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A comunhão entre a filosofia estóica e a doutrina cristã 

“Portanto, não vos inquieteis com o dia de amanhã, pois o amanhã trará os seus cuidados; 
basta ao dia o seu próprio mal.” – Mateus 6:34. 

“Tudo o que você precisa é isto: certeza de julgamento no momento presente; ação para o 
bem comum no momento presente; e uma atitude de 
gratidão no momento presente para tudo o que aparecer no 
seu caminho.” – Marco Aurélio. 

  Quando  soube  que  o  Florescer  estava  abrindo  vagas  para  textos,  pensei diversas vezes 
em  algo  relevante  para  escrever.  Tenho  vários  assuntos  em  mente  que  poderia  servir  de 
auxílio  às  meninas,  mas  Deus  tocou  no  meu  coração  para  citar  ansiedade  e  preocupações. 
Decidi,  por  fim,  que  as  abrangeria  no  texto;  mas  algo  não  estava  concluído,  sentia  falta de 
um  tema  cerne  para  começar  a  escrever,  foi  quando  logo  ao  acordar,  surgiu-me  a  ideia  do 
estoicismo – Eureca!  

  Bom,  o  que é o estoicismo e em que se assemelha com o cristianismo? Segundo a fonte 
de  informações  mais  confiável  de  todos  os  tempos,  a  Wikipédia,  o  estoicismo  foi  uma 
escola  da  filosofia  helenística. O mesmo fora fundado em Atenas, e seus pontos se baseiam 
na  ação virtuosa, no estar presente e na luta contra o prazer. Antes de eu me tornar cristã, o 
pensamento  estoico  me  conquistara  por  esse  último  ponto:  o fato de constantemente lutar 
contra  si  mesmo,  contra  sua  carne,  contra  o  pecado.  Concomitantemente,  o  pensamento 
cristão  comunga com tal ação, pois Jesus nos convida: “Se alguém vir após mim, ​negue-se a si 
mesmo​,  tome  sua  cruz,  e  siga-me”.  A  luta  constante  contra  o nosso maldade intrínseca foi a 
primeira  característica  que  me  chamou  atenção  entre  a  filosofia prática estóica e a doutrina 
cristã. 

PATHOS X PECADO 
  Pathos é uma palavra grega que significa paixão, mas no estoicismo a utilizaremos com 
um  significado  além.  Pathos  servirá  para  designar  tudo  aquilo  que  afeta  o  corpo  e  a  alma, 
para  o  bem  ou  para  o  mal  –  como  sofrimento  ou  experiências  –  mas  que  geram  um 
comportamento passivo. Pathos é a paixão da alma.  

  Na doutrina das paixões do estoicismo, o pathos é condenado por ser um estado onde 
o  ser  age  movido  em  busca por prazer. Uma forma de exemplificar seria: imagine que você 
decide  fazer  um  jejum,  mas  ao  ver  um  de  seus  pratos  favoritos  no  jantar,  cede  e  decide 
comer.  Você  come,  mas  se  arrepende  da  sua  ação,  pois  não  conseguiu  cumprir  o  seu 
objetivo,  então,  entra-se  em  um  estado  de  compulsão  e  aquele pensamento de “Ah, mas já 
que  fiz  isto  de  errado,  então  qual  o  problema  de  continuar?”.  E  consequentemente,  o  que 
era para ser uma simples janta, se transforma numa santa ceia. 

  Veja,  ao  ceder  ao  primeiro  impulso,  o  de  quebrar o jejum e comer, cedestes à paixão, 


ao  prazer  da  sensação  que  o  alimento provoca. Todos nós precisamos nos alimentar, não é 
errado comer – errado é ver o alimento como exclusivamente fonte de prazer, visto que seu 
objetivo  é  nos  nutrir  e dar energia – mas ao estabelecer um objetivo como o jejum devia-se 
justamente  se  abster  da  satisfação  proporcionada  pela  comida;  mas  cedemos  à  paixão  da 
alma  e  comemos  o  fruto  proibido  no  jardim  do  Éden,  todavia  não  fomos  enganados, 
estamos totalmente conscientes do erro e escolhemos pecar. 

