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Unidade 3 – Conjuntos

Definição. Um conjunto A é uma coleção não ordenada de objetos. Dizemos que a pertence a
A e escrevemos a ∈ A se a for um elemento de A. O sı́mbolo a ̸∈ A significa que a não pertence
a A.
Exemplo. O conjunto A = {1, 3, 5, 7, 9} é o conjunto dos números naturais ı́mpares menores do
que 10. Outra forma de representar esse mesmo conjunto é A = {n ∈ N | n é ı́mpar e n < 10}.
Note que {3, 5, 1, 9, 7} representa o mesmo conjunto, pois conjuntos são coleções não ordenadas
de elementos. Assim a ordem em que escrevemos os elementos não influi.
Definições. Dizemos que um conjunto A está contido em um conjunto B e escrevemos A ⊆ B
se e somente se qualquer elemento de A é elemento de B.
Em sı́mbolos A ⊆ B ⇐⇒ (∀x ∈ A)( x ∈ B). Também podemos escrever B ⊇ A e ler “B contém
A”.
Quando A ⊆ B, dizemos que A é um subconjunto de B, ou ainda, que A é uma parte de B.
Dois conjuntos A e B são iguais quando possuem os mesmos elementos, ou seja,
A = B ←→ A ⊆ B e B ⊆ A.
Em alguns livros aparece a notação A ⊂ B para dizer que A está contido em B. Note que se
A e B forem iguais, então A está contido em B. Por essa razão vamos preferir a notação ⊆,
análoga a ≤ para números.

Em geral, trabalhamos dentro de um conjunto U, chamado de conjunto universo. Se P (x)


designa uma certa propriedade envolvendo um elemento x, podemos formar o conjunto A =
{x ∈ U | P (x)} de todos os elementos x ∈ U que satisfazem a propriedade P (x). Já vimos,
acima, o exemplo A = {n ∈ N | n é ı́mpar e n < 10}. Neste caso, U = N e P (n) é a propriedade
n é ı́mpar e n < 10.

Observação. Note que a definição “estar contido” com a noção de conjunto universo pode ser
escrita usando uma implicação. Mais precisamente, dados subconjuntos A e B do universo U,
temos A ⊆ B ⇐⇒ (∀x ∈ U)[x ∈ A −→ x ∈ B].

Notação. O sı́mbolo ∅ designa o conjunto vazio, que não contém nenhum elemento.

Teorema. O conjunto vazio está contido em qualquer conjunto.


Demonstração: Seja A um conjunto qualquer. Vamos provar que ∅ ⊆ A. A demonstração
será por absurdo.
Por absurdo, suponhamos que ∅ ̸⊆ A (∅ não está contido em A).
Dizer que ∅ ⊆ A equivale a dizer que (∀x ∈ ∅)( x ∈ A). Negando essa sentença, temos que
nossa hipótese de que ∅ ̸⊆ A implica que (∃x ∈ ∅)( x ̸∈ A). Mas isto é um absurdo, pois ∅
não possui nenhum elemento (qualquer proposição que inicie com ∃x ∈ ∅ é falsa). O absurdo
resultou de ter feito a hipótese de que ∅ ̸⊆ A. Logo ∅ ⊆ A. 

Definição. Se existirem exatamente n elementos no conjunto A, onde n ≥ 0 é inteiro, diremos


que A é finito e que n é a sua cardinalidade. Denotamos este fato por |A| = n, ou ainda por
#A = n.
Se um conjunto A não for finito, dizemos que A é infinito.
Exemplo. A = {a, e, i, o, u} é finito, com |A| = #A = 5.
O conjunto N = {1, 2, 3, 4, . . .} dos números naturais é infinito.
Definição. Seja A um conjunto. O conjunto das partes de A é o conjunto ℘(A) de todos os
subconjuntos de A.
Os elementos de ℘(A) são os subconjuntos de A. Como o vazio ∅ está contido em qualquer
conjunto e como para qualquer conjunto A vale A ⊆ A, temos que, para qualquer conjunto A,
∅ ∈ ℘(A) e A ∈ ℘(A).

Exemplo.

