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Chimica Francisco
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Vitor Cei
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Geografia na BNCC
temas étnicos-raciais, Direitos Humanos
e interdisciplinaridades
1ª Edição
Rio de Janeiro
Eulim
2020
Copyright © da editora, 2020.
Capa e Editoração
Mares Editores
CDD 370
CDU 37/49
2020
Todos os direitos desta edição reservados à
Mares Editores e seus selos editoriais
Eulim é um selo editorial de Mares Editores
Contato: mareseditores@gmail.com
Sumário
Apresentação .................................................................................. 9
-9-
contextualizando as diferenças culturais e geopolíticas nas notícias e
propondo uma solução aos problemas sociais apresentados pelas
notícias.
Em “A transformação territorial das universidades federais
após a Lei Federal nº 12.711/2012”, escrito por Wilson Carlos Diniz
(UFCAT) e Ronaldo da Silva (UFCAT), é o segundo capítulo da obra, que
aborda sobre à disponibilização e acesso ao ensino básico e superior à
população negra escrava e ex-escrava no território brasileiro, desde a
primeira Constituição promulgada em 1824, envolvendo leis
infraconstitucionais, até a Constituição Federal do Brasil de 1988, na
qual a educação é tida como um direito de todos. Aborda-se também
conceitos da ciência geográfica correlacionando-os com textos
legislativos que serviam e como mecanismos para a perpetuação da
vontade e do poder de determinado grupo dominante sobre um outro,
dominado. No caso, as relações de poder entre a população branca
para com a negra territórios escolares. Por fim, correlaciona a Lei
12.711/12 como instrumento de transformação socioespacial nas
universidades públicas a partir de sua publicação.
Escrito por Tuane Telles Rodrigues (UFSM) e João Henrique
Quoos (UFSM), o terceiro capítulo é “Uma contribuição dos geogames
para o ensino inclusivo da Geografia frente à BNCC”, demonstrando
que o lugar, expresso como um dos principais conceitos geográficos na
BNCC, possui diversas formas de representação, seja através dos
- 10 -
mapas, de imagens, ou através de tecnologias, como os jogos digitais
educacionais, ou àqueles voltados exclusivamente ao entretenimento.
Nesse sentido, utilizamos o jogo digital “CartoCon: Nossa Expedição
Geográfica” como recurso para abordar o tema em duas oficinas
realizadas em uma escola de educação especial em Santa Maria/RS.
Como resultado, apresentamos a impressão dos alunos diante do
reconhecimento do lugar representado no jogo digital, juntamente
com suas nuances e possibilidades futuras, qualificando não apenas a
utilização do recurso como método de aprendizagem, como também
uma ferramenta contemporânea para a expressão do lugar.
O quarto capítulo da coletânea é denominado de “Reflexões
sobre o ensino de Geografia e a BNCC”, cuja autoria são de Alessandra
Souza (UFSM), Roberto Rech (UNICAMP) e Ana Carla Lenz (UFSM),
trazendo algumas reflexões sobre a importância do ensino de
Geografia na Base Nacional Comum Curricular – BNCC e o caráter
formativo da Geografia enquanto disciplina escolar. Para isso, fez-se
uso da abordagem qualitativa e de leituras relacionadas à proposta.
Segundo a BNCC (2018), o ensino de Geografia deve desenvolver
atividades para que o aluno construa a habilidade de “fazer a leitura
do mundo em que vivem, com base nas aprendizagens em Geografia,
os alunos precisam ser estimulados a pensar espacialmente,
desenvolvendo o raciocínio geográfico”. Consoante com esse ponto de
vista, justificamos a importância do presente texto.
- 11 -
O penúltimo capítulo da coletânea foi escrito por Wilson Carlos
Diniz (UFCAT), cujo título é “O ensino de Geografia como ferramenta
de ressignificação espaçosocial do indivíduo”, em que são tratados
diversos conceitos da ciência geográfica, procurando-se relacioná-los
com o processo de formação de professores de Geografia e bem com
o processo de ensino-aprendizagem de Geografia e a transformação
da sociedade. A metodologia utilizada foi a revisão bibliográfica,
relacionando-se as ideias dos diversos autores que já trataram do
tema. A relação entre ensino de Geografia e ressignificação espacial
do indivíduo é complexa e difícil de expor; no entanto, procurou-se,
ainda que de forma sucinta, demonstrar essa relação e sua
importância.
Por fim, o último capítulo apresentado será “Elaborando o
currículo “Território de Bossoroca”: reflexões teóricas em
consonância à BNCC”, cujo autor é Airton Rosa Lucion Guites (UFSM),
relatando que ao longo de 2019, foi realizado nos âmbitos municipais,
uma formação sobre a nova legislação educacional que entraria em
vigor em 2020, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Sendo
assim, era necessário adequar a legislação municipal, da mesma forma
que a esfera estadual da educação no Rio Grande do Sul já havia
adequado em 2018, através do Referencial Curricular Gaúcho (RCG).
Desta forma, foi elaborado o currículo “Território de Bossoroca”, a fim
de estabelecer as bases de conteúdos programáticos em
- 12 -
competências e habilidades no município gaúcho de Bossoroca/RS.
Neste artigo, iremos refletir sobre uma análise teórica da BNCC que
norteia o ensino de Geografia, bem como relatar o que foi inserido nas
habilidades locais para a disciplina.
Os artigos aqui apresentados como capítulos desta coletânea
digital contribuem ao debate da ciência geográfica e propõe uma
reflexão sobre a legislação educacional em vigência atual, bem como
sobre temas diversos aos Direitos Humanos correlacionados ao
processo de ensino-aprendizagem em Geografia na
contemporaneidade, que está cada vez mais comprometido com
assuntos sociais e de formação cidadã-crítica dos discentes. Deseja-se
uma ótima leitura a todos!
O organizador.
- 13 -
Ensinar Geografia para garantir os Direitos Humanos nas
competências transversais da BNCC
Introdução e Contextualizações
Após o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o mundo
encontrava-se devastado, seja em decorrência dos bombardeios
durante os conflitos bélicos, seja com o extermínio de populações.
Neste cenário, é fundada por 51 países – dentre eles, o Brasil – a
Organização das Nações Unidas (ONU), uma organização
intergovernamental com sede oficial em Nova York (EUA) e três sedes
subsidiárias em Genebra (Suíça), Viena (Áustria) e Nairóbi (Quênia),
além de diversos escritórios pelo mundo, tendo por objetivo principal
a promoção da paz e o desenvolvimento mundial.
Em 1948, a ONU promulgou a Declaração Universal dos Direitos
Humanos, que viria a assegurar o direito de todas as pessoas de ter
uma vida digna, principalmente após os horrores das guerras ocorridas
na primeira metade do século XX. Segundo o site da ONU (2019):
1
Mestre em Geografia, UFSM. Professor concursado da rede pública municipal de
Bossoroca/RS. E-mail: airtonlucion@bol.com.br.
2
Doutor em Geografia, USP. Orientador do trabalho. Professor titular de graduação
e pós-graduação no curso de Geografia, UFSM. E-mail: educard@smail.ufsm.br.
- 14 -
Os direitos humanos incluem o direito à vida e à
liberdade, à liberdade de opinião e de expressão, o
direito ao trabalho e à educação, entre muitos
outros. Todos merecem estes direitos, sem
discriminação. [...] Estão expressos em tratados, no
direito internacional consuetudinário, conjuntos
de princípios e outras modalidades do Direito. A
legislação de direitos humanos obriga os Estados a
agir de uma determinada maneira e proíbe os
Estados de se envolverem em atividades
específicas. No entanto, a legislação não
estabelece os direitos humanos. Os direitos
humanos são direitos inerentes a cada pessoa
simplesmente por ela ser um humano. (ONU,
2019).
- 15 -
Mais especificadamente no capítulo sobre as Ciências
Humanas, em que se inclui a Geografia, o MEC (2017, p. 357) afirma
na BNCC que é necessário “negociar e defender ideias e opiniões que
respeitem e promovam os direitos humanos” através da
responsabilidade e do protagonismo para construir “uma sociedade
justa, democrática e inclusiva”. Portanto, podemos entender como as
características principais dos Direitos Humanos, segundo informa o
site oficial da ONU (2019):
- 16 -
de Segurança da ONU, por exemplo, é reconhecido como o maior
órgão político do planeta. O Brasil tem papel importante na ONU e é
reconhecido por sua característica pacífica diante dos conflitos
internacionais, sempre buscando o diálogo e a ajuda humanitária. Por
conseguinte, desde a primeira assembleia geral da organização, é um
representante do Brasil (geralmente, o Presidente da República) quem
discursa nas conferências de abertura. Sobre o Brasil, o site da ONU
(2019) menciona que:
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Conforme dados do site do Ministério das Relações Exteriores
(2020), o papel do Brasil na ONU para assegurar a paz mundial
atualmente é percebido em missões no Líbano, Sudão, Sudão do Sul,
Saara Ocidental, República Centro-Africana, República Democrática do
Congo, Chipre e Iêmen.
Portanto, ao integrar a ONU, o Brasil deve cumprir os artigos
da Declaração Universal dos Direitos Humanos, podendo ser expulso
da organização em caso de violação, como qualquer outro país. Para
tal, o país aprovou na década passada, no plano jurídico e social, a
Plataforma Brasileira de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais e
Culturais (DHESCA Brasil), sendo reconhecida pela ONU como um
grande avanço na garantia da declaração. (TEXEIRA, M. I. A.;
CAVALCANTE, M. H. K. 2012, p.124). Além disso, as autoras afirmam
na mesma publicação que:
- 18 -
liberdades individuais e à dignidade humana.
(TEXEIRA, M. I. A.; CAVALCANTE, M. H. K. 2012, p.
124).
- 19 -
interior do município de Bossoroca/RS, no ano de 2019. Foi realizado
com uma turma de 7º ano do Ensino Fundamental e teve por objetivo
geral: refletir sobre os Direitos Humanos em uma perspectiva
geográfica; e por objetivos específicos: (1) analisar notícias com ações
que cumprem ou violam os Direitos Humanos; (2) contextualizar as
diferenças culturais e geopolíticas nas notícias; (3) propor uma solução
aos problemas sociais apresentados pelas notícias.
Desenvolvimento e Metodologia
Para estimular o interesse dos alunos frente a temática dos
Direitos Humanos, buscou-se na obra de Bruner e seu método de
aprendizagem por descoberta. Segundo Lakomy (2014):
- 20 -
alunos um conhecimento pautado na investigação e no planejamento.
Sobre o professor-pesquisador, Lopes (2012) afirma:
- 21 -
discutirem em grupo qual notícia cumpria e qual violava, bem como
quais artigos comprovariam isto. As notícias foram selecionadas pelo
professor através de sites oficiais da imprensa ou de governos,
baseado na relevância e proporções que tais notícias ganharam na
mídia. Assim também foi possível gerar uma discussão sobre a
influência da mídia na perpetuação de notícias, que podem
estereotipar situações, como a ideia de que os países desenvolvidos
são cumpridores fiéis dos Direitos Humanos, enquanto os países em
desenvolvimento são violadores compulsórios dos Direitos Humanos;
todavia, é preciso romper com generalizações.
