Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
As flores Improváveis
ESPERANÇA
No Piauí,Mato Grosso, Paraná e Maranhão, casos onde a
dedicação, a perseverança e o espírito público fizeram a diferença e
mudaram a vida de dezenas de crianças.
Para o poeta Carlos Drummond de Andrade, "onde não há jardim, as flores nas
cem de um secreto investimento em formas improváveis". E na terra arrasada
da educação brasileira, há, de fato, algumas flores surgidas de anônimos
investimentos pedagógicos de bons professores e diretores. As iniciativas foram
reveladas a partir da análise da Prova Brasil, avaliação feita no ano passado pelo
MEC, que permite identificar o desempenho por escola, e não por estudante.
Lamentavelmente, o estado de São Paulo, onde a média dos alunos despencou, não
participou do exame, embora a atual secretária de Educação,Maria Lucia Vasconcelos,
tenha prometido rever a decisão nas próximas edições.
Os resultados do Prova Brasil permitiram uma pesquisa de campo realizada pelo
Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) em parceria com o MEC em 33
escolas públicas. A pesquisa Aprova Brasil identificou escolas que obtiveram bom
desempenho no exame, embora estivessem incrustadas em regiões de baixo Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH). Segundo Maria de Salete Silva, coordenadora do
Aprova Brasil, as coisas acontecem nas unidades escolares, mas iniciativas individuais
não podem ser tomadas como alento, e sim como exemplo. É um desafio colocado
para a sociedade brasileira, diz ela. "Todos falam que educação é futuro. Não.
Educação é presente", diz. Os exemplos falam por si:
Em 2000, quando foi inaugurada, a Escola Municipal Casa Meio Norte,
encravada na base de um morro repleto de barracos, na periferia de Teresina (PI),
tinha no quadro de alunos crianças fora da escola ou que nunca haviam freqüentado
uma. O índice de defasagem entre a idade ideal e a série freqüentada chegava a 80%
e a repetência, 60%. "O trabalho começou aí. Tivemos de fazer com que elas
acreditassem ser capazes de correr atrás do prejuízo. Hoje, a nossa distorção idade-
série é praticamente zero", comemora a diretora, Osana Santos Morais. A carga
horária foi ampliada para incluir atividades extracurriculares e o acompanhamento
individualizado dos 440 alunos das salas de alfabetização à 4a série.
Professores e pais voluntários verificam, diariamente, a freqüência dos
estudantes e a lição de casa. Eles vão à casa de quem falta e cobram explicações dos
que não fizeram as tarefas. O projeto da Casa Meio Norte é o de valorização da escola
pública, o que leva a só permanecerem na equipe professores comprometidos com ele.
"Quem não se enquadra não fica muito tempo porque a equipe não permite", ressalta
Rutinéia Vieira Lima Costa, coordenadora pedagógica. Para ela, "a escola ocupa um
papel de mediação. A realidade aqui é nua e crua': comenta.
"Nossas crianças não têm nenhum incentivo social diferente da escola. Este é o
único prédio que existe no bairro. Elas não têm acesso à internet, cinema, nada,
explica a diretora. A merenda, única fonte de alimentação da grande maioria das
crianças, também é fundamental para o bom desempenho da escola. Com a
contribuição de empresários da região, a escola consegue servir cinco refeições
diárias.
Em Aquidauana, cidade de 43 mil habitantes no interior de Mato Grosso do Sul,
a coordenação da Escola Estadual Coronel Antonio Trindade percebeu que, se
esperasse a tão desejada participação da família, teria o trabalho enterrado. Os alunos
são filhos de pais que trabalham muito e têm baixa escolaridade. A escola, com 240
vagas, aposta no planejamento das aulas e no trabalho em equipe. Semanalmente, o
corpo docente se reúne e define como será a semana. Criam-se reforços e
atendimentos específicos para cada aluno.
"A escola tem uma política pedagógica de incentivo ao sucesso. Eles investem
no cuidado a cada aluno. Os professores e a direção têm orgulho deles e os próprios
estudantes também acreditam que são bons, isso faz muita diferença", conta a
pedagoga Marta Lúcia Teles Brito de Jesus, pesquisadora do Aprova Brasil, que
esteve na escola. A atenção à necessidade das classes levou a escola a tomar uma
medida tão simples quanto inteligente. Na época da colheita, é comum os pais dos
alunos arrumarem empregos temporários em fazendas. As crianças vão junto. A escola
passou, então, a orientar o estudo e, ao retomar, os estudantes têm acompanhamento
para que voltem à turma na qual estavam matriculados. Assim, evita-se a evasão
escolar. "É uma realidade da nossa cidade o trabalho agrícola. Como queremos que o
aluno continue na escola, criamos essa política", explica Marina.
Os bons resultados não surpreendem a equipe, de acordo com Marina: "Nossos
alunos são bons mesmo". Mas foi um reconhecimento que veio em boa hora.
"Colocamos um cartaz na escola, para os pais lerem a notícia que saiu em um jornal
sobre a escola. Todo mundo ficou orgulhoso:'
E.E. Cel. Antonio Trindade (AquidauanalMS) Média Língua Portuguesa 83 série: 242,5 Média
Nacional: 224,0 Média Matemática 83 série: 260,4 Média Nacional: 238.76
Em uma cidade cujo IDH é 0,675 não era de esperar que todos os 12
professores da Escola Municipal Edirce Neneve Carvalho, de 1ª à 4ª série, tivessem
curso superior. Com a implantação de uma política de plano de carreira, pensada e
discutida com os docentes, a prefeitura de Diamante do Sul (PR) fornece ônibus para
transportá-las até a cidade de Cascavel, distante 60 quilômetros, onde fazem cursos
de graduação e pós-graduação. "Os professores daqui querem estudar. Além disso, as
verbas públicas são bem administradas e, no fim do ano, o professor chega a receber
14° salário", conta a pesquisadora Sandra Viana, que visitou a escola. Nem tudo é
perfeito. "Faltam espaço e material didático, mas a gente aluga salas fora da escola e
tenta aproveitar os materiais que temos", diz Erondina das Neves Hart, vice-diretora.
Mesmo localizada na zona urbana de Diamante do Sul, cerca de 80% dos 380 alunos
moram na zona rural e chegam à escola com o transporte público. "Nossos alunos
trabalham em fazendas, com os pais, pequenos agricultores e bóias-frias, mas não
deixam de vir", conta a diretora. Quando um aluno falta sem justificativa, é designado
um funcionário da escola ou do Conselho Tutelar para visitar a família e se inteirar da
situação. Como a cidade é pequena, cerca de 4 mil habitantes, todos se conhecem, e a
comunicação fica mais fácil.