  Assim  é  o  pecado,  uma  desobediência,  mas  neste  caso  a  Deus.  Ignoramos  o  seu 
padrão perfeito e não agimos conforme a vontade dEle.  

“Sabemos  que  a  Lei  é  espiritual;  eu,  contudo, não o sou, pois fui vendido como escravo ao pecado. 


Não  entendo  o  que  faço.  Pois  não  faço  o  que  desejo,  mas  o  que 
odeio.  E,  se  faço  o  que  não  desejo, admito que a Lei é boa. Nesse 
caso,  não  sou  mais  eu  quem  o  faz,  mas  o  pecado  que  habita  em 
mim.” - Romanos 7:14-17. 

  Em  um  vídeo¹  do  canal  “Dois  dedos  de  teologia”,  o  pastor  Yago  Martins  cita  sobre 
Adão  ser  o  nosso  representante  federal,  logo,  quando  Adão peca, nós estávamos presentes 
nele,  pecando  também.  Como  diz  Paulo  em  Romanos  7:14-17,  fazemos  o  que  odiamos,  e 
somos,  nestes  momentos,  não  nós,  mas  o pecado que habita em nós. O que o estoicismo e 
o  cristianismo  dizem  em  uníssono  nesse  momento  é  a  respeito  das  nossas  vontades 
impulsivas  que  não  estão  necessariamente,  de acordo com os nossos valores. Para vencer o 
pecado  e  a  paixão,  devemos  controlar  o  nosso eu em um esforço contínuo, prestando uma 
atenção  genuína  às  nossas  ações  e  pensamentos.  Fomos  vendidos  ao  pecado  sim,  mas 
fomos  comprados  com  o  sangue  de  Cristo,  e  é  nosso  dever negar-se diariamente, e resistir 
aos impulsos das paixões, o que nos leva ao próximo tópico. 

“Não  reine,  portanto,  o  pecado  em  vosso  corpo  mortal,  de  maneira que obedeçais às suas paixões; 
nem  ofereçais  cada  um  os  membros  do  seu  corpo  ao  pecado, 
como  instrumento  de  iniquidade;  mas  oferecei-vos  a  Deus,  como 
ressurretos  dentre os mortos, e os vossos membros, a Deus, como 
instrumento de justiça.” – Romanos 6:12-13. 

ANSIEDADE X VIVER O MOMENTO PRESENTE 


“Se  te  afliges  por  alguma  causa  externa,  não é ela o que te importuna, mas o juízo que fazes dela. E 
depende  de  ti  apagar  esse  juízo.  Mas  se  te  aflige  algo  que  se  encontra  em 
tua  disposição,  quem  te  impede  de  retificar  teu  critério?  E  de igual modo, 
se  te  aflige  por  não  executar  essa  ação  que  te  parece  sã,  por  que  não  a 
colocas em prática em vez de afligir-te?” – Marco Aurélio. 
“Portanto,  não  vos  inquieteis  dizendo:  Que  comeremos?  Que  beberemos?  Ou:  Com  que  nos 
vestiremos?  Porque  os  gentios  é  que  procuram  todas  estas  coisas:  pois 
vosso  Pai  celeste  sabe  que  necessitais  de  todas  elas;  buscai,  pois,  em 
primeiro  lugar,  o  seu  reino  e  a  sua  justiça,  e  todas  estas  coisas  vos  serão 
acrescentadas. ​Portanto,  não  vos  inquieteis  com  o  dia  de  amanhã,  pois  o 
amanhã  trará  os  seus  cuidados;  basta  ao  dia  o  seu  próprio mal.” – Mateus 
6:31-34. 

