Kg se fosse uma do tipo (3) ou (4) .

4
.

EXEMPLO DE VÁLVULA DE DESCARGA CONTÍNUA:

DADOS TÉCNICOS DA CALDEIRA :


Fabricante : Dedine
Tipo : Aquatubular
Modelo : Keystone
Pressão de trabalho : 150 psi
Capacidade : 12 T/h
Combustível : C-1A

DADOS COLETADO NA CASA DE CALDEIRA

CONSUMO DE ÁGUA
Durante todo processo de medições das variáveis do processo , algumas eram estarrecedoras . Como
explicar por exemplo , no dia 14/11/96 a entrada de 53000 litros de água no desaerador e a
produção de vapor de 31617 kg? Teoricamente se entra 51 t de água tem que sair 51 t de vapor ,
não estamos levando em conta o retorno de condensado e estamos dispensando as perdas por efeito
JOULE e outras menos significantes , mas na realidade o que ocorria era uma discrepância .
Outra situação que nos intrigou foi o fato de , quando se fazia o alinhamento dos permutadores ( o
consumo em torno de 6 t/h ) a quantidade de água que entrava no desaerador era bem menor
comparada com a quantidade consumida quando os permutadores não estavam alinhados .
Comecei a monitorar a relação entrada de água / produção de vapor e equipamentos alinhados .

FATOS INERENTES A ÁREA


A linha V3 , alimenta o FLARE e ÁREA DE GLP , estes processos não tem retorno de condensado
, isto quer dizer que : A quantidade de vapor produzido terá proporcionalmente a quantidade de
água entrando na caldeira .
A linha V10 , alimenta os trocadores de calor ; as serpentinas dos tanques ; os steam-trace , estes
processos tem retorno de vapor , isto quer dizer que : parte do vapor retorna em forma de
condensado , portanto necessitamos de menos água para completar o nível do desaerador .
Com essas informações podemos concluir que :

5
.

Quando só V3 está alinhada , não existe praticamente retorno , neste caso o consumo de água
entrando no desaerador é alto , pelo menos o que a caldeira produziu . ( a relação água/vapor com
este alinhamento chegou a 3,36 litros de água para cada quilo de vapor produzido )
Quando a V10 está alinhada , uma parte do vapor retorna em forma de condensado , neste caso
encontramos uma relação de 1,5 litros de água para cada quilo de vapor produzido .

Com tantas informações contraditórias , concluímos que seria melhor monitorarmos as variáveis
“vazão de água e vazão de vapor” mais de perto , pois assim teríamos um reflexo mais coerente do
que estava acontecendo .
No dia 27/11/96 o consumo de água foi 62123 litros e o vapor de 19309 kg , a relação ficou em
3.21 l/kg .
No dia 28/11/96 o consumo de água foi 67043 litros e o vapor de 14445 kg , a relação ficou em
4,63 l/kg .
Nos dois casos as descargas de fundo foram feitas com duração de 20 seg. e seis vezes (6) por turno
( informalmente sabemos que as vezes este número pode chegar a sete por turno , e o tempo pode
ultrapassar 20 seg. ) .
Modificamos a descarga de fundo para o tempo de abertura da válvula de 3 segundos , a seguir
tabela com os dados coletados .

4e5/12/96 terça terça quarta quarta quarta


9:30 h 16:00 h 00:00 h 8:30 h 16:50 h
totalizador de
vapor ( kg ) 177635 204550 234580 244153 264201
hidrômetro
em m3 1313 1329 1352 1378 1409
relação
água/vapor 0,59 0,76 2,71 1,54

Na terça entre 9:30 h 2 19:00 h aproximadamente , os permutadores estavam alinhados , com isso ,
temos retorno de condensado , e as descargas de fundo foram feitas com o tempo de 3 seg. , a
relação água/vapor ficou entre 0,59 à 0,76 , ou seja , para cada quilo de vapor produzido entrou 0,59
quilos de água .
O teste continou no turno da meia-noite às 8:00 h , só que , apenas a V3 estava com consumo , a
relação volta a subir novamente . O valor 2,71 é contestável , pois , no período do ADM a caldeira
estava nas mesmas condições e a relação caiu para níveis aceitáveis de 1,54 ( o fator humano fez a
diferença ) .
Este valor pode ser dividido em :
- Se entra um quilo de água , sai um quilo de vapor .
- O restante ( 0,54 ) está as descargas corretas , as quais consome 273 litros de água
aproximadamente com tempo de 3 seg. e descargas que não estavam programadas .

CÁLCULO DE PERDAS
Se para cada quilo de vapor produzido , entra 3,21 litros de água , e nossa produção diária gira em
torno de 20.000 kg de vapor , podemos afirmar que :
- Por dia ( nas condições de somente linha V3 consumindo vapor ) o consumo de água gira em
torno de 60 m3 .
- Fazendo descarga de fundo com tempo de 20 seg. ( anexo 1 ) seis vezes ( 6 ) por turno , ou seja ,
dezoito vezes (18) por dia , e levando em consideração a pressão do corpo da caldeira 7,5 kg/cm2 ;
diâmetro da válvula de descarga de fundo 2 inch , o consumo de água é de 32 m3 .
Estamos jogando fora boa parte da água que foi tratada , abrandada e desaerada .

