Você está na página 1de 62

ISSN 2526-0596

REVISTA

CML
CRIMINALÍSTICA E
MEDICINA LEGAL
| V.1 | N.1 | BELO HORIZONTE

2016
REVISTA

CML
CRIMINALÍSTICA E
MEDICINA LEGAL
| V.1 | N.1 | BELO HORIZONTE

2016
Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

©2016 by Os autores
©2016 by Valor Editora

Belo Horizonte | 2016

idealizador
Marco Antônio de Oliveira Paiva

ORGANIZAÇÃO
Guilherme Ribeiro Valle
Pablo Alves Marinho
Sordaini Maria Caligiorne

revisor de português
Mônica Baeta Neves Pereira Diniz

revisor de inglês
João Henrique Roscoe Diniz Maciel

EDITORIA DE ARTE, PROJETO GRÁFICO


Valor Editora | Helô Costa

DIAGRAMAÇÃO
Valor Editora | Esther Figueiredo

www.revistacml.com.br
contato@revistacml.com.br

Revista Criminalística e Medicina Legal / Organizado por


Guilherme Ribeiro Valle, Pablo Alves Marinho e
Sordani Caligiorne – Belo Horizonte: Valor Editora,
2016.
v.1, n.1

Anual
ISSN 2526-0596 (impresso)
ISSN 2526-2785 (online)

1. Direito Penal. 2. Criminalística. 3. Medicina Legal


I. Valle, Guilherme Ribeiro. II. Valor Editora. III. Título

CDU 343.9
(Ficha catalográfica elaborada pelo Sidney Rodrigues dos Santos)

Patrocinadores Realização

www.valoreditora.com.br

2
Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

EDITORIAL
As atividades diárias dos peritos criminais e legistas, de buscar e materializar provas técnicas mediante
análise de vestígios produzidos e deixados na prática de crimes, exige a aplicação de métodos e conhecimentos
cuja simplicidade é fruto de desenvolvimento científico anterior na bancada dos laboratórios e das salas
de anatomia patológica das universidades e institutos de pesquisa pelo mundo, bem como procedimentos
complexos, cuja capacidade de realização poucos profissionais detêm.
A necessidade da ciência forense de se aproximar mais das academias e ter seus métodos avaliados
pelo rigor científico foram questões levantadas em publicações da National Academy of Science dos Estados
Unidos em 2009 1
e da revista Nature em 2010 2,3
. Dessa forma, objetivamos com a Revista Criminalística
e Medicina Legal tornar públicas nossas metodologias e vivências disseminando-as para a comunidade
científica, a fim de fomentar a pesquisa e também estimular peritos criminais e legistas a divulgarem seus
trabalhos, que poderão se tornar ciência ao serem avaliados e publicados por uma revista científica.
Nada nos impede de aplicar a ciência não apenas na atividade pericial, mas também produzir
conhecimento científico, mesmo que nossa função institucional primeira não seja essa. Não falamos daquela
pesquisa sistematizada e com absoluto controle de métodos experimentais, cujo resultado obtido inspira
elevada confiança lastreada pelo rigor experimental e estatístico. É sim possível realizá-la, mas falamos
principalmente daquela pesquisa observacional, que vem do nosso dia-a-dia de imensa casuística que,
se bem explorada, pode verdadeiramente contribuir para o crescimento científico na área forense. Casos
periciais incomuns ou inusitados, desenvolvimento preliminar de métodos periciais não consagrados, análise
de bancos de dados, revisões de literatura sobre temas de interesse pericial, todos podem contribuir para o
crescimento científico e profissional dos peritos criminais e legistas de qualquer lugar e ou espaço de atuação.
É a isso que esta revista se propõe: transformar nosso cotidiano em ciência que seja aplicada e difundida
entre aqueles que se interessam pela ciência forense.
Foi com este pensamento que começamos a trabalhar para que a Revista Criminalística e Medicina
Legal se concretizasse, mas de forma sólida, para ter longa vida. O ex-diretor do Instituto de Criminalística
de Minas Gerias e colega perito criminal, Marco Antônio Fonseca Paiva, idealizou em sua gestão a perícia
criminal mineira também como produtora de ciência, e não apenas usuária dela. Um dos projetos para o qual
fomos chamados a desenvolver foi a criação de uma revista científica, para divulgação e estímulo à produção
científica forense entre peritos criminais e legistas no âmbito nacional. Espera-se, também, que a diversidade
de temas abordados nesta revista possa ilustrar para os demais profissionais da área forense e a sociedade
a importância, riqueza e profundidade do trabalho pericial.

(Endnotes)
1 Strengthening forensic science in the United States: a path forward.

2 Science in court, v. 464, n. 7287, 2010.

3 Making forensic science more scientific, v. 464, n.18, 2010.

Guilherme Pablo Sordaini


Ribeiro Valle Alves Marinho Maria Caligiorne
Perito Criminal do Perito Criminal do Perito Criminal do
Instituto de Criminalística Instituto de Criminalística Instituto de Criminalística
de Minas Gerais de Minas Gerais de Minas Gerais
Médico Veterinário Farmacêutico e Mestre Bióloga doutora
doutor em Ciência Animal em Ciências Farmacêuticas em Fisiologia
Humana

3
Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

SUMÁRIO

Artigos

A lei 12.654/12 e os novos desafios para a perícia criminal na área de biologia forense em Minas Gerais
Aline Torres de Azevedo Chagas, Valéria Rosalina Dias e Santos ............................................................................................................................................................... 6 a 11

Análise de imagens na determinação de velocidades de entrada em perícias de trânsito


Tales Giuliano Vieira, Gustavo Henrique Canedo Fraga, Paulo Elpídio de Alvarenga Marinho ..................................................................................................................... 12 a 17

A importância de uma documentação odontológica completa na identificação de corpos carbonizados: relato de dois casos
Rodrigo Camargos Couto, Geraldo Elias Miranda, Silvia Guzella de Freitas, Adriana Maria Carneiro Moreira, Jéssica Enes Morais Rodrigues ........................................... 18 a 23

Eficiência em cartuchos de fogo central e radial, sem uso de arma de fogo


Alberto Luiz Guerra Brandão, Wellington Luiz Barbosa, Alex Oliveira Pinho, João Henrique Lopes Moura, Frederico Nunes Valladão ........................................................ 24 a 29

Avaliação de um caso de morte por intoxicação com monóxido de carbono produzido pela queima de carvão
Claiton Pires Ventura, Homero Augusto Righi ......................................................................................................................................................................................... 30 a 33

Cocaína: aspectos históricos, toxicológicos e analíticos – uma revisão


Sordaini Maria Caligiorne, Pablo Alves Marinho ...................................................................................................................................................................................... 34 a 46

Resumos

Caracterização de marcadores moleculares com aplicabilidade para identificação de duas espécies de peixe com interesse
forense: Prochilodus argenteus e Prochilodus costatus (Dissertação de Mestrado)
Aline Torres de Azevedo Chagas, Evanguedes Kalapothakis .................................................................................................................................................................... 48 a 49

Microespectroscopia no Infravermelho Médio por Transformada de Fourier no modo Reflexão Total Atenuada e técnicas
quimiométricas aplicadas à detecção de fraudes em documentos (Dissertação de Mestrado)
Luisa Pereira e Ferreira, Clésia Cristina Nascentes .................................................................................................................................................................................. 50 a 51

Suicídio e sentido da vida: uma análise de cartas de suicidas a partir da teoria do sentido da vida de Viktor Frankl
(Monografia de Graduação)
Francielle Fátima de Carvalho, Manoel Deusdedit Júnior ......................................................................................................................................................................... 52 a 53

Normas para publicação ............................................................................................................................................................................... 55 a 58

5
rcml
revista criminalística
e medicina legal
revista criminalística e medicina legal
v.1 | n.1 | 2016 | p. 6-11

A LEI 12.654/12 E OS NOVOS DESAFIOS


PARA A PERÍCIA CRIMINAL NA ÁREA DE
BIOLOGIA FORENSE EM MINAS GERAIS
Aline Torres de Azevedo Chagas*
Instituto Médico Legal da Polícia Civil de Minas Gerais
Valéria Rosalina Dias e Santos
Instituto de Criminalística da Polícia Civil de Minas Gerais

THE BRAZILIAN LAW NR. 12,654/12 AND


THE NEW CHALLENGES FOR FORENSIC
BIOLOGY IN MINAS GERAIS STATE

Resumo
A impunidade tem despontado como um dos principais motivos do aumento da criminalidade no Brasil, principalmente devido à
dificuldade dos processos investigativos em apontar a autoria de delitos. A indisponibilidade generalizada de dados e a alta taxa de
sub-registro nos dados oficiais são alguns entraves à investigação do crime. Neste contexto, a ausência de bancos de dados criminais
contribui para o agravamento da situação, uma vez que muitas amostras coletadas em locais de crime não são comparadas com as
de referência, diminuindo assim, a possibilidade de auxílio nas investigações policiais. Na busca de soluções para esse impasse,
surge a Lei 12.654/12, que prevê a coleta de material biológico como parte da identificação criminal e a possibilidade de reunir tais
informações em um banco de dados de perfis genéticos. Nesse panorama, este estudo buscou levantar os desafios trazidos pela
nova lei na perícia criminal, mais notadamente no Instituto de Criminalística de Minas Gerais, Brasil.

Palavras-chave: Lei 12.654/12; banco de dados de perfis genéticos; perícia criminal.

Abstract
Impunity has emerged as one of the main reasons for the increase of criminality in Brazil, mainly because the inves-
tigative processes are unable to determine de authorship of crimes. The general unavailability of data and the high
rate of underreporting in the official records are some of the main difficulties inherent in the investigation of crime.
In this context, the absence of DNA databases contributes to it, because many samples that are collected in crime
scenes can’t be compared with standard samples, thus reducing the possibility of assistance in police investiga-
tions. The Brazilian law nr. 12,654/12 was created intending to solve this problem, by authorizing the collection of
biological samples as part of criminal identification and future organization of such information in a DNA database.
This study aims to evaluate the challenges brought by the new law in forensic investigation, mainly in the Criminal-
istics Institute of the Civil Police Department of Minas Gerais State, Brazil.

Keywords: Law 12,654/12; DNA databases; forensic investigation.

* alinetchagas@yahoo.com.br
Chagas et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Introdução oficial e seu caráter sigiloso, a necessidade de laudo pericial fir-


mado por perito oficial habilitado e a exclusão dos perfis quando
Nos últimos anos o Brasil vem vivenciando um expressivo da prescrição do delito.
aumento nos índices de criminalidade e mortes violentas, com No ano de 2013, foi publicado o Decreto nº 7.950 9, que
grandes custos sociais e econômicos. O crescimento da crimi- instituiu o Banco Nacional de Perfis Genéticos e a Rede Inte-
nalidade, além de ser percebido pela população dia após dia, é grada de Bancos de Perfis Genéticos que prevê, entre outros
mostrado através de estudos 1,2. aspectos, o compartilhamento e comparação dos perfis genéti-
O Mapa da Violência 2012 3 mostra que, de 1980 a 2010, cos armazenados em bancos de dados de todo o país, a adesão
houve um aumento de 259% no número absoluto de homicídios, dos Estados por meio de acordo de cooperação técnica com o
sendo que o incremento é de 124% quando se analisa o número Ministério da Justiça e a padronização de procedimentos e técni-
de homicídios por grupo de 100 mil habitantes. O mesmo estudo cas de coleta, análise, inclusão, armazenamento e manutenção
mostra que, em Minas Gerais, no mesmo período, houve regres- pelo Comitê Gestor.
são das taxas de homicídio na capital, enquanto a tendência foi Percebe-se que a legislação é clara quanto à atribuição
de crescimento nas cidades do interior. Um estudo divulgado pela das unidades de perícia criminal oficial e dos peritos oficiais na
Secretaria de Estado de Defesa Social de Minas Gerais 4 também utilização, na alimentação e no gerenciamento dos bancos de
detectou um aumento na taxa de homicídios a partir de 2010. dados de perfis genéticos, o que cria para essas instituições de-
A impunidade advinda da não identificação e punição dos safios técnicos, operacionais e logísticos para viabilizar o funcio-
autores de delitos é uma das razões apontadas pelos estudio- namento desses bancos de dados. Dessa forma, este trabalho
sos que se dedicam ao estudo dos fenômenos que levam ao au- se propõe a mostrar os impactos trazidos pela nova legislação
mento da criminalidade violenta. Nessa seara, os processos de junto ao Instituto de Criminalística de Minas Gerais (ICMG), mais
identificação humana surgem como proposta para auxiliar nas in- especificamente na Seção Técnica de Biologia e Bacteriologia
vestigações e até mesmo apontar autorias, através da criação de Legal (STBBL). Para tanto, realizou-se pesquisa bibliográfica na
bancos de dados criminais. A literatura mostra que países como literatura disponível sobre o assunto e efetuou-se a busca de da-
os Estados Unidos obtiveram resultados expressivos no combate dos junto à STBBL do ICMG.
à criminalidade a partir da criação de bancos de dados de perfis
genéticos, que possibilitaram a identificação de criminosos em Os bancos de dados de perfis
casos em que não havia suspeita de autoria 5. genéticos e o CODIS
No Brasil, a taxa de elucidação de crimes de homicídio gira
em torno de 6%, enquanto em países que apresentam legislação É incontestável a natureza técnica e científica da perícia
mais avançada sobre a utilização de técnicas moleculares, os criminal e da criminalística, para a produção de provas dentro do
índices são mais expressivos, como por exemplo na Inglaterra, processo penal. Entretanto, também é sabida a grande desvincu-
onde chegam a 90%. Os legisladores favoráveis à implantação lação entre os Institutos de Criminalística e os Centros de Pes-
dessas tecnologias esbarram, principalmente, em questões le- quisa que, no Brasil, geralmente são vinculados às Universida-
gais e éticas relacionadas aos Direitos Humanos 6. des, o que gera uma grande dificuldade em relação à formação e
A legislação brasileira prevê, por meio da Lei nº 12.037/09 capacitação profissional, produção científica e padronização de
7
, que a identificação criminal do indivíduo ocorrerá apenas quan- procedimentos, sendo esta última o fator crítico à cientificidade
do o mesmo não for identificado civilmente ou quando o docu- da perícia 10. De modo a suprir essa lacuna, setores da perícia
mento de identificação apresentar problemas como rasura ou criminal, dentre eles o de Genética Forense, vêm recebendo in-
indício de falsificação, dentre outras situações. A mesma lei ain- vestimentos tanto para padronização de procedimentos quanto
da prevê que a identificação criminal seria composta por registro para instrumentalização de laboratórios. Apesar de ainda ser in-
datiloscópico e fotográfico, apenas. fluenciada pela morosidade de processos burocráticos (quer seja
Nesse sentido, a Lei nº 12.654/12 8, alterou a legislação para aquisição de material ou pela lentidão com que as leis que
anterior, passando a prever a coleta de material genético como regulamentam sua atividade são discutidas), a Genética Forense
parte da identificação criminal, assegurando que, na hipótese de tem se destacado como exemplo factível da cientificidade da pe-
a identificação criminal ser essencial às investigações policiais e, rícia no Brasil, com grandes contribuições ao processo criminal,
mediante despacho da autoridade judiciária competente, poderá ao auxiliar na identificação de pessoas por meio de ferramentas
ser efetuada a coleta de material biológico para obtenção de per- que utilizam análises genéticas 11.
fil genético. A coleta terá caráter obrigatório para condenados por Vestígios de origem biológica são frequentemente encon-
crimes dolosos com violência de natureza grave contra a pessoa, trados em locais de crime, e tais vestígios são passíveis de se-
ou por qualquer dos crimes previstos na lei de crimes hediondos. rem coletados e analisados em laboratório, a fim de identificar,
A mesma lei ainda trata de aspectos importantes, como o ge- pelo ácido desoxirribonucleico (DNA), quem os produziu. Como
renciamento do banco de dados por unidade de perícia criminal objeto de estudo, o DNA apresenta muitas características favo-

7
Chagas et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

ráveis, como a sua existência em qualquer material de origem Estados Unidos e Chile, o banco de dados foi implantado através
biológica, seu imenso potencial discriminatório, a possibilidade do software CODIS (Combined DNA Index System), de-
de se multiplicar exponencialmente sua quantidade através da senvolvido pelo Federal Bureau of Ivestigation (FBI) e por
reação em cadeia da polimerase (PCR) e a sua estrutura mole- ele cedido à Polícia Federal brasileira para utilização em território
cular estável que lhe confere resistência aos fatores ambientes nacional. Em 2010 foi feita a maior instalação do programa CO-
e à passagem do tempo. Tais propriedades permitem que as DIS fora dos Estados Unidos, incluindo 15 laboratórios estaduais,
técnicas moleculares sejam aplicadas na investigação criminal um laboratório federal, além do banco nacional, localizado em
para apontar a autoria de delitos, excluir inocentes e identificar Brasília/DF, que é responsável pelo gerenciamento dos demais
cadáveres e pessoas desaparecidas 12. laboratórios. A partir da criação do Banco Nacional de Perfis Ge-
A análise de DNA com o propósito de identificação humana néticos, foi criada uma grande expectativa em virtude do sucesso
é um teste comparativo, através do qual se estabelece o confron- alcançado em outros países 16.
to entre amostra(s) de identidade conhecida (amostra-referência) O CODIS apresenta dois segmentos: CODIS 5.7.4, cuja
e amostra(s) de identidade não conhecida (amostra questiona- interface abrange o armazenamento e comparação de perfis ge-
da). Por isso, a simples coleta de material biológico em local de néticos de DNA de amostras coletadas em locais de crimes com
crime e obtenção de seu perfil genético de DNA tem pouca re- amostras de referência de vítimas e suspeitos; e o CODIS 6.1,
levância no processo investigativo sem que haja a presença de que busca vínculos genéticos de parentesco entre amostras de
uma amostra de referência para comparação. Daí surge a neces- ossadas e restos mortais associados a pessoas desaparecidas
sidade de se cadastrar amostras de suspeitos, vítimas, parentes e seus supostos parentes. Em 2013, o FBI iniciou os trabalhos
de pessoas desaparecidas, entre outras, que sejam passíveis de como o CODIS 7, que integra as funcionalidades dos dois seg-
serem comparadas com o material coletado em campo. A criação mentos anteriores. Basicamente, o CODIS é estruturado em
de bancos de dados de perfis genéticos surge como uma solução arquivos distintos e complementares de perfis genéticos, deno-
interessante para esse impasse, uma vez que possibilita o cru- minados índices. O Índice Forense, por exemplo, contém perfis
zamento de dados extraídos de locais de crimes sem suspeitos genéticos de amostras coletadas em locais de crime, enquanto o
com perfis genéticos de DNA de pessoas que estão envolvidas Índice de Criminosos contém perfis de pessoas condenadas por
na investigação criminal, quer por serem suspeitos ou vítimas crimes violentos. O intercâmbio de dados de informações genéti-
de crime ou por apresentarem parentesco com pessoas desapa- cas depositadas nos diferentes índices possibilita a identificação
recidas. Tal ferramenta possui características muito vantajosas, de criminosos de diversas naturezas e também de pessoas de-
notadamente em modalidades de crime que apresentam elevado saparecidas e restos mortais.
grau de reincidência, como os crimes contra o patrimônio e cri- O licenciamento para uso do CODIS no Brasil se deu
mes sexuais 13. através de Termo de Compromisso firmado entre o FBI e o DPF.
Em 2004, com o advento da Rede Nacional de Genética Também foram firmados Acordos de Cooperação Técnica entre o
Forense, via Secretaria Nacional de Segurança Pública (SE- Ministério da Justiça e os estados participantes, prevendo ações
NASP), foi possível criar laboratórios de Genética Forense em para a padronização de procedimentos, captação de recursos de
diversos Estados, melhorar os já existentes, além de capacitar e infraestrutura e adoção de medidas de segurança para garantir a
treinar os peritos criminais que neles atuavam. Tal iniciativa levou confiabilidade dos dados genéticos armazenados.
à formação de grupos de especialistas que desenvolveram e pa- Para determinação da identidade genética das amostras, o
dronizaram procedimentos, abrindo precedentes para, em 2009, CODIS utiliza treze polimorfismos genéticos (ou marcadores ge-
ser implantada a Rede Integrada de Bancos de Dados de Perfis néticos) do tipo microssatélites (STR - Short Tandem Repe-
Genéticos (RIBPG) que permitiu que as Secretarias Estaduais de at), que estão presentes em diferentes cromossomos do genoma
Segurança Pública e o Departamento de Polícia Federal (DPF), humano, possuem características altamente individualizantes e
através de suas respectivas instituições de Perícia Oficial, com- proporcionam alto poder de discriminação 12. Além desses mar-
partilhassem e comparassem perfis genéticos de DNA 14. cadores, o CODIS 6.1 passou a utilizar marcadores do cromos-
A RIBPG, então, nasce com o objetivo de dar mais celeri- somo Y (Y-STR) e também sequências de DNA mitocondrial,
dade às investigações criminais e diminuir os índices de violên- cuja finalidade é a identificação de pessoas desaparecidas e de
cia através da identificação de autores de delitos e consequente vítimas de desastres.
redução da impunidade, além de proporcionar a identificação de O CODIS, uma vez em operação, disponibiliza dados de
ossadas e restos mortais associados a pessoas desaparecidas. perfis genéticos obtidos de material biológico coletado em locais
Em seu projeto de implantação, foram estabelecidos requisitos de crime, de vítimas de crimes violentos ou cedidos por pessoas
mínimos para participação dos laboratórios na rede, incluindo envolvidas na investigação. Essas informações podem, então,
experiência, pessoal, estrutura laboratorial e procedimentos de ser armazenadas, compartilhadas e comparadas entre si, na
garantia e controle de qualidade 15. busca por autores e pessoas desaparecidas e para relacionar di-
No Brasil, assim como já acontecia em outros países como ferentes ocorrências e linhas de investigação, a um mesmo autor.

