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06/07/13 Eliseu Sposito - Reestruturação produtiva e urbana no Estado de São Paulo

IX Coloquio Internacional de Geocrítica

LOS PROBLEMAS DEL MUNDO ACTUAL.


SOLUCIONES Y ALTERNATIVAS DESDE LA GEOGRAFÍA
Y LAS CIENCIAS SOCIALES

Porto Alegre, 28 de mayo - 1 de junio de 2007.


Universidade Federal do Rio Grande do Sul

REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E REESTRUTURAÇÃO URBANA NO ESTADO DE SÃO


PAULO1

Eliseu Savério Sposito


Departamento de Geografia
Universidade Estadual Paulista (Unesp) - Campus Presidente Prudente
Pesquisador do CNPq
essposito@prudenet.com.br

Reestruturação produtiva e reestruturação urbana o Estado de São Paulo (Resumo):

No Estado de São Paulo, movimentos de desconcentração da atividade industrial produtiva vêm se


acompanhando de centralização do capital na metrópole paulistana. Novos padrões de localização industrial
denotam a formação de eixos de transporte e comunicações que são escolhidos pelas empresas, constituindo
territórios que se diferenciam por sua densidade de investimentos e de implantação de estabelecimentos
industriais com fortes componentes tecnológicas. Aglomerações metropolitanas, não-metropolitanas e
cidades que desempenham papéis intermediários na rede urbana experimentam completa redefinição de seus
papéis, podendo se averiguar, então: - reestruturação urbana, decorrente da alteração das relações entre as
cidades paulistas, e entre estas e outras cidades do Brasil e do exterior; - mudanças nas lógicas de
organização dos espaços internos dessas cidades, conformando reestruturação da cidade.

Palavras-chave: localização industrial, reestruturação produtiva, eixo de desenvolvimento, reestruturação


urbana, território, cidades médias.

Reestructuración productiva y reestructuración urbana en el Estado de São Paulo, Brasil


(Resumen):

En el Estado de São Paulo, Brasil, los movimientos de desconcentración de la actividad productiva industrial
se vienen acompañando de la centralización del capital en la metrópoli. Nuevos patrones de localización
industrial muestran la formación de ejes de transporte y de comunicaciones que inducen a las empresas en su
localización y constituyen territorios que se diferencian por la densidad de inversiones y por la implantación
de establecimientos industriales con fuertes componentes tecnológicos. Aglomeraciones metropolitanas, no-
metropolitanas y ciudades intermedias dentro de la red urbana experimentan completa redefinición de sus
roles, lo que permite-reestructuración urbana resultante de la alteración de las relaciones entre las ciudades
paulistas, y entre esas y otras ciudades de Brasil y del exterior- cambios en las lógicas de organización de los
espacios internos de las ciudades, conformando una reestructuración de la ciudad.

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Palabras-clave: localización industrial, reestructuración productiva, eje de desarrollo, reestructuración


urbana, territorio, ciudades intermédias.

Productive restructuration and urban restructuration in the State of São Paulo, Brazil (Abstract):

In São Paulo State, Brazil, movements of deconcentration of productive industrial activity comes together
with the centralization of capital within the metropolis. New patterns of industrial localization show the
formation of transport and communication axes which are chosen by the enterprises, making these territories
to be differenciated by their density of investments and of implantation of industrial settings with strong
technological components. Metropolitan and non-metropolitan agglomerations, and middle-cities in an urban
network experience a total redefinition of their roles, allowing us to affirm: - urban reestructuration resulting in
the alteration of relations among cities in São Paulo State, and among those cities and other cities in Brazil and
foreign lands; - changes in the logic of organization of internal spaces of the cities conforming a restructuration
of the city.

Key-words: industrial localization, productive reestructuration, axis of development, urban reestructuration,


territory, middle cities.

No Estado de São Paulo, movimentos de desconcentração da atividade produtiva industrial vêm se


acompanhando de centralização do capital na metrópole paulistana. Novos padrões de localização industrial
denotam a formação de eixos de transporte e comunicações que são escolhidos pelas empresas, constituindo
territórios que se diferenciam por sua densidade de investimentos e de implantação de estabelecimentos
industriais com fortes componentes tecnológicas. Aglomerações metropolitanas, não-metropolitanas e
cidades que desempenham papéis intermediários na rede urbana experimentam completa redefinição de seus
papéis, podendo se averiguar, então: - reestruturação urbana, decorrente da alteração das relações entre as
cidades paulistas, e entre estas e outras cidades do Brasil e do exterior; - mudanças nas lógicas de
organização dos espaços internos dessas cidades, conformando reestruturação das cidades.

Para realizar a exposição e ensaiar uma análise do tema, vamos trabalhar com as noções de
desenvolvimento, eixo e território, demonstrar como ocorreu a desconcentração industrial em São Paulo e
como ocorreram as mudanças nas lógicas de organização dos espaços internos das cidades, com enfoque
principal nas cidades médias do estado.

Eixos de Desenvolvimento

O primeiro elemento a ser apresentado é a noção de desenvolvimento associada à idéia de eixo.

O aprofundamento de um conceito como o de eixo de desenvolvimento vem sendo elaborado, no Brasil, e


provocando debates no meio acadêmico, desde as primeiras contribuições de Sposito (2002) e Matushima
(2001, 2002).

