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Disciplinas:
e-mail: alexandrebonafim@hotmail.com
Prof. Ms. Alexandre Bonafim Felizardo
TEORIA DA LITERATURA II
Guia de Disciplina
Caderno de Referência de Conteúdo
© Ação Educacional Claretiana, 2005 – Batatais (SP)
Trabalho realizado pelo Centro Universitário Claretiano de Batatais (SP)
Curso: Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
Preparação Revisão
Aline de Fátima Guedes Felipe Aleixo
Camila Maria Nardi Matos Marcela Fonseca Ferreira
Cátia Aparecida Ribeiro Rodrigo Ferreira Daverni
Dandara Louise Vieira Matavelli Talita Cristina Bartolomeu
Elaine Aparecida de Lima Moraes Vanessa Vergani Machado
Josiane Marchiori Martins
Projeto gráfico, diagramação e capa
Lidiane Maria Magalini
Eduardo de Oliveira Azevedo
Luciana A. Mani Adami
Joice Cristina Micai
Luciana dos Santos Sançana de Melo Lúcia Maria de Sousa Ferrão
Luiz Fernando Trentin Luis Antônio Guimarães Toloi
Patrícia Alves Veronez Montera Raphael Fantacini de Oliveira
Rita Cristina Bartolomeu Renato de Oliveira Violin
Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli Tamires Botta Murakami
Simone Rodrigues de Oliveira Wagner Segato dos Santos
GUIA DE DISCIPLINA
1 APRESENTAÇÃO.............................................................................................. VII
2 DADOS GERAIS DA DISCIPLINA........................................................................ VII
3 CONSIDERAÇÕES GERAIS.................................................................................VIII
4 BIBLIOGRAFIA BÁSICA..................................................................................... IX
5 BILBIOGRAFIA COMPLEMENTAR......................................................................... IX
INTRODUÇÃO À DISCIPLINA
AULA PRESENCIAL........................................................................................... 2
UNIDADE
1 –
ELEMENTOS ESTRUTURAIS DA LINGUAGEM POÉTICA:
MUSICALIDADE DA PALAVRA
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. 4
2 ELEMENTOS ESTRUTURAIS DA LINGUAGEM POÉTICA........................................... 5
3 E-REFERÊNCIAS..............................................................................................11
4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................11
UNIDADE
2 –
ELEMENTOS ESTRUTURAIS DA LINGUAGEM POÉTICA:
MUSICALIDADE DA PALAVRA II
1 INTRODUÇÃO..................................................................................................14
2 RIMA.............................................................................................................14
3 ESTROFE........................................................................................................16
4 PROCESSOS INTENSIFICADORES.......................................................................17
5 REITERAÇÃO...................................................................................................17
6 ANÁFORA.......................................................................................................17
7 ALITERAÇÃO E ASSONÂNCIA.............................................................................18
8 ONOMATOPEIA................................................................................................18
9 PARALELISMO.................................................................................................18
10 REFRÃO..........................................................................................................19
11 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................20
UNIDADE
3 –
ELEMENTOS ESTRUTURAIS DA LINGUAGEM POÉTICA:
LINGUAGEM IMAGÍSTICA DA POESIA
1 INTRODUÇÃO..................................................................................................22
2 PROCESSOS IMAGÍSTICOS...............................................................................22
3 COMPARAÇÃO ................................................................................................26
4 METÁFORA......................................................................................................27
5 E-REFERÊNCIAS..............................................................................................32
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................32
UNIDADE
4 –
ELEMENTOS ESTRUTURAIS DA LINGUAGEM POÉTICA:
LINGUAGEM IMAGÍSTICA DA POESIA II
1 INTRODUÇÃO..................................................................................................34
2 METONÍMIA....................................................................................................34
3 SINESTESIA....................................................................................................36
4 ANTÍTESE.......................................................................................................37
5 PARADOXO.....................................................................................................38
6 PROSOPOPEIA.................................................................................................38
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................40
UNIDADE 5 – INTERPRETAÇÃO DO POEMA
1 INTRODUÇÃO..................................................................................................42
2 MEMÓRIA LÍRICA DE ALBERTO DA COSTA E SILVA1.............................................44
3 APAIXONADO NOVICIADO DE HILDA HILST2.......................................................46
4 POESIA CONVULSIVA DE FERREIRA GULLAR3 .....................................................48
5 E-REFERÊNCIAS..............................................................................................50
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................51
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................51
GUIA DE DISCIPLINA
1 apresentação
Seja bem-vindo! Você inicia agora a disciplina Teoria da Literatura II, na
modalidade EAD.