1. Para A = ∅, temos ℘(A) = {∅} e |℘(A)| = 1.


2. Para A = {a}, temos ℘(A) = {∅, A}, |A| = 1 e |℘(A)| = 2.
{ }
3. Para A = {a, b}, temos ℘(A) = ∅, {a}, {b}, A , |A| = 2 e |℘(A)| = 4.
{ }
4. Para A = {a, b, c}, temos ℘(A) = ∅, {a}, {b}, {c}, {a, b}, {a, c}, {b, c}, A , |A| = 3 e
|℘(A)| = 8.

Com base nesse exemplo, fazemos a seguinte conjectura.

Conjectura. Se |A| = n, então |℘(A)| = 2n , ou seja, para qualquer conjunto finito A, temos
que |℘(A)| = 2|A| .

Uma justificativa intuitiva para a validade de nossa conjectura é a seguinte. Suponhamos que
B seja o conjunto obtido acrescentando um novo elemento b ao conjunto finito A. Quem são
as partes de B?
Cada subconjunto D = {d1 , d2 , . . . , dk } ⊆ A dá origem a dois subconjuntos de B, a saber,
D e {b, d1 , d2 , . . . , dk }.
Por exemplo, sejam A = {r, s, t} e B = {b, r, s, t}. Cada elemento de ℘(A) dá prigem a
dois elementos de ℘(B). Por exemplo,
{r, t} ∈ ℘(A) dá origem a {r, t} ∈ ℘(B) e {b, r, t} ∈ ℘(B)
{s} ∈ ℘(A) dá origem a {s} ∈ ℘(B) e {b, s} ∈ ℘(B)
∅ ∈ ℘(A) dá origem a ∅ ∈ ℘(B) e {b} ∈ ℘(B)
etc.
Portanto, a cada novo elemento que se acrescente a um conjunto, vai fazer com que duplique
o número de partes do conjunto. Portanto, iniciando com o vazio, que tem 0 partes e acrescen-
tando os n elementos de A um a um, o número de subconjuntos que podem ser formados vai
ser multiplicado por 2 n vezes. Logo, se |A| = n, então |℘(A)| = 2n .

Vejamos agora como essa justificativa intuitiva pode ser tornada rigorosa.

Teorema. Se |A| = n, então |℘(A)| = 2n , ou seja, para qualquer conjunto finito A, temos que
|℘(A)| = 2|A| .

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Demonstração: Vamos provar por indução.
Para cada n ≥ 0 inteiro, consideremos a afirmação
P (n) : Se A for um conjunto finito e |A| = n, então |℘(A)| = 2n .
Base de indução: P (0) é verdadeira. De fato,

℘(∅) = {∅}, |∅| = 0, |℘(∅)| = 1 e 20 = 1.

Passagem de indução: Suponhamos que, P (n) seja verdadeira para algum n (hipótese de
indução).
Vamos mostrar que isso implica que P (n + 1) também é verdadeira. Para isso, seja B um
conjunto qualquer com |B| = n + 1. Então B é da forma

B = {b1 , b2 , . . . , bn , bn+1 }.

Separamos o elemento bn+1 e consideramos o conjunto A = {b1 , b2 , . . . , bn }. Então, pela hipótese


de indução, |℘(A)| = 2n , pois |A| = n.
Como acima, cada subconjunto D ∈ ℘(A), D = {d1 , d2 , . . . , dk }, dá origem dois subconjuntos
pertencentes a ℘(B), a saber D = {d1 , d2 , . . . , dk } ∈ ℘(B) e {bn+1 , d1 , d2 , . . . , dk } ∈ ℘(B).
Segue que
|℘(B)| = 2 · |℘(A)| = 2 · 2n = 2n+1 .
Portanto P (n + 1) também é verdadeira.
Logo, se P (n) for verdadeira para algum n, então P (n + 1) também é verdadeira.
Logo P (n) é verdadeira para qualquer inteiro n ≥ 0. 

Notação. Por causa desse teorema, em alguns livros se encontra a notação 2A para o conjunto
das partes de A.

Operações com conjuntos


Produto cartesiano.
Definição. Sejam A e B dois conjuntos. O produto cartesiano A × B é o conjunto de todos os
pares ordenados (x, y) tais que x ∈ A e y ∈ B.