No plano teórico, o conceito abrange as mudanças se dão na territorialização de novas dinâmicas


direcionadas pelo paradigma dos eixos que se sobrepõe ao modelo do paradigma das áreas ou das manchas
de disseminação de novas tecnologias e de unidades de produção. A tese defendida neste momento é de que
o paradigma das áreas, sem a inter-relação de trocas, fluxos e movimento pessoas e mercadorias não explica
mais as dinâmicas territoriais. A argumentação que sustenta esta proposta vem a seguir.
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O aumento da produtividade, a redução dos custos de produção, os ganhos de escala e a acumulação de


capital, embora dinamizem algumas parcelas do território, não são suficientes para se explicar e compreender
o desenvolvimento, pois o incremento da atividade produtiva e o aumento da acumulação, por si só, não são
suficientes pois, no modo capitalista de produção, as rendas são apropriadas pelos proprietários dos meios
de produção; e isso pode gerar, quando muito, crescimento econômico. O desenvolvimento, em sua forma
geográfica mais extensa e socialmente positiva só ocorrerá quando os benefícios auferidos com o aumento da
produtividade forem revertidos para a satisfação das condições de vida da maioria da população, com uma
melhor distribuição da renda e das riquezas geradas com investimentos maiores nas potencialidades humanas.

Para Bresser Pereira (2003), por exemplo, só há desenvolvimento quando se conjugam transformações
econômicas, sociais e políticas proporcionando melhorias nas condições de vida da população de forma
continuada. Para ele,

O desenvolvimento é um processo de transformação econômica, política e social,


através do qual o crescimento do padrão de vida da população tende a tornar-se
automático e autônomo. Trata-se de um processo social global, em que as
estruturas econômicas, políticas e sociais de um país sofrem contínuas e profundas
transformações. Não tem sentido falar-se em desenvolvimento apenas
econômico, ou apenas político, ou apenas social. Não existe desenvolvimento
dessa natureza, parcelado, setorizado, a não ser para fins de exposição didática.
Se o desenvolvimento econômico não trouxer consigo modificações de caráter
social e político; se o desenvolvimento social e político não for a um tempo o
resultado e a causa de transformações econômicas, será porque de fato não
tivemos desenvolvimento. As modificações verificadas em um desses setores terão
sido tão superficiais, tão epidérmicas, que não deixarão traços. (BRESSER
PEREIRA, 2003, p. 31).

Celso Furtado definia, na década de 1960, o desenvolvimento econômico como uma mudança na estrutura
econômica que vai muito além do crescimento, que não trará desenvolvimento a menos que gere empregos e
contribua para a diminuição da pobreza e das desigualdades sociais com a realização das potencialidades
humanas:

Sintetizando, o desenvolvimento tem lugar mediante aumento de produtividade do


conjunto econômico complexo. Esse aumento de produtividade (e de renda per
capita) é determinado por fenômenos de crescimento que têm lugar em
subconjuntos, ou setores, particulares. As modificações de estrutura são
transformações nas relações e proporções internas do sistema econômico, as
quais têm como causa básica modificações nas formas de produção, mas que não
se poderiam concretizar sem modificações na distribuição e utilização da renda.
(FURTADO, 2000a, p. 103-104).

Na visão de Furtado (1964; 2000a; 2000b), nota-se, claramente, a necessidade da existência do requisito
da satisfação social plena como decorrência das inovações tecnológicas.

Schumpeter (1989) foi um dos primeiros autores a reconhecer a importância das inovações nos processos
de desenvolvimento e que se fazem necessárias em razão da concorrência das empresas na conquista de
novos mercados. Ele já considerava como inovação a introdução de um novo bem e de um novo método de
produção, a abertura de um novo mercado, a utilização de uma nova fonte de abastecimento e a criação de
uma nova organização na indústria.

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Mesmo que o papel da tecnologia esteja associado, no plano do senso comum, a materiais, técnicas,
ferramentas e processos, deve ser entendido, também, como o conhecimento humano utilizado para se
aumentar a produção e a competitividade empresarial. Por outro lado, a realização de investimentos é o
caminho utilizado pelas empresas para se transferir o conhecimento científico para as bases produtivas.

O desenvolvimento econômico e a dinâmica produtiva dependem da introdução e difusão das inovações e


do conhecimento que impulsionam a transformação e a renovação do sistema produtivo, tendo em vista que
a acumulação do capital traduz-se pela acumulação de tecnologias e do conhecimento científico. O fator
tecnológico é imprescindível para a vitalidade da economia e a inovação tecnológica é responsável pelo
rompimento e/ou aperfeiçoamento das técnicas e processos de produção que resultam em ganhos de
competitividade.

A inovação é um processo contínuo integrado às várias etapas do conhecimento que permitem transformar
uma idéia em um produto e as empresas inovadoras levam vantagem sobre suas concorrentes quando são
capazes de satisfazer as necessidades e demandas que clientes e consumidores expressam no mercado.
Assim, a busca constante pela inovação é uma condição cada vez mais necessária para as empresas
continuarem crescendo e permanecerem competitivas.

Por essas razões, o par desenvolvimento humano – inovações tecnológicas é fundamental para a
caracterização do conceito de desenvolvimento.

No entanto, não se pode negar que a introdução de inovações tecnológicas em uma sociedade gera
transformações nas relações sociais de produção como o desemprego estrutural2, com novas localizações e,
por conseqüência, com novas dinâmicas na estruturação interna das cidades e nas relações entre as cidades.

