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Suplemento

literário do
Jornal A União

Agosto - 2020
Ano LXXI - Nº 6
R$ 6,00
Exemplar encartado no jornal A União apenas para assinantes. Nas bancas e representantes, R$ 6,00

Lourdes
Ramalho 100 anos
Especial de 30 páginas celebra a memória e o
legado da professora que se tornou um dos nomes
mais importantes do teatro paraibano
6 editorial

A professora do moderno teatro nordestino


Maria Valéria Rezende, pau- Dona Lourdes As páginas seguintes elen-
lista de Santos, costuma dizer cam passagens biográficas da
que a escritora nasceu na Paraí- escreveu peças dramaturga com análises de
ba. Portanto, a autora de Carta sua obra e de sua formação
à Rainha Louca é paraibana. Da
como 'As Velhas', teatral, partindo de um vasto
mesma forma, a professora e 'Fogo-Fátuo' e material de pesquisa condu-
dramaturga Lourdes Ramalho zido pelo professor Diógenes
é paraibana, embora tenha nas- 'Maria Roupa Maciel, sem o qual esta edição
cido em Ouro Branco (RN). Mas não seria possível e cuja dedi-
foi aqui, na Paraíba, entre Santa
de Palha' que cação à produção deste suple-
Luzia e Campina Grande, onde levaram seu mento fez com este Correio das
efetivamente fixou residência Artes se tornasse um valioso
e constituiu família, que Dona nome a subir em material de pesquisa e consulta
Lourdes, como era conhecida, sobre um dos grandes nomes
escreveu peças como As Velhas,
palcos de dentro da cultura paibana, que faleceu
Fogo-Fátuo e Maria Roupa de Pa- e fora do Brasil em setembro do ano passado,
lha (esta, de sua seara infantil) aos recém-completados 99 anos
que levaram seu nome a subir e a colecionar de idade.
em palcos de dentro e fora do Em parceria com a tam-
Brasil e a colecionar aplausos
aplausos ao longo bém professora Valéria
ao longo de quase 50 anos de de quase 50 anos Andrade, Diógenes assina
carreira. a organização da edição
Neste 23 de agosto de 2020, de carreira do texto inédito Chã dos
Lourdes Ramalho faria 100 Esquecidos, um mergulho
anos. Para marcar a data, o bruçam sobre a vida e obra de profundo na obra da profes-
Correio das Artes sai com esta alguém que, a seu modo, uniu sora que ensinou à Paraíba
edição especial que você tem referências medievais, judai- o bê-a-bá do mais autêntico
em mãos. Ao longo das próxi- cas e sertanejas para criar uma teatro moderno nordestino.
mas 30 páginas, professores, obra de valor artístico e histó- Boa leitura!
pesquisadores, encenadores, rico, em que a crítica social é O editor
artistas e acadêmicos se de- pertinente. editor.correiodasartes@gmail.com

6 índice

, 34 @ 39 2 45 D 49
entrevista poesia Augusto dos anjos cinema
O encontro entre dois Hildeberto Barbosa Filho Milton Marques Júnior Há 70 anos, chegava às
Sérgios, o paraibano Castro faz uma análise minuciosa compõem um sólido estudo telas a obra-prima 'O Anjo
Pinto, poeta, e o gaúcho de ‘Abissal’, coletânea de sobre um dos poemas Azul', que João Batista de
Faraco, ficcionista, rendeu poemas alegóricos Brito rememora em texto
uma conversa exclusiva da paraibana escritos pelo poeta repleto de bastidores e
sobre conto. Glória Azevedo. paraibano: 'A Nau' análises.

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6 resenha

A chã fértil
de um centenário
Nayara Brito
Epecial para o Correio das Artes

A
ntes que Lourdinha se en-
cantasse, lá no último se-
tembro, já estavam em anda-
mento os preparativos para
comemorar o seu centenário de
vida, que calhou de se dar nes-
se estranho ano de 2020. Guar-
daram-se os guizos e, no espaço
virtual que nos restou ocupar, fez-
-se circular o nome, a história e a
obra desta dramaturga que, embora
tenha alcançado grande reconheci-
mento ainda em vida, permaneceu
clandestina em relação ao cânone da
dramaturgia nacional, mesmo a nor-
destina e, ainda mais particularmente,
a de autoria de mulheres. Reconhecida
sim, embora ainda lhe falte, contradito-

Lançado durante o
Agosto das Letras 2020,
‘Chã dos Esquecidos’
retoma as memórias
e os caminhos de
investigação, além de
uma revisão teórica,
‘Chã dos Esquecidos’, de Valéria crítica e analítica
Andrade e Diógenes Maciel (na foto),
é resultado de décadas de pesquisa
sobre a obra de Lourdes Ramalho e
da obra de Lourdes
marca o centenário da dramaturga
Ramalho