8
Chagas et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Segundo o FBI 17, até maio de 2014, o Índice Nacional para realização de nova perícia, a existência de procedimentos
de DNA dos Estados Unidos da América contava com mais de padronizados, entre outros. A RIBPG ainda prevê períodos para
10.971.392 perfis de agressores e 559.705 perfis coletados em adequação dos laboratórios à ISO 17025 15.
locais de crime, tendo sido obtidos em torno de 245.447 coinci- Em 2009, o Estado de Minas Gerais, através da Secretaria
dências, que auxiliaram em mais de 235.540 investigações. de Estado de Defesa Social, e o Ministério da Justiça celebraram
Entretanto, para maximizar os efeitos vantajosos desse um Acordo de Cooperação Técnica, o qual objetivou a implanta-
tipo de análise, é urgente a padronização de outros procedimen- ção da RIBPG no Estado e previu a realização de ações conjun-
tos, com vistas a melhorar a qualidade do material que chega aos tas para padronização de procedimentos, captação de recursos
laboratórios e, consequentemente, a qualidade e confiabilidade e infraestrutura e adoção de medidas de segurança para garantir
dos resultados. a confiabilidade dos dados.
As primeiras precauções devem ser tomadas logo quan- Nesse acordo, a SENASP, através do Ministério da Justi-
do da identificação e coleta do vestígio. Os peritos e outros ça, se compromete, entre outros aspectos, a prover: hardware
profissionais que atuam em locais de crime devem adotar pro- e software necessários à implantação da RIBPG, recursos para
cedimentos de modo a evitar a contaminação do material. Além funcionamento de canais de transmissão de dados, aquisição de
disso, é importante catalogar e documentar a posição original material de consumo e equipamentos, construção e reformas,
da evidência coletada. Cuidados adicionais devem ser tomados eventos de capacitação etc. Ao Estado de MG coube, principal-
em relação ao acondicionamento, armazenagem e transporte mente, manter e gerenciar o banco de dados estadual, zelar pela
até o laboratório. Uma vez no laboratório, é necessária a pa- adequada utilização dos dados, disponibilizar e manter canal de
dronização de procedimentos e controle de qualidade, sem- dados entre a SENASP e o Estado, adquirir materiais de consu-
pre atentando para a documentação da cadeia de custódia. mo para o laboratório, entre outras atribuições.
Por fim, o tratamento estatístico dado aos resultados obtidos, Até a conclusão deste estudo, o Estado de Minas Gerais,
bem como a sua apresentação em forma de laudo devem ser através dos órgãos competentes, não havia publicado a portaria
cuidadosamente estabelecidos. Tais procedimentos, ao serem que cria no Estado o Banco de Dados de Perfis Genéticos. Bahia,
adotados, conferem qualidade ao material a ser examinado e Mato Grosso, Pará, Paraíba, Paraná, Santa Catarina e São Pau-
aumentam a confiabilidade dos resultados, que farão parte do lo já publicaram suas respectivas portarias.
conjunto probatório durante o processo penal 12. As análises de DNA para fins forenses em Minas Gerais
são realizadas pela STBBL, da divisão de Laboratório do ICMG;
A Genética Forense em Minas Gerais as amostras analisadas são oriundas de material coletado em
e a Lei nº 12.654/12 cenas de crime, enviadas pelo Instituto Médico-Legal (IML) e
coletadas em vítimas de crimes sexuais. Ao longo dos anos, a
Quando da implantação do CODIS no Brasil, a RIBPG STBBL tem desenvolvido projetos de natureza técnico-científica
determinou exigências a serem cumpridas pelos estados para voltados para o combate à violência. Neste contexto, destaca-
garantir sua participação no grupo, de modo a cumprir os ter- se o “Projeto Crimes Sexuais”, do ano de 2005, que armazenou
mos impostos pelo FBI quando da cessão da licença para uso do perfis genéticos obtidos em casos de crimes sexuais, tornando
software. Assim sendo, a SENASP propõe como procedimento possível, entre outras ações, o mapeamento das áreas de ação
para coleta e exame de materiais biológicos o disposto na Reso- de um criminoso e a verificação do envolvimento do mesmo em
lução nº 194/99 da Secretaria de Segurança Pública de São Pau- outros delitos. Também se destaca a implantação de um banco
lo. Ademais, a SENASP disponibiliza em seu site na internet um de perfis genéticos de cadáveres e ossadas para identificação
manual de padronização de exames de DNA em perícias crimi- de pessoas desaparecidas. Além disso, um grande avanço ocor-
nais, que prevê procedimentos de coleta e custódia de amostras, reu em 2009, com a implantação do CODIS, que permitiu que
instalações físicas, os marcadores moleculares a serem utiliza- amostras provenientes de crimes sem suspeitos ou crimes inte-
dos nos exames, instruções sobre interpretação de resultados, restaduais, entre outros, sejam analisadas e seu perfil genético
tratamento estatístico e conteúdo dos laudos periciais. de DNA adicionado ao banco de dados. Ressalta-se, no entanto,
Para efetiva participação dos laboratórios na RIBPG, fo- que em MG o exame de DNA ainda é realizado apenas à medida
ram destacados requisitos mínimos, que incluíam comprovação que a investigação policial encontra suspeitos ou novas amostras
da experiência do laboratório e corpo técnico-científico qualifica- relacionadas ao crime, sendo o exame realizado apenas para ca-
do. Quanto à estrutura física, foram exigidos acesso controlado sos denominados “completos”, ou seja, aqueles em que há uma
e limitado, procedimentos de limpeza e descontaminação, espa- amostra de referência para comparação. Nos casos “incomple-
ços distintos para realização das diferentes etapas dos exames tos”, as amostras ficam arquivadas até que a investigação policial
e a presença de áreas seguras para armazenamento. Quanto aponte um suspeito. Tal procedimento decorre, principalmente,
aos procedimentos e metodologias, exige-se um sistema docu- da falta de infraestrutura e pessoal para realizar a análise de to-
mentado de controles de amostras; armazenamento de material das as amostras recebidas na seção e o armazenamento dos

9
Chagas et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

perfis genéticos das mesmas no CODIS. mitem afirmar que a existência de um banco de dados robusto
As estatísticas da STBBL para o ano de 2010 dão conta de é capaz de auxiliar sobremaneira nos processos investigativos.
que, naquele ano, apenas 9% dos casos de crimes sexuais esta- Além do banco de dados de amostras de referência, cum-
vam completos, ou seja, permitiam análises comparativas. Dados pre destacar a importância de se obter dados de qualidade a
estatísticos da Seção mostraram que, entre 2001 e 2010, a maioria partir dos perfis coletados em locais de crime. A análise de DNA
dos casos que aportaram no laboratório referentes a crimes se- depende da qualidade das amostras que são enviadas ao labora-
xuais eram provenientes de Belo Horizonte, perfazendo os casos tório. A simples existência de um banco de dados com capacida-
vindos do interior menos da metade dos recebidos pela capital. de para indicar suspeitos de nada vale se as amostras de origem
Embora a Lei 12.654/12 estabeleça que a coleta de amos- biológica coletadas no local estiverem sem condições de análise,
tra biológica para fins de análise de DNA deva ser realizada de degradadas, contaminadas ou em desacordo com a documenta-
maneira indolor, não há legislação que regulamente os procedi- ção da cadeia de custódia. Assim, é importante que sejam feitos
mentos de coleta de material genético para fins de identificação investimentos no treinamento do perito de local de crime, com
criminal. Dessa forma, apesar de a legislação permitir a coleta, vistas a melhorar o processo de identificação de vestígios e sua
ainda não se sabe de que forma ela será feita, onde, nem por correta coleta e armazenamento.
qual profissional. Há que se destacar a necessidade de adaptação do es-
Quanto à capacitação dos peritos que atuam em locais de paço físico do laboratório, rotina de compra de materiais de con-
crime, os conhecimentos acerca da coleta, preservação, arma- sumo, manutenção e aferição dos equipamentos, formação do
zenamento e transporte de material biológico são transmitidos corpo técnico-científico e contratação de pessoal administrativo
durante o Curso de Formação Policial na Academia de Polícia. para que o grande potencial das técnicas moleculares seja explo-
Em complementação, a STBBL elaborou um Manual de Coleta rado e sua utilização maximizada para fins, em última análise, de
de Evidências para Análises de DNA, o qual explicita em seu con- queda da impunidade e dos índices de criminalidade.
teúdo, de maneira detalhada, as técnicas e precauções a serem Por fim, recomenda-se que haja maior celeridade na pu-
observadas durante o manejo de material biológico. blicação de legislação que regulamente a forma como será feita
a coleta de material genético para fins de identificação criminal.
Discussão Durante esse processo é desejável que se realize estudos que
levem em consideração a dimensão territorial de Minas Gerais e
De forma geral, a perícia criminal no Brasil carece de padro- a situação precária em que se encontra a perícia e demais insti-
nização. Foi o que concluiu estudo feito pela SENASP, intitulado tuições de segurança pública, de modo a estabelecer estratégias
“Diagnóstico da Perícia Criminal no Brasil”, em que se apontou que sejam factíveis em todo o Estado.
a escassez de dados sistematizados e o desconhecimento das
instituições por seus próprios gestores. De forma preocupante, o Considerações finais
estudo diagnosticou o desconhecimento que a perícia criminal no
Brasil tem de si mesma 18. As técnicas de biologia molecular possuem grande apli-
No transcurso das pesquisas para elaboração do presente cabilidade nas ciências forenses, notadamente na identificação
estudo, verificou-se uma grande dificuldade na apuração de da- humana. O Brasil tem avançado muito em termos de legisla-
dos oficiais referentes ao número de condenados que cumprem ção pertinente ao caso, mas ainda tem muito a progredir. A Lei
pena atualmente em Minas Gerais, bem como o número médio 12.654/12 prevê a possibilidade de se aprimorar o processo de
de condenações por período de tempo. Tais dados seriam de identificação criminal no Brasil, com vistas a dar mais robustez
grande relevância na implantação do banco de perfis genéticos aos processos de investigação criminal por meio da definição da
de condenados, uma vez que é preciso prever a demanda de autoria de delitos.
exames que aportarão no laboratório mensalmente para que se- Urge o fortalecimento das instituições de perícia criminal,
jam feitas ações de planejamento que permitam que as amostras com maciços investimentos nos laboratórios de genética forense,
sejam analisadas com qualidade e celeridade. De modo similar, aquisição de equipamentos e reagentes, contratação, capacita-
não foi possível obter junto à STBBL dados que permitissem en- ção e qualificação dos peritos criminais.
tender a atual demanda de exames no laboratório e prever os Por fim, cabe aos gestores e responsáveis pela implemen-
impactos vindouros na ocasião em que as estratégias de coleta tação do CODIS em Minas Gerais a realização de estudos e a
e envio de material biológico estiverem estabelecidas e em fun- propositura de estratégias que permitam, em todo o Estado, a
cionamento. coleta de amostras que alimentarão o banco de dados atinente
A realização deste trabalho permitiu que se depreendesse aos condenados, bem como a difusão de boas práticas de coleta
que a análise de DNA é uma ferramenta poderosa para a inves- e armazenagem de material proveniente de locais de crime, além
tigação criminal e promissora no que diz respeito à identificação da regulamentação das leis que certificam a existência do CODIS
de autores de delitos. Os dados disponibilizados pelo FBI per- em MG, ademais de sua administração.

10
Chagas et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Referências Perfis Genéticos. Diário Oficial da União, Brasília, 13 mar. 2013.


10- GIOVANELLI, A.; GARRIDO, R.G. A perícia criminal no Bra-
1- SANTOS, M.J.; KASSOUF, A.L. Estudos econômicos das cau- sil como instância legitimadora de práticas policiais inquisitoriais.
sas da criminalidade no Brasil: evidências e controvérsias. Revis- Revista do Laboratório de Estudos da Violência da
ta Economia, v.9, p.343-372, 2008. UNESP/Marília, n.7, p.5-24, 2011.
2 - PANUCCI, L.F.A. Aumento da criminalidade: causas. 11- SILVA, L.L.R.; BINSFELD, P. Evolução histórica da genética
2004. Monografia – Faculdades Integradas Antônio Eufrásio de forense no judiciário brasileiro. In: Mostra de Produção Científica
Toledo, Faculdade de Direito de Presidente Prudente, Presidente da Lato Sensu PUC/GO, Anais... Goiânia. 2012.
Prudente. 12- PENA, S.D.J. Segurança pública: determinação de identidade
3- WAISELFISZ, J.J. Mapa da violência 2012 - os novos genética pelo DNA. In: Seminários Temáticos para a 3ª Conferên-
padrões da violência homicida no Brasil. São Paulo: Ins- cia Nacional de C, T & I. Anais... Brasília. 2005.
tituto Sangari. 2011. 13- LIMA, H.B. DNA x criminalidade. Revista Perícia Federal,
4- MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Defesa Social. Infor- n.26, p.8-11, 2008.
mativo dos índices de criminalidade de Minas Gerais 14- HAMMMERSCHIMIDT, D.; GIACOIA, G. Banco de perfis ge-
2012. Belo Horizonte: SEDS, 2013. néticos dos criminosos: tratamento normativo na Lei espanhola e
5- SCHIOCCHET, T.; BRAGATO, F.F.; ROCHA, C.P.M.; WUNSCH, na Lei brasileira. In: Congresso Nacional do Conselho Nacional de
G.; DUMKE, C.; UGALDE, J.M.B.; RAMBO, M. Banco de per- Pesquisa e Pós Graduação em Direito, Anais... .Niterói. 2012.
fis genéticos para fins de persecução criminal. Projeto 15- BRASIL. Projeto Rede Integrada de Perfis Genéticos.
Pensando o Direito. v.43. Brasília: Ministério da Justiça, 2012. Brasília, 2009. Disponível em: <http://www.publicadireito.com.br/
6- PEDRUZZI, P. Rede nacional de genética forense. Revista artigos/?cod=8cea559c47e4fbdb> Acesso em: 31 ago. 2016.
Perícia Federal, n.26, p.6-7, 2008. 16- AGUIAR, S.M.; ALBUQUERQUE, T.C.K.; BITTENCOURT,
7- BRASIL. Lei 12.037, de 01 de outubro de 2009. Dispõe sobre E.A.A.; DE OLIVEIRA, J.P.S.C.; FAGUNDES, P.R.; JACQUES,
a identificação criminal do civilmente identificado, regulamentando G.S.; KOSHIKENE, D.; LIMA, H.B.; MALAGHINI, M.; MOREIRA,
o art. 5º, inciso LVIII, da Constituição Federal. Diário Oficial da A.P.D.M.; SILVA, J.S.F.P.; WELTER, A.C. Rede integrada de ban-
União, Brasília, 01 out. 2009. cos de perfis genéticos e a implantação do CODIS no Brasil. In:
8- BRASIL. Lei 12.654, de 28 de maio de 2012. Altera as Leis nos Congresso Brasileiro de Genética Forense, Resumos... Porto
12.037, de 1o de outubro de 2009, e 7.210, de 11 de julho de 1984 Alegre. 2011.
- Lei de Execução Penal, para prever a coleta de perfil genético 17- FEDERAL BUREAU OF INVESTIGATION. Codis - NDIS
como forma de identificação criminal, e dá outras providências. Di- statistics, 2014. Disponível em: <http://www.fbi.gov/about-us/lab/
ário Oficial da União, Brasília, 29 mai. 2012. biometric-analysis/codis/ndis-statistics> Acesso em: 26 jun. 2014.
9- BRASIL. Decreto 7.950, de 12 de março de 2013. Institui o Ban- 18- BRASIL. Secretaria Nacional de Segurança Pública. Diagnós-
co Nacional de Perfis Genéticos e a Rede Integrada de Bancos de tico da perícia criminal no Brasil. Brasília: SENASP, 2012.

11
rcml
revista criminalística
e medicina legal
revista criminalística e medicina legal
v.1 | n.1 | 2016 | p. 12-16

ANÁLISE DE IMAGENS NA DETERMINAÇÃO


DE VELOCIDADES DE ENTRADA
EM PERÍCIAS DE TRÂNSITO
Tales Giuliano Vieira*
Superintendência de Polícia Técnico Científica de Minas Gerais – 6º DPC/1ª DRPC – Lavras/MG
Gustavo Henrique Canedo Fraga
Universidade Federal de Lavras, Lavras, Minas Gerais
Paulo Elpídio de Alvarenga Marinho
Instituto de Criminalística da Polícia Civil de Minas Gerais

IMAGE ANALYSIS FOR DETERMINING


SPEED OF ENTRY OF CARS IN THE INVESTIGATION
OF TRAFFIC ACCIDENTS

Resumo
Perícias em locais de acidente de trânsito vêm ocorrendo cada dia com mais frequência, o que tem como prováveis causas o aumento
do fluxo rodoviário e imprudência/imperícia de condutores. Em um local de acidente de trânsito, o agente pericial tenta remontar o
local da colisão, utilizando-se dos vestígios para tentar descrever a dinâmica envolvida no fato. A falta de vestígios em locais é um
dos fatores que mais impossibilita ou dificulta a análise, uma vez que esses vestígios são usados, por exemplo, para a determinação
da velocidade dos veículos instantes antes do sinistro. O cálculo da velocidade das unidades motoras pode ser realizado de diversas
maneiras; no entanto, existem locais em que não é possível a constatação de vestígios suficientes para os cálculos, ocasião em que
as câmeras de segurança têm papel fundamental nessa natureza pericial. Esse trabalho tem como objetivo avaliar o uso de câmeras
na estimativa de velocidade de veículos em local de acidente de trânsito em comparação com métodos clássicos da Física. Os resul-
tados mostraram-se promissores, principalmente em locais com ausência de vestígios.

Palavras chave: câmeras; perícia; velocidade.

Abstract
Investigations into scenes of traffic accident, whose probable causes are the increasing traffic flow and driver’s
recklessness/inexperience, occur more frequently each day. In a traffic accident scene, the forensic investigator
tries to reassemble the collision site, using the trace evidences in hopes of describing the dynamics of the fact. The
absence of trace evidences in scenes is one of the factors that hamper analysis or even make it impossible, since
these traces are used, for example, to determinate the speed of the vehicle moments before the accident. The
speed calculation of the motor vehicles can be accomplished in several ways. However, in some cases there are
not enough traces left to allow calculations. In such cases, security cameras play a key role in this kind of investiga-
tion. This study aims to evaluate the use of cameras in the estimation of speed of vehicles in car accident scenes
compared with classical methods of Physics. The results proved promising, especially in scenes with few traces.

Keywords: camera; investigation; velocity.

* talesgvieira@ig.com.br
Vieira et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Introdução de câmeras de segurança que possam ter registrado total ou


parcialmente a dinâmica do acidente. Além de possibilitarem
Os acidentes de trânsito são reconhecidos como um dos uma prova material do fato em análise, podem ser utilizadas
efeitos negativos dos sistemas de transporte viário. Anualmente, para estimar as velocidades dos veículos envolvidos, possíveis
esses acidentes resultam em um grande número de mortes, in- motivos causadores, intervenção de terceiros, entre tantas ou-
validez e sofrimento às vítimas e seus familiares, representando tras aplicações.
um elevado custo para a sociedade em geral. Os impactos sócio Em geral, filmagens de acidentes ou outros incidentes são
-econômicos dos acidentes de trânsito têm levado a comunidade registrados por câmeras de circuito fechado de televisão (CCTV),
internacional a empenhar esforços na redução dos acidentes 4. que hoje em dia representam a maior parte dos equipamentos
Em um acidente de trânsito a perícia tem papel fundamen- de segurança encontrados. Define-se CCTV como um sistema
tal para determinar a causa do sinistro. Nesse tipo de local, o que inclui todos os sistemas de gravação de vídeo projetados
profissional da criminalística analisa diversos vestígios, como para uso privado, ou seja, gravações que serão usadas com a
fragmentos desprendidos das unidades motoras, avarias nos finalidade de monitoramento e segurança, e não como meio de
veículos e ainda marcas de frenagem ou arrastamentos/com- gravação para retransmissão.
pressões que auxiliam na determinação da velocidade instantes Câmeras com resoluções superiores conseguem registrar
antes do sinistro 5. imagens mais nítidas em comparação com equipamentos de
A estimativa da velocidade em um local de acidente de baixa resolução. A resolução é medida em linhas, por exemplo,
trânsito é de fundamental importância, pois a partir dela, pode-se uma televisão de resolução padrão tem resolução de tela de
elucidar a causa técnica do acidente e atribuir a culpa a algum 480 linhas, enquanto equipamentos televisivos de alta definição
dos condutores caso esse estivesse em velocidade incompatível, (HDTV) têm resolução de 1080 linhas. Contudo, a maioria dos
que é entendida não somente como uma velocidade superior à equipamentos de CCTV têm resoluções que oscilam entre 330 e
máxima permitida, mas também como inadequada para a via e 400 linhas, não se fazendo assim necessário utilizar equipamen-
suas condições no momento (clima, luminosidade, fluxo etc). tos HDTV. Resoluções mais altas de câmera estão disponíveis se
A determinação da velocidade dos veículos envolvidos em a qualidade das imagens obtidas for o alvo desejado 7.
um acidente pode ser realizada de diversas maneiras utilizando-se Uma filmagem é composta por um conjunto de imagens
princípios como a conservação da energia dissipada durante uma que, ao serem passadas em sequência e em um curto espaço
frenagem ou de deformações nos veículos utilizando-se o método de tempo, causam a ilusão de movimento. Não existe um padrão
do princípio da conservação da quantidade de movimento 6. pré-definido a ser seguido sobre a velocidade com que essas
O grande desafio da perícia está, no entanto, em locais imagens devem ser passadas, mas tem-se a convenção para
que não possuam vestígios suficientes para o cálculo das velo- contabilizar e repassar os dados sobre com qual velocidade as
cidades, ocasiões em que o profissional necessita lançar mão imagens estão sendo passadas. Tal convenção adquiriu o nome
de outros meios para a determinação da dinâmica do acidente, de frame, ou quadro, e determinou-se que uma boa unidade
como por exemplo, a utilização de câmeras de segurança. para a contabilização de imagens seria em segundos. Daí ori-
As tecnologias imagéticas e digitais têm aumentado gina-se o termo frames por segundo (FPS) ou quadros por se-
significativamente as formas de vigilância, registrando desde gundo (QPS), que são usados para dizer quantas imagens são
crimes como assaltos, homicídios, até acidentes de trânsito. passadas em um segundo de gravação.
Contudo, ainda há muita discussão em torno do assunto, prin- Nos sistemas de vídeo utilizados no Brasil, Canadá, Es-
cipalmente no que diz respeito à privacidade, pois com os tados Unidos e Japão, a taxa média de velocidade do FPS é de
equipamentos de filmagem digital registrando 24 horas por 29,97 imagens por segundo; portanto, cada frame equivale a
dia, todo o tráfego de veículos e pedestres, algumas pessoas 0,0333 segundos. Aproximadamente tem-se um total de 30 FPS,
veem sua privacidade ferida, pois tais filmagens permitiriam, o que dá uma boa fluidez às filmagens, e é o padrão geralmente
por exemplo, que perfis de comportamento de alguém em adotado por CCTVs.
específico fossem traçados ou poderiam ser utilizadas para Recentemente imagens de câmera foram utilizadas na
outro fim qualquer. determinação de velocidade de veículos, utilizando-se uma me-
A dificuldade de estudar sinistros de trânsito está intima- todologia baseada em arranjos geométricos e a validação foi re-
mente relacionada ao fato de o acidente ser um acontecimento alizada por radar com efeito Doppler 8.
imprevisível, somente observável após sua ocorrência, sendo O método PCQM provém das leis newtonianas e permite
que nem sempre há indícios suficientes para se reproduzir a di- estimar as velocidades baseando-se no princípio da conserva-
nâmica de um acidente. Além disto, as causas dos acidentes de ção da energia/quantidade de movimento pelo deslocamento do
trânsito podem ser tão vastas, que tomar medidas para a preven- centro de massa de um corpo. O método citado é extremamente
ção de sinistros, torna-se uma missão muito árdua 5. confiável e descrito por muitos estudiosos em Física, sendo ex-
Neste contexto, destaca-se a importância das filmagens tremamente utilizado em pericias de trânsito 6.

13
Vieira et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Existem expressões bem definidas para a utilização do


método, as quais seguem abaixo:
∑ Pi = PA + PB = P’A + P’B
A quantidade de movimento (Pi) de um corpo pode ser
definida como o produto de sua massa pela velocidade sendo
esse conservado durante uma colisão, ou seja, o somatório dos
momentos iniciais (PA + PB) é igual à soma dos momentos após
a colisão (P’A + P’B ). O método consiste em calcular as velocida-
des de entrada dos veículos, ou seja, a velocidade das unidades
motoras antes da colisão, através de estimativas das velocidades
de saída, ou seja, após a colisão. Substituindo-se cada momento
(P) pelo produto da massa pela velocidade tem-se: Figura 1: Visão da câmera de segurança utilizada mostrando as
mAvA + mBvB = mAuA + mBuB duas árvores (setas brancas) que foram utilizadas como pontos
Na expressão, vA e vB são as velocidades antes da colisão fixos para a estimativa das velocidades.
(velocidade de entrada) e uA e uB são as velocidades após coli-
são, denominadas como velocidades de saída. Resultados e Discussão

Material e métodos Método PCQM


Para o cálculo da velocidade pelo método do PCQM realizou-se
O presente trabalho foi realizado mediante levantamento inicialmente o cálculo das velocidades de saída, ou seja, velocidades
pericial em um local de acidente de trânsito na área da Delegacia após o abalroamento. A velocidade de saída do veículo 1 (V1) foi esti-
Regional de Polícia Civil de Lavras, Minas Gerais, o qual envol- mada como sendo igual a energia necessária para deslocá-lo por uma
veu dois veículos (automóveis) em uma área urbana. Como as distância d em coeficiente de atrito µ. Para o presente estudo, consi-
câmeras de segurança próximas ao local do acidente não regis- derou-se um coeficiente de atrito cinético (arrastamento) igual a 0,6.
traram o sinistro, o cálculo da velocidade das unidades motoras u1 = (2µgd)0,5
antes da colisão foi estimado mediante três metodologias: u1 = 34,93 km/h
Metodologia 1 A velocidade de saída do veículo 2 (V2) foi estimada como
Método PCQM, baseando-se nas posições de imobiliza- sendo igual à energia necessária para causar danos graves em sua
ção das unidades motoras bem como seus deslocamentos do estrutura quando da colisão contra a árvore (60 km/h = 16,66 m/s),
ponto de impacto; mais a energia despendida na forma de atrito com o rolamento das
Metodologia 2 rodas em rolagem (coeficiente 0,1) por 42 m. O valor de 0,1 é consi-
Cálculo direto através da distância percorrida entre dois derado o mais correto por se tratar de um coeficiente estático, com
pontos, com auxílio de câmera de segurança; valores menores que os cinéticos utilizados em demais cálculos.
Metodologia 3 V-roda-engrenada= (2µgd)0,5
Simulação com veículo de mesma marca e modelo e constru- V-roda-engrenada= (2*0,1*9,81*42)0,5= 9,07 m/s = 32,68 km/h
ção de curva de calibração, utilizando-se imagens de uma câmera.
Para o cálculo da velocidade através da primeira metodolo- Velocidade total de saída de V2:
gia, utilizaram-se as massas dos veículos conforme constava no u22= 16,662 + 9,072
sistema do Departamento de Trânsito (DETRAN/MG) consideran- u2 = 18,97 m/s = 68,28 km/h
do a quantidade de pessoas dentro dos veículos. Os ângulos de A estimativa das velocidades de entrada, ou seja, aquela
entrada e saída dos veículos foram obtidos mediante construção velocidade que antecedeu ao acidente pode ser feita pelas ex-
de croqui esquemático do local no dia do sinistro. As velocidades pressões abaixo, utilizando-se os parâmetros mostrados na TAB.
de saída de cada veículo foram estimadas baseando-se nas ava- 1. Os valores dos ângulos (b) de saída foram obtidos através de
rias dos mesmos, bem como na posição de imobilização de cada medidas no local.
unidade motora após o abalroamento, conforme dados da literatu- V1 = m2/m1*u2*sen b2 + u1*sen b16
ra, assim como todas as expressões para os cálculos efetuados 6. V1 = 1100/1000*18,97*sen2 + 9,70*sen20
A estimativa da velocidade de entrada dos veículos através das V1 = 4,03 m/s
metodologias 2 e 3 foi realizada com o auxílio de uma câmera de se- V1 = 14,53 km/h
gurança da marca JFL, possuindo 30 FPS e resolução de 520 linhas V2= u2*cosb2 + m1/m2*cosb1
a qual se encontrava nas proximidades do local periciado. A FIG. 1 V2 = 18,97*cos2 + 1000/1100*cos20
mostra a imagem obtida através da câmera, podendo-se observar, em V2 = 19,80 m/s
destaque, os pontos fixos (árvores) utilizados para os cálculos. V2 = 71,29 km/h

14
Vieira et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Ângulo de Ângulo de
Massa do veículo (kg) A V (km h-1) B U (km h-1) C
entrada (°) saída (°)
Veículo 1 90 20 1000 14,53 34,93
Veículo 2 0 2 1100 71,29 68,28

Quadro 1: Parâmetros utilizados para o cálculo das velocidades de entrada e saída dos veículos envolvidos.
A) massa total do veículo incluindo o(s) passageiro(s); B) velocidade de entrada do veículo; C) velocidade de saída do veículo.

