29 DE MAIO DE 2020 / / BRUSQUE, SANTA CATARINA / / EDIÇÃO 001

JORNAL LIVRE
UNISA DE BELO MONTE. FOTO: DANIEL GIOVANAZ

O PROGRESSO
IMPACTA: OBRAS
FARAÔNICAS!
SÉRGIO LUIS DE AZEVEDO JÚNIOR

RU: 1773564

POLO: BRUSQUE, SC
CONSTRUÇÃO AVENIDA BEIRA RIO 1999. FOTO: ERICO ZENDRON

Em 1970, durante a ditadura militar no Brasil,

o então presidente da República, o ditador Emílio
Em proporções bem menores, um projeto de
Garrastazu Médici, percebeu uma necessidade
construção e pavimentação de uma Avenida
emergente na região Norte do país. A Amazônia
estava repleta de vazios demográficos, e o
que corta a cidade de Brusque no leio do Rio
Itajaí Mirim, também impactou a economia e a
CONSTRUÇÃO DA
povoamento daquelas regiões supostamente
férteis, com chuvas em abundância, cenário que
poderia desenvolver a região com a produção
cultura da sociedade brusquense. A rodovia
não chega nem aos pés de uma BEIRA RIO: AS
agrícola.
A meta era assentar 100 mil família, a maior
Transamazônica, mas podemos fazer uma
relação de obras que influenciam regiões, ÁGUAS
como aconteceu com a “pequena” cidade
parte entorno do município paraense de Altamira,
que hoje é conhecido como capital da
catarinense, situada no Vale do Itajaí. BAIXARAM E A
A cidade de Brusque está inserida na Bacia
Transamazônica. Lotes de terras, casas e um
salário mínimo seriam repassados às famílias POPULAÇÃO
Hidrográfica no Rio Itajaí ao sul do Brasil, no
estado de Santa Catarina. A bacia compreende
através do Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária (INCRA).
uma área de 15.000 km², dos quais cerca de
80% se encontram na região da Mata Atlântica,
SUBIU.
O primeiro passo era abrir uma estrada de 8
montanhosa e fortemente entrecortada por rios
mil km (SIM, 8 MIL KM!). As obras da BR-230 A Avenida Beira Rio (margens esquerda e
e ribeirões.
começaram em setembro de 1970, e o primeiro direita) possui atualmente pouco mais de 10 km,
Segundo o censo IBGE de 2019, Brusque
trecho inaugurado em agosto de 1972. Cinquenta
possui 134.723 habitantes. No final de 1860e corta a principal área urbana da cidade. Está
anos depois, o projeto de Médici parece ser um
(ano da fundação do município), Brusquesendo ampliada seguindo o leito do Rio, com
desastre nacional. A migração nordestina para a
contava com 657 habitantes, cem anos após,projeto de chegar em quase 15 km, isso na
Amazônia foi menor do que o esperado e os
com cerca de 15.000. Após 1960, com amargem direita. A margem esquerda também
Índices de Desenvolvimento da região estão
construção de estradas e maior conectividade está sendo ampliada, e segundo a atual gestão da
entre os piores do país. A estrada, em período
interurbana e municipal, a cidade já contava Prefeitura Municipal, a inauguração das
chuvoso, é quase inacessível.
com 76.058 habitantes, sendo que 96,7% dessamelhorias será ainda em 2020.
Ainda que o objetivo do ditador não tenha A construção da Beira Rio no fim da década
população é urbana (IBGE).
sido atingido, é evidente perceber o legado
Com o crescimento acelerado da cidade, ficade 1980 não evitou as enchentes causadas pelas
cultural nordestino, à medida que se avança pelo
claro a explosão demográfica sofrida, causandochuvas, mas diminui o impacto das águas que
Pará no sentido Leste-Oeste. Famílias retirantes
deterioração em todos os sistemas que compõeatingiam diversas casas nos bairros próximos aos
deixaram suas digitais em cada povoado às
a cidade: sistema viário, sistemas de drenagemleitos do Itajaí Mirim. As enchentes mais
margens da Rodovia Transamazônica. Nos
fluvial e de saneamento, usos e ocupações, recentes que impactaram a região foram em 2008
restaurantes à beira da estrada, é mais fácil
impermeabilização do solo, supressão dae 2011, e causaram grandes estragos econômicos
encontrar baião de dois do que pato no tucupi. As
vegetação e a desvalorização dos recursospara a sociedade, mas nestes anos, a polução de
camisas dos clubes de futebol de Belém – Brusque já alcançava os seus 100.000 habitantes.
naturais e da paisagem.
Paysandu e Remo – são substituídas pelas cores
A industrialização foi o motor das Com a diminuição das enchentes, Brusque
rubro-negras do Sport Recife, e do Moto Club de
transformações na sociedade. Esta nova formavoltou a atrair novos moradores, vindos de
São Luís e de seus rivais.
de cidades regidas pelo capitalismo, além dediversas regiões do Brasil. A cidade colonizada
A hidrelétrica de Belo Monte, localizada na
modificar as formas de trabalho, altera também por imigrantes alemães, poloneses e italianos,
região do município de Altamira, vende um
as relações sociais e as formas de apropriação hoje encontra-se com uma cultura bem mais
futuro de crescimento econômico e geração de
do espaço. Mas Brusque tinha tudo pra ser a plural. Diversos sotaques foram introduzidos na
energia em grandes proporções, como nunca se
cidade dos sonhos, sempre em constantesociedade. Milhares de pessoas de outros estados
viu no Norte do país.
crescimento econômico, com suas fábricas doda região sul, da região sudeste, e principalmente
Segundo o projeto apresentado pela empresa
setor têxtil e metalúrgico, emprego, sossego eda região nordeste, escolheram Brusque como
geradora, Norte Energia S.A., a usina de Belo cidade para morar, trabalhar e construírem suas