24 | João Pessoa, agosto de 2020 Correio das Artes – A UNIÃO


c riamente, e talvez especialmente verso lúdico da tradição oral bra- ca do nordestino.
pelas novas gerações, ser conheci- sileira.Em sua reflexão, Valéria Mais “tensa e próxima ao ver-
da – para não ser esquecida. nos provoca a pensar a produção náculo, incluindo a preocupação
Chã dos Esquecidos - lançado ramalhiana como sendo uma es- [...] com colocações pronominais
durante o Agosto das Letras 2020 pécie de reescritura de um mes- mais formais”, a língua falada
- vem a público em boa hora. mo e único texto, desdobrado em pelas personagens de Chã dos
Nove anos depois de lançados variadas versões. Isso porque esquecidos – à exceção da empre-
os dois volumes de seu Teatro identifica temas e estruturas re- gada Bá, representante da classe
(Quase) Completo e uma terceira correntes, notadamente nas pe- mais pobre – se afasta da oralida-
publicação reunindo A Feira e ças do primeiro ciclo, em que de da rua, do rancho e da feira,
O trovador Encantado, esta peça, se repetem questões em torno não a excluindo de todo, embora:
inédita tanto nos livros quanto da disputa por terras e da honra a cultura oral e popular encontra
nos palcos, é agora apresentada familiar, sempre dramatizadas expressão nas figuras dos canta-
numa edição comemorativa ao pelo conflito entre duas famí- dores de viola e do cordelista que
centenário de sua autora, Ma- lias, comandadas por suas ma- cruzam a ação dramática, com
ria de Lourdes Nunes Ramalho. triarcas, e as distintas gerações relevante função épico-narrativa.
Desdobramento de uma incansá- que as compõem: eis o caso d’As Outro dado de diferença obser-
vel e, ao que parece, inesgotável Velhas, de Fogo-fátuo, d’A Feira e, vado pelo professor – e mais não
pesquisa empreendida ao longo também, desta Chã dos esquecidos. vamos dizer para que se deixem
das últimas décadas pelos pro- Neste ponto, vale ressaltar lacunas abertas à leitura da peça,
fessores Diógenes Maciel e Valé- que, na análise empreendida nos finalmente oportunizada – diz
ria Andrade, esse texto, colhido comentários alusivos às peças de respeito à transição de um regis-
do “enorme e profícuo espólio da cada período, destaca-se a “com- tro tragicômico, cheio de jocosi-
dramaturga”, hoje sob a guarda preensão feminista do mundo”, dades e sentidos duplo, para um
de seus herdeiros, é publicado traduzida na força rebelde das mais próximo ao drama trágico,
numa versão tomada como de- personagens femininas criadas de feição mais séria. Isso sem
finitiva, uma vez que a própria pela autora, em franco questio- prejuízo aos atravessamentos lí-
autora não chegou a prepará-lo namento a um modelo patriarcal ricos que também são caracterís-
para tal finalidade, como deixam especialmente em voga no Nor- ticos de sua dramaturgia, quan-
ver os registros manuscritos, “as deste brasileiro e à economia do- do as demandas intrassubjetivas
rasuras, correções e emendas [...] méstica e dos afetos dele resulta- e narrativas das personagens e
[a expor, ainda,] parte de seu pro- da. Isso, todavia, como coloca o ação não encontram mais possi-
cesso composicional”. professor Diógenes em seu pos- bilidade de expressão no diálogo
Organizada pelos referidos fácio, “sem que se vislumbrasse a dramático.
pesquisadores, a publicação é saída definitiva ou a ruptura ra- Por fim, antes que os caracte-
composta por um rico aparato dical com a ordem vigente, pois, res acabem, cabe colocar que a
crítico, em que se retomam as nas suas peças, tudo é processo e peça em si e as reflexões de seus
memórias, os caminhos de in- vir a ser”. pesquisadores estão circuns-
vestigação e uma revisão teórica, Embora não possa precisar, critas ainda, nessa publicação,
crítica e analítica de um sem nú- por falta de registros no material pela apresentação de duas per-
mero de outras peças da drama- datiloscrito, o professor situa a sonagens (reais) que foram fun-
turga seridoense-campinense. escrita de Chã dos esquecidosentre damentais na realização desse
No prefácio assinado pela pro- os anos de 1977 e 1978, compreen- projeto, que são o reitor da Uni-
fessora Valéria, encontramos a dendo-a como a peça que fecha o versidade Estadual da Paraíba, o
história da menina Lourdinha primeiro ciclo de sua obra, ini- professor Rangel Junior, e o dire-
e de seu berço familiar, onde ciado com Ingrato é o céu a finais tor de Mídia Impressada Empre-
aprendeu-herdou o gosto pelo da década de 1960, e que abre sa Paraibana de Comunicação e
teatro e pela educação, com for- “a porta de entrada para outros também ex-editor deste fascícu-
te influência de sua mãe Ana modos de fazer na dramaturgia lo, o jornalista William Costa.
Brito. Tomamos nota, então, dos ramalhiana”. “[Assemelhado] e, Uma cronologia da vida e obra de
ciclos que dividem sua obra: o curiosamente, bastante distin- Lourdes Ramalho, assim como a
primeiro, desenvolvido entre as to dos outros [escritos] seus”, na bibliografia de suas publicações,
décadas de 1970 e 1980, voltado mesma medida em que a autora completam o volume que acessa-
eminentemente para um registro retoma os temas da disputa de mos agora digitalmente, dando-
realista-regionalista da cultura terras e da honra familiar evo- -nos a possibilidade de conhecer
nordestina; o segundo, da dé- cados antes e, também como em mais e melhor a história desse
cada de 1990 em diante, voltado outros textos, aponta para uma grande nome do teatro paraiba-
para “o reconhecimento e a res- problemática social mais ampla, no, nordestino e nacional.
significação [das] raízes ibero- desta feita alusiva aos conflitos Que os caminhos sigam aber-
-judaicas do universo popular entre os “caboclos” e os “bran- tos e que seu nome esteja na boca
nordestino”. A professora atenta, cos” do norte do país (ainda em do povo! À leitura! I
ainda, para um terceiro conjunto voga, diga-se), esmaece um dado
de peças, escritas para o público importante de seu programa es- Nayara Brito é professora de Teatro
infantil e referenciadas no uni- tético: a representação linguísti- e pesquisadora em Artes Cênicas

A UNIÃO – Correio das Artes João Pessoa, agosto de 2020 | 25

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