6
.

- Fazendo descarga de fundo com tempo de 3 seg. ( anexo 2 ) seis vezes ( 6 ) por turno , ou seja ,
dezoito vezes ( 18 ) por dia , e levando em consideração a pressão do corpo da caldeira 7,5 kg/cm2 ;
diâmetro da válvula de descarga de fundo 2 inch , o consumo de água é de 5 m3 .

Podemos também mensurar o consumo de água da caldeira através da descarga de fundo utilizando
equação de Bernouli , como mostramos a seguir :
Pc = 7,5 kg/cm2 ( pressão )
γ = 1000 kgf/m3 ( peso específico )
V2c = 0 m/s ( velocidade )
g = 10 m/s2 (aceleração gravitacional )
Zc = 6m ( altura de coluna )
Pd = 0
V2d = ?
Zd = 0

Pc = V2c + Zc = Pd + V2d + Zd
γ 2g γ 2g

7,5 kgf * m3 + 0 + 6m = 0 + V2d + 0


cm2 1000 kgf 2*10m/s2

V2d = 1620 m2
s2
V2d = 40,25 m/s

Q = A* V Área = π * D2 3,14 * ( 0,0508 m )2 = 0,00202 m2


4 4
Q = 0,00202 m2 * 40,25 m/s Q = 0,08153 m3/s

Q = 81,53 litros/seg.

Cada descarga com tempo de duração de 20 seg. , totalizaríamos 1630,6 litros ( por descarga )
são 18 por dia , portanto 29350,8 litros ou aproximadamente 30 m3 . Quando faz-se a contagem
do tempo para a descarga de fundo os métodos variam desde contar de 1 á 20 s como cronometrar
este tempo , portanto a diferença entre o calculado e o medido está no tempo de duração que é dado
cada descarga .
Consultamos também a tabela de um fabricante onde relaciona a vazão de descarga ( litros/segundo
) em função da pressão de operação da caldeira e do diâmetro nominal da válvula de dreno de fundo
mostrado a seguir :
O ½” 1” 1½” 2” 2½”
psi
100 13 27 60 80 118
150 20 36 74 100 135
200 21 38 81 112 170
Podemos notar que :
Onde cruza a linha que indica a pressão de 100 psi , (aproximadamente 7,5 kg/cm2 ) com a coluna
de diâmetro de 2” encontraremos uma vazão de 80 litros/segundo .
Analisando as contas de água por um período de 5 anos, verificamos uma queda acentuada no
consumo a partir da data da instalação da válvula de descarga de fundo.

7
.

ANO CONSUMO MÉDIO


1 6032
5 4732

Custo / Benefício
O custo de uma válvula de descarga de fundo automática é de R$ 3000,00 , em 4 mês teríamos o
retorno só com a economia de óleo combustível , com a grande vantagem de estar unificado o
padrão das descargas de fundo e garantida a qualidade do processo .Devemos salientar que menos
água desperdiçada teremos menos óleo combustível e menos produto químico para tratamento .
Quando colocamos a proposta de automatizarmos a descarga de fundo da caldeira , o objetivo não
era apenas de economizarmos água , já que 27 m3 eram desperdiçados , mas também de
economizarmos óleo combustível , pois a água entra na caldeira com 105 ºC sendo aquecida até
170 ºC , recebendo um calor sensível de 174 kcal/kg , os quais foram gerados pela combustão .
Usando a metodologia a seguir , calculamos a quantidade de óleo utilizado no aquecimento da
água.
Óleo comb. = 9600 kcal/kg
Água à 7,5 kg/cm2 = 174 kcal/kg

Portanto : 9600 kcal/kg 55,17 * 0,8 = 44,13 kg H2O


174 kcal/kg kg óleo

Nessas condições precisamos de 1 kg de óleo para aquecer 44 kg de H2O de 0ºC à 170 ºC , porém
a água entra na caldeira com 105ºC , portanto :

Portanto : 9600 kcal/kg 139,9 * 0,8 = 111,9 kg H2O


68,6 kcal/kg kg óleo

Nessas condições precisamos de 1 kg de óleo para aquecer 111,9 kg de H2O , como 27.000 litros
por dia eram jogados fora concluímos que :

27000 = 241,28 kg de óleo por dia * 30 = 7238,60 litros de óleo por mês
111,9

CONCLUSÃO
A automatização das válvulas de descargas de fundo das caldeiras evitaram uma perda de um
pouco mais de 900 m3 de água por mês , produtos químicos que eram utilizados para tratar esta
água , combustível para elevar a temperatura de 105 ºC até 170 ºC e as constantes perdas de pressão
do tubulão em cada descarga de fundo criando oscilações e dificultando o controle .
Muito há de se fazer objetivando economizar energia e só com muita perseverança conseguiremos
atingir as metas do custo/benefício ideal para cada equipamento/linha e/ou processo .

BIBLIOGRAFIA
Catálogo técnico da SPIRAX/SARCO IND. COM. LTDA
Catálogo técnico da ASCA EQUIPAMENTOS INSDUSTRIAIS LTDA

Você também pode gostar