A × B = {(x, y) | x ∈ A e y ∈ B}.

Exemplo. Se A = {u, v} e B = {a, b, c}, temos

A × B = {(u, a), (u, b), (u, c), (v, a), (v, b), (v, c)}

e
B × A = {(a, u), (a, v), (b, u), (b, v), (c, u), (c, v)}.
Note que A×B ̸= B ×A (ou seja, o produto cartesiano não é uma operação comutativa), exceto
em alguns casos bem particulares como quando A = B ou quando um dos dois conjuntos é

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vazio. Por exemplo, se A = ∅, então ∅ × B = B × ∅ = ∅, pois não se pode formar par ordenado
algum com uma das coordenadas pertencente ao vazio.

Teorema. Se A e B forem conjuntos finitos, com |A| = n e |B| = m, então |A × B| = nm.

Demonstração: Por indução.


Para cada n ∈ N, seja P (n) a afirmação

P (n) : Se |A| = n e B for um conjunto finito, então |A × B| = n|B|.

Base de indução: P (0) é verdadeira.


De fato, se |A| = 0, isto é, A = ∅ e se B = {b1 , b2 , . . . , bm } tiver m elementos, então
A × B = ∅ × B = ∅.
Logo |A × B| = 0 = 0 · m = |A| · |B|.
Passagem de indução: Suponhamos que, para um certo n ∈ N0 , vale P (n) (hipótese de indução).
Vamos mostrar que então vale também P (n + 1). Para mostrar isso, seja A um conjunto
qualquer com |A| = n + 1, digamos A = {a1 , a2 , . . . , an+1 }.
Dado um conjunto finito B = {b1 , b2 , . . . , bm }, consideramos o produto cartesiano A′ × B, onde
A′ = {a1 , a2 , . . . , an } é obtido retirando-se um elemento de A.
O produto cartesiano A × B é formado pelos elementos de A′ × B mais os elementos (an+1 , b1 ),
(an+1 , b2 ), . . . e (an+1 , bm ). Logo
|A × B| = |A′ × B| + m.
Como |A′ | = n, a hipótese de indução nos diz que |A′ × B| = nm. Logo
|A × B| = nm + m = (n + 1)m = |A| · |B|.
Logo vale também P (n + 1).
Logo P (n) é verdadeira para qualquer n. 

Notação. Em vez de A × A, usa-se também a notação A2 .

Definição. Pode-se fazer o produto cartesiano de mais do que dois conjuntos. Por exemplo,
A × B × C é definido como sendo o conjunto das ternas ordenadas
A × B × C = {(x, y, z) | x ∈ A, y ∈ B, z ∈ C }.
Dados conjuntos A1 , A2 , . . . , Ap ,
A1 × A2 × . . . × Ap = {(x1 , x2 , . . . , xp ) | (∀i)( xi ∈ Ai )}.
No caso em que A1 = A2 = . . . = Ap = A, também se usa a notação Ap = A1 × A2 × . . . × Ap .

Teorema (Princı́pio Multiplicativo). |A1 × A2 × . . . × Ap | = |A1 | · |A2 | · . . . · |Ap |.

Aplicação. Vejamos dois exemplos de aplicação do Princı́pio Multiplicativo.


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1. João tem duas calças e três camisas. De quantas maneiras ele pode se vestir?
Temos um conjunto A formado por duas camisas e um conjunto B formado por três
calças. Cada maneira de João se vestir é caracterizada por um par ordenado em que a
primeira coordenada é um elemento de A e a segunda coordenada é um elemento de B.
Portanto a resposta é |A × B| = 2 · 3 = 6.

2. Quantas placas de automóvel podem ser formada usando três letras seguidas de quatro
dı́gitos?
Seja A o alfabeto de 26 letras e seja B = {0, 1, 2, . . . , 9}. Cada possı́vel placa é uma
sequência de sete termos em que os três primeiros elementos pertencem a A e os últimos
quatro pertencem a B. Pelo teorema acima,

|A × A × A × B × B × B × B| = 263 · 104 = 175.760.000

União e interseção.
Definição. Dados dois conjuntos A e B, definimos a união de A e B por

A ∪ B = {x ∈ U | x ∈ A ∨ x ∈ B}

e a interseção de A e B por

A ∩ B = {x ∈ U | x ∈ A ∧ x ∈ B}.