Por fim, a última etapa da atividade consistia em cada grupo
apresentar aos demais suas notícias e conduzir o debate, afirmando os
artigos da Declaração Universal onde se comprovava que as notícias
cumpriam ou violavam. Além disso, o grupo deveria propor uma
solução ao problema apresentado pela notícia em que se confirmou a
violação da declaração. Nesta etapa, o professor teve papel mediador
no debate, em que esclarecia os contextos sociais, geográficos,
históricos, políticos e culturais em torno das notícias, fomentando
ainda mais o aprendizado e a participação de todos com suas opiniões
e dúvidas.
A proposta de analisar a espacialidade mundial dos Direitos
Humanos através de notícias nacionais e internacionais é uma forma
de linguagem geográfica para o processo de ensino-aprendizagem.
Desta forma, os discentes puderam sentir na prática como os artigos
- 22 -
da declaração afetam a vida das populações, quando cumprem ou
violam. Em relação as linguagens no ensino de Geografia, Rundnick e
Souza (2012) explicam:
- 23 -
diferente de relacionar ou elaborar. (CASTELLAR, S.
2014, p. 48).
- 24 -
Continuação
TÍTULO E FONTE DA NOTÍCIA OBSERVAÇÃO
Talvez duas crianças tenham A notícia viola os artigos 3º, 4º e 5º,
morrido para você ter seu celular. sobre o direito à vida, a escravidão
(Brasil de Fato, 11/09/2012). e a tortura.
Índia responde por 40% dos A notícia viola o artigo 16º, que
casamentos infantis no mundo. (O afirma idade núbil para o
Globo, 22/08/2013). matrimônio.
Coreia do Norte pode mandar matar A notícia viola os artigos 5º, 12º e
cristãos “flagrados” com uma Bíblia. 18º, que correspondem a tortura,
(Guia-me, 20/11/2017). intromissão na vida privada e
liberdade religiosa.
Após atentados, mais países fecham A notícia viola os artigos 2º, 13º e
fronteiras a imigrantes. (O Globo, 14º, referentes a igualdade de raça,
23/03/2016). direito de circulação e ao asilo por
perseguição.
Jornalista da Venezuela é preso e A notícia viola os artigos 10º, 11º,
acusado após protesto contra 12º, 18º e 19º, sobre o direito ao
Maduro. (G1, 05/09/2016). julgamento imparcial, a inocência
até que se prove a culpa, a
intromissão na vida particular, a
liberdade de pensamento e de
expressão.
Fonte: GUITES, A. R. L.; CARDOSO, E. S. (2019).
Resultados e Discussões
A seleção de notícias trouxe ao contexto da sala de aula o
debate sobre temas da atualidade, mesclando nos enfoques de
educação, saúde, segurança, política e cultura. Os alunos foram
instigados a interpretação de texto, ao raciocínio crítico, ao
pensamento lógico e ao debate em grupo. Ao professor, coube o papel
de mediador e de contextualizar os fatos apresentados pelas notícias
e fomentar o debate entre os próprios alunos, que opinavam sobre o
- 25 -
cumprimento ou violação que foram apresentados, além de sugerir
soluções aos problemas sociais indicados pelas notícias que traziam
fatos que violaram a Declaração Universal.
Dentre várias contextualizações, ressalta-se a questão cultural
dos povos indígenas, que se articulam no território nacional e lutam
pelo direito a exercer seu modo de vida em parcelas do país destinadas
pelo governo, e que apesar da cultura diferente, são partes integrantes
da sociedade brasileira. Também se ressalta a questão das ditaduras,
em que há violação extrema da declaração, uma vez que o
pensamento livre não é permitido, censurando a imprensa e
interferindo na vida privada dos cidadãos.
Outra ressalva a ser feita é que, em nenhum momento, a
atividade orientou os alunos a pensar que países desenvolvidos
(“ricos”) cumprem a declaração, enquanto os países em
desenvolvimento (“pobres”) violam. Há inúmeras exceções, baseado
em vários critérios, mas que reforçam a necessidade do professor em
ensinar os Direitos Humanos com o olhar geográfico sem relacionar o
poder financeiro de um país com sua conduta na declaração. Exemplo
disto é a Finlândia, país desenvolvido da Europa e que viola três artigos
da declaração na notícia apresentada pelo professor; e a Arábia
Saudita, país em desenvolvimento da Ásia e que cumpre três artigos
da declaração na notícia apresentada pelo professor. Sendo assim,
focou-se em algumas atitudes de alguns países com relação a
Declaração Universal, sem generalizar o país como um todo.
- 26 -
Portanto, a atividade ocorreu mediante a problematização do
conteúdo e a contextualização geográfica. Em relação a isto, Stefanello
(2012) conclui que:
- 27 -
universais, inalienáveis, indivisíveis, inter-relacionados e
interdependentes (ONU, 2019).
Para finalização da atividade, foi confeccionado um cartaz por
todos os discentes, onde continha uma breve explicação sobre a
origem e importância dos Direitos Humanos, bem como os 30 artigos
dispostos em ordem. O cartaz foi fixado na sala da turma, a fim de ficar
exposto durante o ano letivo, retornando as discussões pelo professor
de Geografia sempre que fosse possível ou necessário.
Considerações Finais
Nos últimos anos, uma constante ideia circulou entre a
sociedade brasileira, que indignada com casos de corrupção em cargos
públicos, as injustiças sociais e a crescente violência urbana, atribuiu
- 29 -
erroneamente aos Direitos Humanos a culpabilidade da crise no Brasil,
com a mentalidade de que esses direitos “defendem criminosos”.
A perpetuação desta ideia vem de encontro com as lutas de
movimentos sociais para reivindicar seus direitos e suas liberdades. E
neste sentido, cabe a Geografia um posicionamento frente a
disseminação de pensamentos errôneos a respeito da Declaração
Universal. A ciência geográfica está pautada na relação entre a
sociedade com a natureza; logo, é papel da Geografia defender os
Direitos Humanos e debater isto nas escolas e universidades, uma vez
que essa defesa vai promover a justiça social e desvelar fatos
importantes no contexto da produção do espaço geográfico.
Com esta atividade, foi possível observar o engajamento dos
discentes do 7º ano do Ensino Fundamental, que tiveram a inquietude
de buscar esclarecimentos sobre suas dúvidas em relação aos Direitos
Humanos e permaneceram sempre ativos no processo de ensino-
aprendizagem ao analisar, interpretar e aplicar na realidade os fatos
anunciados pelas notícias. A curiosidade e a empatia foram
motivadoras aos grupos, que interagiam e opinavam de forma
democrática e organizada. Além disso, foi uma forma de incentivar os
estudantes a ler um gênero textual de pouco interesse entre as
crianças e adolescentes, que são as notícias, buscando assim um
complemento com a disciplina de Língua Portuguesa.
Assegurar a manutenção dos Direitos Humanos em uma
sociedade descrente, cuja desinformação se perpetua de forma
- 30 -
avassaladora pelas redes sociais, é uma tarefa árdua e complexa.
Reconhecer a importância histórica da ação do Brasil na ONU em
missões de paz pelo mundo é de grande relevância, uma vez que é uma
forma de perceber na prática a ocorrência desses direitos. Em
contrapartida, superar os aspectos em que o Brasil está em falta para
garantir os Direitos Humanos em seu território e se alinhar à
Declaração Universal, é fundamental, uma vez que devemos manter
constante o olhar crítico e a busca incessante por justiça e equidade
social.
Os professores de Geografia – e das demais disciplinas do
processo de escolarização – devem estar preparados para levar até a
escola este conhecimento, em defesa da paz, incentivando os
estudantes para que se tornem autônomos em reconhecer, reivindicar
e garantir o cumprimento dos Direitos Humanos nas distintas escalas
geográficas.
- 31 -
Referências
- 32 -
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Artigos da Declaração Universal
dos Direitos Humanos em português. Disponível em:
https://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=por.
Acesso em: 04.03.2019.
- 33 -
A transformação territorial das universidades federais após a Lei
Federal nº 12.711/2012
Introdução
A educação, no Brasil, em seus diferentes níveis, é instrumento
propulsor para a diminuição ou mesmo a erradicação das
desigualdades socio-econômicas, pois, proporciona acesso à formação
e a conhecimentos e saberes, dos essenciais ao pleno, seja em
qualquer fase de ensino, seja o ensino técnico ou superior. Dá também
às pessoas as condições técnicas e científicas e capacita-as para
obterem melhor remuneração no mercado de trabalho e a exercerem
funções que, necessariamente, são reservadas à população que possui
qualificação para tal. É o esperado.
No entanto, no Brasil, a educação, por muito tempo, se
apresentou com uma série de particularidades que não a tornava
acessível para toda a população. Na história do País, ainda no período
colonial, alguns grupos de pessoas eram dela excluídos,
especialmente, os escravos e ex escravos. Mesmo a Independência do
3
Mestrando em Geografia, UFCat. E-mail: wilson.dinizc@hotmail.com
4
Doutor em Geografia, UFU. Docente do PPG em Geografia, da Universidade Federal
de Catalão. E-mail: ronaldogeografia@yahoo.com.br
- 34 -
Brasil, ocorrida em 1822 não fez todas as pessoas independentes,
tampouco garantiu a todos o direito de ser livre, de usufruir dos
mesmos direitos, dos mesmos lugares, como as escolas.
O Brasil, promulgou em 1824 a sua primeira Carta
Constitucional que continuou a reproduzir o sistema escravocrata de
antes, ainda que do outro lado do Atlântico, a Revolução Francesa
ainda em 1789, propusesse liberdade, igualdade e fraternidade para
todos. Com a independência, o Brasil contrai uma enorme dívida
externa junto à Inglaterra que, antes, devido às invasões napoleônicas,
havia socorrido, protegido e colocado em segurança em terras
brasileiras a Corte portuguesa. Para Prado Júnior (2004), a Inglaterra,
assim, estava executando um plano para as terras do Novo Mundo
visando compensar as perdas sofridas na Europa, segundo o autor,
- 35 -
comandante supremo do exército português e o
efetivo governador do Reino libertado em 1809
(PRADO JR., 2004, p. 108).
- 36 -
O Ensino Púbico Superior para os escravos e pretos precedentes à
Constituição Federal de 1988
É necessário relacionar a construção social daquele Brasil com
os demais lugares e suas histórias que influenciavam-na época. O
homens se relacionam e exteriorizam pelas/nas relações de poder de
uns sobre os outros no mesmo território ou não, o que pode
acontecer, por exemplo, através das redes. Por isso, lugares são
diferentes entre si, ainda que relativamente próximos ou distantes,
como o Brasil, Portugal e a Inglaterra. É certo que um lugar não explica
tudo por si mesmo porque é preciso considerar as relações de poder
que nele e a partir dele se dão e que afetam-no. Por isso, o geógrafo
precisa preocupar-se também com a história das relações sociais. Para
Santos (1998),
- 37 -
de dois deles ou mais. Mas, o espaço é o conceito a partir do qual os
outros se desenvolvem, assim, sempre estará presente em uma
pesquisa geográfica. Neste estudo, além do conceito de espaço, seu
tema requer a utilização dos conceitos de território e lugar.
