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Universidade de Brasília

Instituto de Letras
Departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas
Aluna: Samara Souza da Silva Matrícula: 160072395
Profa. Lurdes Jorge – Estudo das Gramáticas

UM OLHAR NO DESENVOLVIMENTO DA GRAMÁTICA E AS


CONCEPÇÕES DA LINGUAGEM

INTRODUÇÃO
Quem acha que a gramática é apenas um conjunto de regras está totalmente
enganado, pois o caminho que compõe a língua e seu funcionamento, bem como as
questões filosóficas, vem de muitos anos atrás, na Grécia Antiga e suas reflexões
filosóficas contribuíram grandemente para os estudos linguísticos e gramáticas
posteriores. No decorrer deste texto, apresentaremos os aspectos relevantes sobre a
gramática e suas obras, seus fundamentos históricos de cada período ao longo da história,
citando autores essenciais que marcaram a trajetória da linguagem que torna-se
indispensável o seu uso.
Com base em sua teoria dos conceitos, Aristóteles constituiu a base para a
distinção das classes de palavras, e as noções sobre proposição auxiliaram a definir o
objeto da sintaxe, segundo Azeredo (1990, p.16). O nome, que é a menor parte do discurso
significativo, é um som convencionalmente estabelecido. Segundo NEVES (1981, p, 59)
citado por Aristóteles, “entre os nomes e as coisas não há relação completa. [...]. Os nomes
são símbolos das coisas, mas a relação entre o conceito ou entre a coisa e o nome não é
sempre de congruência”, ou seja, o som de uma palavra nada tem a ver com o sentido que
ela designa, isto é, com exceção das onomatopeias, nenhum símbolo será congruente com
o sinal a que pertence.
Desde à época da Grécia Antiga já era foco de especulação a questão da oposição
da natureza e da convenção da língua. Conforme observa (GÖRSKY & MOURA citado
por WEEDWOOD, 2002, p. 25), “[...] os gregos se perguntavam se a conexão entre as
palavras e aquilo que denotavam provinha da natureza, physei, ou era imposta pela
convenção, thesei”. Já os naturalistas achavam que deveria existir uma relação entre a
forma da palavra e o sentido que ela expressa. Onomatopeias são representações naturais
dos significados que as palavras expressam.
Na Grécia Antiga, os sofistas eram considerados mestres da retórica e da oratória
e acreditavam que a retórica era um procedimento de persuasão para apresentar uma causa
de qualquer tema, sendo verdade ou não para, assim, obter a aprovação do público geral.
A retórica está intrinsicamente ligada à gramatica. Para (COSTA 2019, p 353 citado por
SANTO ISIDORO DE SEVILHA, Etimologias, II, 1, 1-2; 3, 1, e 16, 2):

A retórica é a ciência de falar bem nas questões cívicas e com os


adequados recursos da eloquência para persuadir o que é justo e
o que é o bem. O nome retórica deriva do grego rhetorídsen, que
quer dizer “recurso da palavra”, já que entre os gregos “palavra”
se chama rhésis e, orador, rhétor. A retórica está
inseparavelmente ligada à arte da gramática. Com a gramática
aprendemos a falar corretamente e, com a retórica, a expor os
conhecimentos adquiridos. [...]

Para os estoicos, a linguagem era retratada como expressão do pensamento.