Por exemplo, {a, b, c} ∪ {c, d} = {a, b, c, d} e {a, b, c} ∩ {c, d} = {c}.


Definição. Dizemos que dois conjuntos A e B são disjuntos quando A ∩ B = ∅, ou seja,
quando A e B não têm elementos comuns.
Propriedade. A e B disjuntos =⇒ |A ∪ B| = |A| + |B|.
Essa propriedade é uma consequência imediata da próxima propriedade.
Se A e B não forem disjuntos, ao somar |A| + |B| estamos contando os elementos de A e os
elementos de B, só que os elementos da interseção A∩B estarão sendo contados duas vezes. Por
isso precisamos corrigir, subtraindo os elementos de A∩B. Assim temos a seguinte propriedade.
Propriedade (Princı́pio da inclusão-exclusão para dois conjuntos). Para quaisquer
dois conjuntos A e B finitos, temos

|A ∪ B| = |A| + |B| − |A ∩ B|.

Observação. O nome inclusão-exclusão de deve ao fato de que primeiro (quando somamos


|A| + |B|) incluı́mos os elementos, depois (quando subtraı́mos |A ∩ B|) excluı́mos elementos que
foram somados duas vezes.

Antes de passar a um aplicação, precisamos introduzir uma definição.


Definição. Sejam a, b ∈ N. Escrevemos a | b e lemos a divide b, se (∃c ∈ N)( ac = b). Ou seja,
a divide b quando b for um múltiplo de a.
Por exemplo, 3 | 12, pois 3 · 4 = 12. Também (∀a ∈ N)( a | 0), pois ∃c = 0 tal que a · 0 = 0.

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Se a | b também dizemos que b é divisı́vel por a.

Aplicação. Quantos números naturais n ≤ 100 não são divisı́veis nem por 2 nem por 3 (isto
é, são relativamente primos com 6)?
Um comentário antes de começar a resolução do problema. Lembramos que dois números são
relativamente primos (também se diz primos entre si) quando 1 for o único divisor comum aos
dois números. Por exemplo, 15 e 8 são relativamente primos, os divisores de 15 são 1, 3, 5 e
15, os divisores de 8 são 1, 2, 4 e 8, sendo 1 o único divisor comum. Como os divisores de 6 são
1, 2, 3 e 6, um número n é relativamente primo com 6 se e somente se n não for divisı́vel nem
por 2 nem por 3.
Passando agora à resolução, consideremos o universo U = {n ∈ N | n ≤ 100}. Sejam
{ } { }
A = n ∈ U 2 | n e B = n ∈ U 3 | n .

Estamos interessados nos n ∈ U que não são elementos nem de A nem de B, ou seja, que não
pertencem a A ∪ B. Portanto a resposta do problema é 100 − |A ∪ B|.
Pelo Princı́pio da inclusão-exclusão, |A ∪ B| = |A| + |B| − |A ∩ B|.
A fatoração de 6 em fatores primos é 6 = 2 · 3. Portanto um número natural n é divisı́vel
por 6 se e somente se n for divisı́vel por 2 e por 3. Segue que
{ }
A ∩ B = n ∈ U 6 | n .

Fazendo divisão com resto, temos

100 = 50 · 2 + 0
100 = 33 · 3 + 1
100 = 16 · 6 + 4

Logo
|A| = 50 , |B| = 33 e |A ∩ B| = 16.
Daı́ segue que
|A ∪ B| = 50 + 33 − 16 = 67.
Logo a resposta do problema é 100 − 67 = 33.

Propriedade (Princı́pio da inclusão-exclusão para três conjuntos). Para quaisquer


conjuntos finitos A, B e C vale

|A ∪ B ∪ C| = |A| + |B| + |C| − |A ∩ B| − |A ∩ C| − |B ∩ C| + |A ∩ B ∩ C|.

Justificativa: Seja x ∈ A ∪ B ∪ C. Temos três casos a considerar.