Apesar de lastrear-se na Geografia, por vezes este estudo
incursionará pelos acontecimentos históricos e buscará portanto, as
relações ente (Geografia, História e Direito, considerando, desse
modo, que o homem age sobre o espaço para satisfazer suas
necessidades, nele estabelece relações e modifica-o (Geografia) e
esses acontecimentos e suas consequências se dão no tempo
(História) e é necessário estabelecer normas para dirimir os conflitos
decorrentes (Direito).
Lugar, por não ser capaz de explicar tudo por si mesmo, mas a
partir das relações sociais que nele ocorrem e que para ele convergem,
é uma “porção discreta do espaço total” (SANTOS, 1978, p. 152)
identificada por um nome. Mesmo a menor de todas as relações
sociais e a mais específica delas contém parte das relações que são
globais (SANTOS, 1988),
- 38 -
Sobre território, aqui na perspectiva de não fazer confusão com
o conceito de lugar, pois são diferentes, pode-se afirmar, segundo
Sequet (2004), que
- 39 -
Nesta perspectiva, a fim de perpetuar o tratamento de
exclusão dos negros escravos e/ou libertos da sociedade em geral,
uma das ferramentas utilizadas, e com grande êxito foi o direito. Leis
oficiais formalmente segregavam os negros, na prática, impondo-lhes
limites dentro dos quais podiam existir. Leis e Estado servem à parcela
da sociedade que é dominante. Assim, o Estado brasileiro legalizava o
racismo. As escolas não eram lugar de/para negros. Neste sentido, os
artigos 1º e 3º da Lei nº 1 de 1.837, determinavam que
- 40 -
se que os pobres livres e negros e pardos, escravos ou libertos, não
eram cidadãos. A escravidão só acabaria (formalmente) em 1888,
sessenta e seis anos após a Proclamação da Independência.
Legislações infraconstitucionais tratavam de manter os
privilégios dos brancos (grupo dominante), tratados como pessoas,
enquanto os negros eram tratados como coisas, como no artigo 42 da
consolidação das Leis Civis, feita por Teixeira de Freitas, citado por
MAZZAROBA e DE CASTRO no artigo “História do direito constitucional
brasileiro: a Constituição do Império do Brasil de 1824 e o sistema
privado escravocrata”,
- 41 -
forem especificados no contrato, sendo
hipotecados com elas. (FREITAS, 2002, pp. 35,49,
apud MAZZAROBA e DE CASTRO, 2017, p. 115).
- 42 -
Assim, estavam proibidos de frequentar a escola no período
noturno, os escravos e escravas e a população feminina livre.
Certamente a intenção era em manter a população negra no trabalho
forçado, escravo, consumindo seus esforços no trabalho diário,
impossibilitando-a de participar do processo de ensino-aprendizagem
para que, quando a escravidão acabasse (o que ocorreu cem anos
depois), os negros continuassem dominados, subalternos e excluídos
da sociedade.
Em se tratando de ensino superior, sua implementação no
Brasil, ocorreu em 1808 com a vinda de Dom João VI e da Corte
portuguesa para o Brasil. Foram criadas a Escola de Cirurgia da Bahia
(medicina), em Salvador, em 1808, as faculdades de Direito de São
Paulo e de Olinda-PE, em 1827. No Rio de Janeiro em 1920 foi criada a
primeira universidade.
O Decreto nº 7.247, de 19 de abril de 1879, reformou o ensino
primário e o secundário no município da Côrte (Rio de Janeiro) e o
superior em todo o Império, além de regulamentar os exames de
preparatórios nas províncias, e os estatutos das Faculdades de Direito
e de Medicina e da Escola Polytechnica. Nele são observados alguns
progressos. Afirma-se em seu artigo 2º que “até se mostrarem
habilitados em todas as disciplinas que constituem o programma das
escolas primarias do 1º gráo, são obrigados a frequental-as, no
municipio da Còrte, os individuos de um e outro sexo, de 7 a 14 annos
de idade” (BRASIL, 1879, [s.p]).
- 43 -
Proclamada a República, em 1889, dentre os textos
normativos, chama a atenção o Decreto 8.659, de 11 de abril de 1911,
que aprovou a Lei Orgânica do Ensino Superior e do Fundamental na
República e trazia os requisitos para a concessão de matrículas no
Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro como idade, formas de avaliação
para admissão, pagamento de matrícula e curso e a possibilidade de
se ter, na escola, alunos que não pagassem para frequentá-la.
- 44 -
conhecimentos necessários para serem aprovados no exame de
admissão? Nas escolas públicas? É como pagariam a matrícula e o
curso? A escola era pública mas não era gratuita. O mesmo Decreto
8.659, de 11 de abril de 1911, estabelecia as regras para a entrada nos
cursos superiores,
- 45 -
segregação, não só durante o período em que o Brasil foi colônia de
Portugal, mas também, com a independência, durante o Império, em
que a escravidão de negros era legalizada. A proclamação da República
(1889), com a abolição da Escravidão um ano antes (1888) não traz
nenhuma mudança na segregação a que negros e pobres eram
submetidos na educação pública e de forma legal.
Logo depois da Independência, o Brasil, passou a ter sua
Constituição. A Constituição Política do Império do Brasil (outorgada
de 25 de março de 1824) em seu art. 179 tratava da inviolabilidade dos
direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros e tinha por base a
liberdade, a segurança individual, e a propriedade. Mas escravos e
negros livres não eram considerados cidadãos porque a escravidão
ainda estaria em vigor até 1888.
Assim, a população negra, não estava contemplada com o
acesso à educação gratuita conforme rezava o próprio inciso 32 deste
mesmo artigo cujo afirmava que “a instrução primária é gratuita para
todos os cidadãos” (BRASIL, 1824, [s.p]). A Constituição da República
dos Estados Unidos do Brasil (promulgada em 24 de fevereiro de 1891)
mantém a exclusão do povo negro, não faz alterações quanto ao
acesso ao ensino pela população negra. Até para a população não
negra não era garantido o livre acesso ao ensino e ensino gratuito.
Já a Constituição Federal, de 10 de novembro de 1937, trazia
em seu Artigo 129 que à infância e à juventude, a que faltarem os
recursos necessários à educação em instituições particulares, é dever
- 46 -
da Nação, dos Estados e dos Municípios assegurar, pela fundação de
instituições públicas de ensino em todos os seus graus, a possibilidade
de receber uma educação às suas faculdades, aptidões e tendências
vocacionais. Mas essa foi a Constituição da ditadura do Estado Novo e,
sabe-se, numa ditadura, as leis podem não ser aplicadas pelos
governantes ou são aplicadas conforme a vontade e o interesse deles.
E este artigo 129 é destinado à educação profissional, ou seja, para a
formação de trabalhadores adequados, (BRASIL, 1937, [s.p]).
Assim, a Constituição de 1837 retrocedeu em relação à de
1934, fruto das mudanças e fatos ocorridos a partir da Revolução de
1930. Passada a ditadura do Estado Novo, a Constituição de 1946
buscou restaurar, para a educação, as normas da Constituição de 1934
e o Capítulo II, do Título VI, foi dedicado à educação, à família e a
cultura. O Artigo 169 da Constituição de 1946 previa que a União
gastasse nunca menos que dez por cento (10%) de seu orçamento com
a educação. Os estados, o Distrito Federal e os municípios, nunca
menos que vinte por cento (20%), (BRASIL, 1937). Depois do golpe
militar de 1964, que instaurou novamente a ditadura no Brasil, foi
elaborada a Constituição de 1967, no seu Título IV, Da Família, Da
educação e da Cultura,
- 47 -
§ 1º - O ensino será ministrado nos diferentes graus
pelos Poderes Públicos.
§ 2º - Respeitadas as disposições legais, o ensino é
livre à Iniciativa particular, a qual merecerá o
amparo técnico e financeiro dos Poderes Públicos,
inclusive bolsas de estudo (BRASIL, 1967, [s.p.]).
- 48 -
Entre avanços e retrocessos constitucionais, em tempos de
ditaduras explícitas, de exclusões claras e em tempos menos
tenebrosos, o acesso à educação pública, gratuita e de qualidade para
a população negra foi negado de várias formas, na teoria e na prática.
Além da legislação constitucional, é preciso considerar, ainda, a
infraconstitucional. Finalmente a Constituição Federal de 1988, que
reconheceu os direitos humanos fundamentais e aperfeiçoou as
possibilidades de se buscar a igualdade e combater o racismo, o
preconceito e a discriminação contra os negros praticados desde
sempre no Brasil.
Na redemocratização do Brasil, após o fim da ditadura militar,
iniciada em 1964, a promulgação da Constituição Federal em 1988,
tornou-o um País formalmente mais igualitário, em direitos e deveres.
Preceitua o Artigo 5° da vigente Constituição da República Federativa
do Brasil (CF/88), que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, [...]”(BRASIL, 1988, [s.p.]).
Esses direitos humanos fundamentais são individuais.
Na mesma intenção, a Constituição Federal de 1.988 também
garante aos brasileiros direitos sociais, dentre eles o da educação,
conforme dispõe em seu artigo 6°: “São direitos sociais a educação, a
saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a
segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância,
- 49 -
a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” (BRASIL,
1988, [s.p]), e trata da educação em todos os níveis, bem como do
acesso à ela.
Antes de os direitos humanos fundamentais serem
formalizados na Constituição de 1988, a Assembleia Geral das Nações
Unidas (ONU), em 10 de dezembro de 1948, fez a proclamação da
Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), que, em seu
Artigo 1º afirma que “todos os seres humanos nascem libres e iguais
em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem
agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”, (ONU,
1948, [s.p.]). E o Artigo XXVI da DUDH determina que “todo ser
humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos
nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será
obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos,
bem como a instrução superior, está baseada no mérito”, (ONU, 1948,
[s.p.]).
Aqui se depara com um tema, que é um dos argumentos
utilizados pelos indivíduos que são contra os direitos humanos, como
um ponto de inflexão para as políticas públicas voltadas para o acesso
à educação: a meritocracia que é estabeleceria o direito de acesso ao
ensino. Mas, os méritos de uma pessoa depende das condições
educacionais, sociais, culturais, econômicas da sociedade da qual faz
parte. Daí só a igualdade total de condições legitimariam a
meritocracia, fariam dela um fator aceitável, ainda que pudessem
- 50 -
levar à extrema competição entre indivíduos. Não se pode nem é
necessário aqui alongar o debate sobre a meritocracia, basta apenas
admitir que a DUDH não tenha feito um bom uso da palavra ou que
quem a usa como argumento contrário ao acesso universal à educação
superior é quem faz esse mau uso.