Smith (1988) deixa claro, em sua obra, a desigualdade e a contradição do desenvolvimento existente no
modo capitalista de produção. A desigualdade entre os detentores dos meios de produção e os assalariados
é a contradição decorrente da mobilidade do capital (que o autor chama de “vaivém do capital”), pois, ao
mesmo tempo em que o capital desenvolve territórios com condições favoráveis para o aumento das taxas
de lucro, gera o subdesenvolvimento daquelas áreas onde se verifica o contrário. No entanto, o próprio
desenvolvimento contínuo, por sua vez, leva à diminuição das taxas de lucro, em razão de vários fatores
como o aumento salarial dos trabalhadores, fortalecimento dos sindicatos, diminuição do exército industrial
de reserva, aumento das conquistas trabalhistas etc. Com isso, o capital, que não mais se encontra preso às
barreiras geográficas em razão do desenvolvimento dos transportes, da informação e das telecomunicações,
migra para áreas ou regiões até então com condições diferenciadas na localização das atividades produtivas,
mas que despontam como atrativas para o aumento da lucratividade capitalista em razão do baixo custo da
mão-de-obra (desempregada ou subempregada) e/ou dos reduzidos níveis de organização dos
trabalhadores. Assim:

O capital busca não um equilíbrio construído na paisagem, mas um equilíbrio que


seja viável precisamente em sua capacidade de se deslocar nas paisagens de
maneira sistemática. Este é o movimento em ‘vaivém do capital’, que está
subjacente ao processo mais amplo de desenvolvimento desigual. (SMITH, 1988,
p. 213).

Amartya Sen (2000, p. 25) considera o desenvolvimento estritamente relacionado com as várias formas de
liberdade, que são: “(1) liberdades políticas, (2) facilidades econômicas, (3) oportunidades sociais, (4)
garantias de transparência e (5) segurança protetora”, em oposição às diversas modalidades de privação do
crescimento humano pleno, como a miséria, a fome, a deficiência cultural, a violação das liberdades políticas
e dos direitos humanos, a violência, a carência de oportunidades econômico-sociais, o desemprego e a
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negligência dos serviços públicos, entre outras modalidades que ele descreve.

As liberdades instrumentais estão interligadas e são interdependentes, funcionando como uma corrente que
contribui para o crescimento da liberdade humana como um todo. Nas palavras do autor:

Às vezes, a ausência de liberdades substantivas relaciona-se diretamente com a


pobreza econômica, que rouba das pessoas a liberdade de saciar a fome, de obter
uma nutrição satisfatória ou remédios para as doenças tratáveis, a oportunidade de
vestir-se ou morar de modo apropriado, de ter acesso à água tratada ou
saneamento básico. Em outros casos, a privação de liberdade vincula-se
estreitamente à carência de serviços públicos e assistência social, como, por
exemplo, a ausência de programas epidemiológicos, de um sistema bem planejado
de assistência médica e educação ou de instituições eficazes para a manutenção da
paz e da ordem locais. Em outros casos, a violação da liberdade resulta
diretamente de uma negação de liberdades políticas e civis por regimes autoritários
e de restrições impostas à liberdade de participar da vida social, política e
econômica da comunidade (SEN, 2000, p. 18).

Para se amenizar as profundas privações de liberdades existentes, principalmente (mas não unicamente), nos
países mais pobres, Sen (2000) defende dois caminhos que devem se encontrar e se complementar,
denominados de processos “mediados pelo crescimento” e os “conduzidos pelo custeio público”.

O primeiro processo refere-se ao crescimento econômico rápido e contínuo, que deve ser construído,
paulatinamente, nas suas bases, com uma política de crescimento do número de empregos e investimentos
em educação, saúde e assistência social.

O segundo processo defendido por Sen (2000), conduzido pelo custeio público, diz respeito a um programa
social de manutenção dos serviços de saúde, educação e assistência social mesmo em situações de baixo
crescimento econômico.

No entanto, vamos voltar para a principal preocupação neste texto. A introdução e a difusão das inovações
tecnológicas são vitais para a modernização do sistema produtivo das empresas, contribuindo para uma
maior competitividade e rentabilidade. São representadas por melhorias nas ferramentas, na qualidade das
máquinas e equipamentos e na organização das empresas que aumentam a produtividade da mão-de-obra e
dinamizam os produtos para uma melhor aceitação no mercado, assegurando os lucros que estimulam a ação
empresarial, a produção e novos investimentos em tecnologias, que se torna um processo contínuo. E isso
provoca, territorialmente, novas lógicas de localização das atividades.

A organização flexível da produção se faz presente principalmente nos sistemas produtivos locais, com
empresas inter-relacionadas que permitem manter “rendimentos crescentes quando as relações e a interação
entre as empresas propiciam a utilização das economias de escala ocultas nos sistemas produtivos e nos
centros urbanos” (VÁZQUEZ BARQUERO, 2001, p. 21). Relaciona-se com a formação de redes de
empresas que possibilitam a ampliação dos mercados e uma maior cooperação empresarial no sentido de
uma troca de experiências, serviços, produtos e conhecimentos, possibilitando uma maior eficiência e
competitividade das empresas dinamizando o território e os seus entornos.