– Se x pertence a um conjunto só, então x foi contado uma vez quando se fez |A| + |B| + |C|

– Se x pertence a exatamente dois conjuntos, por exemplo, se x ∈ A, x ∈ B e x ̸∈ C,


então x foi contado duas vezes quando se fez |A| + |B| + |C|, mas foi descontado uma vez
quando se fez −|A ∩ B| − |A ∩ C| − |B ∩ C|

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– Se x pertence aos três conjuntos, então x contado três vezes quando se fez |A| + |B| + |C|,
foi descontado três vezes quando se fez −|A ∩ B| − |A ∩ C| − |B ∩ C| e foi contado mais
uma vez quande se fez +|A ∩ B ∩ C|.

Em qualquer um dos três casos, x acabou sendo contado exatamente uma vez. Isso justifica a
propriedade.
Aplicação. Quantos números que não excedem 300 são relativamente primos com 30?
A fatoração de 30 em fatores primos é 30 = 2 · 3 · 5. Portanto um número n é relativamente
primo com 30 se e somente se n não for divisı́vel nem por 2, nem por 3 e nem por 5.
Consideremos o universo U = {n ∈ N | n ≤ 300}. Para cada d ∈ N, seja
{ }
Id = n ∈ U d | n .
{ }
Nosso problema é determinar a cardinalidade do conjunto C = n ∈ U n ̸∈ I2 ∪ I3 ∪ I5 . Mas
|C| = 300 − |I2 ∪ I3 ∪ I5 |.
Pelo Princı́pio da inclusão-exclusão,

|I2 ∪ I3 ∪ I5 | = |I2 | + |I3 | + |I5 | − |I2 ∩ I3 | − |I2 ∩ I5 | − |I3 ∩ I5 | + |I2 ∩ I3 ∩ I5 |.

Note que
x ∈ I2 ∩ I3 ⇐⇒ x ∈ I2 ∧ x ∈ I3 ⇐⇒ 2 | x ∧ 3 | x ⇐⇒ x | 6.
Segue que I2 ∩ I3 = I6 . Por raciocı́nio semelhante se mostra que I2 ∩ I5 = I10 , I3 ∩ I5 = I15 e
I2 ∩ I3 ∩ I5 = I30 .
Dividindo 300 por cada um dos números 2, 3, 5, 6, 10, 15 e 30, temos

|I2 | = 150, |I3 | = 100, |I5 | = 60, . . . |I30 | = 10,

de modo que
|I2 ∪ I3 ∪ I5 | = |I2 | + |I3 | + |I5 | − |I2 ∩ I3 | − |I2 ∩ I5 | − |I3 ∩ I5 | + |I2 ∩ I3 ∩ I5 |
= 150 + 100 + 60 − 50 − 30 − 20 + 10
= 220.
Segue que |C| = 300 − 220 = 80. Logo existem 80 números naturais que não excedem 300 e
são relativamente primos com 30.

Diferença.
Definição. Dados dois conjuntos A e B contidos em um conjunto universo U, definimos o
conjunto diferença A − B como sendo

A − B = {x ∈ U | x ∈ A ∧ x ̸∈ B }.

Exemplo. {1, 3, 5, 7, 9} − {1, 2, 3, 4, 5} = {7, 9}.


Definição. Definimos o complementar de A e denotamos por A como sendo o conjunto de
todos os x ∈ U que estão fora de A,

A = {x ∈ U | x ̸∈ A } = U − A.

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Alguns livros usam a notação A \ B para o conjunto diferença e a notação Ac para o comple-
mentar de A.

Teorema. A − B = A ∩ B.
Demonstração: Como já vimos, dois conjuntos são iguais quando o primeiro está contido no
segundo e o segundo está contido no primeiro.
1) Prova de que A − B ⊆ A ∩ B:
Seja x ∈ A − B. Então, pela definição de conjunto diferença, x ∈ A e x ̸∈ B. Segue que x ∈ A
e x ∈ B. Logo x ∈ A ∩ B. Portanto A − B ⊆ A ∩ B.
2) Prova de que A ∩ B ⊆ A − B:
Seja x ∈ A ∩ B. Então x ∈ A e x ∈ B. Segue que ∈ A e x ̸∈ B. Logo x ∈ A − B.
PortantoA ∩ B ⊆ A − B.
Logo A − B = A ∩ B. 
Esse teorema é muito útil pois transforma a diferença de dois conjuntos em uma interseção
de conjuntos e, como veremos a seguir, interseções (e uniões) possuem várias propriedades.