O QUADRO 1 apresenta os parâmetros utilizados no cál- velocidade da unidade motora seria constante no trecho, o que
culo pelo método PCQM, bem como as velocidades de entrada e nem sempre ocorre na prática.
saída dos veículos 1 e 2. Para minimizar os erros do método anterior, foi realizada
O confronto desse resultado foi realizado mediante com- uma simulação com um veículo de mesma marca e modelo que
paração com os resultados dos cálculos pelas metodologias 2 e V2 no mesmo trecho onde esse teria sido filmado. Após isola-
3, os quais utilizaram imagens obtidas por uma câmera de segu- mento da área, dois Investigadores de Polícia da 1ª Delegacia
rança. A FIG. 2 apresenta um frame de um trecho em que o V2 Regional de Polícia Civil de Lavras/MG conduziram o veículo
passava pelos pontos fixos (árvores). similar a V2 no mesmo trecho de modo que fosse captado pela
câmera retrocitada no mesmo ângulo que no dia do acidente,
Figura 2: Fragmento da filmagem (frame) mostrando o produzindo velocidades de 50, 60, 70, 80 e 90 km/h que foram
momento em que o veículo 2 passava pelos pontos fixos em aferidas pelo velocímetro no momento do teste.
destaque (setas brancas).
Como ambos os veículos percorreram o mesmo trecho e
considerando que havia uma referência de demarcação (árvo-
res), pode-se afirmar que a velocidade que o condutor imprimiu é
inversamente proporcional ao tempo gasto para percorrer o tre-
cho e também inversamente proporcional ao número de frames
correspondentes para a porção dianteira do veículo percorrer o
intervalo entre as árvores.
Dessa forma foi construída uma curva de calibração de ve-
locidade real do veículo similar a V2 versus número de frames
gastos para percorrer o intervalo fixo, obtendo-se a equação da
reta como mostrado na FIG. 3.

Figura 3: Gráfico de número de frames versus velocidade


imprimida no experimento.
O cálculo da velocidade do V2 foi feito inicialmente pela
razão da distância percorrida (espaço entre as árvores) pelo tem-
po gasto no trajeto do V2. Esse tempo foi obtido pelo número
de frames que a porçao dianteira do V2 gastou para percorrer o
intervalo de 7,54 m (distância entre as árvores) dividido pela taxa
de frames por segundo (FPS) da câmera, sendo mostrado na
sequência.
V = D t-1
V = 7,54 m * (9 frames /24FPS)-1
V = 20,1066 m/s ou V = 72,38 km/h
Na análise dos arquivos de vídeo constatou-se que a câ-
mera apresentou uma variação de 22 a 26 FPS obtendo-se uma Após a construção da curva de calibração, as imagens do
média de 24 frames por segundo o qual foi utilizado para o cál- V2 no dia do sinistro foram analisadas, obtendo-se que o mesmo
culo da velocidade. Esse valor de 72,38 km/h é mais susceptível gastou 9 (nove) frames para percorrer o espaço fixo. Sendo
a erros e, com certeza, menos preciso e exato, já que o desvio assim, sua velocidade pode ser calculada pela equação da reta
padrão foi elevado na obtenção da quantidade de FPS. mostrada acima, considerando-se “y” o número de frames e “x”
Outra provável fonte de erro para o cálculo direto da ve- a velocidade do V2. Substituindo-se na equação da reta pode-se
locidade do veículo (metodologia 2) é a consideração de que a obter a velocidade do V2.

15
Vieira et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

9 = -0,125 x + 19,05 utilizadas para estimativa da velocidade do V2.


V2 = 80,4 km/h Independente do valor absoluto da velocidade encontrada,
O valor calculado é susceptível a erros principalmente no caso em estudo, foi possível afirmar que o V2 encontrava-se
devido à não calibração do velocímetro do veículo utilizado du- em velocidade acima da máxima permitida para a via, informação
rante a reprodução simulada. Além disso, o próprio velocímetro esta valiosa tanto para a análise pericial quanto judicial.
apresenta erro de medição de 5 km/h, calculado como sendo a Melhores resultados com a terceira metodologia podem
metade da menor divisão do equipamento. ser obtidos com a utilização de radares móveis para a aferição
A TAB. 1 apresenta os resultados das três metodologias da velocidade durante a simulação.

Tabela 1: Estimativas da velocidade do


V2 pelos três métodos propostos
Metodologia Velocidade estimada de V2 (km h-1)
1 71,29
2 72,38
3 80,40
1) Método PCQM, baseando-se nas posições de imobilização das unidades
motoras bem como seus deslocamentos do ponto de impacto;
2) Cálculo direto através da distância percorrida entre dois pontos, com auxílio
de câmera de segurança;
3) Simulação com veículo de mesma marca e modelo e construção de curva
de calibração, utilizando-se imagens de uma câmera.

Conclusão nal: uma abordagem de serviços. Gestão & Produção, UFS-


CAR, v.17, p.843-857, 2010.
O procedimento de estimativa das velocidades através 3- BRASIL. Código de processo penal Brasileiro. Decreto
de filmagem apresentou grande potencial de utilização em pe- -Lei, n˚ 3689, de 03 de outubro de 1941.
rícias de trânsito uma vez que, considerando o erro das me- 4- INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. 2014.
dições, os resultados foram próximos e totalmente coerentes. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br>. Acesso em: 30 jul. 2014.
Mesmo apresentando complexidade mais elevada que as duas 5- CHAGAS, D.E. Estudo sobre fatores contribuintes
primeiras metodologias, a estimativa através de simulação e de acidentes de trânsito urbano. 2011. Dissertação
curva de calibração pode ser útil nos locais em que não existi- (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Por-
rem vestígios suficientes para cálculo de velocidade pelos prin- to Alegre.
cípios clássicos da Física. 6- NEGRINI NETO, O; KLEINÜBING, R. Dinâmica dos aci-
dentes de trânsito – análises, reconstruções e preven-
Referências ção. 4.ed. Campinas: Millennium, 2012.
7- INTELBRAS. Disponível em: <http://www.intelbras.com.br/em-
1- ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PERITOS CRIMINAIS FEDE- presarial/monitoramento/cameras>. Acesso em: 22 ago. 2016.
RAIS. 2014. Disponível em: <http://www.apcf.org.br/PeríciaCrimi- 8- WONG T.W; TAO C.H.; CHENG Y.K.; WONG K.H.; TAM C.N.
nal/Oqueéperícia.aspx>. Acesso em: 30 jul. 2014. Application of cross-ratio in traffic accident reconstruction. Foren-
2- RODRIGUES, C.V.; SILVA, M.T.; TRUZZI, O.M.S. Perícia crimi- sic Science International, v.235, p.19–23, 2014.

16
Vieira et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

17
rcml
revista criminalística
e medicina legal
revista criminalística e medicina legal
v.1 | n.1 | 2016 | p. 18-23

A IMPORTÂNCIA DE UMA DOCUMENTAÇÃO


ODONTOLÓGICA COMPLETA NA IDENTIFICAÇÃO
DE CORPOS CARBONIZADOS: RELATO DE DOIS CASOS
Rodrigo Camargos Couto*
Perito Criminal Odontolegista IML/BH
Geraldo Elias Miranda
Perito Criminal Odontolegista IML/BH
Silvia Guzella de Freitas
Perito Criminal Odontolegista IML/BH
Adriana Maria Carneiro Moreira
Perito Criminal Odontolegista IML/BH
Jéssica Enes Morais Rodrigues
Graduanda em Odontologia da Pontifícia Católica de Minas Gerais

Resumo
Identificação é o processo pelo qual se estabelece a identidade de uma pessoa ou coisa, baseando em caracteres ou conjunto de
qualidades que a distingue de todas as outras e igual apenas a si mesma. Dentre os métodos mais empregados estão o exame de
DNA, a papiloscopia e a odontologia forense, que se destaca por ter alta resolutividade, celeridade e baixo custo. Este artigo teve
como objetivo o relato de dois casos de indivíduos carbonizados, que foram admitidos no Instituto Médico Legal de Belo Horizon-
te-MG, sem identificação formal, sendo rotulados como desconhecidos. Após o exame odontolegal foram realizados os confrontos
com as características dos prontuários odontológicos disponibilizados pelas famílias. Em um dos casos o prontuário odontológico
apresentava-se com poucos elementos para comparação. No outro, era rico em informações como radiografias, fotografias e registro
dos tratamentos executados. Os casos relatados demonstraram a eficácia do método odontológico e a importância fundamental da
documentação completa do paciente realizada pelo cirurgião-dentista proporcionando maior robustez na identificação positiva.

Palavras-chaves: Odontologia Legal; Identificação de Vítimas; Registros Odontológicos; Arco Dental.

THE IMPORTANCE OF A COMPLETE DENTAL


DOCUMENTATION IN THE PROCESS OF IDENTIFYING
CHARRED BODIES: REPORT OF TWO CASES

Abstract
Identification is the process that establishes the identity of a person or an object based on characteristics or a set
of qualities that makes it unique from all others and equal only to itself. Among the most commonly, used methods
to identify an individual are DNA testing, fingerprinting and forensic dentistry. The latter stands out for being highly
decisive, fast and low-cost. This article presents two case reports of charred individuals, allegedly victims of wrong-
ful death. Both individuals were admitted to the Legal Medicine Institute of Belo Horizonte-MG with no identification
and labeled as unknown. Comparative tests were performed using dental records provided by the victim’s families.
In one case, the dental records presented little data. However, the other case proved to be rich in information with
radiographs, photographs and past treatment records, making the positive identification process more robust.

Keywords: Forensic Dentistry; Victim’s Identification; Dental Records; Dental Arch.

* rodrigocamargoscouto@gmail.com
Couto et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Introdução Identificação Humana (SOFIH) e destacar a importância de um


prontuário odontológico bem feito para as perícias de identifica-
Identificação é o processo no qual se determina a iden- ção humana.
tidade de uma pessoa ou coisa, estabelecendo caracteres ou
conjunto de qualidades que a faz diferente de todos os outros Casuística
e igual apenas a si mesma1. Os métodos mais utilizados para
identificação humana são análise das impressões digitais, aná- Caso 1
lise odontológica e DNA, sendo a condição do corpo encon-
trado o fator determinante para escolha da metodologia 2,3,4. Em fevereiro de 2013, foi admitido no necrotério do IML/
Assim como os outros métodos, a identificação odontológica BH, um cadáver do sexo masculino sem identificação formal, ví-
faz a comparação dos dados ante-mortem (AM) com os dados tima de morte supostamente criminosa registrado com o rótulo
post-mortem (PM) sendo, portanto, um processo científico de “desconhecido”, procedente de um lote vago. Foram realizados
identificação comparativo. os exames necroscópicos de rotina com objetivo de determinar a
A odontologia forense é muito útil na identificação de cor- causa da morte, exame odontolegal e exames complementares.
pos de cadáveres desconhecidos que se encontram em fase Como os tecidos moles do cadáver encontravam-se bastante
adiantada de decomposição, mutilados, esqueletizados, frag- destruídos, devido à ação do fogo, a identificação por reconhe-
mentados e carbonizados, já que os arcos dentários resistem cimento visual da face ou pela análise papiloscópica tornou-se
mais que outras partes do corpo à ação do calor e têm preser- prejudicada, fazendo-se necessária a análise por meio de exame
vação indefinida após a morte. Apesar das características dos comparativo odontológico ou de DNA.
dentes mudarem ao longo da vida, a combinação dos dentes ca- Os supostos familiares da vítima disponibilizaram
riados, restaurados e ausentes pode ser comparada, sendo que um prontuário odontológico datado de 2007, conten-
a presença, posição, características anatômicas e restaurações do um odontograma (Fig. 1) e relação de procedimentos
proporcionam dados essenciais para confrontação 5,6. executados. Do confronto realizado entre as anotações
O objetivo do presente trabalho é relatar dois casos de do prontuário odontológico, foram constatadas diversas
indivíduos que foram encontrados carbonizados, sendo identifi- concordâncias (Fig. 2), como a ausência de dentes (Fig.
cados por meio de comparações das informações contidas nos 3) e a presença de restaurações, mas revelaram também
prontuários odontológicos com as informações obtidas no exa- algumas divergências, que foram consideradas não exclu-
me necroscópico realizado no Instituto Médico Legal de Belo dentes, já que havia pouca documentação disponível para
Horizonte-MG (IML/BH) pelo Setor de Odontologia Forense e o exame comparativo odontolegal.

Figura 1: Detalhe para o odontograma presente no prontuário ante-mortem (am).

19
Couto et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Figura 2: Fotografia post-mortem (pm) mostrando os pontos Figura 3: Detalhe para a ausência dos dentes inferiores, que
coincidentes com o odontograma. tinham extração indicada segundo o odontograma.

Caso 2 identificação odontológica.


Regiões da radiografia panorâmica foram cortadas resul-
Em julho de 2014, um cadáver carbonizado sem identifica- tando em imagens (Figs. 7 e 9), que foram comparadas com as
ção formal, do sexo masculino, procedente de Contagem-MG, foi radiografias PM (Figs. 8 e 10).
admitido no IML/BH. Foram realizados os exames necroscópicos Quanto aos aspectos éticos, ressalta-se que foi aten-
de rotina, exame odontolegal, fotografias e radiografias. dido integralmente o que é exigido na resolução do Con-
Os supostos familiares da vítima disponibilizaram um selho Nacional de Saúde (CNS) 466/12, com assinatura de
prontuário odontológico contendo descrição dos procedimen- termo de consentimento livre e esclarecido dos familiares,
tos executados, fotografias (Fig. 4) e uma radiografia panorâ- inclusive para a utilização de documentos e/ou fotografias
mica (Fig. 6) que serviram de confronto para a realização da no trabalho científico.

Figura 4: Fotografia AM (vista frontal). Figura 5: Fotografia PM (vista frontal).

20
Figura 6: Radiografia panorâmica utilizada para confronto.

Figuras 7 e 8: Radiografia AM (esquerda) comparada com Figuras 9 e 10: Radiografia AM (esquerda) comparada com
radiografia PM (direita). radiografia PM (direita).

Através da técnica de sobreposição de imagens 7, foram ciando a concordância dos caracteres odontológicos entre essas
sobrepostas as radiografias AM (Fig. 9) e PM (Fig. 10) eviden- tomadas (Figs. 11 a 16).

Figura 11: Transparência 0%. Figura 12: Transparência 20%. Figura 13: Transparência 40%.

Figura 14: Transparência 60%. Figura 15: Transparência 80%. Figura 16: Transparência 100%.
Couto et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Discussão giões-dentistas em realizar um prontuário odontológico completo,


legível e atualizado, pois além das questões éticas e legais, o
A identificação humana usando características dos dentes prontuário pode ser usado para fins de identificação.
tem sido usada há muito tempo 8. A técnica de identificação odon- Quanto mais completo e organizado for o prontuário odon-
tológica é um método comparativo que estabelece no mais alto tológico, maiores são as chances de uma identificação da víti-
grau de certeza que as características dos restos mortais PM e ma15. Entretanto, a grande maioria da documentação utilizada
os dados AM são do mesmo indivíduo 9. Após obter as informa- para análise forense apresenta-se incompleta, com anotações
ções AM e PM é realizada uma comparação por similaridades imprecisas e até mesmo incorretas 16.
e discrepâncias 6. A odontologia possui os cinco requisitos para
um método de identificação: unicidade, imutabilidade, praticabi- Considerações finais
lidade, classificabilidade e perenidade 6, além de oferecer maior
rapidez e baixo custo. Os casos relatados demonstraram a eficácia do método
A identificação de vítimas de incêndio é muito difícil devido odontológico e a importância fundamental da documentação com-
aos danos graves e à carbonização dos corpos10. Isso mostra o pleta do paciente realizada pelo cirurgião-dentista proporcionando
papel fundamental da odontologia para identificação de vítimas maior robustez na identificação positiva. A identificação humana
carbonizadas, porque os dentes e estruturas dentais são mais pela odontologia legal é, portanto, um método célere, resolutivo, de
resistentes a temperaturas elevadas11. baixo custo e dispensa a realização de outros exames.
O cadáver deve ser radiografado, principalmente nos Os cirurgiões-dentistas devem ter consciência de que
casos de carbonização, pois os dentes podem estar calcina- exercem um papel de relevância social, contribuindo sobre-
dos e o manuseio do corpo pode desintegrá-los facilmente, maneira nos casos de identificação humana. Portanto, devem
sendo então preciso obter radiografias para confronto, per- manter prontuário odontológico completo, preciso e atualizado,
mitindo uma análise das particularidades anatômicas, possí- contendo dados de identificação, odontogramas e radiografias de
veis alterações morfológicas e características que contribuam seus pacientes.
para a identificação do indivíduo12.
Muitas vezes os odontolegistas encontram dificuldades Referências
para alcançar parâmetros comparativos que permitam atuar
com mais acerto no momento da identificação, que normalmente 1- França, G.V. Medicina legal. 9.ed. Rio de Janeiro: Guana-
acontece por falta de anotações e falhas ou ausência da docu- bara Koogan, 2011.
mentação AM3. A documentação odontológica, além de possibili- 2- SILVA, R.F.; PORTILHO, C.D.M.; REGES, R.V.; LELES,
tar um acompanhamento clínico do paciente, pode contribuir em C.R.; FREITAS, G.C.; DAURUGE JÚNIOR, E. Importância
resoluções de questões legais, como nos casos de identificação pericial dos registros odontológicos decorrentes de tratamen-
ou averiguação de erro odontológico 2,13. O exame odontolegal to restaurador. Revista Dental Press de Estética, v.4,
permite fazer uma identificação economizando tempo e recursos p.32-38, 2007.
quando comparado ao exame genético (DNA), que apesar de ser 3- PARANHOS, L.R.; CALDAS, J.C.F.; IWASHITA, A.R.; SCANAVI-
extremamente confiável, tem alto custo 12,14. NI, M.A.; PASCHINI, R.C. A importância do prontuário odontológico
No primeiro caso relatado, embora tenha demonstrado nas perícias de identificação humana. Revista da Faculdade
pontos coincidentes em relação à ausência de dentes posterio- de Odontologia da Universidade de Passo Fundo, v.14,
res e presença de restaurados, existem algumas discordâncias p.14-17, 2009.
que não são excludentes, pois foi considerada a progressão 4- CEVALLOS, L.B.; GALVÃO, M.F.; SCORALICK, R.A. Identifica-
natural das doenças instaladas na época da realização do pron- ção humana por documentação odontológica: Carbonização sub-
tuário, sem a intervenção curativa ou restauradora. A identifica- sequente à impacto de helicóptero no solo. Revista Conexão
ção positiva pode ser concebida mesmo com algumas diver- SIPAER, v.1, p.191-202, 2009.
gências na comparação de documentação como substituição 5- SALES-PERES, A.; SALES-PERES, S.H.C.; CASTAÑEDA-ES-
de restaurações, extrações dentárias realizadas posteriormen- PINOSA, J.C.; CARDOSO, C.L.; HERRERA, F.S.; CAETANO, I.;
te, não existindo um mínimo de pontos coincidentes para que MOLITERNO, N.; FREITAS, P. Identificação de cadáveres através
um indivíduo seja identificado positivamente 6,14, desde que não da arcada dentária. Revista Odontológica de Araçatuba,
haja incompatibilidades. v.27, p.25-27, 2006.
Já o segundo caso possuía uma documentação AM mais 6- CARVALHO, C.M.; NAZAR, R.J.; MOREIRA, A.M.C.; BOU-
completa, o que tornou possível uma identificação com mais pon- CHARDET, F.C.H. Identificação humana pelo exame da arcada
tos concordantes. Quanto mais completa for a comparação do dentária. Relato de caso. Arquivo Brasileiro de Odontolo-
material AM/PM, mais robusto o procedimento de identificação se gia, v.4, p.67-69, 2008.
torna 11. Isso mostra a importância da conscientização dos cirur- 7- FORREST, A.S. Collection and recording of radiological infor-

22
Couto et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

mation for forensic purposes. Australian Dental Journal, v.57, OLIVEIRA, F.V.N. Desastre de massa; desastre aéreo. In: COUTO,
p.24-32, 2012. R.C. Perícias em medicina & odontologia legal. Rio de
8- SWEET, O.C.D. Forensic dental identification. Forensic Janeiro: Medbook, 2011, cap. 18.
Science International., v.201, p.3-4, 2010. 13- SILVA, R.F.; PRADO, M.M.; BARBIERI, A.A.; DAURUGE JÚ-
9- DOSTALOVA, T.; ELIASOVA, H.; SEYDLOVA, M.; BROUCEK, NIOR, E. Utilização de registros odontológicos para identificação
J.; VAVRICKOVA, L. The application of CamScan 2 in forensic humana. Revista Sul-Brasileira de Odontologia, v.6, p.95-
dentistry. Journal of Forensic and Legal Medicine, v.19, 99, 2009.
p.373-380, 2012. 14- SILVA, R.F.; DAURUGE JÚNIOR, E.; PEREIRA, S.D.R.; AL-
10- Valenzuela, A.; Marques, T.; Exposito, N.; Heras, S.M.; García, MEIDA, S.M.; OLIVEIRA, R.N. Identificação de cadáver carboni-
G. Comparative study of efficiency of dental methods for identifica- zado utilizando documentação odontológica. Revista Odonto
tion of burn victims in two bus accidents in Spain. The American Ciência, v.23, p.90-93, 2008.
Journal of Forensic Medicine and Pathology, v.23, p.390- 15- CARVALHO, G.P.; MATOSO, R.I. O odonto-legista e um cor-
393, 2002. po não identificado. Revista Gaúcha de Odontologia, v.58,
11- Hill, A.J.; Lain, R.; Hewson, I. Preservation of dental evidence p.405-409, 2010.
following exposure to high temperatures. Forensic Science In- 16- MIYAJIMA, F.; DARUGE, E.; DARUGE JÚNIOR, E. A impor-
ternational, v.205, p.40-43, 2011. tância da odontologia na identificação humana: Relato de um caso
12- TSUCHIYA, M.J.; GOMES, E.M.; ABE, D.M.; MASSAOKA, C.; pericial. Arquivos em Odontologia, v.37, p.133-142, 2001.