Objetivo geral
Objetivos específicos
Modalidade
( ) Presencial ( X ) A distância
ATENÇÃO!
3 CONSIDERAÇÕES GERAIS
A disciplina Teoria da Literatura II permitirá a você uma maior compreensão
dos aspectos formais do poema, bem como da importância de se valorizar tais recursos.
O poema é, sobretudo, uma educação sentimental: você travará conhecimento com a
profundidade existencial do homem. A condição humana é a seiva que irriga o texto lírico,
possibilitando ao leitor uma consciência mais aguda de sua vida e de sua existência.
Bom estudo!
4 BIBLIOGRAFIA BÁSICA
ARCHANJO, Neide. Epifanias. Prefácio de Carlos Nejar. Rio de Janeiro: Record, 1999.
BOSI, Alfredo. O ser e o tempo da poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
GUIMARAENS, Alphonsus de. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguillar, 2001.
5 BILBIOGRAFIA COMPLEMENTAR
ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992.
ARRIGUCCI JÚNIOR, Davi. Coração partido: uma análise da poesia reflexiva de Drummond.
São Paulo: Cosac & Naify, 2002.
BOSI, Eclea. O tempo vivo da memória: ensaio de psicologia social. São Paulo: Ateliê,
2004.
CARPI, Maria. As sombras da vinha: poemas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.
CARNEIRO, Flávio. No país do presente: ficção brasileira no início do século XXI. Rio de
Janeiro: Rocco, 2005.
FILHO, Ruy Espinheira. Poesia reunida e inéditos. Rio de Janeiro: Record, 1998.
GALVÃO, Donizete. A carne e o tempo. São Paulo: Nankin Editorial, 1997 (Coleção Janela
do Caos).
LISBOA, Henriqueta. Obras completas – I: poesia geral (1929-1983). São Paulo: Duas
Cidades, 1985.
LUFT, Lya. Secreta mirada e outros poemas. Rio de Janeiro: Record, 2005.
MORIN, Edgar. Amor, poesia, sabedoria. Tradução de Edgard de Assis Carvalho. 2. ed. Rio
de Janeiro: Bertrand Brasil: 1999.
MOURA, Emílio. Itinerário poético: poemas reunidos. Belo Horizonte: UFMG, 2002.
OLIVEIRA, Marly de. Antologia poética. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997.
PAES, José Paulo. Os melhores poemas de José Paulo Paes. 5. ed. São Paulo: Global,
2000.
PRADO, Adélia. Oráculos de maio. 4. ed. São Paulo: Siciliano, 1999. LEMOS, Lara.
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Batatais – Claretiano
GUIA DE DISCIPLINA
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
ROSA, António Ramos. Antologia poética. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 2001.
SAVARY, Olga. Repertório selvagem: obra reunida. São Paulo: Multimais, 1998.
SILVA, Alberto da Costa e. Poemas reunidos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000.
SILVA, Dora Ferreira da. Poesia reunida. Rio de Janeiro: Topbooks, 1999.
Objetivos
• Esclarecer a organização da disciplina e as atividades que
a compõem.
Conteúdo
• Elementos Estruturais da Linguagem
UNIDADE 1
ELEMENTOS ESTRUTURAIS
DA LINGUAGEM POÉTICA:
MUSICALIDADE DA PALAVRA
Objetivo
• Conhecer e identificar os seguintes recursos fônicos da
poesia: metro e ritmo.
Conteúdos
• Metro.
• Ritmo.
UNIDADE 1
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
1 Introdução
Olá pessoal!
Para iniciarmos, é de suma importância que se faça esta reflexão: por que
algumas pessoas gostam de poesia e outras não? Por que tanta gente acha o poema um
texto de leitura difícil e complicada? Será que a poesia é um bem para poucos?
Com isso, você já pode imaginar que o poema é um texto que se difere dos
demais, pois ele se apoia em determinadas regras. Isso acontece porque o poema não
visa apenas à informação, mas, sobretudo, a atingir níveis estéticos capazes de arrebatar
o leitor, levando-o ao sentimento do belo e às profundidades da vida e da alma humana.