Propriedades das operações com conjuntos

1. Elemento neutro. (∀A)(A ∩ U = A) e (∀A)(A ∪ ∅ = A).


Lembre que para as operações em R, 0 é o elemento neutro da adição e 1 é o elemento
neutro da multiplicação. Isto porque 0 somado a qualquer número não altera esse número,
(∀x ∈ R)( 0 + x = x). Da mesma forma, (∀x ∈ R)( 1 · x = x). No presente caso, U é o
elemento neutro da interseção e ∅ é o elemento neutro da união.

2. Leis de Dominação. (∀A) (A ∪ U = U) e (∀A) (A ∩ ∅ = ∅).

3. Leis de idempotência. (∀A)(A ∪ A = A) e (∀A)(A ∩ A = A).

4. Lei de complementação. ∀A, A = A.

5. Propriedade comutativa. A ∪ B = B ∪ A, A ∩ B = B ∩ A.
[ ]
6. Distributividade. (∀A)(∀B)(∀C) A ∩ (B ∪ C) = (A ∩ B) ∪ (A ∩ C) .
[ ]
(∀A)(∀B)(∀C) A ∪ (B ∩ C) = (A ∪ B) ∩ (A ∪ C) .
Lembre que em R, a multiplicação é distributiva em relação à adição, isto é,
[ ]
(∀x ∈ R)(∀y ∈ R)(∀z ∈ R) x · (y + z) = x · y + x · z .

A adição não é distributiva em relação à multiplicação, x + (y · z) ̸= (x + y) · (x + z).


[ ]
7. Associatividade. (∀A)(∀B)(∀C) (A ∪ B) ∪ C = A ∪ (B ∪ C) .
[ ]
(∀A)(∀B)(∀C) (A ∩ B) ∩ C = A ∩ (B ∩ C) .
A mesma coisa acontece com os números reais. As operações de adição e de multiplicação
são operações binárias. Por exemplo, dados dois números reais x e y, existe um outro

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número real chamado de soma de x e y e denotado por x + y. Assim, dados três números
reais x, y e z, nessa ordem, se desejarmos somá-los, podemos fazer isso de duas maneiras,
(x + y) + z ou x + (y + z). A propriedade associativa nos diz que os dois resultadoss são
iguais. Podemos, então, escrever x + y + z sem o perigo de ambiguidade, seja qual for a
maneira de agruparmos esses três elementos o resultado é o mesmo.
Por causa da propriedade associativa, a partir de agora podemos escrever A ∪ B ∪ C, ou
A1 ∪ A2 ∪ · · · ∪ An , pois não haverá o perigo de ambiguidade, seja qual for a maneira que
associarmos os conjuntos o resultado será o mesmo.
∑ n
Notação: Por analogia com a notação de somatório xn = x1 + x2 + · · · + xn , são
i=1

n ∩
n
usadas as notações Ai = A1 ∪ A2 ∪ · · · ∪ An e Ai = A1 ∩ A2 ∩ · · · ∩ An .
i=1 i=1

8. Leis de De Morgan. A ∪ B = A ∩ B e A ∩ B = A ∪ B.
Observe a semelhança com as Leis de De Morgan para proposições, que diziam
¬(p ∨ q) ⇐⇒ (¬p) ∧ (¬q) e ¬(p ∧ q) ⇐⇒ (¬p) ∨ (¬q).
Note que ∨ corresponde a ∪ e, de fato, A ∪ B = {x | x ∈ A ∨ x ∈ B}.
∧ corresponde a ∩ e A ∩ B = {x | x ∈ A ∧ x ∈ B}.
¬ corresponde a complementar A = {x ∈ U | ¬(x ∈ A)}.