  Segundo  dados  da  OMS  (Organização  Mundial  de  Saúde),  o  Brasil  é  o  país  mais 
deprimido  e  ansioso  da  América  Latina.  A  ansiedade  que  deveria  ser  tão  somente  a 
capacidade da natureza humana de antecipar o perigo, sendo então uma maneira de garantir 
a sobrevivência da espécie, acabou-se desenrolando em um problema que afeta a população 
hodiernamente.  É  importante  ressaltar que problemas como transtorno de ansiedade e/ou 
depressão,  que  afetam  diretamente  a  saúde,  devem  ser  tratados  com  profissionais,  meu 
objetivo  é  expor  a  ansiedade  como  sensação  normal  do  ser  humano  e  como  podemos 
melhorá-la.  

  Os  motivos  pelos  quais  nos  tornam  ansiosos  variam  desde  fazer  uma  prova  muito 
difícil,  ter que fazer uma importante viagem ou tomar uma decisão que pode afetar sua vida 
drasticamente.  Ficamos  com  medo  de  as  coisas  não acontecerem conforme ​nossos planos, e 
acabamos  frustrados.  De  repente,  o  que  poderia  ser  decidir  usar  uma  roupa  preta  ou 
amarela,  transforma-se  na  decisão  mais difícil da sua vida, e você não sabe o que fazer, e ao 
contrário  de experimentar, age contra a própria racionalidade e não faz nada. Eu sei o que é 
isso,  pois  passo  todos  os  dias  –  não  exatamente  nessas  condições,  risos  –  e  tenho  certeza 
que a maioria de vocês também já se encontrou ao menos um momento, assim.  

  Bom,  segundo  o  pensamento  estóico,  a  ansiedade  é  totalmente  irracional,  pois 


podemos  separar  todas  as  coisas  do  universo  em  apenas duas: o que você tem controle e o 
que  você  não  tem.  Se  você  tem  controle  sobre  uma  determinada  situação  e  pode agir para 
mudá-la,  faça-o.  É  mais  simples  do  que  parece.  Cito  uma  experiência  pessoal  como 
exemplo.  Eu  passei  a  minha  infância  inteira  no  sobrepeso.  Minha  mãe  levava-me  a 
incontáveis  nutricionistas  e  eu  nunca  emagrecia,  pois  ao  invés  de  diminuir  o  consumo  de 
alimentos,  me  encontrava  ansiosa,  entrava  em um estado de compulsão e comia mais. Esse 
tipo  de  característica  normalmente  tem  a  ver  com  transtornos  psicológicos  e  uma  terapia 
seria  adequada,  logo  as  coisas  não  são  tão  simples  assim,  mas  irei explicar da maneira mais 
esdrúxula  possível  a  fim  de  possibilitar  o  entendimento,  não  se  irritem com a comparação. 
Eu  tinha  controle  sobre  o  que  comia,  apesar  de  houver  tentações,  ninguém  me  obrigava a 
ingerir  esses  alimentos,  que  geralmente  eram biscoitos e salgadinhos sem nutrientes alguns. 
O  que  fiz  para  perder  peso  foi  tão  somente:  parar  de  comê-los,  fazer  uma  reeducação 
alimentar e caminhar/fazer exercício. 

  A  fórmula  para conseguir o que almejamos são simples, os empecilhos se baseiam na 
nossa  fraqueza  carnal,  basicamente  derivado  de  problemas  psicológicos.  Novamente, 
saliento,  se  você  se  encontra  em  um  estado  onde  não  sente  que  tem  o controle sobre suas 
ações,  de  tristeza  e  derivados,  procure  o  médico.  Mas,  de  uma  forma  geral  o  que  estou 
tentando  dizer  ao  expor  esta  situação  é,  se  você  pode  mudar  uma  situação  é  inútil  ela  te 
afligir.  De  mesma  forma,  se  você  não  tem  controle  sobre  uma  situação,  ora,  o  que  fazer? 
Percebem  como  a ansiedade é irracional? A forma de se livrar dela, segundo o estoicismo é: 
faça  a  separação  entre  o  controlável  e  o  não.  Se  for  controlável,  veja  como  pode  mudar  e 
aja. Se não for, não deixe este algo externo te importunar, ​não é o fim do mundo! 