23
rcml
revista criminalística
e medicina legal
revista criminalística e medicina legal
v.1 | n.1 | 2016 | p. 24-29

EFICIÊNCIA EM CARTUCHOS DE FOGO


CENTRAL E RADIAL, SEM USO DE ARMA DE FOGO
Alberto Luiz Guerra Brandão*
Wellington Luiz Barbosa
Alex Oliveira Pinho
João Henrique Lopes Moura
Frederico Nunes Valladão
Seção Técnica de Balística e Identificação de Armas e Munições, Instituto de Criminalística da Polícia Civil de Minas Gerais

EFFICIENCY OF CENTRAL FIRE AND RIM FIRE


CARTRIDGES, WITHOUT USE OF FIREARM
Resumo
Diversos casos policiais são solucionados nos laboratórios de balística forense através de exames periciais em armas de fogo e seus
cartuchos. Entretanto, nem todos os laboratórios de criminalística no país possuem as armas de fogo nos calibres necessários para
a realização dos testes de eficiência nos cartuchos/munições encaminhados. Faz-se necessário, neste contexto, o uso de técnicas
alternativas para testar tais artefatos na ausência de arma de fogo compatível. O método proposto permite que o perito examinador
realize a eficiência de munições dos calibres mais comumente utilizados, com ferramentas simples disponíveis no comércio e pos-
sibilitando, até mesmo, a dispensa do martelo de inércia na desmontagem dos cartuchos. O procedimento mostrou-se com nível de
segurança satisfatório para o utilizador, eficaz e barato.

Palavras-chave: cartuchos de arma de fogo. exame pericial. eficiência. martelo de inércia. extração de projétil.

Abstract
Several police cases have been solved in forensic ballistics laboratories through expert examinations on firearms
and their cartridges. However not all forensic laboratories in the country have firearms in calibers needed to perform
the efficiency tests on the cartridges/forwarded ammunition. It is necessary, in this context, the use of alternative
techniques for testing such devices in the absence of compatible firearm. The proposed method allows the exam-
iner expert realize the efficiency of ammunition calibers of the most commonly used simple tools available in trade
and enabling even the inertia hammer dismissal of dismantling the cartridges. The procedure showed up with a
satisfactory level of safety for the user, effective and inexpensive.

Keywords: cartridges of firearms; forensics exam; efficiency; inertial hammer; impact bullet puller.

* alberto.kombato@gmail.com
Brandão et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Introdução mados de cartuchos de caça) e os cartuchos de carabinas/fuzis


nos calibres mais comuns: 5,56mm (.223 Rem) e 7,62mm (.308
O interesse pela Criminalística se expande a cada dia em Winchester). E por fim, dentre os cartuchos de fogo radial, tam-
virtude da grande visibilidade que a perícia criminal alcançou na bém conhecidos como de fogo circular (ou RIM FIRE), mais
sociedade moderna. Inúmeros casos policiais são solucionados conhecidos os calibres .22 curto e .22 longo (.22 LR), estes car-
com o auxílio das análises realizadas nos laboratórios da perícia tuchos possuem o espoletamento na periferia da base do estojo
oficial subsidiados, obviamente, pelas diversas áreas das ciên- e por isso devem ser tratados de forma especial, além de não po-
cias forenses, tais como: análise de DNA e tratamento estatístico derem ser desmontados com o martelo de inércia. São estas as
dos dados, uso da espectroscopia no exame de matrizes diver- munições que visamos tratar, por serem as de uso comum 2, 3, 9-11.
sas e o exame de armas de fogo e seus cartuchos, além de ar- As armas de fogo mais comumente periciadas no Brasil
mas diversas e munições avulsas 1, 4-6, 9-11. são dos calibres: espingardas/pistolões nos calibres nominal
No Brasil, vários laboratórios de criminalística não pos- 12, nominal 16, nominal 20, nominal 24, nominal 28, nominal
suem os equipamentos necessários para realização de de- 32, nominal 36; carabinas/fuzis e metralhadoras nos calibres
terminados exames, inclusive alguns de rotina. As seções de 5,56mm (.223 Rem) e 7,62mm (.308 Winchester). As armas de
balística estão neste contexto. As armas de fogo nos calibres fogo curtas como a pistola .25 auto (6,35mm), revólver .32 S&W
necessários para realizar os testes de eficiência nos cartuchos/ (curto e longo), pistola .32 auto (ou 7,65mm), revólver .38 SPL
munições encaminhados à perícia técnica nem sempre estão (e .357 Magnum), carabina/revólver .44 W, carabina/revólver .44
disponíveis. Considerando que os exames de eficiência de Magnum, pistola .45 ACP (.45 auto), pistola/submetralhadora/ca-
munições são de fundamental importância na condução de in- rabina .40 S&W (.40 auto), pistola/submetralhadora 9mm Luger
vestigação e auxílio às autoridades competentes e que o prin- e pistola .380 ACP 2, 3, 9-11. E também as carabinas/pistolas em
cipal problema dos laboratórios balísticos, no que concerne aos calibres de armas de pressão diferentes, a saber: .177 (4,5mm)
exames de eficiência e prestabilidade em cartuchos de armas e .22 (5,5mm), .236 (6mm); algumas destas armas de pressão
de fogo, é a ausência das armas dos principais calibres men- são de alta potência, como a de calibre 6mm, já comercializada
cionados anteriormente, a solução seria a aquisição dessas ar- no Brasil.
mas pelos órgãos competentes e o encaminhamento às seções Dentro deste universo, o presente trabalho objetivou de-
regionais competentes à realização de tais exames. Entretanto, monstrar o uso correto do martelo de inércia como ferramenta
isso não se mostrou uma solução viável para diversos estados pericial adequada para desmontar cartuchos de fogo central e,
da federação. Faz-se necessário, portanto, o uso de técnicas e também, o uso de ferramentas simples para desmontar e testar
ferramentas alternativas para testar de forma segura e eficaz os elementos do cartucho, principalmente quando o examinador
as munições que são encaminhadas para os exames periciais, necessitar de teste de eficiência em cartuchos de fogo central e
sem o uso de uma arma de fogo. não tiver a arma de fogo de calibre compatível para os testes 13.
Há diversas munições disponíveis comercialmente e estas
se apresentam sob variados calibres, além de diferir no tipo de Materiais utilizados
alma, lisa ou raiada, características que se deve saber antes de
quaisquer procedimentos com o intuito de se determinar sua efi- São necessários sala com ventilação adequada e isola-
ciência e prestabilidade. Os cartuchos de fogo central, aqueles mento acústico, ausência de material combustível nas proximi-
que possuem a espoleta centralizada na base do estojo, são mui- dades, bancada fixada ao piso com morsa/torno de bancada,
to utilizados em nosso país e os de armas curtas mais comuns protetores de ouvidos, viseira/protetor de rosto, alicate, martelo
são os de calibre: .25 auto (6,35mm), .32 S&W (curto e longo), (ou similar), chave de fenda, chave Phillips (ou ferramenta simi-
.32 auto (ou 7,65mm), .38 SPL, .44 W, .45 ACP (.45 auto), .40 lar), fósforos (ou isqueiro), avental, luvas e martelo de inércia e
S&W (.40 auto), 9mm Luger e .380 ACP 2, 3, 7-13. seus acessórios para desmontagem de cartuchos de fogo central
Há ainda os cartuchos de calibre nominal (também cha- (Figuras 1 a 3).

25
Brandão et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

projétil para cima (Figura 4). Em seguida, choca-se firmemente


o martelo de inércia contra uma estrutura rígida recoberta por
material amortecedor (borracha), para permitir o desprendimento
do projétil e retirada da pólvora (Figuras 4 e 5).

Figura 1: Alguns EPIs e ferramentas necessários. Figura 4: Cartucho de fogo central sendo colocado no anel
compatível do martelo de inércia (foto à esquerda) e montado,
pronto para a retirada do projétil/pólvora (direita).

Figura 2: Martelo de inércia e anéis de diâmetros diferentes para


desmontagem de cartuchos de fogo central.
Figura 5: Estojo, dentro do anel; projétil semijaquetado ponta
oca (este de calibre .38, de 125 grains) e pólvora, separados
pelo martelo de inércia.

O estojo com a espoleta intacta retorna à morsa/torno e é


firmemente fixado com a base para cima (Figura 6). Uma chave
tipo Phillips (ou ferramenta semelhante) é alinhada com o cen-
tro da espoleta e desferido com um martelo uma batida firme
na base do cabo da chave com a finalidade de mimetizar o per-
cussor de uma arma atingindo a espoleta (Figura 7). A pólvora
ou propelente é testada (o) colocando uma amostra na ponta de
uma chave de fenda, queimando-a com a chama produzida por
um palito de fósforo (Figura 8).
Figura 3: Martelo e chave Phillips: ferramentas de exame de
eficiência em estojos espoletados de fogo central, após retirados
e separados pólvora e projétil. Sem martelo de inércia em cartuchos de
fogo radial
Técnicas utilizadas
A extremidade do projétil é segurada com um alicate e o
Com martelo de inércia em cartuchos de estojo é puxado pela sua porção mediana com a mão ou com ou-
fogo central tro alicate, inclinando levemente o alicate para separar o projétil
do estojo e retirar a pólvora (Figura 9).
O cartucho de fogo central é encaixado no anel compatível
do martelo de inércia e fixado; prendido firmemente com a peça
da própria ferramenta por cima da base do estojo, com a base do

26
Brandão et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Figura 6: Morsa de bancada com estojo de espoleta central


(após desmontagem e retirada da pólvora e projétil), pronto para
o teste de eficiência na espoleta.

Figura 9: Cartucho de calibre .22 LR (percussão radial) sendo


desmontado e preparado para exames (princípio básico da
Figura 7: Perito criminal usando EPI e ferramentas descritas alavanca, usando alicate).
para realizar o teste de eficiência na espoleta de cartucho de
fogo central, após ter sido desmontado pelo martelo de inércia. Sem martelo de inércia em cartucho
nominal (cartuchos de caça)

Os cartuchos (lado oposto à espoleta) são abertos na ex-


tremidade com uma chave de fenda ou alicate de bico (Figura
10). São retirados e separados os projéteis, em seguida é ex-
traída a bucha (em geral feita de plástico, papelão ou cortiça)
do interior do cartucho com o auxílio de alicate de bico e/ou uma
chave de fenda pequena. Depois da retirada da bucha, toda a
pólvora é extraída e colocada em um recipiente aberto, separan-
do, assim, todos os elementos do cartucho de calibre nominal:
pólvora, projétil único ou projéteis múltiplos (balins) e a bucha.
Os testes de eficiência da espoleta e pólvora são realizados con-
forme descrito para os cartuchos de fogo central.

Sem martelo de inércia em cartuchos


de fogo central, com estojo do tipo garrafa

Com cartucho fixado na morsa/torno com o projétil para


cima, usa-se um alicate preso firmemente na extremidade do
projétil para fazer uma alavanca para extrair o projétil apoiando-
se em uma superfície rígida (Figura 11). Os elementos do cartu-
Figura 8: Chave de fenda contendo amostra de pólvora e
fósforo (esquerda); à direita, o teste de eficiência da pólvora. cho (projétil, pólvora e estojo com espoleta) são separados como

27
Brandão et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

descrito para cartuchos de fogo central. Por segurança, Resultados e discussão


verifica-se se o estojo não contém nenhum resíduo de pólvora
em seu interior. São feitos os testes de eficiência em espoleta e O desmonte dos cartuchos de diversos calibres revelou ser
pólvora conforme descritos para cartuchos de fogo central. um procedimento simples sem a necessidade de conhecimento
elaborado em nenhuma área do conhecimento e de fácil apren-
dizado. Os cartuchos de percussão radial são os que requerem
mais cuidado no processo de separação dos componentes, de-
vendo-se estar atento ao uso das ferramentas adequadas. Nes-
tas munições, o martelo de inércia é contraindicado em virtude da
possibilidade de detonação do cartucho com o choque da base
do estojo (espoleta) contra o anel que o prende ao martelo. As
munições de caça não demandam nenhum procedimento espe-
cial, sendo os cartuchos mais simples para se desmontar. Os
cartuchos usados em carabinas, fuzis, metralhadoras, tal como
o de calibre 7mm Mauser, são facilmente desmontados usando
o princípio básico da alavanca, sem a necessidade da utilização
de martelo de inércia. Mostra-se que, mesmo com total falta de
equipamentos específicos para se realizar as operações num la-
boratório de balística é possível, com métodos alternativos, que
sejam realizados os desmontes de cartuchos e, consequente-
mente, os demais procedimentos que se seguem. Com a sepa-
ração dos cartuchos em seus elementos constituintes primários,
sejam eles projétil, estojo e pólvora, não há grandes riscos em
proceder aos testes de eficiência da espoleta e propelente para
se determinar a eficiência dos referidos artefatos bélicos.
A utilização de chave tipo Phillips se mostrou eficaz para
simular o percussor ofendendo a espoleta no momento do dispa-
Figura 10: Teste de eficiência em cartucho de calibre nominal ro, e o teste de chama para constatar a eficiência do propelente
desmontado e pronto para exames. também se revelou satisfatório. Assim, com todos os componen-
tes ativos (espoleta e pólvora) do cartucho estando em condições
de uso, constata-se que o uso dessas munições produziria o dis-
paro. Caso um ou ambos os componentes estejam ineficientes
(espoleta ou pólvora), conclui-se obviamente que a munição em
questão não é eficiente e o disparo seria impossível com aquele
determinado cartucho.
Todo o procedimento foi realizado levando-se em conta
as mais rígidas normas de segurança para procedimentos em
laboratório de balística, com o uso dos EPIs necessários para
executar o protocolo e o posicionamento estratégico de extintor
de incêndio no momento da queima da pólvora.
Finalizados os procedimentos, é importante ressaltar a pro-
blemática do descarte do material que não foi consumido durante os
exames. Os resíduos da análise (restos de pólvora, estojos percuti-
dos e deflagrados, projéteis extraídos dos cartuchos intactos) devem
ser encaminhados para a Polícia Militar, Exército e/ou empresa habi-
litada para destruição ou inutilização desses componentes.

Considerações Finais

O método proposto neste trabalho mostrou-se simples, fá-


Figura 11: Cartucho de calibre 7mm Mauser sendo desmontado cil, rápido, seguro e de baixo custo. Demonstrou, também, que
e preparado para exames (uso do princípio básico da alavanca,
com ferramentas disponíveis no comércio é possível realizar o
usando martelo e alicate).

28
Brandão et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

teste de eficiência e prestabilidade de diversos tipos de muni- Agradecimentos


ções sem a necessidade de armas de fogo. Isso é importante,
tendo em vista que materiais como cartuchos intactos são enca- Aos colegas e peritos criminais da STBIAM / Divisão de
minhados para perícia sem a arma de fogo de calibre compatível. Laboratório / IC, Minas Gerais.
Desta forma, o perito examinador pode executar a eficiência nos
cartuchos, mesmo não possuindo a arma de fogo do calibre com- Referências
patível. Outro fato que vale destaque é que alguns cartuchos de
armas de fogo são bastante incomuns (como exemplo o cartucho 1- ARAÚJO, T. Ciência contra o crime. Revista Superinteres-
5,7mm do tipo garrafa) e, desta forma, seria bastante difícil fazer sante, n.257, s/p, 2008.
a eficiência visto que a arma desse calibre não está disponível no 2- BRANDÃO, A.L.G. O que são armas de fogo. In: ____ Autode-
Brasil, o que inviabilizaria o exame. fesa contra arma de fogo – DECAF. Rio de Janeiro: Editora
Outra vantagem do método descrito para fazer a efi- Clube de Autores, 2013, p.31-42.
ciência de munições é que o impacto na estrutura do labo- 3- CBC: Companhia Brasileira de Cartuchos. Catálogo de ar-
ratório é menor, minimizando custos, já que uma câmara de mas e munições. Santo André: CBC, 2004.
disparos (ou sala de tiros) requer maior espaço, isolamento 4- COSTA, F. Comportamento: caso reaberto. Revista Isto É,
acústico, proteção contra os projéteis e possíveis ricoche- n.2241, p.62-63, 2012.
tes e fragmentos, blindagem de paredes. Também o impacto 5- COUTINHO, L. Crime: parecia tão perfeito. Revista Veja,
ambiental é maior quando se produz um disparo real usando n.33, p.72-74, 2013.
uma arma de fogo, do que quando se testa parte da pólvora 6- DINIZ, L.; CARVALHO, J. Reviravolta macabra. Revista Veja,
de um cartucho. n.25, p.88-89, 2012.
A exposição do examinador é menor e com menos risco 7- LEE, J. Gun digest. 68.ed..Iola:Editora Krause; 2014.
nos testes aqui propostos, ao invés de disparar o cartucho em 8- NUNES, J,A.F. Grande enciclopédia armas de fogo –
uma arma de fogo. defesa e segurança. Rio de Janeiro: Editora Século Futuro,
Recomenda-se, subsidiados pelos resultados obtidos, 1988.
que todas as Seções de Criminalística devem ser equipadas, 9- PINHO, A.O.; BRANDÃO, A.L.G.; COELHO NETO, J. Balística
ao menos, com as ferramentas citadas neste trabalho e, quan- forense: apostila do curso de formação policial: perito
do possível, outras, conforme a necessidade do serviço. Na im- criminal e médico legista. Belo Horizonte: ACADEPOL, 2013.
possibilidade de se disparar com uma arma de fogo de calibre 10- RABELLO, E. Balística forense. Porto Alegre: Editora Sa-
compatível para realizar os testes de eficiência nas munições, gra-DC Luzzato, 1995.
pode-se recorrer ao método ora descrito. 11- TOCHETTO, D. Balística forense: aspectos técnicos e
Neste contexto, todos os setores da sociedade ganham, jurídicos. 7.ed. Campinas: Editora Millenium, 2013.
pois, a perícia usará uma alternativa técnica para cumprir o pra- 12- ZANOTTA, G.M. Identificação de munições. v.1. São
zo legal, em situações especiais. Além disso, a autoridade que Paulo: Ed. Magnum, 1992.
requereu a prova de eficiência e prestabilidade ganha em agilida- 13- ZANOTTA, G.M. Magnum – manual de recarga de mu-
de, visto que os prazos legais são exíguos. nições. 44.ed. São Paulo: Editora Sicurezza, 2012.

29
rcml
revista criminalística
e medicina legal
revista criminalística e medicina legal
v.1 | n.1 | 2016 | p. 30-33

AVALIAÇÃO DE UM CASO DE MORTE


POR INTOXICAÇÃO COM MONÓXIDO DE CARBONO
PRODUZIDO PELA QUEIMA DE CARVÃO
Claiton Pires Ventura *
Homero Augusto Righi
Instituto de Criminalística da Polícia Civil de Minas Gerais

EVALUATION OF A CASE OF DEATH BY INTOXICATION


WITH CARBON MONOXIDE PRODUCED
BY BURNING OF CHARCOAL

Resumo
Um jovem de 21 anos foi encontrado morto no piso do banheiro da cobertura do apartamento onde morava, em um bairro nobre de Belo
Horizonte. A janela e a porta desse banheiro estavam vedadas internamente por fita crepe, e externamente, junto à porta, havia um vaso
contendo uma porção de carvão vegetal com sinais de queima recente, o qual teria sido arrastado do banheiro. A análise do local indicou
que se tratava de um autoextermínio incomum no país, perpetrado por inalação de monóxido de carbono formado pela queima de carvão.
Posteriormente a causa mortis foi confirmada no IML: concentração, fatal, de 80% de carboxiemoglobina no sangue.

Palavras-chave: monóxido de carbono; carvão; autoextermínio; suicídio.

Abstract
A 21-year-old man was found dead on the bathroom floor of the penthouse of apartment building where he lived,
in an upscale neighborhood of Belo Horizonte. The window and the door of this bathroom were sealed from in-
side with adhesive tape, and outside, by the door, there was a vase containing a portion of charcoal with signs of
recent burning, which would have been dragged from the bathroom. Scene analysis indicated it was an unusual
type of suicide in this country, perpetrated by inhalation of carbon monoxide formed from charcoal burning. Later,
the cause of the death was confirmed in the Legal Medicine Institute: a fatal-80% carboxyhemoglobin concen-
tration in the blood.

Keywords: Carbon monoxide, charcoal, self-extermination, suicide.

* xclaiton@gmail.com
Ventura et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Introdução estava fechada e vedada internamente por fita adesiva de cor


O monóxido de carbono (CO) é um gás sem cor e sem branca. Quando os peritos chegaram a porta já estava aberta,
odor produzido pela combustão incompleta de combustíveis fós- por alguém que teria chegado anteriormente, e continha fitas
seis de carbono. A concentração normal na atmosfera é menor adesivas nas bordas de sua face interna, colocadas para fins de
que 0,001% e a inalação de ar com uma concentração de 0,1% vedação nos vãos com os marcos e soleira, sendo o rolo da fita
(uma parte por mil) de CO pode ser letal. A exposição a essa utilizada encontrado sobre a pia do banheiro. O banheiro tinha
substância é uma importante causa de envenenamentos com 1,20m de largura por 2,48m de comprimento e 2,66m de pé direi-
consequentes morbidades e mortalidades em centros desenvol- to (altura), totalizando um volume de 7,92m3.
vidos. Formas comuns de envenenamentos, acidentais ou não, A vítima estava deitada com as costas em contato com o
são a partir de fumaças de incêndio e gases de escape de motor, piso (decúbito dorsal), apenas de cueca, com o corpo alinhado
além de queima de carvão em ambiente confinado 1,2. junto à parede lateral esquerda do cômodo. A cabeça e a porção
O efeito tóxico do CO é atribuído a sua interação rever- superior do tronco estavam posicionadas no box, e o restante
sível com a hemoglobina (Hb), levando à formação de carbo- (porção inferior do tronco e membros inferiores) encontravam-se
xiemoglobina (HbCO), que pode acarretar o impedimento no em frente ao vaso sanitário e à pia. Sua cabeça estava apoiada
transporte de oxigênio (O2) e provocar asfixia tissular3. Além em um travesseiro, com o rosto voltado para o teto. Seus mem-
disso, observa-se também reação do CO com mioglobina, cito- bros superiores estavam fletidos com as respectivas mãos apoia-
cromos e metaloenzimas como citocromo C oxidase e citocro- das sobre o peito. Seu membro inferior direito estava estendido,
mos P-450 4,5. A afinidade do CO pela Hb é de 200 a 250 vezes alinhado com o eixo do tronco. Seu membro inferior esquerdo es-
superior em relação ao O2. Por isso, pode-se chegar a uma tava semifletido (Figura 1). A face estava com tonalidade rósea,
concentração sanguínea de 50% de HbCO, considerada muito corado como se estivesse vivo. Foram verificadas rigidez cada-
tóxica, em ambientes com concentrações muito baixas de CO vérica, manchas de hipóstase com coloração rósea (vermelho
no ar (1/200 ou 1/250 em relação ao O2). Ou seja, formam-se carmim) nas costas e ombros e queimaduras de segundo grau na
200 partes de HbCO e 1 parte de oxihemoglobina (HbO2) em porção inferior dos três primeiros dedos do pé esquerdo.
uma mesma concentração de O2. Os sintomas em níveis supe-
riores a 50% de HbCO no sangue são coma, convulsões, blo-
queio das funções respiratórias e paralisia, podendo ser, dessa
forma, fatal 6,7.
A emissão de CO através da queima de carvão foi des-
coberta como uma nova forma de autoextermínio e sua utiliza-
ção objetivando ao suicído tem aumentado em todo o mundo,
especialmente na Ásia (China, Hong Kong, Taiwan), Europa e
Estados Unidos. Em 2002, o suicídio por intoxicação com CO
pela queima de carvão tornou-se o método de segunda maior
incidência em Hong Kong, responsável por 25% dos autoex-
termínios. Devido a esse grande número, foram tomadas me-
didas, em algumas regiões da Ásia, para se evitar esse tipo de
morte, como por exemplo, a impressão de números de telefo-
nes de ajuda em embalagens de carvão (para os suicidas em
potencial) e também a restrição da venda de carvão em lojas Figura 1: Fotografia mostrando a vítima como foi encontrada.
de conveniência 8-11.
O presente relato de caso mostra um suicídio por inalação No interior do banheiro percebia-se um forte odor carac-
de CO pela queima de carvão, fato ocorrido no Brasil no ano de terístico de queima de carvão. Havia marcas de atritamento
2012. Não foram observados relatos na literatura sobre suicídios produzidas por arrastamento sobre o piso do banheiro, a qual
semelhantes no país, sugerindo não se tratar, aqui, de uma prá- se iniciava em frente à pia, a 1,0m da porta, e estendia-se para
tica comum. fora dele, à esquerda da porta e terminava sob um vaso de bar-
ro contendo carvão vegetal (Figura 2), o qual teria sido arrasta-
Casuística do desse cômodo. No momento da perícia, o vaso estava frio,
assim como as unidades de carvão, e continha fuligens e cha-
Um jovem de 21 anos, branco, de compleição física nor- muscamentos em sua face interna. Havia uma garrafa de vodca
molínea, foi encontrado morto no piso do banheiro da cobertura parcialmente consumida no cômodo adjacente à esquerda do
do apartamento onde morava, em um edifício de 12 andares de banheiro, que era utilizado como copa. Na lixeira da varanda
um bairro nobre de Belo Horizonte-MG. A janela desse banheiro da cobertura havia cinco fragmentos de papel, de tamanhos