Para conseguir tais feitos, o poeta articula a linguagem, “forja” a palavra, burila o discurso,
a fim de gerar não apenas a informação, como também uma forma adequada para o que
ele deseja exprimir. O poema, como afirma o crítico literário Davi Arrigucci Júnior, é um
enigma, um texto que exige certo esforço para a compreensão.
Diante de um texto mais complexo, nós não vamos nos dar por vencidos, não
é verdade? A dificuldade precisa ser encarada como se estivéssemos jogando xadrez:
quanto mais difícil a partida, mais instigante torna-se a competição.
Agora, já podemos compreender por que tanta gente não gosta de poesia. Será
que essas pessoas possuem conhecimentos necessários para se usufruir do texto poético?
Eis uma coisa fascinante: quanto mais compreendemos o poema, mais e mais sentimos
deleite e prazer ao lê-lo. Por isso, torna-se fundamental conhecermos a poesia em sua
complexidade e beleza.
2 E lementos
poética
estruturais da linguagem
Note que todos os versos possuem dez sílabas poéticas. São, portanto, versos
decassílabos.
Observe a força expressiva desse poema. Com apenas cinco versos, a poeta
revelou o drama de todo ser humano: a sua finitude. O homem, frágil e efêmero, encontra-
-se, nesse poema, face a face com a morte.
Entretanto, diante dessa perspectiva trágica, ele possui a força dos sonhos.
Sonhar torna a vida mais fecunda, mais rica. Tudo no mundo torna-se maior diante da
força da imaginação. Na presença da morte, portanto, o eu lírico mantém as mãos sempre
ocupadas, tecendo o poema. Que verdade magnífica e cheia de vida que Sophia nos
passa, não é mesmo?
(2) Sophia de Mello Breyner
Andresen:
Ao ocorrer o encontro vocálico entre duas palavras (vogal que finaliza uma É uma das grandes poetas
palavra + vogal que inicia uma outra palavra), a contagem pode ocorrer, de acordo com a portuguesas do século 20.
Além de poemas, escreveu
necessidade imposta pelo metro, de duas maneiras: contos, literatura infantil e
ensaios. Traduziu Eurípedes,
Dante e Shakespeare.
Elisão Recebeu inúmeros prêmios,
entre os quais destacam-se o
As vogais se fundem formando uma única sílaba poética. Camões (1999) e o Reina Sofía
(2004).
Hiato
As vogais não se unem, pertencendo cada qual a sílabas poéticas diferentes. INFORMAÇÃO:
Aqui vão algumas dicas de sites
Vejamos os exemplos a seguir: para você fazer suas pesquisas.
• http://www.mulheres-ps20.ipp.
Sentimentos Carnais pt/SophiaMBreyner.htm.
• http://www.triplov.com/sophia/
Sentimentos carnais, esses que agitam helena.html.
• http://www.maricell.com.br/
Todo o teu ser e o tornam convulsivo... sophiandresen/sophia_m_b_
Sentimentos indômitos que gritam andresen.htm.
Na febre intensa de um desejo altivo. • http://www.secrel.com.br/
jpoesia/brey.html.
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UNIDADE 1
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Arrigucci Júnior (2002, p. 15) afirma que Drummond forjou, ao longo de sua
obra, “um denso lirismo meditativo”, em que “o poeta coaduna discórdia com reflexão”.
Dessa forma, para o escritor mineiro, o lirismo “nunca foi puro, mas mesclado de drama
e pensamento”. Isso é o que se pode perceber nesse poema, em que a pergunta torna-
-se uma poderosa ferramenta, com a qual o eu lírico pesquisa a vida humana, revelando
as contradições e complexidades que lhe são inerentes. Com o intuito de compreender a
existência, o sujeito lírico realiza um extenso questionário sobre o ser do homem, sobre
o seu fundamento, a sua natureza, utilizando-se de perguntas repletas de uma aura
metafísica, cujas respostas se perdem no mistério em que se constitui a própria existência
humana.
Sinérese
Junção das vogais em uma única sílaba poética.