  No evangelho de Mateus, quando Cristo fala sobre a ansiosa solicitude pela vida, ele diz: 
“Por  isso,  vos  digo:  não andeis ansiosos pela vossa vida, quanto ao que haveis de comer ou 
beber;  nem  pelo  vosso  corpo,  quanto  ao  que  haveis  de  vestir.  Não  é  a  vida  mais  do que o 
alimento,  e  o  corpo,  mais  do  que  as  vestes?”.  A  filosofia  estóica  surgiu  antes  do 
cristianismo,  portanto,  seus  pensadores  acreditavam  num  Deus  criador  de  tudo,  mas  não 
haviam  presenciado  o  Deus  cristão.  Nós,  por  outro lado, temos o prazer de reter o melhor 
do estoicismo e aplicá-lo aos nossos valores cristãos.  

  No  estoicismo,  não  havia  um  lugar no qual se apoiar, tudo se baseava em um controle 


emocional  árduo.  Nós,  por  outro  lado,  temos  Cristo.  Temos  as  boas  novas.  Jesus  diz 
claramente  para  nós,  os  homens  de  pequena  fé,  que  Deus  sabe  de  todas  as  coisas  que 
necessitamos.  Ora,  Ele  veste  as  ervas  do  campo,  sustenta  as  aves  do  céu,  e  achas  mesmo 
que  não  se  preocupar  a  amada  criação?  João  3:16  diz  “Porque  Deus  amou o mundo de tal 
maneira  que  deu  o  seu  Filho  unigênito,  para  que  todo  aquele  que  nele crê não pereça, mas 
tenha  a  vida  eterna”.  Manter  ansiedades  e  preocupações  infundadas  é,  a  meu  ver,  uma 
ofensa  ao  amor  ofertado  por  Deus.  Não  quero,  por  meio  deste,  fazer  com  que  se  sintas 
inquietude,  mas que sim, medite no amor de Deus, este amor imensurável que sabe de tudo 
o  que  precisas  e  que  jamais  te  abandonará.  Portanto,  que  sigamos  o  conselho  de  Jesus  e 
busquemos  o  que  realmente  importa:  o  reino  e  a  justiça  de  Deus,  pois  todas  as  outras 
coisas nos serão acrescentadas! 

   
CONSIDERAÇÕES FINAIS 

 
Espero  que  este  estudo  tenha  de  alguma  maneira  edificado  a  vida  de  vocês  e  que  possam 
tirar  alguma  lição  dele.  Eu  sei  que  diversas  vezes  as  situações  são  mais  difíceis  do  que  o 
comentado  e  um  simples  texto  demonstrando  a  irracionalidade  da  ansiedade  não  será  o 
suficiente,  mas  espero  do  fundo  do  meu  coração  que  Deus  guie  cada  uma  de  vocês  e  que 
consigam  superar  quaisquer  problemas  que  as  aflige.  Repito  NOVAMENTE,  procurem 
um médico se necessário.  

Com amor, 
Dani. 

INDICAÇÕES 
¹ Link do vídeo do Dois dedos de Teologia: 
https://www.youtube.com/watch?v=UZOycrNWgKk​. 

Para quem se interessou pelo estoicismo, indico dois livros. 


² Meditações, do Marco Aurélio; 

E um livro gratuito escrito pelo autor brasileiro Thiago Limeira, onde ele faz uma 
comparação das lições estoicas para a contemporaneidade.  
³ Estoicismo e tradicionalismo para o século XXI: 
https://www.docdroid.net/G5ydnzY/estoicismo-e-tradicionalismo-para-o-seculo-xxi.docx 

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Danielle Santiago tem 18 anos de idade, é de Eunápolis - BA e faz parte da Igreja


Presbiteriana. É uma das participantes do grupo Florescer.

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