Vázquez Barquero (2001) considera as cidades como o espaço preferencial para o desenvolvimento, pois é
o local de onde são tomadas as principais decisões de investimentos e de localização das empresas, devido
às potencialidades de desenvolvimento e à capacidade de gerar externalidades existentes no território,
entendido como um espaço de relações econômicas, sociais, políticas, culturais e legais. É na atmosfera das

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cidades que o conhecimento científico se faz presente, pois é no meio urbano que se localizam os principais
centros de pesquisa e desenvolvimento (P & D), responsáveis pela criação e o desenvolvimento das
tecnologias que serão utilizadas pelas indústrias. É no meio urbano que os atores econômicos, sociais e
políticos se relacionam e trocam suas experiências, bens, serviços e conhecimentos.

Associado ao conceito de desenvolvimento, a noção de eixo torna-se necessária para se compreender as


dinâmicas territoriais no Estado de São Paulo. As vias de transporte de trânsito rápido, associadas à infra-
estrutura logística de comunicação por internet e fibras óticas, que proporcionam condições mais favoráveis
para a localização industrial e a dinâmica interna das cidades em sua organização em forma de redes,
recebem a denominação de eixos de desenvolvimento.

A primeira contribuição sobre o tema é de Sánchez Hernández (1998), para quem há propriedades que
caracterizam as vias de transporte como definidoras dos eixos:

· Conjunto de vias de transporte que outorga acessibilidade aos fatores de localização industrial.

· Redutor das incertezas nas decisões de localização.

· Conjunto de vias de transporte balizadas por núcleos urbanos industriais.

· Canal de circulação de mercadorias.

· Canal concentrador de oferta que apresenta um alto nível de serviços.

· Cenário privilegiado para a difusão de inovações.

· Sucessão de centros e periferias funcionais e especializadas.

· Suporte territorial dos processos de desconcentração produtiva.

· Unidade geográfica dotada de uma base econômica própria derivada da agregação de centralidade
territorial, centralidade locacional e centralidade funcional.

· Síntese dos elementos do sistema de transporte.

· Instrumento e objeto de política regional.

Os eixos de desenvolvimento estão associados a uma

cadeia de núcleos urbanos, de diferentes tamanhos, situados ao longo de uma via


de transporte de alta capacidade que estimula a localização da atividade industrial
e facilita o estabelecimento de relações funcionais internas. (SÁNCHEZ
HERNÁNDEZ, 1998, p. 33).

As vias de transporte de grande capacidade que constituem os eixos de desenvolvimento são as autopistas,
as ferrovias modernas (eletrificadas) e as infovias (cabos de fibra óptica, telefonia, rede mundial de
computadores etc.).

A infra-estrutura de transporte e comunicações adequada e de qualidade propicia condições favoráveis para


a dinâmica territorial dos centros urbanos situados nas proximidades dos eixos, principalmente no tocante à
localização das mais diversas atividades industriais, com as empresas buscando reduções do tempo

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necessário aos deslocamentos de matérias-primas e mercadorias, bem como o aumento da competitividade


produtiva.

As propriedades citadas não têm a mesma intensidade em sua participação nas definições dos eixos, mas se
articulam de maneira diferente dependendo da aglomeração urbana considerada e de sua posição em relação
à metrópole. Considerando as características dos eixos de desenvolvimento, passamos a expor o que
compreendemos por território.

O Território

Para Raffestin (1993), as idéias de relação de poder, de mecanismos de controle e de dominação são
fundamentais para a caracterização do território. Dentro da concepção enfatizada pelo autor, o território é
tratado, principalmente, com uma ênfase político-administrativa, isto é, como o território nacional, espaço
físico onde se localiza uma nação; um espaço onde se delimita uma ordem jurídica e política; um espaço
medido e marcado pela projeção do trabalho humano com suas linhas, limites e fronteiras. Já o espaço
geográfico é entendido como substrato, um palco pré-existente ao território que, ao ser apropriado pelos
atores sociais e políticos, passa a ser territorializado.

É essencial compreender bem que o espaço é anterior ao território. O território se


forma a partir do espaço, é o resultado de uma ação conduzida por um ator
sintagmático (ator que realiza um programa) em qualquer nível. Ao se apropriar de
um espaço, concreta ou abstratamente [...] o ator “territorializa” o espaço.
(RAFFESTIN, 1993, p. 143).

Haesbaert (2004, p. 40) analisa o território com diferentes enfoques, elaborando uma classificação em que
são verificadas três vertentes básicas: a) política ou jurídico-política, em que “o território é visto como um
espaço delimitado e controlado sobre o qual se exerce um determinado poder, especialmente o de caráter
estatal”; b) cultural ou simbólico-cultural, que “prioriza a dimensão simbólica e mais subjetiva, em que o
território é visto, sobretudo, como o produto da apropriação/valorização simbólica de um grupo em relação
ao seu espaço vivido”; e c) econômica, “que enfatiza a dimensão espacial das relações econômicas, o
território como fonte de recursos e/ou incorporado no embate entre classes sociais e na relação capital-
trabalho”.

Assim, além do caráter do poder estatal, o autor salientou o aspecto humano da identidade social e das
relações culturais, bem como os aspectos econômicos da relação capital-trabalho, todos presentes na
constituição do território.

Neste mesmo sentido, Saquet (2004) lembra as diferentes interpretações do conceito de território levando
em consideração as três vertentes mencionadas por Haesbaert (jurídico-política, econômica e cultural), como
sendo essenciais para se fazer as interligações necessárias.

[...] O processo de apropriação do espaço geográfico é econômico, político e


cultural. É resultado desta articulação. O mesmo acontece com o território, como
fruto do processo de apropriação e domínio de um espaço, inscrevendo-se num
campo de forças, de relações de poder econômico, político e cultural [...]
(SAQUET, 2004, p. 123).