Diérese
Cisão das vogais, formando sílabas poéticas diferentes. Vejamos os exemplos
a seguir:
Quem/fez/es/ta/ma/nhã/fê/la/por/ser
Um/rai/oa/fé/cun/dá/la/não/por/li (2ª sílaba: sinérese,
3ª: elisão)
Au/sên/cia/sem/pe/ca/do’e/ fê/la/ter (3ª sílaba: sinérese,
7ª elisão)
Em/si/prin/cí/pio’e/fim/ter/em/tr’au/ro (5ª e 9ª idem)
E/mei/o/di/a’um/ho/mem’e/su/a/ho (2ª sinérese,
3ª diérese, 5ª elisão, 9ª diérese)
Os versos com mais de doze sílabas não têm nome. Na poesia anterior ao nosso
século, eles eram chamados de versos bárbaros. Com o advento da poesia moderna,
esses versos passaram a ser usados de forma sistemática. Veja o exemplo de Fernando
Pessoa / Álvaro de Campos:
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UNIDADE 1
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Ritmo
Meio-Dia
INFORMAÇÃO:
António Ramos Rosa,
considerado um dos Contemplo a mulher adormecida. Ocupa uma metade do terraço, longa
melhores poetas portugueses e voluptuosamente extensa, constelada de um silêncio que é todo aéreo
contemporâneos, tem recebido
inúmeros prêmios e já viu o seu e ondulante. Em volta o mundo converteu-se em um pomar unânime.
nome apontado como candidato Tudo está imóvel, fixo, como um centro. As superfícies lisas, brancas, sem
ao Prêmio Nobel da Literatura. reflexos, sem sombras. Imperceptível, insondável é o gesto fulgurante
Disponível em: <http://www.
citi.pt/cultura/literatura/poesia/ da imobilidade. A intensidade da presença identifica-se com o vazio da
ramos_rosa/>. Acesso em: 25 ausência. O meu corpo entende o corpo da mulher, enrola-se nas volutas de
ago. 2005. sua música silenciosa, adere às paisagens brancas do seu sono completo.
Um importante poeta francês, Paul Valéry, teorizou sobre o ritmo. Ele compara
o ritmo do poema à dança e ao balé; ao passo que a prosa de todo dia é a marcha do
soldado. Um outro poeta importante, o mexicano Octavio Paz, faz esta afirmação sobre o
ritmo do poema:
São vários os recursos usados para que ele se faça presente. Esse é o caso do
poema de Ramos Rosa. Agora, leiam esse poema do Carlos Nejar:
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UNIDADE 1
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Eis um exemplo tocante de ritmo. Ele permite que a emoção poética atinja
o leitor. A luta do homem contra a sua condição de ser preso a terra, de ser mortal,
está explícita pelo ritmo perfeitamente regular. Cada verso se divide em dois segmentos
idênticos. Com isso, o poeta imita, por meio da palavra, o movimento monótono da enxada
a arar a terra. Esse movimento também metaforiza a condição frágil do homem: um ser
que se esvai e se perde como a terra arada.
INFORMAÇÃO:
O poeta gaúcho Carlos Nejar,
membro da Academia Brasileira Vamos conhecer outro poema do Carlos Nejar? Leiam este belo texto chamado
de Letras, segundo o crítico Sísifo. Infelizmente, vocês não o conhecem na íntegra, mas apenas um excerto do poema.
suíço Gustav Siebenmann, autor
do ensaio Poesia y Poéticas del Leiam:
Siglo XX en la América hispana
y el Brasil, é considerado um dos
37 escritores-chaves do século, Sísifo
dentre 300 autores memoráveis,
no período compreendido entre
1800-1900. Aceitei.
Saiba mais acessando o site:
Levo esta pedra
<www.nejar.cjb.net/>.
Temos aqui apenas um pequeno ao alto da montanha
fragmento da grandiosa obra de e ela tomba depois
Nejar, Os Viventes, da editora
Record. e recomeço.
Neste gesto
a condição humana
até o excesso
de amar, sofrer
e respirar
os planos
e os mais longos
dos receios.
Nessa pedra
a resistência
que se faz eterna.
E começo de novo.
Felicidade é apenas
o possível
no impossível
ou rastro
que nos fica
do sopé
para o cume.
E com a pedra
caímos,
transportando
o mar.
Feliz ou não:
pretexto.