Neste sentido, deixando de lado, por enquanto, a meritocracia,
a Constituição Federal de 1988 estabelece uma série de princípios e
direitos que levam à garantia da implementação de ações afirmativas
através de políticas públicas a fim de dar promover a equidade social
para aquelas pessoas que são iguais na lei mas desiguais na vida. Em
seu Art. 206, a CF/88 determina que o ensino será ministrado com
base nos princípios da “igualdade de condições para acesso e
permanência na escola”; da “gratuidade do ensino público em
estabelecimentos oficiais” e de uma “gestão democrática do ensino
público” (BRASIL, 1988, [s.p]).
Se nunca houve igualdade de condições para acesso e
permanência, em todos os níveis de educação e se a educação pública
gratuita é sem qualidade, como se aplicar a meritocracia como
elemento de aferição para a entrada nos cursos públicos oferecidos
pelas universidades brasileiras, principalmente as públicas? A
desigualdade alcança todas as áreas da vida. Assim, quando se junta à
condição de raça outras variáveis, como na condição econômica, por
exemplo, a exclusão se potencializa e se torna permanente.
- 51 -
Daí a necessidade da interferência do Estado em implantar
políticas públicas para a promoção dos direitos, como a igualdade,
como a Lei das Cotas, uma ação afirmativa, uma discriminação
positiva, que, com base no Direito, possibilita, como direito, condições
de acesso à educação técnico-profissionalizante de nível médio e à
educação superior. E o que tem haver a Lei das Cotas com a Geografia?
Ora, essa lei só é necessária e foi criada em detrimento da
desterritorialização feita na África pelos europeus sem que aqui no
Brasil os africanos e seus descendentes pudessem se territorializar,
com tudo o que isso implica e significa. Melhor dizendo, “as cotas [...],
como uma lei, são formas sociais não-geográficas [que] tornam-se um
dia ou outro, formas sociais geográficas” (SANTOS, 2011, p 75)5.
5
SANTOS, Renato Emerson dos. Sobre espacialidade das relações sociais: raça,
racialidade e racismo no espaço urbano. In: SANTOS, Renato Emerson dos (Org.).
Questões urbanas e racismo. Petrópolis ABPN, 2012. Pp. 261-243.
- 52 -
No Brasil, a Lei 12.711/2012 – Lei de Cotas – foi criada após o
reconhecimento da constitucionalidade das Cotas Raciais pelo
Superior Tribunal Federal – STF, no ano de 2012, por meio da ADPF –
186/DF, após o partido político Democratas (DEM) questionar a
constitucionalidade dos atos normativos da Universidade Federal de
Brasília (UnB) em ter implantado, em 2004, uma política de ação
afirmativa em que previa reserva de vinte por cento (20%) das vagas
para candidatos negros e um pequeno número para indígena. Como
resultado, todos os ministros do STF a consideraram constitucional.
Essa forma de democratização da educação superior teve início
na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) que no ano de 2000
por meio da reserva de 50% (cinquenta por cento) das suas vagas para
estudantes que tivessem estudado em escolas públicas cariocas.
Depois, em 2004, a UnB, cria o sistema de cotas raciais para negros e
índios. Assim, depois da Lei nº 17.711/12, as cotas no Brasil, não são
apenas raciais, mas também sociais. A lei das Cotas foi regulamentada
pelo Decreto 7.824/2012 que determina os percentuais de vagas nas
universidades públicas para cada grupo étnico-social.
Estas medidas facilitaram o acesso às instituições de ensino
superior e público para grupos étnicos-socias contemplados, que
passaram a ser um território múltiplo, plural, mais representativo,
mais democrático e mais igual. O tratamento desigual para aqueles
considerados desiguais pela sociedade efetiva o direito à educação
- 53 -
profissional e superior e promove o desenvolvimento social e
econômico não só para aqueles que se encontram em situação de
vulnerabilidade, mas para toda a população.
A Lei 12.711/2012 ainda não foi aceita por diferentes setores
da sociedade, que argumentam, por exemplo, que ela diminuiria a
qualidade do ensino além de aumentar o preconceito, a discriminação
e o racismo porque os estudantes não beneficiados por ela se sentem
prejudicados. Para Cunha (2017),
- 54 -
mais elevado, pois, os estudantes, para dela se beneficiar, devem,
necessariamente, alcançar a nota mínima estipulada (pela legislação)
no processo seletivo a que se submetem. Assim, as cotas no ensino
superior e no médio profissionalizante efetivam o direito à educação
e promovem a diminuição das desigualdades sociais, incluindo as
materiais, entre os grupos que a ela têm direito e os brancos com boa
situação econômica.
A tabela abaixo elaborada através de compilação de dados
obtidos no site do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais (Inep) e também apresentada em artigo intitulado
Desigualdades Sociais e a Lei De Cotas Nas Universidades Federais
Brasileiras: políticas públicas de ações afirmativas para negros e
pardos na busca da transformação espaçosocial, apresentado no
evento ENANPEGE, no ano de 2019, mostra, em números, um pouco
da nova realidade territorial das universidades públicas a partir do ano
de 2011, ano anterior ao ano de 2012 em que a Lei 12.711 foi
implementada, até 2017.
- 55 -
Dados Gerais - Graduação Presencial e a Distância
MATRÍCULAS NOS CURSOS DE GRADUAÇÃO PRESENCIAIS E A DISTÂNCIA, POR
COR / RAÇA – DE 2011 A 2017
PORCENTAGEM PORCENTAGEM
POR RAÇA ou GERAL SOBRE
POPULAÇÃO POR RAÇA OU COR
COR SOBRE AS O NUMERO DE
VAGAS MATRÍCULAS
ANO
Total Geral
Pretos e
Branca
Branca
Branca
Pardos
Parda
Parda
Preta
Preta
2011 224.115 58.305 145.035 427.455 52% 14% 34% 52% 48%
2012 253.961 64.436 163.289 481.686 53% 13% 34% 53% 47%
2013 288.996 70.103 198.439 557.538 52% 13% 36% 52% 48%
2014 360356 69.162 290.035 719.553 50% 10% 40% 50% 50%
2015 411.887 92.698 333.838 838.423 49% 11% 40% 49% 51%
2016 458.549 107.660 387.457 953.666 48% 11% 41% 48% 52%
2017 492.462 127.708 438.139 1.058.309 47% 12% 41% 47% 53%
Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep)
Disponível em: http://portal.inep.gov.br/web/guest/sinopses-estatisticas-
da-educacao-superior. Acesso em 02 de jul de 2019.
Org. O autor, 2019.
- 57 -
de produção e exposição de trabalhos e pesquisas científicas afim de
fomentar a dinâmica e a transformação socioespacial do território
universitário federal e ir além, para que aquela parte da sociedade que
não os compreendem ou que não aceita, saiba da sua necessidade e
importância, em especial a da Lei de Cotas, que passará por revisão em
2022 e pode ser afetava negativamente por falta de conhecimento ou
de negação de seus benefícios para toda a sociedade.
Conclusão
Considerando o quadro histórico de preconceito e de
discriminação, de falta de políticas públicas educacionais, em especial
no Ensino Superior voltadas para as “minorias”, que perdurou por
longo período, e as primeiras ações afirmativas criadas a partir da
promulgação da Constituição Federal de 1988, é possível afirmar que:
atualmente em algum lugar no território brasileiro há um ou mais
estudantes universitários negros oriundos das favelas e das periferias
brasileiras em geral se reafirmando como pessoa e como marca ou
marcas da sobrevivência, da resistência, pois tornou-se/tornaram-se
agora mais visíveis ampliando a visibilidade para outros lugares cujo o
acesso até pouco tempo era , não por leis propriamente, mas pelo
preconceito, pela discriminação e pelo racismo, que podem e devem
ser contidos assiduamente com leis que punam os agressores e com
leis que afirmem os direitos e os colocam em prática. A transformação
sócio-espacial é contínua, para o bem e para o mal, cabe às pessoas e
à sociedade efetuá-las.
- 58 -
Referências
- 59 -
1º gráo do sexo masculino do municipio da Côrte. Disponivel em:
https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1824-1899/decreto-
7031-a-6-setembro-1878-548011-publicacaooriginal-62957-pe.html.
Acesso em: 22 set, 2020.
- 60 -
PRADO Jr. Formação do Brasil Contemporâneo (Colônia). 6. ed. São
Paulo: Brasiliense. 1961.
_______. Por uma Geografia nova. São Paulo: EDUSP; Hucitec, 1978.
- 61 -
Uma contribuição dos geogames para o ensino inclusivo da
Geografia frente à BNCC
Introdução
A Geografia Escolar não é mera disciplina curricular. Sua
importância no aprendizado e na formação do cidadão vai além da
capacidade de ler e compreender as relações naturais e sociais. A
Geografia contemporânea busca ir à frente, motivada por debates
mais participativos das comunidades que, em um processo de
constante busca pelo aperfeiçoamento dos meios de comunicação
social, evidenciam cada vez mais a importância do respeito e o
reconhecimento das individualidades humanas. Nesse contexto, a
Geografia tende a modificar-se para se tornar mais acessível em seus
métodos de ensino e aprendizagem.
No Ensino de Geografia, que segundo Rodrigues (2020) é
versada em muitas linguagens, como a cartográfica que possui uma
relação semiótica com a Língua Brasileira de Sinais, o domínio de seus
conhecimentos torna-se muito relevante sob a perspectiva
educacional de uma formação crítica e consciente. De forma
6
Doutoranda em Geografia, UFSM.
7
Mestre em Geografia, UFSM.
- 62 -
semelhante, Gonçalves (1988, p.18), contribui dizendo que a
“Geografia, deve ser entendida como um momento necessário da
sociedade, que só pode ser compreendida dentro da totalidade social
de que faz parte e que ajuda a construir”.
Atualmente, as pesquisas que envolvem a Geografia Escolar e
o processo de inclusão estão muito bem representadas por centros e
laboratórios especializados, como é o caso do LabTATE (Laboratório de
Cartografia Tátil e Escolar) do Centro de Filosofia e Ciências Humanas
da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), e também do
Laboratório de Cartografia Tátil da UNESP de Rio Claro, que
desenvolvem pesquisas interessantes voltadas à deficiência visual.
Esse movimento corrobora com o que disse Oliveira (1998), que o
professor de Geografia se encontra com a tarefa de desenvolver na
criança a visão de totalidade da sociedade brasileira, sendo ela o
produto da unidade e da diversidade.
Para Bobbio (2004), a historicidade dos direitos humanos, nos
quais se incluem os direitos das pessoas com deficiência, é dada pela
correlação entre as transformações técnicas na sociedade e a condição
de enunciação dos direitos. À medida em que as condições de vida e
produção se alteram e se sofisticam, torna-se possível a reivindicação
de novos direitos e esse raciocínio ajuda a compreender a evolução
das práticas sociais. Ele também diz que esse processo é acompanhado
pela especificação de direitos para populações e grupos específicos no
interior do conjunto abstrato de direitos presente nas declarações
- 63 -
internacionais, que embora nem sempre tenham efeitos vinculantes
sobre os países que as adotam, funcionam como um horizonte
programático de padrão civilizatório para as sociedades
contemporâneas. Assim, os direitos são anunciados em compromissos
internacionais, e em seguida as instituições nacionais, de acordo com
as condições políticas vigentes, fazem refletir esses compromissos nos
ordenamentos jurídicos. A partir daí, a concretização dos direitos
depende de uma série de fatores, estatais e extraestatais.