Souza (2001) salienta que o território é um espaço definido e delimitado por e a partir de relações de poder
engendradas por um determinado grupo social, e que o poder não se restringe ao Estado e não se confunde

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com violência e dominação. O território deve ser apreendido em múltiplas vertentes com diversas funções e
aponta a existência de múltiplos territórios, principalmente nas grandes cidades. Nas palavras do autor, “todo
espaço definido e delimitado por e a partir de relações de poder é um território” (SOUZA, 2001, p.11).

Também para Santos (2002), a formação do território perpassa pelo espaço e a forma do espaço é
especificada segundo as técnicas vigentes e utilizadas no próprio território. O território pode ser distinguido
pela intensidade das técnicas trabalhadas, bem como pela diferenciação tecnológica das técnicas, uma vez
que os espaços são heterogêneos. O autor conceitua conjunto territorial como um conjunto natural que o
homem se apropriou, utilizando-o de muitas maneiras diferentes de acordo com os períodos e técnicas.
Neste caso, o território forma-se na base histórica através da utilização do conjunto natural e suas
configurações sócio-espaciais.

Deste modo, entendemos que, para se compreender os eixos de desenvolvimento, o território é referência
necessária, pois ele é pleno de conteúdos que têm papel ativo. O território não é fundamental apenas por ser
referência de identificação de várias formas de investimento, mas, principalmente, pela possibilidade de
participação das populações locais na dinamiza das políticas de desenvolvimento, mobilizando seus recursos
e capacidades para atender as suas necessidades básicas.

Definidas as premissas teóricas sobre eixos de desenvolvimento e território passamos, agora, a expor as
dinâmicas territoriais que se constituíram, historicamente, como bases da localização industrial no Estado de
São Paulo.

A desconcentração industrial em São Paulo

Embora estejam separados por força da exposição no texto, o território e os eixos de desenvolvimento,
quando chegamos na escala do Estado de São Paulo, são conceitos estruturadores das transformações que
aí ocorreram nas últimas décadas. Para Lencioni (2003),

Historicamente, a indústria paulista, desde sua gênese, esteve presente no interior,


haja vista que no final da década de 1920 cerca de 30% da produção industrial
paulista era proveniente do interior, sobretudo das regiões de Sorocaba e de
Campinas, que concentravam 21,2% dos operários do Estado de São Paulo
(SUZIGAN apud LENCIONI, 2003, p. 466).

O censo industrial de 1907 apontava o interior de São Paulo como responsável por 41,8 por cento do valor
da produção industrial, enquanto a área geográfica que constituiria, no futuro, a Grande São Paulo (capital e
os municípios vizinhos) concentrava 58,2 por cento da produção industrial do Estado. No interior, os ramos
industriais que mais se destacavam eram o alimentício e o têxtil, responsáveis por três quartos do valor da
produção industrial. Além disso, os ramos de couros e peles, metalurgia, material de transporte e produtos
químicos também estavam dispersos pelo interior, principalmente nas regiões de Sorocaba (tradicional centro
da indústria têxtil) e Campinas (ramos mais diversificados) (NEGRI, 1996).

A proximidade das matérias-primas, principalmente o café, a cana-de-açúcar, o algodão e o gado bovino


para a agroindústria, e o algodão para a indústria têxtil, a disponibilidade de água e o potencial energético do
interior do Estado, foram os principais fatores de localização industrial no interior de São Paulo nas primeiras
décadas do século XX.

O setor de material de transporte desenvolveu-se no interior na medida em que a rede ferroviária foi se
expandindo da capital rumo ao norte, o noroeste e o oeste do estado, e isso demandava oficinas de

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reparação, fabricação de peças e montagem de equipamentos para as ferrovias (NEGRI, 1996).

No entanto, o aumento da concentração industrial das atividades mais complexas, como química, metalurgia,
plásticos, material de transportes, mecânica, borracha e material elétrico na capital paulista e no seu entorno,
fundamentalmente nas décadas de 1930 e 1940, fizeram com que o interior paulista perdesse participação
relativa no total da produção industrial do Estado.

Na década de 1960, algumas regiões do interior, principalmente Campinas e o Vale do Paraíba, tiveram um
crescimento industrial superior à média estadual, como conseqüência do movimento que se disseminava no
entorno da capital a partir dos anos 1950.

Assim, a indústria interiorana não é uma novidade, “o novo está na importância industrial que assume o
interior paulista e que o coloca como o segundo espaço industrial do país, superado apenas pela Região
Metropolitana de São Paulo” (LENCIONI, 2003, p. 466).

Como conclusão parcial, podemos afirmar que os principais fatores que influenciaram decisivamente o
crescimento industrial do interior paulista e que se fizeram presentes com maior intensidade na década de
1970 foram:

1) A modernização da agricultura, que propiciou condições favoráveis para a expansão e modernização de


uma estruturação agroindustrial.

2) As políticas de “descentralização” industrial e os investimentos estatais.

3) A elevação dos custos de aglomeração na Grande São Paulo.

4) A política estadual de construção de uma malha viária ampla e moderna, que diminuiu os custos de
transportes e propiciou novas vantagens para a localização industrial.