31
Ventura et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

diversos, os quais pertenciam a pelo menos duas folhas inteiras Os surtos de suicídio por inalação de CO pela queima de
de formato A4, e continham lançamentos produzidos por um carvão observados em Hong Kong e Taiwan apresentam como
punho escritor, com caneta esferográfica azul. Grande parte do característica importante a idade das vítimas, que são, em sua
que estava escrito era ilegível. Dentre os pontos legíveis en- maioria, menores de 30 anos 16, tal como a vítima desse relato
contram-se os seguintes trechos: “você é o irmão que eu não de caso. Diferentemente dos países citados, conforme já men-
tive”, “você era o amigo perfeito”, “você foi o melhor amigo que cionado, o Brasil aparentemente não se situa em um contexto
eu tive nos últimos tempos”. de surto de suicídios com esse método. Para explicar o grande
número de casos de suicídios por inalação de CO observados
na Ásia, alguns autores consideram que grande parte das víti-
mas obteve informações sobre esse método pela internet 9,11,16.
Isso pode mostrar o poder da mídia e dos meios de comuni-
cação para influenciar, ensinar ou encorajar jovens a cometer
suicídios. Uma possibilidade a ser considerada é que a vítima
do presente relato de caso tenha obtido informações dessa for-
ma de suicídio pela internet, em webpages estrangeiras. No
Brasil não se divulgam suicídios, o que contribui para evitar a
disseminação de métodos peculiares.
Figura 2: Fotografia mostrando o Encontra-se na literatura que, comparada com outras for-
carvão queimado no interior do vaso. mas de suicídio, a queima de carvão necessita de maior convicção
e preparação 17. A análise técnica do local em casos de morte por
A porta do banheiro não foi trancada internamente, apenas intoxicação com CO é importante para a determinação se o ocorri-
fechada e vedada com a fita adesiva, e assim como nas demais do tratou-se de um suicídio, homicídio ou acidente. Destaca-se que
portas do apartamento, não havia sinais externos de arromba- esse tipo de morte é raramente acidental ou homicida 3.
mento. Os móveis de todos os cômodos do apartamento esta- No presente relato, a vítima teria feito um planejamento, no
vam alinhados e não havia desordem. qual teria separado um vaso de barro para a queima do carvão.
Nos exames necroscópicos realizados no Instituto Médico Teria adquirido um rolo de fita adesiva para vedar o cômodo. Te-
Legal de Belo Horizonte-MG, verificou-se que a concentração de ria optado pelo banheiro por se tratar de um cômodo pequeno e
álcool no sangue da vítima era de 0,96g/L e que a concentração de fácil vedação, de forma a acelerar, assim, a saturação de CO
de HbCO era de 80%, o que confirmou a suspeita da causa- no ambiente. Além de toda essa preparação, é revelada ainda
mortis: asfixia tissular por intoxicação por CO. uma determinação de ir até o fim, uma vez que iniciado o pro-
cesso (a queima do carvão no ambiente fechado), a vítima teria a
Discussão opção de desistir antes de perder a consciência.
Os achados perinecroscópicos no local do fato revelaram
O suicídio é um fenômeno comum na população em geral bastante sobre a causa mortis. As tonalidades róseas da face
e uma das causas de morte com maior incidência em todo o pla- da vítima e das manchas de hipóstase indicam a presença de
neta. Há diferentes maneiras de se cometer um suicídio, sendo HbCO no sangue 3. Somou-se a isso ausência de ferimentos ex-
que três se destacam entre as mais frequentes: enforcamento, ternos e de lesões de hesitação, o que indica que a vítima sequer
intoxicação com pesticidas e disparo de arma de fogo. Aparecem caiu sobre o piso. Simplesmente, deitou sobre o chão, colocou
também nas estatísticas, mas de forma esporádica, precipitação a cabeça em um travesseiro, acomodou-se e esperou a ação
de grande altura e outros tipos de envenenamento 12,13. do agente tóxico (CO), à semelhança de dois triplos suicídios
É importante considerar que as vítimas usualmente pro- relatados na Alemanha 18.
curam métodos de suicídio de fácil execução e conveniência. A A confirmação da causa mortis só foi possível por meio
emissão de CO por meio da queima de carvão insere-se nesse dos exames posteriores de necropsia realizados pelos Médicos
contexto. Ainda são de baixo custo e é necessário apenas um es- Legistas, nos quais foram constatados os efeitos da asfixia tissu-
paço fechado, pequena porção de carvão e um recipiente para a lar nos órgãos internos. Nessa etapa também foi coletado san-
queima. Outro fator que também chama atenção para essa forma gue da vítima e foram solicitados exames, dentre eles o de teor
de suicídio é o fato de ser um método indolor e rápido, levando à alcoólico e o da medição da concentração de HbCO (responsável
perda de consciência em poucos minutos em situações em que pela asfixia tissular 3), além de outras buscas toxicológicas.
a vítima inala grandes concentrações de CO 5,8,14. Essas carac- No presente caso, a única fonte de CO no local era o vaso
terísticas do CO favorecem, inclusive, a ocorrência de acidentes contendo carvão vegetal parcialmente combusto (o chuveiro do
fatais, principalmente em ambientes mal ventilados contendo sis- banheiro era elétrico, e não havia tubulações ou dispositivos de
tema de aquecimento a gás 15. aquecimento a gás nesse cômodo e nem no apartamento). A pre-

32
Ventura et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

sença de um vaso contendo carvão em combustão no interior bara Koogan, 2011


do banheiro seria estranha ao ambiente e só poderia ter sido ali 4- KLAASSEN, C.D. Casarett & Doull’s toxicology the ba-
colocado visando à liberação de CO no ar. A vedação interna da sic science of poisons. 7.ed. United States: McGraw-Hill, 2008.
janela e da porta do banheiro por meio de fita adesiva demonstra 5- SEDDA, A.F.; ROSSI, G. Death scene evaluation in a case of
intenção de conter a fumaça e provocar saturação do ar com fatal accidental carbon monoxide toxicity. Forensic Science In-
o CO. O fato de a vítima estar deitada sobre o piso do banhei- ternational, v.164, p.164, 2006.
ro, com a cabeça sobre um travesseiro, em posição confortável, 6- OGA, S. Fundamentos de toxicologia. 3.ed. São Paulo:
apenas de cueca, pode ser explicado pela provável previsão de Atheneu, 2013.
elevação da temperatura do banheiro. As queimaduras de segun- 7- PASSAGLI, M.F. Toxicologia forense - teoria e prática.
do grau na porção inferior dos três primeiros dedos de seu pé es- 4.ed. Campinas: Millennium, 2013.
querdo indicam que o vaso estava quente no interior do banheiro, 8- SCHMITT, M.W.; WILLIAMS, T.L.; WOODARD, K.R.; HARRUFF,
com o carvão em combustão, o que ocasionou as queimaduras R.C. Trends in suicide by carbon monoxide inhalation in King Coun-
no contato com a vítima já deitada (exames laboratoriais indica- ty, Washington: 1996–2009. Journal of Forensic Science,
ram que tais lesões foram post-mortem). v.56, p.652, 2011.
A presença da garrafa de vodka na copa ao lado do banhei- 9- LIU, K.Y.; BEAUTRAIS, A.; CAINE, E.; CHAN, K.; CHAO, A.;
ro, parcialmente consumida, indicou que a vítima ingeriu o líquido, CONWELL, Y.; LAW, C.; LEE, D.; LI, P.; YIP, P. Charcoal burning
o que foi confirmado nos exames laboratoriais de teor alcoólico. suicides in Hong Kong and urban Taiwan: an illustration of the im-
No entanto, a concentração de álcool encontrada foi de 0,96g/L o pact of a novel suicide method on overall regional rates. Journal
que não seria suficiente para produzir coma alcóolico 5 (o consumo of Epidemiology Community Health, v.61, p.248, 2007.
de álcool como fator encorajador por parte de suicidas no autoe- 10- LABERKE, P.J.; BOCK, H.; DITTMANN, V.; HAUSMANN, R. Fo-
xtermínio é considerável, sendo que em um estudo observou-se rensic and psychiatric aspects of joint suicide with carbon monoxide.
uma taxa de uso de álcool previamente ao ato entre 18 e 51% dos Forensic Science Medical Pathology, v.7, p.341, 2011.
casos avaliados 19). 11- PAN, Y.; LIAO, S.; LEE, M. Suicide by charcoal burning in Taiwan,
Não houve outros achados toxicológicos que causariam a 1995–2006. Journal of Affective Disorders, v.120, p.254, 2010.
morte, além da concentração de HbCO no sangue, que foi de 80%, 12- LEE, J.; LEE, M.; LIAO, S.; CHANG, C.; SUNG, S.; CHIANG,
um valor superior de saturação em relação a outros casos descri- H.; TAI, C. Prevalence of suicidal ideation and associated risk fac-
tos na literatura 10,14,18. O alto teor de HbCO encontrado deve ter tors in the general population. Journal of the Formosan Med-
sido favorecido pelas pequenas dimensões do banheiro. A presen- ical Association, v.109, p.138, 2010.
ça de pedaços de papel rasgado na lixeira da cobertura, contendo 13- AJDACIC-GROSS, V.; WEISS, M.G.; RING, M.; HEPP, U.;
frases curtas manuscritas, enaltecendo um amigo, entre elas um BOPP, M.; GUTZWILLER, F.; ROSSLER, W. Methods of suicide:
nome e um número de telefone (provavelmente o do amigo), indica international suicide patterns derived from the WHO mortality
intenção da vítima, não mantida, de produção de carta de despe- database. Bulletin of the World Health Organization, v.
dida. Tais elementos, além da ausência de ferimentos de defesa 86, 2008. Disponível em: http://www.who.int/bulletin/volu-
na vítima, afastam as hipóteses de acidente ou homicídio para o mes/86/9/07-043489/en/ Acesso em: 18 agosto 2016.
fato ocorrido, restando, assim, a hipótese de suicídio como a mais 14- PATEL, F. Carbon copy deaths: Carbon monoxide gas chamber.
provável, perpetrado por intoxicação por CO. Journal of Forensic and Legal Medicine, v.15, p.398, 2008.
15- THOMSEN, J.; KARDEL, T. Intoxication at home due to carbon
Considerações Finais monoxide production from gas water heaters. Forensic Science
International, v.36, p.69, 1988.
Num caso de suicídio como o apresentado no presente ar- 16- CHEN, Y.; BENNEWITH, O.; HAWTON, K.; SIMKIN, S.; COO-
tigo, bastante incomum no país, é de grande importância um bom PER, J.; KAPUR, N.; GUNNELL, D. Suicide by burning barbecue
levantamento técnico do local da morte, o que, em conjunto com charcoal in England. Journal of Public Health, v.35, p.223, 2012.
os achados necroscópicos, permite a determinação da natureza do 17- LEE, A.; OU, Y; LAM, S.; SO, K.; KAM, C. Non-accidental carbon
fato. A comparação com outros casos relatados na literatura enrique- monoxide poisoning from burning charcoal in attempted combined homi-
ce a análise e traz maior solidez ao fato, tornando-o menos isolado. cide–suicide. Journal of Pediatric Child Health, v.38, p.465, 2002.
18- JÜBNER, M.; HATZ, D.; LYNESS, J.; ROHRICH, J.; RIEPERT,
Bibliografia T.; ROTHSCHILD, M.A. Zwei fälle von dreifachsuiziden mithilfe von
holzkohle. Rechtsmedizin, v.2, p.111, 2011.
1- MEHTA, M.G.S.R.; DAS, L.C.S.; SINGH, L.C.S.K. Carbon monoxide 19- HOLMGREN, A.; JONES, A.W. Demographics of suicide vic-
poisoning. Medical Journal Armed Forces India, v.63, p.362, 2007. tims in Sweden in relation to their blood–alcohol concentration and
2- BATEMAN, D.N. Carbon monoxide. Medicine, v.40, p.115, 2011. the circumstances and manner of death. Forensic Science In-
3- FRANÇA, G.V. Medicina Legal. 9.ed. Rio de Janeiro: Guana- ternational, v.198, p.17, 2010.

33
rcml
revista criminalística
e medicina legal
revista criminalística e medicina legal
v.1 | n.1 | 2016 | p. 34-45

COCAÍNA: ASPECTOS HISTÓRICOS,


TOXICOLÓGICOS E ANALÍTICOS – UMA REVISÃO
Sordaini Maria Caligiorne*
Pablo Alves Marinho
Instituto de Criminalística de Minas Gerais

COCAINE: HISTORICAL, TOXICOLOGICAL


AND ANALYTICAL ASPECTS – A REVIEW
Resumo
A cocaína é o principal alcalóide encontrado nas folhas do vegetal Erytroxylum coca. Os relatos de uso da cocaína são milenares
e até hoje permeiam algumas culturas ocidentais, porém o uso recreativo já se disseminou por todo o mundo. Vários estudos demons-
tram que o uso abusivo da droga é um grave problema de saúde pública, uma vez que pode ocasionar alterações cardiovasculares
e do sistema nervoso central nos usuários. As ciências forenses são uma ferramenta da Perícia Criminal que trata da utilização do
conhecimento e da tecnologia da ciência no cumprimento das leis sociais. Deste modo, é de extrema importância que o Perito Cri-
minal tenha conhecimento pleno dos métodos analíticos disponíveis para a identificação da cocaína, tendo em vista que esta droga
representa boa parte de todo o montante apreendido pelas forças policiais. O presente artigo apresenta uma breve revisão sobre
os aspectos toxicológicos decorrentes do uso da cocaína, bem como as principais técnicas analíticas para a identificação da droga
segundo recomendações internacionais, visando à harmonização dos procedimentos adotados pelos Peritos Criminais, evitando,
assim, diferenças na qualidade de laudos toxicológicos realizados em várias instituições.

Palavras-chave: Cocaína. Efeitos tóxicos. Técnicas de triagem. Técnicas de confirmação.

Abstract
Cocaine is the main alkaloid found in the leaves of the Erytroxylum coca plant. Cocaine use reports are ancient
and still permeate some western cultures, but recreational use has spread throughout the world. Several studies
demonstrate that the abuse of drugs is a serious public health problem, since it can lead to cardiovascular and cen-
tral nervous system changes in users. Forensic science is a tool of Forensics that deals with the use of knowledge
and science technology in compliance with social laws. Therefore it is of the utmost importance that a Forensic
Investigator have full knowledge of the analytical methods available for the identification of cocaine, given that this
drug represents a large portion of the entire amount seized by the police. This article presents a brief review of the
toxicological aspects arising from the use of cocaine as well as the main analytical techniques for the identification
of drugs according to international recommendations, aimed at harmonization of the procedures adopted by Foren-
sic Investigators, thus, avoiding quality differences in toxicology reports performed by different institutions.

Key-Words: Cocaine. Toxic effects. Trial techniques. Confirmatory techniques.

*sordaini@gmail.com
Caligiorne et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Histórico sódio) para produção de um intermediário de refino da cocaína


denominado pasta base de cocaína ou pasta de coca, possuindo
A cocaína é o principal alcalóide encontrado nas folhas do um teor de 30 a 80% de cocaína. A fim de aumentar a pureza da
vegetal Erythroxylum coca. Os relatos de uso da cocaína da- droga e torná-la mais esbranquiçada, o que agrega maior valor
tam de mais de 1.200 anos, quando os nativos sul-americanos econômico no mercado ilícito, a pasta de coca pode ser oxidada
dos Andes já utilizavam folhas de E. coca, por suas proprieda- com o uso de permanganato de potássio, a fim de retirar impure-
des estimulantes 1. zas, como os outros alcalóides presentes no vegetal, formando
Apesar de a espécie E. coca ser a mais conhecida, exis- assim um segundo intermediário do refino denominado de cocaí-
tem mais de vinte espécies do gênero Erythroxylum que pos- na base, base de coca, pasta lavada ou pasta oxidada, possuin-
suem o alcalóide, se destacando a E. coca variedade coca, do um teor de cocaína de 80 a 95% 3,5,6.
E. coca variedade ipadu, E. novogranatense variedade Segundo os critérios da Drug Enforcement Adminis-
novogranatense e E. novogranatense variedade truxil- tration (DEA) dos Estados Unidos da América (EUA), a cocaína
lense como as que apresentam os maiores teores de cocaína, é considerada altamente oxidada se o teor de cinamoilcocaína
variando entre 0,5 a 1,5% 2,3. A Figura 1 4 apresenta as estruturas (cis e trans) estiver menor que 2% em relação ao teor de cocaína
químicas dos principais alcalóides presentes nesse vegetal. total, sendo considerada como base de coca. Em caso do teor re-
lativo de cinamoilcocaína ser maior que 6%, esta é considerada
não oxidada e denominada de pasta base de cocaína; e entre 2 a
6% de cinamoilcocaína, moderadamente oxidada 3,7.
O refino inicial da cocaína muitas vezes é realizado nos pa-
íses andinos, chegando ao Brasil a pasta base ou cocaína base,
as quais têm seu processo de purificação finalizado no Brasil,
onde são utilizados reagentes químicos como acetona e ácido
clorídrico para preparo do cloridrato de cocaína; e carbonato ou
bicarbonato de sódio para preparo do crack. A merla é outro pro-
duto de refino da cocaína, estando a cocaína na forma de base
livre e, portanto, utilizada pela via pulmonar. É frequentemente
comercializada como uma pasta semi-sólida em recipientes me-
tálicos, apresentando alto teor de água e sais de sódio, levando
à hidrólise da cocaína em benzoilecgonina, que é também um
dos produtos de biotransformação da cocaína no organismo 6.
Na Figura 2 é representado um esquema do refino da cocaína.

Figura 1: Estrutura química da cocaína (A), tropacocaína


(B), cis-cinamoilcocaína (C), trans-cinamoilcocaína (D),
trimetoxicocaína (E), alfa-truxilina (F) 4.
Figura 2: Processo de refino da cocaína.

Apesar de o cultivo do vegetal E. coca ser permitido em Vale ressaltar que o cloridrato de cocaína é comumente
alguns países da América do Sul, como Bolívia, Colômbia e Peru, adulterado com substâncias farmacologicamente ativas como
o refino é proibido em qualquer parte do mundo. Para obter os cafeína, lidocaína, benzocaína, procaína, levamisol, fenacetina,
produtos refinados da droga, como o cloridrato de cocaína e o diltiazem e diluída com pós inertes como açúcar, carbonato de
crack, os traficantes utilizam diversos produtos químicos, que sódio, silicatos, sulfatos, cal e amido, diminuindo a pureza da
são mais facilmente encontrados no Brasil, devido ao destaque droga. Em estudo realizado em Minas Gerais, Brasil, os teores
da indústria química brasileira no cenário mundial. de cocaína nas amostras apreendidas pela Polícia Civil variaram
No processo de refino da cocaína, as folhas da E. coca de 6,4 a 75,3%, sendo a cafeína e a lidocaína os principais adul-
são maceradas e extraídas com solventes orgânicos (ex.: gaso- terantes encontrados 8.
lina e querosene), sendo adicionadas substâncias ácidas (ex.: O nome coca deriva de uma palavra aimará, “khoka”,
ácido sulfúrico) e básicas (ex.: óxido de cálcio e carbonato de cujo significado seria “a árvore” 9. Este vegetal cresce na forma

35
Caligiorne et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

de arbusto ou em árvores ao leste dos Andes e acima da Bacia de toxicidade, tolerância, dependência química e morte pelo uso
Amazônica 10 sendo cultivado em clima tropical e altitudes que passaram a ser relatadas e ainda agravadas, no início dos anos
variam entre 450 e 1.800 metros acima do nível do mar e, ainda, 1.920, quando surgiram comercialmente as seringas hipodérmi-
continua sendo usado pelos nativos da região que mascam sua cas, facilitando a administração de uma maior quantidade de co-
folha. No norte do Brasil, também é chamada de epadu e muitas caína pela via endovenosa 19.
tribos da Bacia Amazônica, na região fronteiriça entre Venezue- Há registro do uso restrito de cocaína nas décadas de
la, Colômbia e Brasil, mantêm o hábito de mascar o “epadu” ou 1.930 a 1.960 nos EUA, porém esse uso mudou à medida que
“ipadu” 11,12. Indígenas andinos reconheciam suas propriedades a droga começou a estar disponível no mercado, por meio do
tônicas e utilizavam-nas para suportar os esforços físicos e a fa- incremento do narcotráfico internacional, a partir da América do
diga 13,14. Como a coca possuía um caráter místico para os índios, Sul 13,14. No fim do mesmo século começaram a aparecer os sin-
os espanhóis proibiram seu consumo para converter os mesmos tomas psicóticos e maléficos da droga. Em 1.980, pelo menos
ao cristianismo. 400 casos de danos físicos e psíquicos relacionados à cocaína já
Em 1.850, a coca foi levada para a Europa e em 1.855 o haviam sido registrados. Na segunda metade do século XX, gra-
químico alemão Friedrich Gaedecke conseguiu o extrato das fo- ças ao fortalecimento do puritanismo e da ideologia proibicionis-
lhas de coca, o erythroxylene. Quatro anos mais tarde, em 1.859, ta, o consumo da cocaína caiu significativamente nos EUA e na
o químico alemão Albert Niemann conseguiu isolar, entre os Europa. Entretanto, o estímulo às experiências com substâncias
seus numerosos alcalóides, o extrato de cocaína, e em 1.898 foi psicoativas dos movimentos beat e hippie dos anos 1.950 e
descoberta a sua estrutura química. Em 1.902, Willstatt (prêmio 1.960 resultaram no aumento do consumo da droga. Atualmente,
Nobel) produziu cocaína sintética em laboratório 16. a cocaína é uma das drogas ilícitas mais consumidas no mundo
Na segunda metade do século XIX, a cocaína ganhou 16
. As complicações neuropsiquiátricas, cardiocirculatórias assim
grande popularidade. O psicanalista Sigmund Freud (1.856- como os transtornos sócio ocupacionais, econômicos e legais
1.939), em 1.884, publicou um livro chamado Uber Coca associados ao seu uso abusivo fazem com que esse fenômeno
(Sobre a Cocaína) no qual defendeu o uso terapêutico como necessite ser cada vez mais estudado.
estimulante, afrodisíaco, anestésico local, assim como indicativo
no tratamento de asma, desordens digestivas, exaustão nervo- Aspectos sociais do uso da cocaína
sa, histeria, sífilis além do mal-estar relacionado a altitudes 15,16.
Freud receitava essa droga aos seus pacientes para o trata- O uso abusivo de cocaína tem se constituído em um pro-
mento de depressão e dependência à morfina. Sendo assim, foi blema cada vez maior na sociedade. O aumento das taxas de
considerado inicialmente um fármaco milagroso para tratamento morbi-mortalidade parece ser devido a uma diminuição no preço
de diversas moléstias. Mais tarde, após o registro de uma morte da droga e um aumento da sua disponibilidade. Um maior núme-
por uso abusivo, o psicanalista passou a observar seus efeitos ro de pessoas utiliza a droga em concentrações e doses cada
adversos e então, após quatro anos de sua publicação original, vez mais elevadas, dados que nunca tinham sido relatados num
Freud voltou atrás, rendendo-se às evidências de que a droga passado recente 20.
milagrosa tinha uma série de inconvenientes, começando pelo Nas primeiras décadas do século XX, o consumo mundial
potencial de desenvolver a dependência química. Em 1.892 pu- dessa droga pareceu ter diminuído de forma importante, com ex-
blicou uma continuação do Uber coca modificando seu ponto ceção dos países andinos, onde a substância continuava a ser
de vista originalmente favorável à cocaína 17. consumida 21. O conhecimento da população sobre os efeitos
Após um grupo de cientistas italianos ter levado a planta nocivos da cocaína, além do surgimento de regulamentações e
para o país, o químico Angelo Mariani desenvolveu, em 1.863, uma leis restritivas, como o tratado de Haia (1.912), ou o Decreto-lei
mistura de folhas de coca com vinho, denominando-o de vinho Ma- Federal nº 4.292 de 6 de julho de 1.921, no Brasil, tornaram a
riani. A bebida, de grande aceitação entre as classes mais altas e cocaína menos disponível para a população em geral, e também
muito apreciada pelo Papa Leão XIII, consistia em uma infusão ajudou no declínio do uso de droga. Houve, no entanto, o res-
alcoólica de folhas de coca. Em 1.886, John Styth Pemberton criou surgimento de uso abusivo de cocaína nos últimos 30 anos. No
um soft drink isento de álcool. Assim, foi na tentativa de competir início da década de 1.970, havia pouca literatura demonstrando
com o vinho Mariani que os americanos criaram a Coca-Cola 18, a a toxicidade dessa droga e suas consequências na saúde do
qual permaneceu contendo a cocaína na sua fórmula até 1.906, usuário. Assim, a cocaína ressurgiu como droga de escolha para
quando foi substituída por outro alcalóide estimulante do sistema uso “recreacional”, que colaborava para a falsa crença de que a
nervoso central (SNC), a cafeína 10,12,15. droga era segura, sem risco de causar dependência 22.
Em 1.885, um químico trabalhando para a indústria farma- Foi a partir dos anos 1.980, com o aumento da oferta de
cêutica Parke Davis, revolucionou a produção ao descobrir cocaína no mercado de todos os países americanos, que essa
uma maneira de produzir cocaína semirefinada nos próprios pa- concepção começou a mudar. O aumento da oferta deveu-se,
íses onde estavam instaladas as fábricas 19. Grandes problemas principalmente, a uma maior produção e à distribuição mais efi-