A inclusão escolar é o retrato de um processo de
aperfeiçoamento da educação, nela os agentes modificam-se e
transformam-se em prol do desenvolvimento das habilidades e
técnicas para que o conhecimento seja proporcionado coletivamente.
De acordo com Silva e Aranha (2005, p.377) “a escola se torna inclusiva
à medida que reconhece a diversidade que constitui seu alunado e a
ela responde com eficiência pedagógica”, e concluem atentando para
a necessidade na adequação dos diferentes elementos curriculares, de
forma a atender as peculiaridades de cada um e de todos os alunos.
No que se refere aos recursos em geral, para o uso em sala de
aula, deve-se considerar seus aspectos democráticos e humanizados,
especialmente hoje com a presença cada vez mais ativa e participativa
das comunidades no processo das decisões sociais. Nesse contexto, no
plano das deficiências físicas e cognitivas, como a surdez e a deficiência
auditiva - público para o qual o jogo digital utilizado na pesquisa se
direciona, a necessidade de pensar para além da convencionalidade é
- 64 -
fundamental. A educação inclusiva deve levar em conta as
transformações dos meios de comunicação e entretenimento e utilizar
suas linguagens a seu favor. A comunicação é o lócus central desse
processo e o contexto de atuação privilegiada do educador. Nela
devem operar os esforços de integração e valorização das diferentes
experiências. Democratizar a educação é, assim, não apenas a
introdução de um conceito político-liberal nos modos de gestão da
instituição escolar. É torná-la efetivamente um espaço de convivência
capaz não apenas de reproduzir, mas alterar relações sociais.
O Conselho Nacional de Educação (CNE) em 2010, com a
publicação oficial das novas Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais,
ampliou e organizou o conceito e a contextualização da inclusão como
“a valorização das diferenças e o atendimento à pluralidade e à
diversidade cultural resgatando e respeitando as várias manifestações
de cada comunidade” (CNE/CEB nº 7/20106). Com isso, sob as premissas
da igualdade, diversidade e equidade, a BCC (p.15) encontra um
respaldo importante e que deve ser considerado pelos agentes da
educação, não cabendo qualquer tipo de negligência ou
desresponsabilização de qualquer parte da hierarquia escolar para
com os alunos. Dessa forma, a BNCC diz que:
- 65 -
remanescentes de quilombos e demais
afrodescendentes – e as pessoas que não puderam
estudar ou completar sua escolaridade na idade
própria. Igualmente, requer o compromisso com os
alunos com deficiência, reconhecendo a
necessidade de práticas pedagógicas inclusivas e
de diferenciação curricular, conforme estabelecido
na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com
Deficiência (Lei nº 13.146/2015)14. (BRASIL, p. 15-
16)
- 66 -
e inclusão digital que ainda é uma realidade proeminente em muitas
partes do território nacional.
Há quem afirme, que a BNCC apresenta indicativos de há um
distanciamento entre planejamento, currículo, avaliação e educação
inclusiva, no que se refere às especificidades das pessoas com
deficiência e a proposta curricular que contemple a discussão da
inclusão escolar. Dentre os pesquisadores estão as professoras
Elisangela Mercado e Neiza Fumes (2017, p. 7), ao discutirem que “no
que tange à Educação Especial na ótica da BNCC, que é o objetivo do
debate proposto neste artigo, o documento aponta o grande desafio
de definir numa BNCC os pressupostos da Inclusão Escolar”.
A inserção dos jogos digitais educacionais têm sido cada vez
mais frequente, servindo como ponte entre a aprendizagem dos
conteúdos, a iniciação tecnológica para além das redes sociais, a
inclusão escolar. Para a Geografia, esse recurso consolida-se como
uma possibilidade na aprendizagem de uma grande variedade de
temas e conteúdos geográficos, tais como, a Cartografia, a
Climatologia, a Geomorfologia, a Geografia Cultural, entre outros,
podendo trabalhar diversas escalas e conceitos geográficos. Segundo
Tarouco (2008), os jogos digitais proporcionam a melhora da
flexibilidade cognitiva, ao servir como exercício mental que favorece o
estímulo de conexões neurais e modifica o estado reflexivo mediante
a exigência de concentração. Dessa forma, os jogos digitais tendem a
instigar a busca por resoluções ao mesmo tempo em que ensina sobre
- 67 -
um conteúdo específico, e não possibilita que o aluno entre em um
estado de repostas mecânicas daquilo que decorou em um
procedimento de ensino antiquado e individualista.
Observada como “uma atividade lúdica do ser social”, Cezar
(2009, p.33) discute a socialização como aspecto importante dos jogos
e como ferramenta de aprendizagem, dizendo que “o confronto de
diferentes pontos de vista, essencial ao desenvolvimento do
pensamento lógico, está sempre presente no jogo”, e que tudo
depende das exigências que fazemos em relação a educação da
criança surda e quais objetivos que essa educação persegue. Assim,
em um cenário social/educacional contemporâneo em que as práticas
e técnicas de ensino transformam-se em compasso com a evolução
científica e informacional que chega às escolas, refletir sobre o uso
desses recursos como atividades práticas, sempre mediadas pelos
professores, é fundamental.
Ao explorar outros aspectos dos jogos digitais para o ensino de
Geografia, temos o estudo do lugar. Conceito geográfico que, segundo
Callai (2000, p. 71) “na literatura geográfica, o lugar está presente de
diversas formas” e que estudá-lo é fundamental, pois, ao mesmo
tempo em que o mundo é global, as coisas da vida e as relações sociais
se concretizam nos lugares específicos. Lugar esse que a BNCC (2017,
p. 365) destaca como:
Metodologia
Esta pesquisa foi realiza na Escola Estadual de Educação
Especial Dr. Reinaldo Fernando Cóser (Escola Cóser), no município de
Santa Maria, RS. O mapa a seguir mostra a localização da escola:
- 71 -
ano e 2 do sétimo. Desses, 4 são surdos (com 1 autista) e 1 deficiente
auditivo. Embora o jogo seja para alfabetização cartográfica de alunos
surdos e deficientes auditivos, é possível trabalhar com os alunos
outros aspectos do jogo, como o lugar, frente à realidade simulada. A
figura 2 mostra o cenário onde o jogo digital se desenvolve a partir de
uma visão horizontal.
- 72 -
Na segunda etapa fomos ao laboratório de informática para
que os alunos interagissem com o jogo digital “CartoCon: Nossa
Expedição Geográfica” e assim trabalhar de forma prática os
conteúdos apresentados anteriormente de forma teórica. A figura 3
mostra como foi esta atividade:
- 73 -
jogo os objetos utilizados para representar pontos específicos do lugar
como, chafariz, calçadão, termômetro e relógio digital, os bancos, o
coreto, entre outros. Além disso, os alunos foram questionados sobre
quais elementos foram difíceis de identificar, do espaço percorrido
pelo personagem, as imagens que retiraram as lojas e outros serviços
no cenário.
- 74 -
as ferramentas digitais interativas voltadas à alfabetização
cartográfica, utilizando conceitos e teorias acerca da educação
democrática. Sabemos que existem diversos contextos nos quais as
escolas se inserem na medida em que buscam, através do ensino,
mudar a realidade dos alunos e da comunidade, e isso significa
reconhecer que existem instituições de ensino que não possuem uma
estrutura apropriada para sequer planejar o uso de jogos digitais como
ferramenta.
No que se refere à BNCC, e nas pesquisas realizadas sobre a
discussão acerca da efetiva contemplação do documento a um
processo de inclusão escolar, podemos dizer que, embora possa haver
lacunas em alguns aspectos, não cabe exclusivamente à Base Nacional
Comum Curricular a articulação de métodos e processos para uma
inclusão escolar adequada, mas sim de uma mistura entre interesse,
participação popular, e discussões mais objetivas sobre como fazer.
- 75 -
Referências
- 76 -
em: https://revista.fct.unesp.br/index.php/formacao/article/view/
645. Acessado em 22 de out. de 2020.
- 77 -
Reflexões sobre o ensino de Geografia e a BNCC
Alessandra Souza9
Roberto Carlos Rech10
Ana Carla Lenz11
Introdução
O presente capítulo aborda a importância do ensino de
Geografia. Haja vista que os seus conteúdos programáticos e os
conceitos geográficos favorecem a inserção dos elementos culturais,
os atrelados ao modo de vida dos alunos, nos processos de ensino e
de aprendizagem. Além de auxiliar na constituição e na solidificação
das identidades, as quais são reveladas pela paisagem brasileira. O que
evidencia a diversidade cultural da população que a habita, promover
reflexões sobre essa riqueza faz parte dos afazeres da Geografia
Escolar, afirmativa ratificada na Base Nacional Curricular Comum -
BNCC.
Assim, observa-se que o ensino de Geografia colabora para
com o desvendamento dos diferentes cenários que compõem as
unidades de paisagens do Brasil. Por conseguinte, ela, a Geografia, o
seu ensino torna-se uma ponte entre os conceitos geográficos e os
9
Graduada em Geografia, UFSM.
10
Doutorando em Geografia, UNICAMP.
11
Doutoranda em Geografia, UFSM.
- 78 -
conhecimentos locais. O que favorece a ampliação do entendimento
de mundo dos alunos e no processo de construção de tal
conhecimento o professor de Geografia é o condutor, o orientador.
Profissional que vislumbra a formação integral dos alunos.
Como as demais disciplinas curriculares ela segue a orientação
de documentos normativos, um deles é a BNCC. Logo, no primeiro
subtítulo do capítulo intitulado “O SENTIDO FORMATIVO DO ENSINO
DE GEOGRAFIA”, trazemos algumas considerações sobre o sentido
formativo do ensino de Geografia, isto é, sobre a Geografia que se
ensina na sala de aula. No segundo subtítulo “A BNCC E A
IMPORTÂNCIA DA GEOGRAFIA” aborda questões, julgadas pelos
autores, relevantes no texto do documento que ressaltam a
importância do ensino de Geografia, não só para a formação integral
dos sujeitos, como também, para toda a sociedade. Já o terceiro
“ENSINO DE GEOGRAFIA, BNCC E OS SUJEITOS DA EDUCAÇÃO” é uma
correlação dos dois fragmentos anteriores. Destaca -se nele que as
estratégias do ensino de Geografia fazem o aluno pensar, a refletir
sobre as dinâmicas sociais, econômicas, culturais, educacionais entre
outras que ocorrem nas paisagens que compõem o globo terrestre.
A abordagem utilizada para a redação deste capítulo foi a
qualitativa. No primeiro momento realizou-se o levantamento
bibliográfico sobre os documentos norteadores da educação
brasileira, em especial a Base Nacional Comum Curricular - BNCC. Na
sequência deu-se prioridade para leitura voltadas ao sentido
- 79 -
formativo da Geografia; ensino de Geografia e Geografia Escolar.