Motivados pela perda de competitividade, pela pressão social e pelo nascente movimento ambientalista, o
governo do estado e a União criaram, a partir dos anos 1960, uma série de restrições à instalação de novas
plantas industriais na capital e sua região metropolitana, incentivando a migração de indústrias para o interior
paulista e outras regiões do país, uma vez que a concentração industrial foi identificada como uma das raízes
dos problemas urbanos da metrópole.

As principais medidas ou as mais eficazes para facilitar e direcionar o processo de desconcentração industrial
partem do governo estadual, que passa a construir ou melhorar as rodovias que ligam o interior à capital,
possibilitando a consolidação de “corredores” ou eixos de transporte cuja infra-estrutura para a circulação
de mercadorias, capitais e pessoas. Assim, a indústria paulista pôde seguir as tendências locacionais
induzidas pelo capital transnacional, ou seja, desvinculação do processo produtivo do processo de comando,
estratégia utilizada em organizações empresarias que atuam em diferentes escalas e ramos, e que buscam
eficiência competitiva. Se, por um lado, a região metropolitana perde unidades fabris para o interior, o que
caracteriza um processo de desconcentração; por outro, esse processo segue a lógica capitalista de caráter
transnacional e configura um redirecionamento das unidades produtoras para o interior do estado,
concentrando a tomada de decisões na capital, onde se encontram os principais nós das redes de
comunicações e os serviços necessários para se desempenhar papel de comando nas escalas estadual,
nacional e na América Latina.

A Região Metropolitana de São Paulo não deixou de ser a principal área industrial do país, mas foi
crescendo em ritmo mais lento do que algumas áreas do interior do estado e foi se especializando em
atividades do setor terciário e nos serviços de alta tecnologia, como é comum às grandes metrópoles
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contemporâneas no mundo atual. Assim, não é correta a idéia de que estaria havendo um processo de
desindustrialização da Grande São Paulo, pois a indústria metropolitana especializou-se nas atividades mais
complexas e competitivas que exigem o emprego mais apurado de novas tecnologias, superando a
diminuição da capacidade industrial desconcentrada.

Apesar da desconcentração urbano-industrial para o interior do Estado, a Grande São Paulo detém a
centralização do comando do grande capital privado no Brasil e sedia a maioria dos mais importantes
complexos industriais, comerciais e, principalmente, financeiros, que controlam as atividades econômicas
privadas no país. Por isso,

Do ponto de vista espacial, a concentração e centralização do capital propiciaram


movimentos de concentração, desconcentração e reconcentração espacial dos
capitais fixos no conjunto do Estado de São Paulo, e centralização espacial dos
capitais produtivos e financeiros na metrópole paulista, como demonstramos por
meio da análise da urbanização em termos demográficos e econômicos.
(SPOSITO, 2004, p. 223).

Isso indica o elevado grau de centralização da aglomeração metropolitana, pois 35,30 por cento das sedes
das 500 maiores empresas brasileiras por vendas localizavam-se na Grande São Paulo em 2002. Levando-
se em conta apenas o total das empresas sediadas no Estado de São Paulo, o grau de centralização da
aglomeração metropolitana eleva-se para 81,48 por cento. Afinando a observação, considerando-se apenas
as 50 maiores empresas brasileiras privadas por venda (excluindo-se as estatais), 50% delas estão sediadas
no estado e o grau de centralização da aglomeração metropolitana no total estadual passa para 92 por cento
(Sposito, 2004, p. 242).

O que se observa é uma reconfiguração do papel metropolitano de São Paulo com maior integração à rede
urbana paulista. São Paulo consolida-se como o maior centro de serviços e comércio especializados em
âmbito nacional e essas atividades, concentradoras de trabalho intelectual de elevada qualificação, fazem da
metrópole um centro privilegiado nos trabalhos de concepção, inovação, criação, pesquisa e
desenvolvimento.

Uma outra conclusão parcial é: a configuração atual que orienta a desconcentração produtiva e a
centralização da gestão nas dinâmicas territoriais no Estado de São Paulo é definida pelo paradigma dos
eixos de desenvolvimento. Essa assertiva, que se aplica a esse território, não é, necessariamente, verdadeira
para outras áreas do Brasil.

As dinâmicas urbanas: reestruturação das cidades

Para completar o conjunto de pressupostos que possibilitam a teorização das dinâmicas territoriais no Estado
de São Paulo, faz-se necessário expor, resumidamente, o que ocorre no espaço interno das cidades paulistas
e quais as inter-relações que dinamizam sua rede urbana.

Com exceção feita à metrópole, que não será abordada neste texto, o recorte territorial restringe-se às
cidades médias. Elas se redefinem, na rede urbana, pelo aumento das relações internacionais e dos avanços
na difusão das informações, em função da constituição do sistema de telecomunicações que se territorializa
no Brasil.

O conjunto dessas mudanças produzidas pelo processo de concentração econômica não se restringe à
redefinição das redes urbanas e dos papéis das cidades médias no âmbito delas, mas na reestruturação dos

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espaços dessas cidades.

Um aspecto a se considerar é, sem dúvida, que tratar as cidades médias como recortes analíticos a partir dos
quais se pode, também, compreender as formas de produção do espaço urbano, supõe reconhecer a
possível transitoriedade da condição de ser cidade média. Essa possível transitoriedade apresenta-se mais
para as cidades médias do para as cidades pequenas, grandes ou metrópoles porque a ampliação de seus
papéis pode levá-las a mudar de patamar na organização da hierarquia urbana, por causa da redefinição da
divisão regional do trabalho e da competição entre os lugares, cada vez mais fortes numa economia
mundializada.