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BRUSQUE, SC / / 29 DE MAIO DE 2020 / / EDIÇÃO 001
Monte poderá produzir o equivalente a 10% do
consumo nacional e será a maior hidrelétrica
brasileira.
As duas grandes obras faraônicas no Norte
brasileiro - a Rodovia Transamazônica (BR-230)
e a hidrelétrica de Belo Monte, projetos
nacionais para desenvolvimento da região desde
a década de 1970, durante a ditadura militar, -
resultaram em impactos populacionais,
econômicos e culturais nas cidades envolvidas na
obra. Evidente que citando a mudança cultural,
incluímos a influência de variações linguísticas,
com interferências nordestinas na linguagem do
povo que ali já estava.
Alguns impactos causados por grandes obras
só são percebidas ao longo dos anos. Após 50
anos, Altamira tem cerca de 100 mil habitantes,
que já se adaptaram com a cultura que a história
do país forjou naquela região, com o avanço do
progresso, resultado do “milagre econômico”,
utopia propagada durante a ditadura militar.
Referências:
1. Acessado dia 29 de maio de 2020: https://www.brasildefato.com.br/2017/11/16/transamazonica-45-anos-or-o-preterito-imperfeito-que-une-belo-monte-a-br-230
2. Acessado dia 29 de maio de 2020: https://www.brasildefato.com.br/2017/11/14/transamazonica-45-anos-or-presenca-indigena-e-a-tabua-de-salvacao-da-floresta/
3. Acessado dia 29 de maio de 2020: https://www.brusquememoria.com.br/acervo-imagem/1398
JORNAL
tranquilidade, a cidade perfeita para atrairfamílias.
centenas e milhares de habitantes. Com certeza, a construção da Avenida como
Mas a natureza respondia às mudançasescoamento para as águas que transbordavam do
causadas pela presença humana. Fortes chuvasRio com as fortes chuvas, influenciou e impactou
causaram diversas enchentes na cidade,no crescimento de Brusque e na formação da
abalando grande parte da população, queatual sociedade brusquense, que abriga hoje
perdia tudo ou quase tudo que o trabalho nas diversas culturas e linguagens, reconfigurando a
fábricas lhes proporcionava. Construir casa novelha visão que se tinha da região, como uma
alto de morros era a melhor opção, tanto é queregião europeia, com a maioria das pessoas sendo
na cidade, terrenos assim valorizavam muito, ebrancas e com uma cultura bem singular, vinda
até hoje valorizam. do velho continente.
Enchentes como a de 1961 e de 1984,
destruíram boa parte da área urbana na cidade,
em torno do leito do Rio Itajaí Mirim e seus
afluentes. Se por um lado a cidade atraia com
oportunidades de empregos, por outro, criava
certa insegurança e instabilidade nas pessoas
que escolhiam Brusque para morar, afinal, não
era em qualquer lugar da cidade que se podia
construir uma casa, sem o risco de uma
enchente atingir e acabar com tudo em
questões de minutos.
A solução: construir uma Avenida nos dois
lados dos leitos do Rio, criando barragens, e
fazendo com que a própria Avenida servisse
para que a água da enchente escoasse, sem
chegar nas casas, prédios e no centro da
cidade, onde se concentra boa parte do
comércio de Brusque.
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