9. Absorção. (A ∩ B) ∪ A = A e (A ∪ B) ∩ A = A.

10. Leis complementares. A ∪ A = U e A ∩ A = ∅.

Vamos mostrar aqui apenas algumas provas, as demais são análogas ou mais simples.
Prova da Lei de De Morgan A ∪ B = A ∩ B :
Prova de que A ∪ B ⊆ A ∩ B :
Seja x ∈ A ∪ B
[ ] (⋆)
x ∈ A ∪ B =⇒ x ̸∈ A ∪ B =⇒ ¬(x ∈ A ∪ B) =⇒ ¬ (x ∈ A) ∨ (x ∈ B) =⇒
(⋆)
=⇒ (x ̸∈ A) ∧ (x ̸∈ B) =⇒ (x ∈ A) ∧ (x ∈ B) =⇒ x ∈ A ∩ B,
onde no passo (⋆) foi usada a Lei de De Morgan para proposições.
Logo A ∪ B ⊆ A ∩ B.
Prova de que A ∩ B ⊆ A ∪ B: Basta inverter os passos acima, ir do fim para o começo
invertendo o sentido das flechas.
Temos então que A ∪ B ⊆ A ∩ B e A ∩ B ⊆ A ∪ B. Logo os dois conjuntos são iguais. 

Prova de que A ∩ (B ∪ C) = (A ∩ B) ∪ (A ∩ C):


Seja x ∈ A ∩ (B ∪ C). Então x ∈ A ∧ x ∈ B ∪ C. Segue que x ∈ B ∨ x ∈ C. Então temos
dois casos a considerar:
Caso 1 : x ∈ B.

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Neste caso, x ∈ A ∧ x ∈ B. Então x ∈ A ∩ B. Portanto x ∈ (A ∩ B) ∪ (A ∩ C).
Caso 2 : x ∈ C.
Neste caso, x ∈ A ∧ x ∈ C. Então x ∈ A ∩ C. Portanto x ∈ (A ∩ B) ∪ (A ∩ C).
Nos dois casos, temos que ∀x ∈ A ∩ (B ∪ C), x ∈ (A ∩ B) ∪ (A ∩ C).
Logo A ∩ (B ∪ C) ⊆ (A ∩ B) ∪ (A ∩ C). (⋆)
Seja x ∈ (A ∩ B) ∪ (A ∩ C). Então x ∈ A ∩ B ∨ x ∈ A ∩ C. Novamente, por causa do ∨,
temos dois casos a considerar:
Caso 1 : x ∈ A ∩ B.
Neste caso, x ∈ A ∧ x ∈ B. Então x ∈ A ∧ x ∈ B ∪ C. Portanto x ∈ A ∩ (B ∪ C).
Caso 2 : x ∈ A ∩ C.
Neste caso, por um raciocı́nio análogo ao do caso anterior, concluı́mos que x ∈ A ∩ (B ∪ C).
Nos dois casos, a conclusão é a mesma. Portanto (A ∩ B) ∪ (A ∩ C) ⊆ A ∩ (B ∪ C). (⋆⋆)
Das inclusões (⋆) e (⋆⋆) segue que A ∩ (B ∪ C) = (A ∩ B) ∪ (A ∩ C). 

Exemplo: Usando o teorema da diferença e as propriedades da união e interseção podemos


mostrar diretamente (usando conjuntos, e não elementos) várias propriedades de conjuntos.
Dados A, B e C contidos em U temos

(B − A) ∪ (C − A) = (B ∪ C) − A.

De fato, pelo teorema da diferença, B − A = B ∩ A e C − A = C ∩ A, portanto,


Distrib.(6) Teorema
(B − A) ∪ (C − A) = (B ∩ A) ∪ (C ∩ A) = (B ∪ C) ∩ A = (B ∪ C) − A.

Definição. Também podemos fazer a união e a interseção de uma quantidade infinita de


conjuntos. Dada uma quantidade infinita de conjuntos A1 , A2 , A3 , . . . , definimos


An = A1 ∪ A2 ∪ A3 ∪ · · · = {x | (∃n ∈ N)(x ∈ An )}
n=1
∩∞
An = A1 ∩ A2 ∩ A3 ∩ · · · = {x | (∀n ∈ N)(x ∈ An )}.
n=1



Exemplos: 1. Se An = {1, 2, 3, . . . , n}, (n ∈ N), então An = N.
n=1



2. Se An = (− n1 , n1 ), intervalos abertos em R, n ∈ N, então An = {0}.
n=1



Para justificar essa igualdade, basta notar que (∀n)(0 ∈ An ) =⇒ 0 ∈ An e, portanto,
n=1