Observamos que não temos a intenção de sanar as discussões
referentes aos temas aqui apresentados, mas sim colaborar com a
comunidade acadêmica e com os futuros estudos que os terão como
pauta.
- 80 -
formas espaciais através da ação do homem, isto é , do espaço, passa
pela consciência do espaço, isto é, pelo objetivo individual e social de
que espaço queremos.
É nesse sentido, que o ensino tem seu papel, o de contribuir na
formação do sujeito que constrói o espaço e que dele tem consciência.
Moraes (2002, p. 13) diz que “o ensino, ao meu ver, é a tarefa
socialmente mais importante da Geografia” de que “o professor de
Geografia está participando com um conteúdo e com uma temática
essencial na formação da cidadania”. Para o mesmo autor, “a auto
localização do indivíduo no mundo é essencial na formação da sua
consciência social. O indivíduo precisa se localizar no mundo nas
variadas escalas, para entendê-lo e se entender nele” (p. 14).
É nesse sentido que para Eduardo Girotto (2015, p. 232) “o
ensino de Geografia contribua na formação de leitores de mundo”, e
que “ler o mundo significa [...], ler as condições que os limitam ou
possibilitam se tornarem sujeitos” (p. 236).
Essas condições não estão diretamente ligadas apenas às
condições imediatas do cotidiano, isto é, do entorno, mas se associam
a diferentes escalas geográficas. Ou seja, o cotidiano e as relações
sociais passam pelos lugares que fazemos parte, e por lugares que
muitas vezes nem “pisamos” ou fazemos ideia que existam.
É aqui que cabe importância do que Moraes (2008, p. 5) chama
de horizonte geográfico, “que se refere exatamente a esse acervo de
conhecimento geográfico que extrapola o espaço imediato da nossa
- 81 -
vivência”. Para o autor esse conceito se forma no “interior da
mentalidade de cada época”. Esse “imaginário geográfico” é
socializado “através de sistemas formais e informais de educação – o
próprio sistema escolar sendo o principal deles na atualidade”,
sistemas que são fundamentais para a “conformação da nossa
consciência do espaço”.
- 82 -
O pontuado está de acordo com a Base Nacional Comum
Curricular - BNCC. Ela orienta que os professores de Geografia, ao
construírem seus planos de aula, ao montarem as suas estratégias de
ensino façam uso de aspectos fundamentais como: localização
(distribuição dos fenômenos na superfície da terra); conexões
existentes entre os componentes que compõem a paisagem;
ordenamento territorial e ações antrópicas no meio. Para fortalecer o
processo de desenvolvimento integral dos sujeitos, além de, contribuir
para com a compreensão das diferentes realidades locais e globais.
(BRASIL, 2018).
Para Batista e Becker (2019),
- 83 -
planejamentos de ensino, os sete princípios do documento (Quadro 1)
com os conhecimentos locais.
- 84 -
geográfico. O que beneficia o ato de ler e interpretar o mundo, mesmo
que ocorram transformações permanentes, relacionando
componentes dos grupos sociais e da natureza. Logo, realiza a
aproximação dos conceitos para o domínio do conhecimento factual,
aqueles que podem ser observados e localizados no tempo e no
espaço, e para o exercício da cidadania. (BRASIL. BNCC, 2018).
Também cabe destacar que,
- 85 -
distribui? Quais são as características? ou seja, focar na alfabetização
cartográfica. (BRASIL. 2018).
Já nos anos finais, do 6º ao 9º ano, é orientado garantir a
progressão das aprendizagens. Porquanto os estudantes devem
demonstrar capacidade não apenas de visualização, mas sim, de
relacionar e entender espacialmente os fenômenos, os fatos, os
objetos técnicos e o ordenamento espacial do território usado. Para
isso, o documento sugere que se trabalhe no 6º ano os conceitos de
paisagem, lugar, clima; no 7º ano conceito de território, de
territorialidades e dos fluxos econômicos; no 8º ano o entendimento
de Geopolítica e de economia e no 9º ano a política, cultura e a
industrialização. (BRASIL, 2018).
Essas são apenas algumas das recomendações, mas a partir
delas já pode-se inferir que a Geografia Escolar por meio dos seus
conteúdos curricular correlacionados com os conhecimento locais é
uma disciplina importante, não só no que tange a formação integral
dos sujeitos/alunos, bem como para toda a sociedade.
- 86 -
os demais espaços que compõem a unidade de paisagem que ele faz
parte. Estimula - se a observação do que está ao seu redor, dos
elementos paisagísticos e, também, das pessoas. A partir delas, das
observações, se incentiva a descrição, a reflexão e a construção de
sínteses.
O descrito segue as orientações da BNCC, que segundo Batista
e Becker (2019),
- 87 -
vivem. Por isso observa-se a importância do acesso universal a uma
Educação Geográfica de qualidade por meio da Geografia Escolar.
Um exemplo do descrito foi apresentado por Lenz e Vargas
(2020), as autoras transcreveram as experiências agrícolas vividas na
infância, na Educação Básica, por um estudante. Na atualidade, ele,
atua no meio em que vive fazendo uso do que aprendeu na escola com
o seu professor,
- 88 -
os alunos conheçam e percebam o seu mundo.Para isso o docente da
disciplina de diferentes recursos didáticos, como os trabalhos em
campo, diretamente nos lugres, em contato com a população e com
as peculiaridades, necessidades entre outros elementos. Ações que
desenvolvem diferentes consciências como: a de descarte correto do
lixo.
Contudo, na contemporaneidade, ao pensar em estratégias de
ensino de Geografia, em muitos casos, cabe realizar alguns
questionamentos, como:
- 89 -
formadores de cidadãos e não apenas conteúdos para serem
decorados.
Porque a Geografia enquanto ciência possui relações diretas
com outras ciências, o mesmo ocorre com a Geografia Escolar, o que
facilita o seu ensino e os trabalhos interdisciplinares, multidisciplinares
favorecendo a ampla compreensão dos fenômenos. Por isso que se diz
que ensinar Geografia é auxiliar no desvendamento do mundo.
Oliveira (2009), acrescenta nesse contexto que,
- 90 -
responsabilidade social, atuantes no meio em que vivem, mas também
com a valorização da diversidade, da pluralidade cultural do Brasil.
Considerações finais
Observamos que para ensinar Geografia se faz necessário
realizar duas perguntas centrais: a) qual a tarefa do ensino de
Geografia? e, b) para que ensinar Geografia? a BNNC colabora com as
respostas por meio da definição de um conjunto de elementos
essenciais à aprendizagem de todos os alunos durante a Educação
Básica. O documento, também, valida a contribuição da Geografia, do
ensino de Geografia para a Educação Básica. Ela promove, por meio
dos seus conteúdos curriculares, o desenvolvimento do pensamento
espacial dos sujeitos, estimulando o raciocínio geográfico.
Contudo, inferimos que se faz necessário realizar uma
correlação, uma união dos conceitos geográficas com os
conhecimentos locais. Para que o aluno desenvolva o sentimento de
pertencimento a sua paisagem e, a partir dele, torne-se um cidadão
consciente e atuante no meio em que vive, mesmo que, não futuro
venha habitar outro espaço geográfico. Por isso tudo, concluímos que
o ensino de Geografia, a Geografia Escolar, não é apenas uma
disciplina curricular a ser cumprida ao longa do período escolar, mas
sim, são importantes conhecimentos que estão na vida cotidiana dos
seres humanos.
- 91 -
Referências
- 92 -
VARGAS, D.L. et al. Passando adiante as heranças: experiências na
horticultura urbana no município de Santa Maria/RS. In. DE DAVID,
Cesar; BATISTA, Natália Lampert; LENZ, Ana Carla (Orgs.) Formação
inicial e continuada de educadores do campo: vivências, práticas e
desafios – Rio de Janeiro: Dictio Brasil, 2020.
- 93 -
O ensino de Geografia como ferramenta de ressignificação
espaçosocial do indivíduo
Introdução
A ressignificação espaçosocial que o indivíduo, em busca de
liberdade, autonomia e igualdade necessariamente se propõe a
alcançar bem como a plena efetivação de seus direitos fundamentais,
requer, sobre tudo educação, ou seja, conhecimentos e/ou
fundamentos necessários para o enfrentamento das constantes
exclusões, étnico-socais, por exemplo, que as relações de poder
advindas do processo de reprodução/reprodução do domínio exercido
pelo dominar sobre o dominado. Assim, a educação serve tanto para
libertar ou reformular pensamentos e posicionamentos daqueles que
lhe acessam, embora ela seja uma das formas que a sociedade
capitalista tem para se produzir.
Para Mészáros,
12
Mestrando em Geografia, UFCat. E-mail: wilson.dinizc@hotmail.com
- 94 -
historicamente importantes funções de mudança
(MÉSZÁROS, s/a, p. 2).
- 95 -
“trabalho humano produz a primeira natureza e as relações humanas
produzem a segunda (SMITH, 1988, p. 95).
As concepções de primeira e segunda natureza são dadas por
Smith (1988) pela leitura da concepção da natureza em Marx que
Alfred Schimidt, da escola de Frankfurt, realizou em sua obra “The
concept of Nature”. Segundo Smith,
- 96 -
[MARX] começa considerando a relação com a
natureza como sendo uma unidade e considera
qualquer separação que exista entre elas como
resultado histórico e lógico. Desta maneira, a
prioridade social da natureza não é algo que deverá
ser infundido de fora, mas algo que já existe na
relação social com a natureza. Ao invés da
dominação da natureza, devemos, portanto,
considerar o processo muito mais complexo de
produção da natureza. Enquanto o argumento da
dominação da natureza sugere um futuro sombrio,
unidimensional e livre de contradições, a ideia de
produção da natureza sugere um futuro histórico
que está ainda para ser determinado pelo eventos
e pelas forças políticas e não pela necessidade
técnica. Porém, os eventos e as forças políticas são
precisamente aquelas que determinam o caráter e
a estrutura do modo capitalista de produção[...]
(SMITH, 1988, pp.64-65).
- 97 -
uso e os valores-de-troca, e o espaço da sociedade
(SMITH, 1988, p. 65).
- 98 -
mudou. Milton Santos, na obra “O retorno do território”, faz-se mais
uma vez sábio ao afirmar que
Mas também afirma que “assim como antes tudo não era
digamos assim território “estatizado”, hoje tudo não é estritamente
“transnacionalizado” (SANTOS, 2005, p. 200), pois mesmos nos
“lugares” onde a força da mundialização opera com maior intensidade
e eficácia o mesmo território é capaz de gerar novas forças que se
contrapõem ao mundo, o que o torna sempre visitante do “início da
história” e coloca sempre no caminho do retorno.
De tal maneira, é no território que as relações de força
acontecem, assim, o território deixa de ser visto apenas como forma
geométrica de países, Estados, nações, cidades ou mesmo vilarejos,
como era e passa a ser visto e tido como o conjunto de objetos e ações
humanas, sinônimo de espaço humano, espaço habitado. (SANTOS,
2005). Nesta lógica, o espaço na ciência geográfica passa a ser principal
categoria de estudo, o objeto de estudo da Geografia.