A transitoriedade a que estão sujeitas as cidades que desempenham papéis intermediários na rede urbana se
redefine, constantemente, pelas reestruturações econômicas decorrentes do atual paradigma técnico-
científico-informacional que promove transformações nas lógicas organizacionais e territoriais das empresas,
o que implica novas configurações territoriais entre as cidades e dentro das cidades.

Assim, podemos afirmar que as cidades médias se definem por sua situação geográfica em relação às outras
cidades de mesmo porte, pela distância maior ou menor das cidades de maior porte, e pelo número de
cidades pequenas que estão em sua área de influência. Além disso, os seus papéis dependem da forma como
o território que comandam e representam participa da divisão do trabalho.

Por essas razões, as cidades médias desempenham papéis segundo relações hierárquicas com as cidades
pequenas que se servem dos bens e serviços por elas oferecidos, e com as cidades grandes que
desempenham papéis de integração nacional ou internacional.

O conjunto de mudanças produzidas pelo processo de concentração e centralização econômicas, com


desconcentração espacial das atividades de produção e consumo, dinâmicas que se acentuam na passagem
do fordismo para a acumulação flexível, tem repercussão direta nos papéis desempenhados pelas cidades
médias, uma vez que as possibilidades de escolhas territoriais para o desenvolvimento de atividades
produtivas e para a instalação de pontos de redes de consumo de bens e serviços é maior, quanto mais
capitalizada for a empresa. As cidades médias têm sido escolhidas como pontos de apoio de diferentes tipos
de empresas, sejam de ramos industriais ou de ramos comerciais, em suas políticas de desconcentração das
atividades produtivas e de expansão das redes de comercialização de bens e serviços.

Por outro lado, quando se consideram as relações entre as cidades motivadas pelas mudanças nas relações
internacionais e pelos avanços na difusão das informações, as cidades médias têm sua estruturação interna
afetada pelas dinâmicas territoriais em função das articulações entre os princípios que orientam a constituição
das redes urbanas e os seus papéis na rede urbana com a redefinição das suas estruturas internas; isto é,
entre estruturação urbana e estruturação das cidades.

Com o que foi exposto até o momento, podemos chegar a uma terceira conclusão: a desconcentração
espacial de atividades econômicas, sobretudo produtivas, da aglomeração metropolitana para o interior
condicionam a reestruturação urbana no Estado de São Paulo, acompanhada da centralização econômica e
espacial dessas atividades na principal área metropolitana, a de São Paulo, seguida pela de Campinas.

Por outro lado, pode se concluir que há, também, reforço dos papéis desempenhados pelas cidades médias
quanto à localização de empresas comerciais e de serviços, com a paralela espacialização das atividades
industriais e agroindustriais que expressam a divisão regional do trabalho, ainda marcada pela diferenciação
entre as regiões administrativas próximas de São Paulo e na direção norte (Campinas, São José dos
Campos, São Paulo, Santos, Ribeirão Preto) e aquelas que ocupam a porção oeste e sul do Estado de São
Paulo (Araçatuba, Presidente Prudente e Registro).

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Assim, a situação geográfica das cidades influi na definição de sua centralidade interurbana e no peso de seus
papéis regionais, principalmente no que se refere ao consumo do tipo moderno, realizado em espaços como
shopping centers, hipermercados e/ou em unidades de franquias, que se amplia nas cidades médias e reflete
a expansão, pelo interior, dos grandes capitais nacionais e transnacionais que operam no setor e que, por sua
vez, tem impactos na estruturação interna das cidades onde se instalam, tanto porque, ao definirem os pontos
de localização produzem novas centralidades intra-urbanas, como por reforçarem novas formas de produção
do espaço urbano.

Se, por um lado, as cidades médias apresentam mercados limitados para o consumo do seu espaço, quando
se considera o conjunto das atividades econômicas, em função de seus papéis comerciais e de serviços, elas
apresentam demandas consideravelmente maiores, mesmo que a diferenciação interna dos espaços urbanos
destinados ao uso residencial tenha que levar em consideração que a segregação e a fragmentação, quando
ocorrem, constituem-se segundo vetores diferentes nas cidades metropolitanas e nas de porte médio.

Além disso, a reestruturação das cidades médias decorre da constituição de centros e centralidades segundo
as mesmas lógicas e interesses que comandam esse processo nas metrópoles.

No que se refere às formas de consumo e apropriação do espaço urbano em cidades médias, há duas
dinâmicas paralelas e articuladas entre si: em primeiro lugar, o aumento do número de áreas centrais
decorrentes do aparecimento e da multiplicação de subcentros, de eixos comerciais e de serviços
especializados ou não, e de shopping centers, gerando uma multicentralidade no plano intra-urbano; em
segundo, a tendência à segmentação social do mercado consumidor, segundo seu poder aquisitivo e suas
formas de deslocamento, por transporte individual ou coletivo, gerando uma policentralidade no plano intra
e interurbano (SPOSITO, 1991b, 1999a, 2001b).

Essa dinâmica não é diferente daquela que se observa na metrópole, quando se analisa o movimento geral
das transformações, mas o ritmo e a intensidade do processo são diferentes em cidades médias, gerando
articulações entre as temporalidades e as espacialidades desse processo que são diversas daquelas
observadas nas cidades grandes. Por isso, é possível afirmar que o peso das determinações externas no
conjunto das decisões que provocam entre as formas de produção, consumo e apropriação do espaço
urbano é maior em cidades de porte médio do que em áreas metropolitanas.