Foram eles que desenvolveram a noção de sentença como unidade significativa, o
conceito de classes gramaticais e também de signo linguístico. De acordo com (GÖRSKY
& MOURA citado por SEUREN, 1998, p. 10), a sentença era a expressão de uma
representação mental de um estado de coisas no mundo. Os estoicos trataram de questões
como: pronúncia, etimologia e gramática, priorizando o estudo das classes de palavras e
paradigmas flexionais. Dionísio, o Trácio, por exemplo, estuda as classes de palavras com
base na flexão, em especial a flexão de caso, adotando assim uma abordagem formal da
estrutura linguística (citado por cf. Neves, 2001, p. 39).
Os gregos também consideraram as noções de regularidade e irregularidade
presente nas línguas, conceitos que eram respectivamente nomeados como analogia e a
anomalia, então “os que sustentavam que a língua era essencialmente sistemática e regular
são chamados geralmente analogistas e os que tomavam a posição oposta, anomalistas”
(LYONS, 1979, p.6). Para os alexandrinos, a linguagem deveria ser eficiente e com
características adequadas de expressão, ou seja, havia uma perspectiva gramatical
normativa, e a linguagem era compreendida como veículo da expressão do pensamento,
dos sentimentos, portanto, como uma representação do ser.
Os estudos gramaticais em Roma, assim como na Grécia, serviam como auxílio
à Filosofia, à Crítica Literária e à Retórica, ou seja, os romanos seguiram os modelos da
tradição gramatical grega. Varrão (séc. I a.C), gramático latino, dividia em três partes o
estudo da língua “etimologia, variação vocabular e sintaxe”, de acordo com Lobato (1986,
p. 81). A concepção clássica considerava que língua era da da literatura, assim,
constituída como objeto de estudo nas escolas e universidades permaneceu sendo
vista por meio dos melhores autores, que escreviam nos gêneros tradicionais, como
Dante, no gênero épico virgiliano, Milton, em um estilo homérico etc.
Com relação aos fatos expostos, é inegável as contribuições dos estudos
relacionados ao modo como a linguagem e o pensamento eram vistos na Grécia Antiga e
em Roma, pois a gramática ocidental remonta à gramática grega, e foi também por meio
dos gramáticos latinos (Varrão, Donato e Prisciano), que foi introduzido e descrito
características sobre as diferenças entre o grego e o latim – as gramáticas de Donato
e Prisciano foram usadas durante a Idade Média, até meados do séc. XVII, e discorreram
sobre a língua do seu tempo, mas também sobre a língua “dos melhores escritores”
(LYONS, 1932, p.14), com ênfase em Virgílio e Cícero. As línguas clássicas (grego e
latim) eram consideradas as únicas verdadeiras; as outras, como italiano, catalão,
provençal, inglês, português, alemão, etc., eram vistas como dialetos ou como línguas
precárias e sem gramática.
Foi no Renascimento que surgiram gramáticas com fundamentos racionalistas,
onde buscavam os princípios universais, isto é, tinha como objetivo tornar acessível a
literatura clássica e também auxiliar no processo de aprendizagem do latim clássico,
conforme Lobato (1986, p.83). Os humanistas da Renascença tomaram Cícero como base
do modelo de estilo latino, colocando-o como equivalente ao considerado civilizado – em
oposto ao que era considerado barbárie, ou seja, a língua dos escolásticos, de acordo com
Lyons (1979, p.17-18).
No ano de 1536 foi escrita a primeira, cuja a base eram as gramáticas greco-
romanas, é desse período a gramática de João de Barros (1540) e de Fernão de Oliveira
(1536), conforme Lobato (1986, p. 83). Com relação à gramática de João de Barros, este
discorreu sobre a Ortografia, Prosódia, Etimologia e Sintaxe ou Construção. Ainda no
séc. XVII, há um crescente interesse pelos estudos de línguas novas, como consequência
de informações advindas de contatos entre línguas diferentes, pelo desenvolvimento da
imprensa etc., conforme Lobato (1986, p.83).
Mais tarde, os estudos foram marcados pelas ideias do Romantismo. Sendo
assim, as línguas nacionais passaram a ter valorização e começaram a adquirir o prestígio
intelectual que as línguas internacionais tinham. A problemática entre língua e
pensamento é ainda debatida nos séculos XVII e XVIII por diversos filósofos – Descartes,
Spinoza, Locke, Bacon etc. Nessa época houve a tentativa de se criar uma língua
filosófica universal e geral, com base na premissa de que existe um sistema lógico e
racional (e comum) que preexiste a todas as línguas, em que as línguas seriam apenas
variantes, já que a língua era proveniente do pensamento, sendo, portanto, reflexo deste
– as gramáticas de Port Royal, de Lancelot e Arnauld, e de Soares Barbosa seguem essa
premissa.
Nesse cenário, o Romantismo terminou criando um ambiente favorável na
construção do método comparativo, que visa comparar línguas diferentes, a fim de
estabelecer relações de parentesco entre elas, isto é, a criação de uma árvore genealógica
com todas as línguas, sendo a língua indo-europeia a pioneira entre elas. No século XVIII,
foi mantido a concepção referente às categorias gramaticais universais, à sintaxe
fundamentada na ordem dos vocábulos, à existência de um suposto sistema que está
implícito em todas as línguas, pois a língua é um reflexo do pensamento; também é neste
período que ocorre um trabalho de caráter descritivo sobre as línguas americanas,
africanas e asiáticas. As gramáticas racionais, sob influência do Século das Luzes, não
trouxeram contribuições diferentes das gramáticas clássicas, pois foram criadas a partir
destas, não apresentando, pois, nenhuma teoria linguística nova – “quanto às regras da
gramática, elas não são arbitrárias, mas ‘derivam das tendências naturais da mente
humana’”, conforme Lyons (1979, p.18).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A linguagem humana tem sido tópico de estudo desde a antiguidade clássica e
gramática está presente em nosso cotidiano, principalmente no jeito como escrevemos e
nos comunicamos. Seu estudo tem uma trajetória muito longa, fruto de uma evolução de
muitos anos, passando por vários estudiosos ao longo do século, sempre procurando
descrever uma gramática como uma descrição, uma exposição de fatos da língua.
Considerando a gramática de João de Barros, é importante salientar que ele
adaptou para a nossa língua a teoria sobre as partes do discurso, que foi iniciada pelos
pensadores gregos, mas também acrescentou à classificação da gramática latina o artigo.
REFERÊNCIAS

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