36
Caligiorne et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

caz realizada por alguns cartéis de traficantes sul-americanos. da cocaína pelas colinesterases plasmática e hepática, e ben-
Essa maior oferta, com um preço muito menor, fez com que o uso zoilecgonina (30 a 45%), resultante da hidrólise espontânea da
de cocaína aumentasse e se diversificasse bastante 19. cocaína ou por reação catalisada por carboxilesterases. Outro
No Brasil, de acordo com o IIº Levantamento Domiciliar produto de biotransformação é a norcocaína (2 a 6%), resultante
sobre o Uso de Drogas, realizado em 2.005, constatou-se que da N-desmetilação direta pelas enzimas do sistema citocromo
3,8% da população brasileira, entre 12 e 65 anos de idade, já P450. A ingestão de álcool combinada com a administração de
usaram algum derivado da droga 23, e outros dados epidemioló- cocaína resulta na transesterificação hepática da droga na forma
gicos mostram que o uso de cocaína vem crescendo nos últimos de cocaetileno. Um dos aspectos importantes deste metabólito é
anos entre os estudantes do ensino médio e fundamental, bem que, devido a sua semelhança estrutural, sua ação farmacológi-
como entre os pacientes que procuram atendimento nas clínicas ca é comparável à da cocaína 14.
especializadas 21. O cloridrato de cocaína pode ser injetado, inalado e, quan-
O mesmo levantamento 23 mostrou que 5,6 milhões de do na forma de base livre (crack), o alcalóide pode ser fumado,
adultos e 442 mil menores, que tinham entre 14 e 17 anos, admi- tendo em vista que essa forma apresenta baixo ponto de fusão,
tiram ter consumido algum derivado da cocaína. O estudo indica volatiliza-se aproximadamente a 90°C, e quando aquecida per-
também que 2 milhões de brasileiros fumaram crack ou merla mite que seus vapores sejam inalados no ato de fumar, tendo a
em alguma ocasião e que 1,2 milhões fizeram uso no ano ante- sua velocidade de absorção muito alta devido a superexposição
rior. O consumo foi três vezes maior em áreas urbanas do que à superfície pulmonar altamente vascularizada. O início dos efei-
em áreas rurais, e muito concentrado na região Sudeste (46%). tos é imediato, alcançando a intensidade máxima em cerca de
O Brasil é o segundo maior consumidor de cocaína e seus de- cinco minutos, com duração de aproximadamente 30 minutos.
rivados no mundo em 2.014. A lista foi liderada pelos Estados O uso da droga nesta forma pode levar à dependência em um
Unidos, com 4 milhões de consumidores, seguido por Brasil (2,8 período muito curto de uso 14.
milhões), outros países sul-americanos (2,4 milhões), Reino Uni- O crack surgiu no Brasil em meados de 1.988, na periferia
do (1,1 milhões), Espanha (0,8 milhão) e Canadá (0,5 milhão), de São Paulo 26. Somente após a virada do milênio, relatos sobre
segundo dados citados no estudo 24. esse tema e suas consequências foram produzidos em maior es-
No Brasil houve um aumento na prevalência de uso ao cala 27. Atualmente, passados 20 anos da chegada da droga no
longo da vida de qualquer droga psicotrópica, que passou para Brasil, constata-se a consequência de seus efeitos em diversos
22,8%. A maconha foi a mais citada (8,8%), seguida pelos sol- segmentos. O crack traz, comprovadamente, prejuízos para a
ventes (6,1%) e pelos benzodiazepínicos (5,6%). A cocaína apa- vida dos usuários, seus familiares e para a sociedade em geral.
receu na sexta posição, com 2,9%. O crack ficou na 11ª posição Entre os prejuízos estão: complicações pulmonares frequentes 28;
(0,7%), juntamente com os barbitúricos, e seguido dos antico- zumbidos, alterações de equilíbrio, alucinações auditivas e hipe-
linérgicos (0,5%), merla (0,2%) e heroína (0,1%). O crack é, atu- racusias29; risco aumentado de contrair o vírus da imunodeficiên-
almente, a maior preocupação das autoridades devido à grande cia humana (HIV) e outras doenças sexualmente transmissíveis
taxa de mortalidade de seus usuários 23. A maior parte da cocaína 30,31
; alto índice de mortalidade, em curto espaço de tempo, em
apreendida no Brasil em 2.011 teve como origem a Bolívia (54%), virtude de fatores externos como homicídios e a soropositividade
seguida pelo Peru (38%) e Colômbia (7,5%) 25. para o vírus da HIV 32; maiores problemas sociais 31; problemas
com a justiça, atraso na vida escolar, alto índice de desempre-
CLORIDRATO DE COCAÍNA E CRACK go 33; ocorrência de condutas antissociais para a obtenção da
droga, como furtos, assassinatos e roubos 34. Em virtude dessas
A cocaína é encontrada nas formas de alcalóide purificado, e outras consequências, a questão do uso de crack no Brasil
base livre, e o sal de cloridrato 1; seu uso tem sido associado a já tomou uma grande proporção, sendo considerado um grave
efeitos decorrentes da toxicidade aguda e crônica em praticamente problema de saúde pública 35.
todos os órgãos, principalmente no sistema cardiovascular. Quanto ao processo de produção, inicialmente, o crack era
Através da administração por via intranasal, a velocidade de convertido do cloridrato de cocaína (pó) pelo próprio usuário, cons-
absorção pelas membranas mucosas da cocaína ocorre de forma tituindo a forma da “casca” 36,37. Posteriormente, uma vez que a pro-
lenta e baixa, devido ao retardamento da absorção relacionado a dução concentrou-se nas mãos do traficante, o crack passou a ser
baixa taxa de difusão pela mucosa nasofaríngea, devido às pro- produzido e comercializado na forma de “pedras”, que despertavam
priedades vasoconstritoras da droga e a possibilidade de sua de- a atenção pelo baixo custo por unidade, o que de inicio causava a
glutição (20 a 30%), quando a absorção é ainda menor em razão falsa sensação de ser uma droga mais barata que as demais 38.
do metabolismo de primeira passagem sofrido pela droga 14. Definida como um forte impulso para utilizar uma substân-
A eliminação da droga é predominantemente controlada cia, a fissura é considerada fator crítico para o desenvolvimento
pela biotransformação, sendo os principais produtos: éster me- do uso compulsivo e dependência de drogas e para recaídas
tilecgonina (35 a 48%), obtida pela hidrólise do grupo benzoato após período de abstinência. O padrão de consumo intenso, con-

37
Caligiorne et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

tínuo e repetitivo de crack, chamado de binge, é provocado Cocaína e o sistema cardiovascular


pela fissura e podem durar dias até que o suprimento de droga
termine, ou que haja a exaustão do usuário. Esses ciclos intermi- A cocaína pode causar a elevação ou diminuição do ritmo
tentes de doses repetidas de crack, seguidos de parada abrupta cardíaco e da pressão sanguínea, calafrios, náuseas, vômitos.
em seu consumo, estão associados a sinais e sintomas da retira- Altas doses da droga podem causar convulsões, arritmias cardía-
da, caracterizados por mal-estar físico e psicológico 39. cas, coma e até mesmo a morte. Dependendo da via de adminis-
A urgência pelo crack e a falta de condições financeiras para tração, pode produzir uma série de efeitos no ser humano como
suprir sua demanda colocam o usuário em situação de fragilidade, aumento do estado de alerta, hiperatividade motora, taquicardia,
submetendo-se a estratégias arriscadas para obtenção da droga, vasoconstrição, hipertensão, broncodilatação, aumento da tem-
como situações de risco (tráfico de drogas, sexo sem proteção) e de peratura corporal e midríase. O aumento da pressão arterial é
violência (assaltos, brigas). A violência e o comportamento sexual de um dos efeitos mais sérios podendo levar a taquicardia, fibrilação
risco atingem a sociedade como um todo e não somente aos usuá- ventricular, arritmias e infarto do miocárdio 14.
rios de crack, aumentando a propagação de doenças sexualmente A cocaína, ao estimular o sistema nervoso simpático pela ini-
transmissíveis e a insegurança da população 39. bição de recaptação de catecolaminas na terminação nervosa sim-
Por meio do “Plano Integrado de Enfrentamento ao Cra- pática, aumenta a sensibilidade da terminação nervosa adrenérgica
ck e Outras Drogas” do governo federal (Decreto 7.179, de à noradrenalina, agindo como um agente antiarrítmico da classe I
20/05/10), pretende-se disseminar informações qualificadas re- (anestésico local) por bloquear canais de sódio e potássio, que leva
lativas ao crack e outras drogas, ressaltando a necessidade de à depressão de parâmetros cardiovasculares, sendo que a atividade
estudos detalhados da população usuária de crack no Brasil 39. simpática aumentada predomina em baixas doses enquanto a ação
Assim, considerando o desenvolvimento do padrão com- anestésica local é mais proeminente em doses altas 46.
pulsivo de uso e dependência de crack e nos possíveis pro- Além disso, a cocaína estimula a liberação de endotelina 1,
blemas que podem advir desse comportamento, estudos rela- um potente vasoconstritor, e inibe a produção de óxido nítrico, prin-
cionados à compreensão desse fenômeno devem ser cada vez cipal vasodilatador produzido pelas células endoteliais, promoven-
mais intensificados. do trombose pela ativação de plaquetas e aumento da agregação
plaquetária. Calcificação e aneurismas ocorrem frequentemente
Cocaína e o sistema nervoso central (SNC) em artérias coronarianas de usuários de cocaína, além de infarto
do miocárdio. O aumento da pressão arterial e frequência cardíaca
No SNC, a cocaína atua como potente estimulante. A coca- ocorrem em consequência do aumento da demanda de oxigênio
ína, ou benzoilmetilecognina, é um anestésico local que bloqueia pelo miocárdio. Esse aumento é dose dependente e mediado pela
a despolarização de canais de sódio dependentes de voltagem estimulação alfa adrenérgica e, ao mesmo tempo, reduz o supri-
e, por consequência, a propagação do impulso nervoso (estímulo mento de oxigênio via vasoconstrição coronariana 47.
doloroso). Provoca vasoconstrição por inibição local da recapta- O consumo de cocaína tem sido associado a doenças
ção de noradrenalina na fenda sináptica. Os efeitos euforizantes cardiovasculares, tanto agudas como crônicas. Entre elas está o
e potencial aditivo estão associados também ao bloqueio da re- infarto agudo do miocárdio, isquemia miocárdica, aceleração de
captação de catecolaminas (dopamina e noradrenalina) e seroto- aterosclerose, miocardite, cardiomiopatia, arritmias, hipertensão
nina nos sistemas nervoso periférico e central 40,41. A recaptação é arterial e endocardite 47.
o principal sistema de retirada de monoaminas da fenda sináptica As causas das cardiomiopatias difusas associadas ao uso
que, quando bloqueado, leva a acúmulo do neurotransmissor na da cocaína são secundárias, mais devidas ao excesso de cate-
fenda sináptica, permitindo uma maior interação com seus re- colaminas do que a um efeito tóxico per si. O uso prolongado
ceptores, intensificando assim a atividade do sistema nervoso 42. de cocaína também está relacionado a hipertrofia ventricular es-
A cocaína é capaz de atravessar a barreira hematoence- querda, cardiomiopatia dilatada, aterosclerose, disritmias crôni-
fálica e entrar no cérebro. Atua sobre a neurotransmissão dopa- cas e apoptose de cardiomiócitos 48.
minérgica, mais especificamente sobre a via mesocorticolímbica, De modo geral, a dependência da cocaína tem se tornado
que se projeta da área tegmentar ventral do mesencéfalo para o um grande desafio da saúde pública, já que resulta em significa-
núcleo Accumbens e o córtex pré-frontal 42. Esta ação pode tivo número de problemas médicos, psicológicos e sociais, in-
ocorrer de forma direta sobre os neurônios dopaminérgicos ou cluindo a violência, a criminalidade, além do desenvolvimento de
indireta sobre neurônios de outros sistemas que modulam a ati- doenças como síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS),
vidade dopaminérgica (glutamato, GABA, noradrenalina, seroto- hepatite e tuberculose, e da exposição de neonatos a drogas de
nina, opióides). A estimulação do núcleo Accumbens a partir abuso. O efeito destrutivo da droga é muito evidente, uma vez
da ativação da via mesolímbica é responsável pela sensação de que o usuário abandona a vida produtiva e, para obter o produto,
prazer obtida com o uso da droga. Por isso, esta via de neuro- comete pequenos delitos, evidenciando a violência associada ao
transmissão é conhecida como via da recompensa 43-45. contexto social do uso 49.

38
Caligiorne et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Métodos de identificação da cocaína de acordo com sua capacidade de identificação inequívoca


de uma molécula. A seguir é demonstrada a classificação de
A identificação definitiva de drogas de abuso, segundo cada técnica, em cuja categoria A são elencadas as técnicas
recomendações internacionais, deve ser feita por técnicas mais seletivas e, na C, as menos seletivas (Figura 3). Vale
que possuam tanto uma boa sensibilidade como, sobretudo, ressaltar, que a recomendação para análise de drogas brutas
uma adequada seletividade para este tipo de análise 50,51. é que se use no mínimo uma técnica A e outra A, B ou C, mas
De acordo com as recomendações do Scientific Working quando não for possível a utilização de uma técnica A, no
Group for the Analysis of Seized Drugs (SWGDRUG), mínimo três técnicas deverão ser utilizadas, sendo duas da
as técnicas analíticas podem ser classificadas em três níveis categoria B 52.

Categorias das técnicas análíticas


A B C
Espectroscopia no infravermelho Eletroforese capilar Testes colorimétricos
Espectroscopia de
Espectrometria de massas Cromatografia gasosa fluorescência

Ressonância magnética nuclear Espectrometria de mobilidade iônica Imunoensaio


Espectroscopia Raman Cromatografia líquida Ponto de fusão
Espectroscopia no
Difração de raio-X Cromatografia em camada delgada ultravioleta
Análise micro e macroscópica *
Microcristalização
*apenas para Cannabis sativa
Figura 3: Quadro de classificação das técnicas analíticas conforme seu desempenho analítico 52.

Neste sentido, uma das técnicas mais amplamente utiliza- Teste com o reagente de Mayer
da mundialmente e que congrega tais características é a croma-
tografia gasosa acoplada à espectrometria de massas (GC-MS). Este ensaio é muito utilizado em análises botânicas para
Porém tal técnica, devido à sua complexidade, necessita ser rea- identificação de alcalóides em vegetais 57. A cocaína, por ser um
lizada sob condições controladas em ambiente laboratorial, o que alcalóide presente na E. coca, reage positivamente ao teste, o
inviabiliza sua utilização em locais de crimes. Deste modo, outras qual possui elevada sensibilidade reagindo a qualquer traço de
técnicas são utilizadas nestes locais, a fim de obter uma resposta cocaína no material. Porém, este teste possui baixa seletivida-
mais célere para a autoridade judiciária, sendo assim elaborado de, reagindo com outros compostos como a lidocaína, sildenafil,
o laudo preliminar de constatação de droga, conforme preconi- dipirona, ecstasy e outros. Neste procedimento, a droga é so-
zado pelo Código de Processo Penal Brasileiro. Estas técnicas lubilizada em meio aquoso, sendo necessária a adição de gotas
utilizadas são apenas de triagem, tendo como características de ácido clorídrico para a cocaína na forma de base livre. Ao se
uma adequada sensibilidade, baixo custo, facilidade na execu- gotejar o reagente de Mayer sobre a solução, há um turvamento
ção e interpretação, rapidez no resultado obtido, porém carece imediato do meio, formando um precipitado branco flocoso que é
de seletividade, devendo seus resultados serem confirmados por desfeito ao se adicionar etanol 14 (Figura 4).
métodos mais específicos no laboratório 53,54.
Para a determinação de cocaína, existem na literatura vá-
rios métodos que podem ser utilizados na triagem desta droga
55-57,64
, cabendo ao Perito Criminal escolher um ou mais métodos
conforme a característica da amostra e limitações de cada rea-
gente para utilizar na sua análise. A seguir, discutiremos alguns
destes métodos de triagem mais comumente utilizados pela Pe-
rícia Criminal no Brasil para identificação da cocaína.

Figura 4: Reação negativa (tubo à esquerda) e reação positiva


(tubo à direita) para a cocaína, mediante o uso do reagente de
Mayer (arquivo pessoal).

39
Caligiorne et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Teste com o reagente de tiocianato de cobalto mazina, cloridrato de promazina, escopolamina, cloridrato de
dibucaína, prometazina e cloridrato de fenciclidina 59. A seguir
Desenvolvido em 1.931 por Young, o teste original utilizava é mostrada, na equação, a reação balanceada entre o rea-
o reagente de tiocianato de cobalto a 2% com cloreto de estanho gente e a cocaína (R3NH+) 58.
(II) em meio ácido. Este teste baseia-se na reação de comple-
xação da cocaína com o cobalto, formando um complexo que [Co(SCN)(H2O)5 ]+ (aq) + 3SCN- (aq) + 2 R3NH+–> (R3NH)2Co(SCN)4 + 5H2O(l)
pode ser visualizado devido ao aparecimento de uma coloração
azul. Devido à baixa seletividade do teste, várias modificações Teste com o reagente de Scott modificado
foram realizadas a fim de diminuir os falsos positivos 58. É impor-
tante ressaltar que o aumento da concentração do tiocianato de Em 1.986, a fim de otimizar o teste de Scott, Fasanello
cobalto alterará favoravelmente a sensibilidade do teste, porém e Higgins modificaram o reagente, adicionando ácido clorídrico
negativamente a sua seletividade. A Perícia Criminal de Minas em sua formulação, porém mantendo-se a mesma concentração
Gerais utiliza uma concentração de 0,5% do tiocianato de cobal- do sal (2%), fazendo com que ele reagisse tanto com a cocaína
to acidificado, priorizando a seletividade do método em relação na forma de cloridrato como na forma de base livre (ex.: crack,
à sensibilidade. Neste procedimento, é adicionado sobre uma merla, pasta base). O restante do procedimento manteve-se, ha-
fração da droga gotas do reagente que pode ser preparado já vendo aparecimento da coloração azul ao adicionar o reativo, se-
acidificado com ácido clorídrico, a fim de reagir com a cocaína guido do desaparecimento da cor ao adicionar o ácido clorídrico
tanto na forma de cloridrato como na sua forma neutra. O desen- a 10% e, na etapa final, com a adição do clorofórmio, ocorrendo
volvimento da coloração deve ser observado em até 5 minutos, a novamente o aparecimento da coloração azul na porção inferior
fim de se evitar falsos positivos (Figura 5) 14. da solução 59.
Objetivando-se melhorar ainda mais esse teste, prin-
cipalmente em relação à seletividade, o uso da concentra-
ção do reagente numa concentração de 0,15%, apesar de
diminuir a sensibilidade do método, o torna bastante sele-
tivo para a cocaína se comparado com as outras concen-
trações. Neste método, é adicionado o reativo sobre a dro-
ga, em seguida o solvente diclorometano. Caso a cocaína
esteja na forma de cloridrato há desenvolvimento de uma
coloração azul na porção orgânica inferior. Caso se trate
de cocaína na forma de base livre é necessário adicionar
Figura 5: Reação negativa (à esquerda) e reação positiva gotas de uma solução de ácido clorídrico a 20% para que
(à direita) para a cocaína, mediante o uso do reagente de a cor azul apareça (Figura 6). É importante ressaltar que
tiocianato de cobalto a 0,5% acidificado (arquivo pessoal). a adição do reagente sobre amostras de cocaína contendo
levamisol (fármaco anti-helmíntico) como adulterante, pro-
Teste com o reagente de Scott original duz uma coloração azul na primeira etapa do teste, masca-
rando o resultado para a cocaína 14.
Desenvolvido em 1.973 por Scott, este teste foi basea-
do no teste de tiocianato de cobalto e é realizado em etapas,
sendo necessária a reação positiva nas três etapas para a
correta identificação da droga 58. O ensaio utiliza o reagen-
te de tiocianato de cobalto a 2% contendo glicerina que, ao
entrar em contato com a droga, desenvolve uma coloração
azul, baseado no mesmo princípio do teste de tiocianato de
cobalto. Na segunda etapa, são adicionadas gotas de ácido
clorídrico concentrado que provocará a mudança da colora-
ção da solução de azul para rosa (cor original do reagente).
Na última etapa, é adicionado clorofórmio, fazendo com que
o complexo entre a cocaína e o cobalto migre para a fração
orgânica, reaparecendo a coloração azul na porção inferior
do meio 55. Esse teste possui boa sensibilidade, reagindo com
amostras bem diluídas, porém pode reagir com outros fárma- Figura 6: Reação negativa (à esquerda) e reação positiva (à
direita) para a cocaína, mediante o uso do reagente de Scott a
cos como o cloridrato de difenildramina, cloridrat de clorpro-
0,15% (arquivo pessoal).

40
Caligiorne et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Imunocromatografia seguido de imersão da fita do imunoensaio na solução e, após


cinco minutos, a leitura é realizada. O desenvolvimento de uma
A fim de obter resultados mais fidedignos para amostras linha na região do controle indica que a eluição da amostra ocor-
muito diluídas ou para confirmar resultados duvidosos obtidos reu de forma adequada, e a ausência de uma linha na região do
nos testes citados anteriormente, a imunocromatografia pode ser teste indica a presença da droga na amostra, devendo o analista
utilizada como técnica de triagem também para drogas brutas. atentar para esta característica do teste. Existem disponíveis no
Apesar dessa técnica ter sido desenvolvida para ser aplicada em mercado imunoensaios para identificação de cocaína, maconha
fluidos biológicos em 2.012 a avaliação da aplicabilidade para e ecstasy separadamente, além de testes multidrogas, os quais
análise de drogas em material apreendido mostrou ter adequada podem detectar várias drogas simultaneamente (cocaína, maco-
sensibilidade e seletividade 60. A técnica é baseada na ligação nha, anfetamina, metanfetamina, opióides, fenciclidina e outras).
de anticorpos presentes numa membrana de celulose que, ao Apesar das vantagens sobre as outras técnicas, o elevado custo
se ligar com a droga (antígeno), é eluída ascendentemente pela deste teste muitas vezes inviabiliza sua adoção na rotina pericial,
membrana, desenvolvendo uma coloração na zona de leitura e além de algumas drogas ainda não serem detectadas por tais
do controle da tira. O procedimento do teste é baseado na extra- testes (ex.: NBOMe, catinonas, triptaminas, LSD e canabinóides
ção da droga em meio aquoso sob agitação vigorosa, principal- sintéticos) 60. Na Figura 7 é mostrado um esquema da fita de
mente para as drogas pouco hidrofílicas (ex.: maconha, crack), imunoensaio para pesquisa de cocaína.

Figura 7: Resultado positivo para determinação de cocaína por imunocromatografia em fita de imunoensaio (arquivo pessoal).