{0} ⊆ An .
n=1

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Por outro lado, se x ∈ An , então (∀n ∈ N)(x ∈ An ) =⇒ (∀n)(− n1 < x < n1 ) =⇒ x = 0,
n=1

∞ ∩

isto é, x ∈ {0}. Portanto An ⊆ {0}. Logo An = {0}.
n=1 n=1



3. Se An = {n, n + 1, n + 2, . . .}, (n ∈ N), então An = ∅.
n=1

Justificativa: Seja x ∈ N. Temos que (∃n ∈ N)(n > x), por exemplo, n = x + 1. Segue
que x ̸∈ An . Portanto (∃n ∈ N)[ ¬(x ∈ An )]. Mas essa última proposição é equivalente a
[ ] [ ∩
∞ ] [ ∩∞ ]
¬ (∀n ∈ N)(x ∈ An ) . Segue que vale ¬ x ∈ An . Ou seja, (∀x ∈ N) x ̸∈ An .
n=1 n=1


Logo An = ∅.
n=1



4. Se An = [ n1 , 1 − 1
n
], intervalos fechados em R, ∀n ∈ N, n ≥ 2, então An = (0, 1).
n=2

( ) ∪

Temos (∀n) [ n1 , 1 − n1 ] ⊆ (0, 1) . Logo An ⊆ (0, 1).
n=2

Por outro lado, se x ∈ (0, 1), então 0 < x < 1, portanto se n ∈ N for suficientemente grande,
teremos 0 < n1 e 0 < n1 < 1 − x, ou seja, (∃n ∈ N)( n1 < x < 1 − n1 ), isto é, (∃n ∈ N)(x ∈ An ).

∞ ∩

Segue que x ∈ An , provando que (0, 1) ⊆ An .
n=2 n=2

( ) ( )

∞ ∩
∞ ∩
∞ ∪

Teorema. (Leis de De Morgan) An = An e An = An .
n=1 n=1 n=1 n=1

Demonstração: Vamos provar a primeira igualdade. A outra é análoga.


(∞ )
∪ ∪

Seja x ∈ An . Então x ∈ U e x ̸∈ An =⇒ (∀n)(x ̸∈ An ) =⇒ (∀n)(x ∈ An ) =⇒
n=1
( ) n=1

∞ ∪
∞ ∩

x∈ An . Logo An ⊆ An .
n=1 n=1 n=1



Para mostrar a inclusão contrária, seja x ∈ An . Então
n=1


x∈ An =⇒ (∀n)(x ∈ An ) =⇒ (∀n)(x ̸∈ An ) =⇒ ¬(∃n)(x ∈ An ) =⇒
n=1
( ) ( )
[ ∪
∞ ] ∪
∞ ∩
∞ ∪

¬ x∈ An =⇒ x ∈ An . Portanto An ⊆ An .
n=1 n=1 n=1 n=1
( )

∞ ∩

Logo An = An . 
n=1 n=1

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Teorema. (Distributividade)
(∪∞ ) ∪ ∞ (∩
∞ ) ∩

( ) ( )
A∩ Bn = A ∩ Bn e A∪ Bn = A ∪ Bn .
n=1 n=1 n=1 n=1

Demonstração: Como exercı́cio.

Definição. Definimos a diferença simétrica de dois conjuntos A e B como sendo o conjunto

A ⊕ B = {x ∈ U | (x ∈ A) ⊕ (x ∈ B)}.

Lembre que para proposições p e q o sı́mbolo p ⊕ q denota “p ou q” com ou no sentido exclusivo,


ou seja, p ⊕ q é verdadeira se e somente se uma e apenas uma das proposições p, q é verdadeira.
Ou seja, A ⊕ B é o conjunto dos x que pertencem a um e apenas um dos conjuntos. Por
exemplo, {a, b, c, d, e} ⊕ {a, 2, c, 4, e} = {b, d, 2, 4}.
Também se usa a notação A∆B para A ⊕ B.

(⋆) Um diagrama de Venn é um diagrama do tipo do diagrama abaixo, em que são representados
o conjunto universo U, os conjuntos A e B e, hachurada, a interseção A ∩ B.

B
A

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