Santos (1999, p. 88) simplifica o exposto acima ao afirmar que
"o espaço é a síntese, sempre provisória, entre o conteúdo social e as
- 99 -
formas espaciais", Assim, o espaço antecede o território, e as relação
de poder promovem a territorialização do espaço. Partindo desta
perspectiva,
- 100 -
Cinco anos após a independência do Brasil, a lei imperial de 11 de
agosto de 1827 criou dois cursos de ciências jurídicas e sociais, introduziu seu
regulamento e o estatuto para o curso jurídico e dispôs sobre o título (grau)
de doutor para o advogado”. Dois meses após, promulgou-se a Lei de 15 de
outubro de 1.827, pelo então Imperador Dom Pedro I que previa seu artigo
1º que “em todas as cidades, villas e logares mais populosos, haverão as
escolas de primeiras letras que forem necessárias” (grifos originais) e em seu
artigo 6°instituiu-se que
- 101 -
estatutos das Faculdades de Direito e de Medicina e da Escola
Polytechnica.
- 102 -
A educação em geral e não só a superior foi elaborada e
institucionalizada como uma ferramenta de domínio e de poder sobre do
Estado e de uma até da sociedade, a elite, sobre o restante da população. A
sociedade, tanto através da educação que o Estado oferece quanto através
de outros meios se especializa, se transforma em espaço.
Para Santos (1978),
- 104 -
dizem respeito aos geógrafos, eles interessam, em
última análise, a todos os cidadãos. Pois, esse
discurso pedagógico que é a geografia dos
professores, que parece tanto mais maçante
quanto mais as mas media desvendam seu
espetáculo do mundo, dissimula, aos olhos de
todos, o temível instrumento de poderio que é a
geografia para aqueles que detêm o poder
(LACOSTE, 1976 p. 9).
- 105 -
poder. Colocar como ponto de partida que a
geografia serve, primeiro, para fazer a guerra não
implica afirmar que ela só serve para conduzir
operações militares; ela serve também para
organizar territórios, não somente como previsão
das batalhas que é preciso mover contra este ou
aquele adversário, mas também para melhor
controlar os homens sobre os quais o aparelho de
Estado exerce sua autoridade (LACOSTE 1976, p. 9).
- 106 -
suas análises, se somente considera o lugar, como
se ele tudo explicasse por si mesmo, e não a
história das relações, onde o objeto acolhe as
relações sociais, e estas impactam os objetos
(SANTOS, 1988).
O lugar, por não ser capaz de explicar tudo por si mesmo, mas
a partir das relações sociais que nele ocorrem e que para ele
convergem, é “uma porção discreta do espaço total” (SANTOS, 1978,
p. 156) identificada por um nome. Mesmo a menor de todas as
relações sociais e a mais específica delas contém parte das relações
que são globais (SANTOS, 1988), mas nenhum lugar pode acolher nem
todas nem as mesmas variáveis, nem os mesmos elementos nem as
mesmas combinações. Por isso, cada lugar é singular, e uma situação
não é semelhante a qualquer outra. Cada lugar combina de maneira
particular variáveis que podem, muitas vezes, ser comuns a vários
lugares.
Daí a necessidade em se ter a geografia como uma ciência
dotada de teorias que ultrapassem a “mistificação da geografia como
mera identificação com o conhecimento empírico dos lugares”
(GOMES, 2009, p. 19). Tinha-se na geografia dificuldade de produzir
modelos de explicação ou mesmo na sua incapacidade de criar um
campo analítico de investigação (GOMES, 2009). Mas, o mesmo autor
ressalta a importância da diferença entre a produção do
conhecimento, empírico e/ou teórico e a aplicação do conhecimento.
- 107 -
A geografia, enquanto disciplina científica, que, conforme
(Cavalcanti, 2011, p. 5) forma “prioritariamente profissionais para
atuarem no ensino, mas, nas expectativas idealizadas e na prática de
professores que formam esses profissionais, e também dos alunos, a
perspectiva de formação é a do profissional pesquisador, planejador,
técnico”.
Cavalcanti (2011), faz ainda importante afirmativa ao discutir a
formação de professores e também à construção da autonomia do
pensamento
- 108 -
limitantes do desenvolvimento humano, com clara
percepção dos momentos históricos e políticos que
se vive em uma sociedade que, a cada momento,
nos surpreende com novos achados científicos,
tecnológicos, artísticos e culturais em geral [...].
este profissional entende que a teoria e a prática
caminham juntas em seu pensar e acionar, e que é
capaz de organizar e reorganizar seu conhecimento
da realidade, ao mesmo tempo, que procura
ensinar pesquisando, isto é, refletindo, pensando e
originando novas formas de conhecimento
(TRIVIÑOS, BURIGO e COLAO, 2003, p. 36).
- 109 -
professores de uma geografia libertária. O papel do professor dos
cursos de graduação é fator determinante para a propositura e busca
de novos paradigmas para essa educação em geografia.
Para Gomes,
- 110 -
[...] sua base de pesquisa e a história dos
historiadores, a natureza “natural” e a economia
neoclássica, todas as três tendo assumido o espaço
real, o das sociedades em seu devir, por qualquer
coisa de estático ou simplesmente não existente,
de ideológico. É por isso que tantos geógrafos
discutem tanto sobre a geografia – uma palavra
cada vez mais vazia de conteúdo – e quase nunca
do espaço como sendo o objeto, o conteúdo da
disciplina geográfica. Consequentemente, a
definição deste objeto, o espaço, tornou-se difícil e
a da geografia, impossível (SANTOS, 2008, pp. 118-
119).
- 111 -
pela sociedade mesma. E, mesmo sofrendo transformações as formas
geográficas são duráveis.
Santos (2008) compreende que
- 112 -
Cavalcanti (2011) afirma que a formação profissional em
licenciatura em geografia, precisa possibilitar ao professor
ferramentas para que ele faça e tenha um conhecimento amplo sobre
o processo de elaboração da Geografia escolar e também de indicar o
seu papel na construção dessa geografia.
Esta formação deve capacitar o professor a tomar
posicionamento teórico-metodológico sobre a Geografia, não
somente isso, mas também sobre o ensino de Geografia, “processo
que é fundamental para que ele se aproprie de um método, como
matriz teórica da Geografia que orienta a elaboração de sua própria
proposta de trabalho, ao longo de sua vida profissional” (CAVALCANTI,
2011, p. 10).
Nesta perspectiva, o professor torna-se em uma ponte entre o
aluno e a fronteira da aprendizagem, que ultrapassa o conhecimento
do “ler” e “escrever”, mas de poder ver, sentir, falar, das categorias da
geografia para a compreensão do seu lugar, do mundo à sua volta e de
seu espaço no mundo, Assim, o professor da ciência geográfica, deve
tê-la compreendida, tanto no seu processo de formação quanto no
processo de ensino “sala de aula” como ferramenta que ao mesmo
tempo que mostra os caminhos e dimensões (mapas e escalas) ela
também controla e faz a guerra.
- 113 -
características econômicas, sociais, demográficas,
políticas (para nos referirmos a um certo corte do
saber), deve absolutamente ser recolocada, como
prática e como poder, no quadro das funções que
exerce o aparelho de Estado, para o controle e a
organização dos homens que povoam seu território
e para a guerra (LACOSTE, 1988, p. 10).
- 114 -
social e humano e não é possível a sua compreensão sem a definição
de outras categorias geográficas, tradicionais, que são: lugar, área,
região, território, habitat, paisagem, população. Também há as atuais,
conforme (SANTOS, 1988) propõe em face da reorganização que o
espaço vem sofrendo. (SANTOS, 1988), no entanto, não propõe novas
categorias, apenas que as categorias tradicionais sejam renovadas.
Nas palavras do autor: “as mudanças que o território vai conhecendo,
nas formas de sua organização, acabam, por invalidar os conceitos
herdados do passado e a obrigar a renovação das categorias de
análise (SANTOS, 1988).
Conclusão
A Geografia, como ciência geográfica, é um instrumento
eficazmente propulsor de transformação sócio‐espacial bem como da
transformação da sociedade. O geógrafo tem, com ela, o poder de
tramar uma relação entre ensino de geografia e a ressignificação
espacial do indivíduo ao fazê‐lo compreender as relações de poder
que ocorrem em/no territórios e no seu lugar de pertencimento.
Daí, os indivíduos, com a concepção do lugar, não apenas
como apenas um espaço ocupado mas como local onde acontecem
as transformações, onde o cotidiano ganha forma e vida, onde as
sensações de exteriorizam, palco das relações de poder, como
produto final das relações humanas, passa a desvendar os demais
processos de domínio. Assim, a Geografia e o geógrafo têm ligação
- 115 -
direta e tomam a ciência geográfica e suas categorias como
elementos de transformação espacosocial de todos, que se
configuram como coautores das transformações locais e globais.
- 116 -
Referências
- 117 -
LOWEN-SHAR, Márcia Silva (Orgs.). Curitiba: Associação de Defesa do
Meio Ambiente e Desenvolvimento de Antonina (ADEMADAN), 2009.
- 118 -
Elaborando o currículo “Território de Bossoroca”: reflexões
teóricas em consonância à BNCC
Breve Introdução
Em 2017, foi aprovado e publicado a nova legislação
educacional do Brasil, denominada de Base Nacional Comum
Curricular (BNCC). A lei veio para estabelecer os novos parâmetros do
ensino no país, as disciplinas obrigatórias no currículo e norteou o
processo de aprendizagem com base em competências e habilidades,
que devem ser seguidas pelos professores e alcançada pelos alunos.
No ano seguinte, em 2018, foi a vez os estados adequarem suas
legislações educacionais a fim de se alinhar a BNCC. Para tal, o Rio
Grande do Sul elaborou o Referencial Curricular Gaúcho (RCG), que
buscou acrescentar questões estaduais aos conteúdos nacionais da
BNCC, aproximando as visões das disciplinas para mais próximo da
realidade dos alunos.
Por fim, em 2019, os municípios deveriam adequar suas
legislações também, para agora se alinhar não apenas a BNCC, mas
também ao RCG. Através de uma formação com os professores do
município de Bossoroca/RS ao longo de meses, foi acrescentado no
13
Mestre em Geografia, UFSM. Professor concursado da rede municipal de
Bossoroca/RS. E-mail: airtonlucion@bol.com.br.
- 119 -
documento as habilidades locais de conteúdos estabelecidos no
âmbito nacional e estadual, a fim de aproximar ainda mais a realidade
dos alunos nos temas que devem ser trabalhados obrigatoriamente
pela lei.
O presente artigo é uma reflexão sobre os pontos positivos e
negativos da BNCC com relação ao ensino de Geografia, bem como é
um relato de experiência sobre a elaboração do currículo local
“Território de Bossoroca”, buscando justificar o acréscimo de
conteúdos no âmbito municipal.