Cromatografia em camada delgada (CCD) ascendente, ocorrendo a eluição da droga e separação dos ou-
tros constituintes da amostra que terão diferentes interações com
As técnicas cromatográficas são técnicas de separação de a fase móvel e estacionária em relação à cocaína. Após a mi-
misturas de amostras por processos físicos e químicos, garan- gração do solvente até um determinado ponto na cromatoplaca,
tindo melhor seletividade em relação às técnicas colorimétricas esta é retirada da cuba, levada à capela e borrifada um revelador
citadas anteriormente. No entanto, são mais onerosas, trabalho- químico que reagirá com a molécula da cocaína desenvolvendo
sas, necessitam de um ambiente laboratorial para sua realização uma cor 61.
e também são consideradas como técnicas de triagem quando Os reativos mais utilizados para a cocaína são o reagente
utilizados reagentes cromogênios para a identificação de uma Dragendorff e o Iodo Platinado acidificado. A positividade do teste
determinada droga. Neste procedimento, a amostra da droga se dará caso a amostra problema apresente o mesmo Rf (fator
é extraída com um solvente orgânico de alta miscibilidade (ex.: de retenção) e cor idêntica ao padrão aplicado na cromatoplaca.
metanol para o cloridrato de cocaína e clorofórmio ou éter etílico É indicado aplicar juntamente ao padrão outros possíveis adul-
para o crack), sendo o solvente aplicado num suporte contendo terantes, a fim de verificar o Rf destes em relação à cocaína no
uma fase estacionária (ex.: sílica) que é colocada dentro de uma método utilizado 14,62.
cuba de vidro contendo uma fase móvel constituída de uma mis- A Figura 8 mostra uma cromatoplaca revelada com o reati-
tura de solventes (ex.: clorofórmio, acetona e hidróxido de amô- vo de Dragendorff para pesquisa de cocaína por CCD.
nio). O solvente, então, migra pela fase estacionária no sentido

41
Caligiorne et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Cromatografia gasosa acoplada à


espectrometria de massas

Lidocaína Esta é a técnica padrão ouro para identificação e, se ne-


cessária, quantificação da cocaína em droga bruta, dada sua
sensilidade (ppm) e principalmente seletividade frente às outras
técnicas citadas anteriormente. Porém, tanto a aquisição como
a manutenção do equipamento é altamente custosa em relação
aos outros métodos. Nesta análise a amostra é extraída com um
solvente orgânico, o qual é injetado e vaporizado no injetor do
Cocaína equipamento. A amostra é então percorrida por uma coluna con-
tendo uma fase estacionária (ex.: polidimetilfenilsiloxano) sob um
fluxo constante de um gás de arraste (ex.: hélio ou hidrogênio).
Ao percorrer a coluna a cocaína é separada dos outros consti-
tuintes da amostra, sendo encaminhadas sendo encaminhadas
ao espectrômetro de massas. No espectrômetro de massas a co-
caína é ionizada e fragmentada na fonte de ionização por impac-
to por elétrons, e os íons conduzidos conduzidos para um filtro de
massas (ex.: quadruplo) que é responsável por focalizar uma fra-
ção destes íons com uma razão massa/carga (m/z) pré-definidos
Cafeína pelo analista. Os íons de m/z selecionados são direcionados para
um detector que amplificará o sinal, gerando o espectro de mas-
sas da substância e, que por meio de um software, poderá ser
visualizado e interpretado na tela do computador 50,63. O espectro
de massas obtido da molécula analisada na amostra questionada
é comparado com um banco de dados de espectros de massas
de várias substâncias químicas. Uma alta similaridade entre o
espectro de massa obtido na amostra com o espectro da coca-
ína contido no banco de dados do equipamento, além do mes-
mo tempo de retenção da molécula presente na amostra com
Figura 8: Cromatoplaca de sílica para análise de cocaína, um padrão de referência previamente injetado no dia, garante a
lidocaína e cafeína, com a utilização do reativo de Dragendorff identificação da cocaína na droga apreendida. A seguir (Figura
como revelador (fase móvel - clorofórmio:acetona:hidróxido de 9) mostra-se o espectro de massas da cocaína, o qual pode ser
amônio 90:10:0,25) (arquivo pessoal). considerado como a “impressão digital” química dessa molécula.

Figura 9: Espectro de massas da cocaína obtido por impacto por elétrons (70eV) 65.

42
Caligiorne et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Considerações finais cocaine seized in two regions of Brazil. Science & Justice, v.53,
p.425-432, 2013.
É de extrema importância que o Perito Criminal tenha 9-KARCH, S.B. The history of cocaine toxicity. Human Patholo-
conhecimento pleno das técnicas analíticas disponíveis para a gy, v.20, p.1037-1039, 1989.
identificação da cocaína, sabendo avaliar de acordo com as limi- 10-FERREIRA, P.E.M; MARTINI, R.K. Cocaína: lendas, história e
tações de cada uma o seu custo/benefício, evitando, assim, a li- abuso. Revista Brasileira de Psiquiatria. v.3, p.96-9, 2001.
beração de resultados falsos positivos ou negativos, o que pode- 11-BUCHER, R. Drogas e drogadição no Brasil. Porto Ale-
ria comprometer o trabalho policial e a credibilidade da instituição gre: Artes Médicas, 1992.
pericial. Ademais, torna-se necessário que todos os envolvidos 12-MAIA, C.R.M,; JURUENA, M.F.P. Cocaína: aspectos históricos,
no processo sejam informados da técnica utilizada pelo Perito farmacológicos e psiquiátricos. Revista da Associação Médi-
Criminal no ensaio, a fim de ser possível sua avaliação quanto à ca do Rio Grande do Sul, v.40, p.263-273, 1996.
adequação do método frente à amostra ensaiada. Embora ainda 13-DENG, S.X.; DE PRADA, P.; LANDRY, D.W. Anticocaine cata-
não haja uma padronização em nível nacional dos ensaios de lytic antibodies. Journal of Immunological Methods, v.269,
triagem e definitivo de drogas em material bruto, tal medida seria p.299-310, 2002.
extremamente salutar tendo em vista a harmonização dos proce- 14-PASSAGLI, M. Toxicologia forense: teoria e prática.
dimentos adotados por todos os Peritos Criminais, evitando-se, 4.ed. Campinas: Millennium, 2013.
assim, diferenças na qualidade de laudos toxicológicos definiti- 15-HAAS, L.F. Coca shrub (Erythroxylum coca). Journal of
vos por instituições distintas. Neurology, Neurosurgery and Psychiatry, v.50, p.25, 1995.
16-MORIARTY, K.M.; ALAGNA, S.W.; LAKE, C.R. Psychopharma-
Referências cology. An historical perspective. Psychiatric Clinics of North
America, v.7, p.411-433, 1984.
1-POZNER, C.N.; LEVINE M.; ZANE, R. The cardiovascular ef- 17-NICASTRI, S. Fluxo sanguíneo cerebral em depen-
fects of cocaine. The Journal of Emergency Medicine, v.29, dentes de cocaína. Relações entre psicopatologia e
p.173-178, 2005. neuroimagem. 1999. Tese (doutorado) - Universidade de São
2-BOTELHO, E.D. Desenvolvimento de uma nova meto- Paulo, Faculdade de Medicina, São Paulo.
dologia analítica para identificação e quantificação de 18-DELPIROU, A; LABROUSSE, A. Coca coke – produtores,
truxilinas em amostras de cocaína baseada em croma- consumidores, traficantes e governantes. Brasília: editora
tografia líquida de alta eficiência acoplada à espectro- Brasiliense, 1988.
metria de massas (CLAE-EM). 2011. Dissertação (mestrado 19-KARCH, S.B. Cocaine: history, use, abuse. Journal of the
em química) - Universidade de Brasília, Instituto de Química, Brasília. Royal Society of Medicine, v.92, p.393-397, 1999.
3-CASALE, J.F.; KLEIN, R.F.X. Illicit production of cocaine. Foren- 20-FERREIRA, P.E.M.S. Estudo do efeito agudo de desa-
sic Science Review, v.5, p.95-107, 1993. fio farmacológico com dipiridamol sobre a perfusão
4-BOUDREAU, D.K.; CASALE, J.F. An in-depth study of the peruvi- regional cerebral em pacientes com uso crônico de
an base llavada (“washed base”) technique for purification of crude cocaína. 2000. Dissertação (mestrado em Psicologia) - Pontifícia
cocaine base. Microgram Journal, v.6, p.72-81, 2008 Universidade Católica de Porto Alegre, Mestrado em Psicologia,
5-DA SILVA JUNIOR, R.C.; GOMES, C.S.; GOULART JÚNIOR, Porto Alegre.
S.S.; ALMEIDA, F.V.; GROBÉRIO, T.S.; BRAGA, J.W.B.; ZACCA, 21-LARANJEIRA, R.; NICASTRI, S. Abuso e dependência de
J.J.; VIEIRA, M.L.; BOTELHO, E. D.; MALDANER, A.O. Demys- álcool e outras drogas. In: ALMEIDA, O.P.; DRATCU, L, LA-
tifying oxi cocaine: chemical profiling analysis of a new brazilian RANJEIRA, R. Manual de psiquiatria. Rio de Janeiro: Gua-
drug from Acre state. Forensic Science International, v.221, nabara Koogan, p. 97-102,1996.
p.113-119, 2012. 22-GAWIN, F.H.; KLEBER, H.D. Abstinence simptomatology and
6-ZACCA, J.J.; BOTELHO, E.D.; VIEIRA, M.L.; ALMEIDA, F.L.A.; psichiatric diagnosis in cocaine abusers. Archieves in Psychia-
FERREIRA, L.S.; MALDANER, A.O. Brazilian federal police drug try, v.43, p.107-113, 1986.
chemical profiling - the PeQui project. Science and Justice, 23-CEBRID - CENTRO BRASILEIRO DE INFORMAÇÕES SO-
v.54, p.300-306, 2014. BRE DROGAS PSICOTRÓPICAS. II Levantamento domi-
7-BOTELHO, E.D.; CUNHA, R.B.; CAMPOS, A.F.C.; MALDANER, ciliar sobre o uso de drogas psicotrópicas no Brasil:
A.O. Chemical profiling of cocaine seized by brazilian federal poli- estudo envolvendo as 108 maiores cidades do país.
ce in 2009-2012: major components. Journal of the Brazilian São Paulo: Departamento de Medicina Preventiva da UNIFESP –
Chemical Society, v.25, p.611-618, 2014. Universidade de São Paulo. 2006.
8-MAGALHÃES, E.J.; NASCENTES, C.C.; PEREIRA, L.S.A.; 24- LARANJEIRA, R.; MADRUGADA, S.C.; RIBEIRO, M.; PINSKY,
GUEDES, M.L.O.; LORDEIRO, R.A.; AULER, L.M.L.A.; AUGUSTI, I., CAETANO, R.; MITSUHIRO, S.S. II Levantamento nacio-
R.; DE QUEIROZ, M.E.L.R. Evaluation of the composition of street nal de álcool e drogas. São Paulo: Instituto Nacional de Ciên-

43
Caligiorne et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

cia e Tecnologia para Políticas Públicas de Álcool e Outras Drogas The Pharmacological Basis of Therapeutics. 10.ed. Lon-
(INPAD), UNIFESP. 2014. don: McGraw-Hill, 2002.
25-UNODC - United Nations Office on Drugs and Crime .World 41-VOLKOW, N.D.; FOWLER, J.S.; WANG, G.J. Imaging studies
Drug Report. New York: UNODC, 2013. on the role of dopamine in cocaine reinforcement and addiction
26-RAUPP, L.M.; ADORNO, R.C.F. Circuitos de uso de crack na in humans. Journal of Psychopharmacology, v13, p.337-
região central da cidade de São Paulo. Ciência e Saúde Cole- 345, 1999.
tiva, v.16, p.2613-2622, 2011. 42-KINSEY, B.M.; KOSTEN, T.R.; ORSON, F.M. Active immuno-
27-KESSLER, F.; PECHANSKY, F. Uma visão psiquiátrica sobre o therapy for the treatment of cocaine dependence, Drugs Future,
fenômeno do crack na atualidade. Revista de Psiquiatria do v.35, p.301-306, 2010.
Rio Grande do Sul, v.30, p97-98, 2008. 43-BRESSAN, R.A.; CRIPPA, J.A. The role of dopamine in reward
28-HAIN, D.H.; LIPPMANN, M.L.; GOLDBERG, S.K.; WALKEN- and pleasure behavior - review of data from preclinical research.
STEIN, M.D. The pulmonary complications of crack cocaine - a Acta Psychiatric Scandinavia, Supplement, v.427, p.14-
comprehensive review. Chest Journal, v.107, p.233-240,1995. 21, 2005.
29-NIGRI, L.F.; SAMELLI, A.G.; SCHOCHAT, E. Potenciais evoca- 44-KOOB, G.F.; SANNA, P.P.; BLOOM, F.E. Neuroscience of ad-
dos auditivos de tronco encefálico em usuários de crack e múltiplas diction. Neuron, v.21, p.467-476, 1998.
drogas. Revista da Sociedade Brasileira de Fonoaudio- 45-NESTLER, E.J. Molecular basis of neural plasticity underlying ad-
logia, v.14, p.528-533, 2009. diction. Nature Reviews Neuroscience, v.2, p.119-128, 2001.
30-AZEVEDO, R.C.S.; BOTEGA, N.J.; GUIMARAES, I.A.M. Crack 46-SCHWARTZ, B.G.; REZKALLA, S.; KLONER, R.A. Cardiovas-
users, sexual behavior and risk of HIV infection. Revista Bra- cular effects of cocaine. Circulation, v.122, p.2558-2569, 2010.
sileira de Psiquiatria, v.29, p.27-30, 2007. 47-KLONER, R.A.; REZKALLA, S.H. Cocaine and the heart. New
31-MALTA, M; MONTEIRO, S.; LIMA, R.M.J.; BAUKEN, S.; MAR- England Journal of the Medicine, v.348, p.487-488, 2003.
CO, A.; ZUIM, G.C. HIV/AIDS risk among female sex workers who 48-BOGHDADI, M.S.; HENNING R.J. Cocaine: pathophysiology
use crack in Southern Brazil. Revista de Saúde Pública, v.42, and clinical toxicology. Heart Lung, v.26, p.466-485, 1997.
p.830-837, 2008. 49-GAWIN, F.H.; KHALSA, M.E; ELLINWOOD, E. Stimu-
32-RIBEIRO, M.; DUNN, J.; SESSO, R.; DIAS, A.C.; LARANJEI- lants. In: Galanter M, Kleber HD, eds. The American Psy-
RA, R. Causes of death among crack cocaine users. Revista chiatric Press textbook of substance abuse treatment.
Brasileira de Psiquiatria, v.28, p.196-202, 2006. Washington, DC: American Psychiatric Press, 1994.
33-DUAILIBI, I.B.; RIBEIRO, M.; LARANJEIRA, R. Profile of cocai- 50-MARINHO, P.A.; LORDEIRO, R.A.; PASSAGLI, M.
ne and crack users in Brazil. Cadernos de Saúde Pública, Cromatografia e espectrometria de massas em análises
v.24, p.545-557, 2008. forenses. In: PASSAGLI, M. Toxicologia forense – teoria
34-GUIMARÃES, C.F.; SANTOS, D.V.V.; FREITAS, R.C.; ARAÚ- e prática, 4.ed. Campinas: Millenium. 2013. Cap.14.
JO, R.B. Perfil do usuário de crack e fatores relacionados à crimi- 51-RIVIER, L. Criteria for the identification of compou-
nalidade em unidade de internação para desintoxicação no Hos- nds by liquid chromatography–mass spectrometry and
pital Psiquiátrico São Pedro de Porto Alegre (RS). Revista de liquid chromatography–multiple mass spectrometry in
Psiquiatria do Rio Grande do Sul, v.30, p.101-108, 2008. forensic toxicology and doping analysis. Analytica Chi-
35-ALMEIDA, M.M; OLIVEIRA, M.A.; PINHO, P.H. O tratamento mica Acta, v.492, p.69-82, 2003.
de adolescentes usuários de álcool e outras drogas: uma questão 52-SWGDRUG - Scientific working group for the
a ser debatida com os adolescentes? Revista de Psiquiatria analysis of seized drugs recommendations. United
Clínica, v.35, p.77-81, 2010. States Department of Justice Drug Enforcement Ad-
36-INCIARDI, J.A. Crack cocaine in the Americas. In: MONTEIRO, ministration. Washington, 2014. Disponível em <http://
M.G.; INCIARDI J.A. Brazil-United States, binational re- www.swgdrug.org/Documents/SWGDRUG%20Re-
search. São Paulo: CEBRID, 1993, p.63-75. commendations%20Version%207-0.pdf>. Acesso em
37-NAPPO, S.A.; GALDURÓZ, J.C.F; NOTO, A.R. Crack use in 31 ago. 2016.
São Paulo. Journal of Substance Use, v.31, p.565-579, 1996. 53-MOREAU, R.L.M. Características das análises toxi-
38-OLIVEIRA, L.G.; NAPPO, S.A. Crack na cidade de São Paulo: cológicas. In: MOREAU, R.L.M.; SIQUEIRA, M.E.P.B.
acessibilidade, estratégias de mercado e formas de uso. Revista Toxicologia analítica. Rio de Janeiro: Guanabara Koo-
de Psiquiatria Clínica, v.35, p.212-218, 2008. gan, 2008, cap.1.
39-CHAVES, T.V.; SANCHES, M.S.; RIBEIRO, L.A.; NAPPO, S.A. 54-TSAI, J.S. Immunoassay technologies for drugs
Fissura por crack: comportamentos e estratégias de controle de of abuse testing. In: SMITH, F.P.; SIEGEL, J.A. Han-
usuário. Revista de Saúde Pública, v.45, p.1168-1175, 2011. dbook of forensic drug analysis. USA:Elsevier Acade-
40-O’BRIEN, C.P. Drug addiction and drug abuse. In: HARDMAN, mic Press:, 2005, cap.2.
J.G.; LIMBIRD, L.E.; GILMAN, A.G. Goodman & Gilman’s. 55-UNITED NATIONS. Rapid testing methods of drugs abuse.

44
Caligiorne et al. | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Manual for use by National Narcotic Laboratories. New imunocromatografia como teste de triagem na detecção de dro-
York, 1994. Disponível em: <https://www.unodc.org/pdf/publica- gas brutas. In: III Encontro Nacional de Química Forense, 2012,
tions/st-nar-13-rev1.pdf>. Acesso em 31 ago. 2016. Anais... Ribeirão Preto. 2012.
56-UNITED NATIONS. Recommended methods for the identifi- 61-LOPES, J.L.C. Cromatografia em camada delgada. In:
cation and analysis of cocaine in seized materials. Manual for COLLINS, C.H.; BRAGA, G.L.; BONATO, P.S. Fundamentos
use by National Narcotic Laboratories. New York, 2012. de cromatografia. Campinas: Editora Unicamp. 2006, cap.3.
Disponível em: <https://www.unodc.org/documents/scientific/Co- 62-MOFFAT, A.C.; OSSELTON, M.D.; WIDDOP, B.
caine_Manual_Rev_1.pdf>. Acesso em 31 ago. 2016. Clarke’s analysis of drugs and poisons. 3.ed. USA:
57-BACCHI, E.M. Alcalóides indólicos. In: SIMOES, C.M.O.; Pharmaceutical Press, 2005.
SCHENKEL, E.P.; GRACE, G.; MELLO, J.C.P.; MENTZ, L.A.; PE- 63-CHIARADIA, M.C.; COLLINS, C.H.; JARDIM,
DRO, P.R. Farmacognosia: da planta ao medicamento. I.C.S.F. O estado da arte da cromatografia associada
3.ed. Porto Alegre/Florianópolis: editora da Universidade UFRGS à espectrometria de massas acoplada à espectrome-
2001, cap.31. tria de massas na análise de compostos tóxicos em
58-MCGILL, J.W.; DIXON, C.A.; RITTER, D. Discovery of an inte- alimentos. Química. Nova, v.31, p.623-636, 2008.
resting temperature effect on the sensitivity of the cobalt thiocya- 64-O´NEAL, C.L., CROUCH, D.J., FATAH, A.A. Validation of twelve
nate test for cocaine. Microgram Journal, v.6, p.26-35, 2008. chemical spot tests for the detection of drugs of abuse. Forensic
59-TSUMURA, Y.; MITOME, T.; KIMOTO, S. False positives and Science International, v.109, p.189, 2000.
false negatives with a cocaine-specific field test and modification of 65- SMITH, R.M.; CASALE, J.F. The mass spectrum of cocaine:
test protocol to reduce false decision. Forensic Science Inter- deuterium labeling and MS/MS studies. Microgram Journal,
national, v.155, p.158-164, 2005. v.7, p.16-41, 2010.
60-MARINHO, P.A.; OLIVEIRA, H.L.P.; VALE, L. Aplicação da

45
RESUMOS
rcml
revista criminalística
e medicina legal
revista criminalística e medicina legal
v.1 | n.1 | 2016 | p. 48-59

Caracterização de marcadores moleculares com


aplicabilidade para identificação de duas espécies
de peixe com interesse forense: Prochilodus
argenteus e Prochilodus costatus

Resumo

A crescente preocupação com as questões ambientais, aliada ao advento de leis que procuram proteger os recursos naturais, tem
criado uma nova demanda na área das ciências forenses que trata das perícias ambientais. Em relação às atividades de pesca,
existem diversas cartas legislativas em vigor que buscam proteger os recursos pesqueiros. Em contrapartida, a correta identificação
de espécimes apreendidos em ocorrências de pesca ilegal ainda é feita de modo precário. Dessa forma, seria desejável o estabe-
lecimento de protocolos simplificados que permitam a correta identificação de materiais apreendidos, como forma de fortalecer as
ações de fiscalização e, posteriormente, a prova no meio jurídico. Nesse aspecto, as técnicas moleculares podem oferecer grande
ajuda através do estabelecimento de marcadores espécie-específicos, que permitam afirmar que o material questionado é prove-
niente, de fato, de espécie cuja pesca não é permitida. O presente trabalho objetiva caracterizar marcadores moleculares para as
espécies Prochilodus argenteus e Prochilodus costatus, ambas de grande importância ecológica e econômica na região
da bacia hidrográfica do rio São Francisco. Para tanto, foi feito o sequenciamento de DNA genômico das duas espécies, montagem
de novo das reads geradas, montagem e anotação das sequências de DNA mitocondrial e comparação com a sequência de DNA
mitocondrial de outra espécie do mesmo gênero: Prochilodus lineatus. Foram selecionados marcadores mitocondriais gênero
-específicos e espécie-específicos e o desenho de primers foi feito levando-se em conta a possibilidade de identificação de gênero
e espécie através de amplicons gerado em reação em cadeia da polimerase (PCR). Foram identificados um par de primers
gênero-específicos, que apresentam boa sensibilidade e especificidade na detecção de DNA do gênero Prochilodus. Quanto aos
primers espécie-específicos, foi encontrado um par que apresentou amplificação apenas para DNA de Pochilodus argenteus. O
presente trabalho também obteve sucesso na extração de DNA de petrechos de pesca (uma rede e uma tarrafa) que foram utilizados
para coleta de espécimes de Prochilodus argenteus e Prochilodus costatus. Através de PCR utilizando marcadores mito-
condriais, foi possível detectar a presença de material genético de Prochilodus no DNA extraído dos petrechos de pesca. Os dados
obtidos a partir do sequenciamento de Prochilodus argenteus e Prochilodus costatus também permitiram a identificação de
dezenas de milhares de marcadores microssatélites, que ainda precisam ser avaliados quanto à aplicabilidade para a identificação
de espécies e para estudos de diversidade. A tecnologia apresentada no presente trabalho possui potencial para ser expandida para
outras espécies e para ser aplicada em estudos de ecologia molecular, genética de conservação e na área forense como meio de
determinação de materialidade de delitos e, consequentemente, fortalecimento da prova pericial no âmbito jurídico.
Resumos | Revista de Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016 |

Characterization of molecular markers


applied to the identification of two fish
species of forensic interest: Prochilodus
argenteus and Prochilodus costatus
Abstract

The increasing concern about environmental issues added to specific legislation aiming inhibition of environmental
damage gave rise to new challenges in forensic science. Regarding fishing activities, there are several laws with
the purpose of protecting fishing resources. On the other hand, the correct identification at species-level of samples
seized in enforcement actions is far from accurate. Thus, it became extremely important the establishment of tech-
niques that enable the correct identification of the seized samples, ideally through easy handling protocols. This
would strength the enforcement actions and the juridical proof. Considering this, molecular techniques can provide
species-specific markers for unambiguously identification. This information is important in juridical process for de-
termining if seized samples are indeed from one of the species whose fishing is prohibited. The aim of this study
was to characterize molecular markers for two fish species: Prochilodusargenteus and Prochilodus costatus. Both
species present great ecological and economic relevance in São Francisco river basin. The genomic DNA of both
species were sequenced and a de novo assembly was carried out, as well as the annotation of mitochondrial DNA
sequences and its comparison to the mitogenomes of a closely related species: Prochilodus lineatus. Genus-spe-
cific and species-specific markers were selected considering its potential ability of genus and species identification
based just on the PCR products sizes through electrophoresis gel. One pair of genus-specific primers presented
highly sensitivity and specificity for Prochilodus genus. Regarding species-specific primers, one pair proved to be
specific for Prochilodus argenteus. The present study was also able to extract DNA from fishing artefacts used
for Prochilodus argenteus and Prochilodus costatus capture. Prochilodus DNA was detected in those artefacts
through PCR using mitochondrial markers. Genomic DNA sequencing also enabled the identification of dozens
of thousands microsatellites markers. Later, they are going to be evaluated for species identification and genetic
diversity studies. The methodology presented in this project can be potentially applied to other species and used for
molecular ecology studies, conservation genetics and in the forensic science, establishing crimes materiality and,
consequently, strengthening the juridical proof.