Analisando esse mesmo processo na França, Brunet (1997, p. 16) faz referência ao “triunfo da ideologia da
empresa” sobre as instituições públicas, à medida que se adotam a linguagem e os argumentos da
competição e do jogo midiático. Essa influência progressivamente maior da “ordem distante” sobre a “ordem
próxima” tem seus efeitos, por exemplo, sobre a legislação urbana e sobre as escolhas que orientam a
tributação e a dotação de recursos públicos nos espaços urbanos (exemplos: renúncia fiscal para a
localização industrial, baixa tributação para áreas de residências privilegiadas...).

Paralelamente à ampliação dos papéis urbanos, há uma homogeneização das paisagens citadinas, que imitam
cada vez mais as metropolitanas, mesmo que haja diferenças entre as práticas sociais e a magnitude dos
papéis desempenhados pelas cidades intermediárias. Os loteamentos fechados, por exemplo, têm sido os
produtos de maior impacto no mercado imobiliário de cidades latino-americanas, nas últimas décadas.

Além disso, a instalação de “distritos industriais”, que devem ser, mais propriamente, ser chamadas de áreas
de localização industrial com diferenças entre o tamanho das empresas que têm capacidades diversas na
incorporação de novas tecnologias, na participação na produção industrial ou nas diferentes formas de
arrecadação oficial, contempla a complexidade da reestruturação das cidades médias no momento atual.

Assim, no anel periurbano formado por glebas não loteadas apareceram, nos setores melhor servidos por

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infraestrutura viária, novos habitats urbanos e novas instalações industriais com diferentes graus de
incorporação tecnológica, trazendo à periferia da cidade um desenho territorial que não lhe era característico
nas décadas de 1950 e 1960, quando o padrão geral de periferização do tecido urbano se generalizou.

Essa dinâmica ocorre, além do mais, com descompasso temporal porque, em primeiro lugar, a redefinição da
morfologia ocorre quando a intensidade do fenômeno e sua freqüência tornam-se definidoras do movimento
da importância das determinações socioespaciais urbanas. Porque há, nesse caso, defasagem temporal entre
a origem de um fenômeno no processo de produção do espaço urbano (implantação de indústrias com novas
tecnologias ou de indústrias tradicionais, implantação de loteamentos fechados ou instalação de shopping
centers, por exemplo) e as repercussões resultantes da apropriação desses novos espaços.

Assim, uma nova dinâmica instaura-se no processo de produção da cidade: é a articulação entre diferentes
processos que definem como a estrutura urbana vai se reorganizar. Desse ponto de vista, o reconhecimento
de uma nova morfologia urbana é indicativo que se vive um processo de ruptura no movimento de
estruturação e que, portanto, há reestruturação dos espaços urbanos. Para Veltz (2003, p. 148) “... não é
mais o espaço que estrutura o tempo, mas os constrangimentos temporais que modelam os esquemas
espaciais”.

Por isso, as novas centralidades ou as novas áreas de localização de estabelecimentos industriais são
valorizadas nas escolhas locacionais de outros estabelecimentos, principalmente nas vias de circulação mais
rápida, algumas delas eixos rodoviários interurbanos.

Desse ponto de vista, mais um elemento se agrega a uma última conclusão: não se trata apenas de um
momento do movimento contínuo de estruturação das cidades, mas da redefinição do próprio movimento
por fortes transformações, cabendo a atribuição do conceito de reestruturação das cidades para melhor
qualificar a urbanização que se realiza no período atual.

Conclusão

O que se pode concluir, neste momento, é que a constituição de eixos de desenvolvimento no Estado de São
Paulo induz a localização industrial, principalmente de empresas com grande capacidade de incorporação
tecnológica, ao mesmo tempo em que influencia na reestruturação urbana das cidades médias, principalmente
aquelas localizadas ao longo dos eixos, cujas dinâmicas de produção do espaço urbano são suscetíveis às
novas lógicas induzidas pela reestruturação produtiva e pela força dos capitais externos que se territorializam
nesses territórios. Além disso, a cidade se reconfigura com os impactos das novas formas de produção da
cidade, seja pela renúncia fiscal, seja pelas novas centralidades ou escolhas específicas para a localização
industrial ou para a produção de novos habitats urbanos.

Reconhecido o papel da metrópole, as cidades médias têm papel importante nas redefinições das novas
localizações industriais ao longo dos eixos de desenvolvimento e de suas novas centralidades.

Notas:
[1] Este texto teve a contribuição direta dos estudos realizados no GAsPERR (Grupo de Pesquisa Produção do Espaço e
Redefinições Regionais), principalmente de Adilson Aparecido Bordo (quando ainda mestrando) e de Maria Encarnação
Beltrão Sposito (membro do grupo de pesquisa), cujos textos de dissertação do primeiro, e de livre-docência da segunda,
fazem parte, parcialmente, da configuração final deste artigo.

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[2] Situação de desemprego que resulta do aprimoramento do processo produtivo através de novas formas de organização
do trabalho e da aplicação de inovações tecnológicas. Típico do final do século XX, o desemprego estrutural é
conseqüência de avanços principalmente na área eletrônica (como a robotização e a informatização). Essas mudanças
permitem aumento de produtividade com grande redução de mão-de-obra, principalmente dos trabalhadores menos
qualificados.

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