Contextualizações Teóricas
A BNCC está estruturada em três etapas da educação básica:
Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. A Geografia
aparece em todas os anos do processo de escolarização, mas como
disciplina individual é apenas a partir do 6º ano do Ensino
Fundamental.
Sendo assim, a legislação nacional estabelece dez
competências gerais, que norteiam todo o documento, na qual os
alunos devem atingir para conseguir alcançar os conhecimentos das
diversas disciplinas. Como bem informa o MEC (2017):
- 120 -
exercício da cidadania e do mundo do trabalho
(BNCC, 2017, p. 8).
- 121 -
conexões, experiências, ensino pela pesquisa,
descobertas e desafios (RIO GRANDE DO SUL, 2018,
p. 32).
- 122 -
Tabela 1: descrição do raciocínio geográfico na BNCC.
- 123 -
foram inseridos na lei estadual e gerou uma reflexão sobre o que
poderia ser complementado na lei municipal.
Com o diálogo entre todos os professores de Geografia do
município de Bossoroca após um estudo minucioso sobre a BNCC e
RCG, ficou acertado que iríamos inserir no documento local as
habilidades que acreditávamos faltar nas habilidades nacional e/ou
estadual ou então que correspondiam a aspectos geográficos do
município e/ou região, a fim de estabelecer uma proximidade dos
temas estudados ao círculo de vivência dos estudantes.
As orientações curriculares da BNCC indicam que houve uma
mudança na ordem dos conteúdos de Geografia. No 6º ano, trabalha-
se as noções básicas de Cartografia e da organização do espaço; no 7º
ano é a vez de enfocar os aspectos geográficos do território brasileiro
em sua totalidade e na divisão regional; no 8º ano aborda-se as
características naturais e socioeconômicas dos continentes América e
África, bem como das regiões polares (Ártico e Antártida); e por fim, o
9º ano corresponde as características naturais e socioeconômicas dos
continentes Europa, Ásia e Oceania.
Sendo assim, em consonância com a BNCC e com o RCG, o
referencial curricular local “Território de Bossoroca” veio a
complementar os temas centrais do ensino de Geografia, a fim de
inserir aspectos locais para enfatizar a aproximação do espaço de
vivência dos estudantes em questões, aparentemente, distantes em
suas mentalidades, demonstrando também que todos os lugares do
- 124 -
mundo estão inseridos no processo de globalização e, mesmo
distantes geograficamente, estão próximos nas relações econômicas e
culturais.
- 125 -
No 7º ano, foi unânime entre os professores de Geografia no
município que seria importante adicionar assuntos do espaço local
com relação a divisão regional do Brasil; no caso, a Região Sul, em que
o Rio Grande do Sul se localiza. Portanto, reforçou-se a presença negra
na formação do município, principalmente em Bossoroca que possui
pontos turísticos de memória, como o cemitério dos cativos e a
senzala. Adicionamos o debate sobre a economia solidária, que aos
poucos se insere na ciência em geral como uma alternativa aos
impactos ambientais; bem como aproveitamos o estudo sobre a
regionalização do Brasil para indicar a necessidade de estudar a
regionalização do estado do Rio Grande do Sul pelos critérios do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e pelos Conselhos
Regionais de Desenvolvimento (COREDES), sempre reforçando a
localização de Bossoroca em cada forma de regionalizar.
Ao currículo do 8º ano, foi aquele que apresentou a maior
anexação de conteúdos para complementar a BNCC e o RCG, uma vez
que os professores de Geografia de Bossoroca perceberam, ao longo
das formações, que haviam uma discrepância com relação as
abordagens geográficas da América com a África, enfocando mais no
continente americano em detrimento dos debates sobre o continente
africano. Desta forma, buscou-se acrescentar temas sobre a África nos
mesmos tópicos que a BNCC e RCG indicavam temas sobre a América,
a fim de gerar um contraponto e um complemento. Além disso, propôs
o estudo das novas relações geopolíticas entre Estados Unidos e Brasil;
- 126 -
a presença do Rio Grande do Sul na conjuntura dos BRINCS e do
Mercosul, em especial por Bossoroca estar próximo da fronteira com
a Argentina, o principal parceiro comercial do Brasil no bloco
econômico; refletir sobre a importância da descoberta do Aquífero
Grande Amazônia – o maior do mundo – no contexto da geopolítica
internacional da água; analisar a organização dos Sete Povos das
Missões – em que Bossoroca pertence a região – no contexto histórico
do espaço geográfico da América Latina; debater sobre a presença do
Brasil na Antártida, a fim de entender a importância dos estudos e
pesquisas científicas da base brasileira na Região Polar; bem como
entender a formulação de políticas públicas através da realidade local,
percebendo como Bossoroca se orienta neste sentido, trazendo
exemplos do município para entender o mesmo assunto com relação
ao continente.
Por conseguinte, a BNCC e RCG do 9º ano apresentou um
problema semelhante ao 8º ano, quando enfocou nos aspectos
geográficos da Europa em detrimento da Ásia e Oceania. Portanto, foi
decidido pelos professores de Geografia de Bossoroca que seriam
complementado no documento local os temas já indicados pelos
referenciais nacional e estadual sobre o continente europeu, agora
indicando a visão para os continentes asiático e oceânico. Além disso,
indicamos a importância em se estudar sobre a influência da Europa
na formação do Rio Grande do Sul e de Bossoroca através dos
movimentos migratórios dos séculos anteriores; entender a dinâmica
- 127 -
e atuação crescente de grupos terroristas no mundo; e refletir sobre a
relevância da religião na organização dos países europeus e asiáticos.
Considerações Finais
A BNCC veio com a proposta de homogeneizar os conteúdos
programáticos do ensino no território nacional, bem como buscou
oferecer um espaço para os entes federados inserirem os contextos
mais próximos de sua realidade para complementar tais conteúdos.
Além disso, priorizou a inserção de tecnologias e o protagonismo
juvenil nas escolas.
Aqui já podemos observar a primeira consideração. As escolas
brasileiras estão preparadas para orientar seus conteúdos
programáticos com base em tecnologias digitais? O exemplo atual nos
oferece a resposta. Com a pandemia pelo coronavírus, as aulas
presenciais foram suspensas ao longo de meses em 2020, acarretando
em adaptações diversas, a fim de tentar oferecer uma forma de
aprendizagem à distância. Conteúdo, as desigualdades sociais e
regionais no Brasil ficaram evidentes quando grande parte dos alunos
não conseguiu acompanhar aulas virtuais nos estados e municípios
que optaram por esse caminho, evidenciando assim que não estamos
preparados para a proposta de enfocar em tecnologias digitais como
indicou a BNCC e reforçou o RCG. O próprio município de Bossoroca
não utilizou as aulas virtuais como alternativa de ensino remoto, mas
- 128 -
sim atividades programadas impressas e distribuídas nas escolas ou
até mesmo nas residências das famílias pelo transporte público.
A segunda consideração que fazemos, é com relação aos
conteúdos em si. Ficou nítido a maior presença dos debates sociais,
em especial aos povos indígenas e quilombolas, bem como a reforçar
a nova posição da Ásia e África nos contextos geopolíticos da Nova
Ordem Mundial. Todavia, o currículo ainda apresenta um enfoque
superior aos aspectos geográficos da América e Europa em
significativa redução do estudo sobre Ásia, África e Oceania, relegando
a esses continentes uma parte secundária dos debates, não centrais
como os continentes europeu e americano. Ou seja, mesmo se
atualizando, a BNCC e RCG mantiveram certo grau de proximidade
com as décadas anteriores no ensino, que também apresentavam um
debate reduzido sobre os continentes asiático, africano e oceânico.
Entretanto, o documento “Território de Bossoroca” foi formulado para
tentar equilibrar melhor essa discrepância, apenas a prática ao longo
dos anos irá demonstrar se isso será possível.
O debate para formulação de conteúdos locais no referencial
municipal foi importante para discutir entre os professores de
Geografia aquilo que seria mais relevante no contexto do espaço de
vivência dos alunos ou que era necessário para completar alguma
lacuna nos referenciais nacional e estadual. Portanto, é importante
entender que não existirá currículo perfeito ou ideal, mas sim
tentativas, apenas a prática individual de cada profissional da
- 129 -
educação na liberdade de cada instituição de ensino é que será
possível de estabelecer uma metodologia capaz de condicionar a
aprendizagem geográfica em sua plenitude.
- 130 -
Referências
- 131 -
SOUZA, A. P. Geografia do Rio Grande do Sul: literatura gaúcha. Porto
Alegre: Martins Livreiro Editora, 2015, 146p.
- 132 -
Sobre os autores
Alessandra Souza
http://lattes.cnpq.br/9839169522949475
Licenciada em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria -
UFSM. Atuou como Professora de Geografia em Grécia Cursos. Atuou
como Professora de Geografia em SOS Aulas. Atuou como Professora
de Geografia em Intensivo ENEM em Super Aprovação Concursos.
Atuou como bolsista |PIBID - Programa Institucional de Bolsas de
Iniciação a Docência - Subprojeto Geografia. Atuou como Professora
de Geografia em CS cursos e concursos. Atuou como Professora de
Geografia em Super Reforço Sassá. Atuou como Professora de
Geografia na Escola de Ensino Médio Tia Elis (Rosário do Sul). Atua
como Professora de Geografia na empresa Triunfo Cursos. Atua como
Professora de Geografia na empresa FASA - Projeto de olho no futuro
/ENEM (Santo Angelo).
- 133 -
Ana Carla Lenz
http://lattes.cnpq.br/0888770742442030
Mestre e Doutoranda em Geografia pelo Programa de Pós-graduação
em Geografia da Universidade Federal de Santa Maria-UFSM, RS.
Graduada em Geografia Licenciatura Plena pela Universidade Federal
de Santa Maria - UFSM, RS. (2018). Integrante do Grupo de Pesquisa
em Educação e Território (GPET/UFSM). Integrante do Núcleo de
Pesquisa da Paisagem ( NEPA/ Silveira Martins). E-mail:
anacarlalenz@gmail.com
- 134 -
SC. Atua na área de Cartografia e Ensino, Patrimônio Natural, Objetos
de Aprendizagem, Geomática, Gestão Ambiental e temas afins.
Ronaldo da Silva
http://lattes.cnpq.br/3873274894552993
Possui graduação em Geografia pela Universidade Federal de Goiás
(1997), mestrado em Geografia pela Universidade Federal de Goiás
(2002) e doutorado em Geografia pela Universidade Federal de
Uberlândia (2010). Atualmente é professor associado 1 da
Universidade Federal de Catalão/UFCAT. Tem experiência na área de
Geografia, com ênfase em Geografia Econômica, Urbana/Indústria e
Geografia Política. Na tese de doutorado, pesquisou a integração da
América do Sul e tem trabalhado com geopolítica, integração da
América do Sul e política externa brasileira. Foi visiting Scholar, bolsista
CAPES/Estagio na American University em Washington DC, American
University, School of International Service.
- 135 -
áreas de Ensino de Geografia e Inclusão, Cartografia Escolar, e
Cosmografia Geográfica.
- 136 -