CHAGAS, A.T.A. Caracterização de marcadores moleculares com aplicabilidade para identificação de duas espécies de peixe
com interesse forense: Prochilodus argenteus e Prochilodus costatus. 2015. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de
Minas Gerais, Programa de Pós-graduação em Genética, Belo Horizonte.

ORIENTADA: Aline Torres de Azevedo Chagas


ORIENTADOR: Evanguedes Kalapothakis
Data de defesa: 03/07/2015.

49
rcml
revista criminalística
e medicina legal
revista criminalística e medicina legal
v.1 | n.1 | 2016 | p. 50-51

Microespectroscopia no Infravermelho Médio por


Transformada de Fourier no modo Reflexão Total
Atenuada e técnicas quimiométricas aplicadas
à detecção de fraudes em documentos

Resumo

Cruzamento de traços, datação de tintas e lavagem química são alguns dos principais problemas que desafiam a Documentoscopia.
As técnicas convencionais de ampliação não produzem resultado conclusivo para amostras de linhas sobrepostas, posto que as cores
mais escuras causam a ilusão de óptica de que estão por cima das mais claras, sendo este o caso ou não. Há circunstâncias em que
a falsidade documental se dá por anacronismo, que se mostra, por exemplo, em documento emitido em data posterior àquela nele
declarada. Nesse cenário, é imprescindível a verificação de quando o documento foi concebido para alcançar a realidade dos fatos.
Ainda, na situação de documentos lavados por imersão total, nos chamados “banhos químicos”, não se observam borrões e, à vista
disso, cabe ao perito documentoscópico buscar outras evidências de que houve fraude. A Espectroscopia no Infravermelho é ideal
para análise forense de tintas em documentos porque combina a seletividade química com o fato de ser uma técnica não destrutiva
e que não requer nenhum preparo da amostra. A natureza multivariada e altamente correlacionada dos dados espectroscópicos
exige que sejam tratados por ferramentas quimiométricas, que permitem a extração do máximo de informação desses sistemas
multicomponentes. Nesse contexto, esse trabalho objetivou: i) determinar a sequência cronológica de traços em regiões de inter-
seção heterogênea (envolvendo impressão e tinta de caneta); ii) discriminar e datar tintas envolvidas em interseções homogêneas
(envolvendo canetas diferentes); e iii) detectar lavagem química em Certificado de Registro e Licenciamento de Veículos (CRLV) por
Microespectroscopia no Infravermelho Médio por Transformada de Fourier no Modo Reflexão Total Atenuada (µATR-FTIR) e Análise
Discriminante por Mínimos Quadrados Parciais (PLS-DA). Interseções de linhas heterogêneas e homogêneas foram produzidas por
quatro marcas de canetas esferográficas azuis, impressora a laser e a jato de tinta, com intervalo de sete dias entre as inscrições
para garantir a secagem da tinta do primeiro traço. As amostras de cruzamento homogêneo foram submetidas a envelhecimento
acelerado por exposição a lâmpada incandescente de 60 Watts por seis horas contínuas. Com o propósito de reproduzir fraudes por
lavagem química dos dados do comprador ou do vendedor no documento, escreveram-se as letras “doc” com caneta esferográfica
azul próximo a letras impressas do verso deste. Utilizando-se uma mistura adequada de solventes, removeu-se cuidadosamente a
escrita. A partir das imagens espectrais das amostras de cruzamento heterogêneo e homogêneo e de lavagem foram escolhidos
pontos de maior intensidade da banda sob a qual a imagem química foi formada. Construíram-se modelos de PLS-DA com os pontos
selecionados. O método proposto mostrou-se adequado para os casos de cruzamento heterogêneo onde se utilizou impressão a
laser e também impressão a jato de tinta, na medida em que agrupou os pontos de cruzamento e impressão quando era esperado
e não o fez na disposição natural de traços, em que a tinta de caneta foi lançada sobre a linha impressa, o que configuraria um falso
positivo. Além disso, o método foi capaz de diferenciar os traços de cinco das seis amostras de interseção homogênea estudadas.
Na etapa de datação, o tempo de exposição a envelhecimento acelerado não foi suficiente para provocar degradação dos colorantes
das tintas detectável pela técnica empregada. No que tange à detecção da lavagem química, foi verificada remoção parcial da tinta
de impressão offset, original do reverso do documento, por µATR-FTIR e PLS-DA e remoção parcial da tinta fluorescente amarela
de fundo do anverso por incidência de radiação na região do ultravioleta. Conclui-se que a técnica µATR-FTIR aliada a métodos qui-
miométricos, como PLS-DA, e a incidência de radiação UV mostraram-se adequadas para elucidação de diferentes tipos de fraudes
em documentos, sendo ferramentas úteis à Documentoscopia.
Resumos | Revista de Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016 |

Micro-Attenuated Total Reflection


Fourier Transform Infrared
Spectroscopy and chemometric methods
applied to detection of document fraud
Abstract

Overlapping lines, ink dating and chemical erasure are some of the major challenges that analysis of questioned doc-
uments faces. Conventional magnification techniques do not provide conclusive results for samples of overlapping
lines, since darker colors cause the optical illusion that they are on top of the clearest ones, whether or not this is the
case. There are circumstances in which the document falsity occurs by anachronism, seen for example, in a document
issued at a later date than the one stated in it. In this scenario, the verification of when the document was designed is
essential to achieve the reality of the facts. Also, in the situation of documents washed by total immersion, called “chem-
ical baths”, blurs are not observed and therefore, forensic document examiners should look for other evidence that a
fraud was committed. Infrared Spectroscopy is ideal for forensic analysis of inks on documents because it combines
the chemical selectivity with the fact it is a non-destructive technique that requires no sample preparation. Multivariate
and highly-correlated nature of spectroscopic data requires it to be processed by chemometric tools, which allow the
extraction of the maximum amount of information from these multicomponent systems. In this context, this study aims
to: i) determine the chronological sequence of strokes in heterogeneous intersection regions (involving printing and
ink pen); ii) discriminate and date inks involved in homogeneous intersections (involving different pens); and iii) detect
chemical erasure in CRLV (Certificate of Registration and Licensing of Vehicles) by Micro-Attenuated Total Reflection
Fourier Transform Infrared Spectroscopy (µATR-FTIR) and Partial Least Squares for Discriminant Analysis (PLS-DA).
Overlaps of heterogeneous and homogeneous lines were produced by four brands of blue ballpoint pens, laser printer
and inkjet, with an interval of seven days between registrations to ensure ink drying of the first stroke. Homogeneous
overlapping samples were subjected to accelerated aging by exposure to incandescent lamp (60W) for six hours
continuously. In order to reproduce fraud by chemical erasure of buyer or seller data in the document, the letters “doc”
were written with blue ballpoint pen near printed letters on the back of the document. Using a suitable mixture of sol-
vents, the writing was carefully removed. From the spectral images of homogeneous and heterogeneous overlapping
samples and erasure samples, points were chosen that had greatest intensity of the band under which the chemical
image was formed. PLS-DA models with the selected points were constructed. The proposed method showed to be
adequate in cases of heterogeneous line overlapping in which laser and inkjet printing were used, since the method
have grouped overlapping and printing points when expected and did not in the natural disposition of strokes, in which
ink pen was dropped on the printed line, which would set a false positive. Furthermore, the method was able to differ-
entiate the strokes of five among the six analyzed samples of homogeneous overlapping lines. In the dating stage, the
accelerated aging exposure time was not sufficient to cause the degradation of ink colorants that could be detected
by the technique. Regarding the detection of chemical erasure, partial removal of the offset printing ink, original to the
back of the document, was verified by µATR-FTIR and PLS-DA as well as partial removal of the background yellow
fluorescent ink from the front of the document by incidence of ultraviolet region radiation. In general the µATR-FTIR
technique combined with chemometric methods, such as PLS-DA, and the UV incidence proved to be suitable for
elucidation of different types of document fraud, being useful tools for document analysis.

FERREIRA, L.P. Microespectroscopia no Infravermelho Médio por Transformada de Fourier no modo Reflexão Total Atenuada
e técnicas quimiométricas aplicadas à detecção de fraudes em documentos. 2015. Dissertação (Mestrado) – Universidade
Federal de Minas Gerais, Departamento de Química do Instituto de Ciências Exatas, Belo Horizonte.

Autora: Luisa Pereira e Ferreira


Orientadora: Clésia Cristina Nascentes
Data de defesa: 25/02/2015

51
rcml
revista criminalística
e medicina legal
revista criminalística e medicina legal
v.1 | n.1 | 2016 | p. 52-53

SUICÍDIO E SENTIDO DA VIDA:


uma análise de cartas de suicidas a partir
da teoria do sentido da vida de Viktor Frankl
Resumo

Este trabalho trata da questão do suicídio como uma possibilidade de escolha que pode se apresentar a qualquer sujeito em deter-
minado momento de sua vida. Tomando como base a psicologia fenomenológico-existencial, mais precisamente os estudos de Viktor
Frankl sobre o sentido da vida, busca-se compreender, através da análise das cartas de suicidas, os motivos que levam um sujeito
ao autoextermínio. O tema foi derivado da pesquisa “Sentidos existenciais manifestos em cartas de suicidas”, que analisa os bilhetes
deixados por suicidas, arquivados nos laudos periciais do Instituto de Criminalística de Belo Horizonte. A metodologia utilizada foi,
além da pesquisa bibliográfica, a pesquisa documental, em que se utilizou das cartas de suicidas para coleta dos dados. Trata-se, de
uma pesquisa qualitativa, que busca compreender a significação atribuída por cada indivíduo a determinado fenômeno. Para a análise
das cartas, utilizou-se o método fenomenológico-hermenêutico, de se apropriar do texto para conhecer o sentido total da experiência.
Buscou-se, neste trabalho, analisar as cartas selecionadas a fim de identificar elementos que auxiliem na compreensão do sentido da
vida para as pessoas que buscam o autoextermínio. Foi possível constatar que culpa, dor e morte são elementos fundamentais para
se compreender o sentido da existência para os autores das cartas analisadas. E que a falta de sentido na vida, embora não seja fator
determinante para o suicídio, contribui significativamente para esta tomada de decisão.
Resumos | Revista de Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016 |

SUICIDE AND MEANING OF LIFE:


an analysis of suicide letters from
the theory of life’s meaning of Viktor Frankl

Abstract

This paper deals with the question of suicide as a possibility of choice that could be presented to anyone at
a determined moment in life. Taking existential-phenomenological psychology as basis, more precisely the
studies of Viktor Frankl about the meaning of life, we try to comprehend through analysis of letters written by
suicidal, the reasons that motivate a being to self-destruction. This theme was derived from the research “Ex-
istential Senses Manifested in Suicidal Letters”, that analyzes the notes left by suicidal, archived at forensic
reports of the Criminalistics Institute of Belo Horizonte. Besides the bibliographic research, the methodology
utilized included the documental research and the data collection from suicidal letters. It is about a qualitative
research that pursues to understand the meaning attributed by each individual to a determined phenomenon.
For the analysis of the letters, the hermeneutic-phenomenological method was utilized to appropriate the text
in order to grasp the total meaning of the experience. In this work, it was sought to analyze selected letters
with the purpose of identifying elements that give support in the comprehension of the meaning of life by
people who attempt self-destruction. It was possible to establish that guilt, sorrow, and death are fundamental
elements in order to apprehend the meaning of existence by the authors of the analyzed letters. And that the
lack of meaning in life, even though not being the determinant factor for suicide, significantly contributes for
making the decision.

CARVALHO, F.F. Suicídio e sentido da vida: uma análise de cartas de suicidas a partir da teoria do sentido da vida de Viktor Frankl.
2015. 53f. Monografia (Graduação em Psicologia) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Curso de Psicologia, Betim.

ORIENTADA: Francielle Fátima de Carvalho


ORIENTADOR: Manoel Deusdedit Júnior
Data de defesa: 23/11/2015

53
NORMAS PARA
PUBLICAÇÃO
Normas para publicação | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Normas para submissão de manuscritos descobertas com relação a aspectos experimentais


ou observacionais. Sua estrutura traz os seguintes
A Revista de Criminalística e Medicina Legal itens: Título; Title; Autores; Resumo; Palavras-chave;
(RCML) é um periódico semestral destinado à divul- Abstract; Keywords; Introdução; Material e Métodos;
gação de produção científica na área de Criminalísti- Resultados e Discussão (juntos ou separadamente);
ca e Medicina Legal. Conclusão; Agradecimentos (opcional); Referências.
Os artigos encaminhados serão submetidos à Deverá se limitar a 15 laudas.
avaliação de até três especialistas na área pertinente Artigos de Revisão: São trabalhos que têm por
à temática do artigo. objeto resumir, analisar, avaliar ou sintetizar trabalhos
Para a avaliação, solicita-se que o manuscrito de investigação já publicados em revistas científicas.
seja enviado para o e-mail contato@revistacml.com.br Sua estrutura traz os seguintes itens: Título; Title; Au-
juntamente com um ofício no qual o autor responsável tores; Resumo; Palavras-chave; Abstract; Keywords;
pela interlocução com os editores declara se respon- Introdução; Itens da revisão distribuídos a critério dos
sabilizar pela ciência e concordância dos demais au- autores; Considerações Finais; Agradecimentos (op-
tores, se houver, em publicar o manuscrito, se apro- cional); Referências. Deverá se limitar a 15 laudas.
vado, na Revista de Criminalística e Medicina Legal. Relatos de Casos: São artigos que apresentam
Tal ofício deverá ser assinado pelo autor responsá- dados descritivos de um ou mais casos relevantes
vel, constando seu endereço eletrônico e telefone de diante do conhecimento científico atual. Sua estrutu-
contato, digitalizado e encaminhado juntamente com ra traz os seguintes itens: Título; Title; Autores; Resu-
o manuscrito para os editores. Serão aceitos ape- mo; Palavras-chave; Abstract; Keywords; Introdução;
nas trabalhos redigidos em língua portuguesa. Res- Casuística; Discussão; Considerações Finais; Agra-
salta-se que as opiniões e conceitos emitidos pelos decimentos (opcional); Referências. Deverá se limitar
autores são de sua exclusiva responsabilidade, não a 10 laudas.
refletindo, necessariamente, a opinião do conselho Resenhas: São textos que trazem aspectos
editorial da revista. descritivos e analíticos de obra recentemente publi-
Os artigos que resultarem de pesquisas experi- cada e de relevância para a Criminalística e a Medici-
mentais envolvendo seres humanos devem ter expli- na Legal. Sua estrutura traz os seguintes itens: Iden-
citado no corpo do trabalho o protocolo de aprovação tificação da Obra (título, nome dos autores/editores/
por Comitê de Ética reconhecido pelo CONEP (Co- organizadores, edição, volume, local e editora, núme-
missão Nacional de Ética em Pesquisa); bem como ro de páginas, ano da publicação e ISBN); Desenvol-
aquelas que envolverem animais vertebrados o pro- vimento em texto único; Considerações Finais; Agra-
tocolo de aprovação por Comissão de Ética no Uso decimentos (opcional). Deverá se limitar a 5 laudas.
de Animais reconhecido pelo CONCEA (Comissão Resumos de Monografias, Dissertações e
Nacional de Controle de Experimentação Animal). Teses: Resumos em parágrafo único com até 4000
Para Relatos de Casos não serão exigidos protoco- dígitos, incluindo espaços, acompanhado da versão
los de aprovação em Comissões de Ética. Em todos em inglês, bem como título e title, trazendo a refe-
os casos o comitê editorial se reserva o direito de de- rência da monografia, dissertação ou tese de acordo
liberar sobre a forma de apresentação, em qualquer com as normas desta revista. Ao final devem vir os
modalidade de artigo, no que concerne à preserva- nomes completos do autor e do orientador, data de
ção da identidade de pessoas físicas e jurídicas, e à defesa (dd/mm/aaaa), local, instituição e curso de
exposição de dados relativos a casos não transitados graduação ou pós-graduação onde foi defendida.
em julgado em qualquer esfera judicial, que possam
comprometer tais procedimentos. FORMA DE APRESENTAÇÃO DOS MANUSCRITOS

INSTRUÇÕES PARA O PREPARO E Os manuscritos de todas as categorias devem


ENVIO DE MANUSCRITOS seguir os seguintes critérios:
Digitação: O texto deverá ser digitado com o
INFORMES GERAIS uso do editor de texto “Microsoft Word for Windows”,
versão 6.0 ou superior, em formato A4 (21,0 x 29,7),
Artigos Originais: São trabalhos resultantes de com espaço 1,5, justificado, com margens esquerda,
pesquisa científica apresentando dados originais de direita, superior e inferior de 2,5 cm, fonte “Times New

56
Normas para publicação | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

Roman” tamanho 12. Deve ser colocada numeração A figura 1 apresenta... ou ...os resultados foram se-
de linhas em todo o texto. Cada item do texto deverá melhantes (tabela 1). Uma vez aprovado o manus-
ser digitado em negrito, e os demais níveis em itálico crito para publicação, serão solicitados arquivos em
negrito, e itálico sem negrito. Exemplo: Item; Sub-i- .jpg separadamente para cada ilustração utilizada.
tem; Sub-sub-item. As páginas devem ser numera- Todas as ilustrações e tabelas devem possuir legen-
das no canto superior direito. das localizadas junto às mesmas, conforme exem-
Título: Deve conter no máximo 25 palavras e plos a seguir:
ser digitado em caixa alta e centralizado, nas versões
das línguas portuguesa e inglesa. Deve ser conciso e
exprimir com clareza o conteúdo do trabalho.
Autoria: Deve ser apresentada logo após o título,
com nome(s) completo(s) do(s) autor(es) alinhado(s)
à esquerda, numerado(s) de forma sobrescrita, apre-
sentando abaixo a sequência numérica indicando o
local de trabalho ou estudo. Um dos autores deverá
ser identificado com asterisco (*) como aquele para Figura 1: Padrão gráfico do rabisco da criança ameaçada.
interlocução, apresentando seu endereço eletrônico.
Resumo e Abstract: Devem ser apresentados Tabela 1: Incidência de homicídios de acordo
logo após a autoria, com informações que permitam a com a faixa etária da vítima na zona rural de Silvópolis-MG,
adequada caracterização do artigo como um todo. No entre os anos de 1910 e 1911.
caso de artigos originais devem informar o objetivo, a
Faixa etária da vítima Incidência de
metodologia aplicada, os resultados principais e as con- (anos) homicídios (%)
clusões. Devem conter até 2000 dígitos, incluindo espa-
ços. O abstract deve ser uma tradução fiel do resumo. 0-20 63 / 252 (25,0) ab
Palavras–chave e Keywords: No máximo 5 21-40 59 / 252 (23,4) ab
palavras-chave e keywords apresentadas em segui-
41-60 52 / 252 (20,6) b
da ao Resumo e ao Abstract, respectivamente, sepa-
radas entre si por ponto e vírgula. 61-80 78 / 252 (31,0) a
Texto principal: As unidades de medida utiliza- a; b significa diferença significativa entre linhas
das devem ser as consagradas pelo Sistema Métrico (P<0,05).
Internacional (kg, cm, mol,...). Abreviaturas, quando
utilizadas pela primeira vez, devem vir inicialmente Referências
por extenso, seguidas de sua forma abreviada entre
parêntesis. Por exemplo: O Instituto de Criminalística A lista de referências será apresentada de acordo
(IC) realiza... As referências deverão ser apresenta- com a ordem em que aparecem no texto. Obras anôni-
das no texto por meio de números arábicos sobres- mas terão sua entrada a partir do título do artigo ou pela
critos imediatamente após a citação feita, segundo a entidade responsável por sua publicação. Cada referên-
ordem em que apareçam no texto. Por exemplo: ...foi cia deverá ser antecedida de sua respectiva numeração,
considerada relevante em alguns casos 1, 2, mas não conforme indicada no texto, alinhada à esquerda e sem
em outros 3, 4. recuos. À excessão de artigos em periódicos científicos,
Ilustrações e Tabelas: Serão aceitas ilustra- toda referência obtida pela internet deverá ser acompa-
ções (fotografias, quadros, gráficos) e tabelas que nhada do endereço eletrônico e data de acesso. Exem-
sejam essenciais ao bom entendimento do trabalho, plos de formatação de referências estão a seguir:
não sendo aceitas aquelas meramente decorativas.
Ilustrações e tabelas que não sejam inéditas devem Artigos publicados em periódicos científicos
estar acompanhadas da fonte original, descrita no 1- RODRIGUES, N.M.; GUEDES, M.; AUGUSTI, R.;
seu rodapé. Em artigos de revisão, ilustrações pró- MARINHO, P.A. Contaminação de cocaína em cédulas de di-
prias dos autores, não publicadas anteriormente, nheiro em Belo Horizonte-MG. Revista Virtual de Quími-
devem vir acompanhadas da expressão “arquivo ca, v.5, p.125-136, 2013.
pessoal”. Qualquer ilustração ou tabela deve ser re- Artigos e resumos publicados em anais de encontros téc-
ferenciada antecipadamente no texto. Por exemplo: nico-científicos

57
Normas para publicação | Revista Criminalística e Medicina Legal | n.1 | V.1 | 2016

2- MARINHO, P.A.; ALVAREZ-LEITE, E.M. Quantifica- Monografias, dissertações e teses


ção de LSD em amostras ilícitas por cromatografia líquida de 6- CARVALHO, F.F. Suicídio e sentido da vida: uma
alta eficiência. In: XVI Congresso Brasileiro de Toxicologia, análise de cartas de suicidas a partir da teoria do sen-
2009, Belo Horizonte. Revista Brasileira de Toxicolo- tido da vida de Viktor Frankl. 2015. 53f. Monografia (Gradu-
gia, v.22, p.42, 2009. ação em Psicologia) – Pontifícia Universidade Católica de Minas
3- SANTOS, V.R.D.; SOUZA, J.V.S.; CALIGIORNE, S.M.; Gerais, Curso de Psicologia, Betim.
PEREIRA, F.S. Identificação de ossada humana através da aná-
lise de microssatélites de DNA nuclear. In: I Congresso Brasileiro Leis, decretos, normas, etc
de Genética Forense, 2007, Anais... Belém. 2007. 7- BRASIL. Lei n. 11.794, de Outubro de 2008. Regulamenta
o inciso VII do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, estabele-
Livros e capítulos de livros cendo procedimentos para o uso científico de animais; revoga a
4- PASSAGLI, M. Toxicologia forense - teoria e prá- Lei no 6.638, de 08 de maio de 1979; e dá outras providências.
tica. 4.ed. Campinas:Millennium, 2013. Diário Oficial da União, Brasília, 08 de outubro de 2008, p.8.
5- DIAS, S.M.; VELHO, J.A. Acidentes de trânsito. In: VE- 8- BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abasteci-
LHO, J.A.; GEISER, G.C.; ESPINDULA, A. (Org.) Ciências fo- mento – MAPA. Manual de Legislação - Programas Na-
renses – uma introdução às principais áreas da crimi- cionais de Saúde Animal do Brasil. Brasília, 2009.
nalística moderna. 2.ed. Campinas:Millennium, 2013, cap.16.
Documentos eletrônicos
9- UNITED NATIONS OFFICE ON DRUG AND CRIME.
World Drug Report, 2013. Disponível em: <http://www.uno-
dc.org/unodc/secured/wdr/wdr2013/World_Drug_Report_ 2013.
pdf>. Acesso em: 09 de maio de 2014.

58

Você também pode gostar