A pedra é o mar
que engendro.
Naufrago andando
[...]
(NEJAR, 1999, p. 247-248).
Vocês devem se perguntar? Mas o que é ou quem é Sísifo? Vejam, o poeta exige
um conhecimento prévio por parte do leitor.
3 E-referências
Chamadas Numéricas
4 Referências bibliográficas
ARRIGUCCI JÚNIOR, Davi. Coração partido: uma análise da poesia reflexiva de Drummond.
São Paulo: Cosac & Naify, 2002.
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UNIDADE 1
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
ROSA, António Ramos. Antologia poética. Seleção, prefácio e bibliografia de Ana Paula
Coutinho Mendes. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 2001.
UNIDADE 2
DA LINGUAGEM POÉTICA:
MUSICALIDADE DA PALAVRA II
Objetivo
• Identificar e classificar os seguintes recursos fônicos da
poesia: rima, estrofes, anáfora, reiteração, aliteração,
assonância, onomatopeia, paralelismo, refrão.
Conteúdos
• Rima.
• Estrofe.
• Reiteração.
• Anáfora.
• Aliteração.
• Assonância.
• Onomatopeia.
• Paralelismo.
• Refrão.
UNIDADE 2
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
ATENÇÃO!
Confira no Guia de disciplina
e no início de cada unidade as
1 Introdução
informações para facilitar o seu
estudo. Então, acharam difícil chegar até aqui? Calma. Lembrem-se: é preciso persistir.
Lembre-se, ainda, de que sua
participação pode significar a
diferença entre ler conteúdos ou Gostaram de algum poema? Sempre gostamos mais de um texto do que de
transformar conhecimentos em outro. Precisamos, simplesmente, descobrir as nossas sintonias.
qualidade de vida.
2 Rima
A musicalidade da poesia tem na rima seu elemento essencial. A rima “é a
semelhança sonora dos fonemas a partir da última sílaba tônica do verso. [...] Em sua
função elementar cabe à rima assinalar o término dos versos” (COELHO, 1974, p. 61).
Nesse caso, ela se chama rima externa. Entretanto, a rima também pode ocorrer no
meio do verso, nesse caso ela se chama rima interna. Por exemplo:
Tipos de Rimas
Temos dois tipos de rimas: consoantes e assonantes. Vamos conhecer cada uma
delas.
• Consoante: apresentam semelhança entre vogais e consoantes. É o caso, por
exemplo, das rimas de Camões: “ado” e “ente”.
• Assonante: somente as vogais se assemelham. Portanto, a unidade sonora
entre as rimas assonantes não é total. Veja um exemplo dessa rima em uma
cantiga medieval do autor Pedro Gonçalves Portocarreiro:
(Por Deus, infeliz eu vivo/ pois meu amigo não vem:/ se não vem, que farei?/
Oh, meus cabelos com sirgo/ eu não vos prenderei).
Há, nesse poema, rimas assonantes (“ivo”/ “igo”) e consoantes (“arei”/ “arei”).
[...]
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UNIDADE 2
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
• Rima encadeada: ocorre quando a palavra que finaliza um verso rima com
outra situada no meio do verso seguinte:
3 Estrofe
Um conjunto de versos chama-se estrofe. A estrofe é, portanto, um bloco de
linhas poéticas. De acordo com o número de versos que a estrofe possui, ela recebe um
determinado nome:
• dístico (dois versos);
• terceto (três versos);
• quarteto (quatro);
• quintilha (cinco);
• sextilha (seis) etc.
As estrofes em que todos os versos possuem todos uma mesma métrica são
chamadas de isométricas. Já as que intercalam medidas diferentes ou versos livres
são chamadas heterométricas. Vejamos no próximo poema, de Álvares de Azevedo, a
estrofe isométrica, em eneassílabos:
Os poemas de forma fixa são aqueles que seguem um certo número de estrofes
e versos preestabelecidos. Esse é o caso do soneto e da quadrinha popular.
4 Processos intensificadores
O poema, como vocês puderam observar, é, portanto, um discurso que se
caracteriza pela melodia e pela musicalidade da palavra. O poeta francês Verlaine dizia “A
música antes de tudo”. A poesia é esse discurso no qual o pensamento torna-se comoção,
sentimento. O poema encarna-se no peito e modula nossa existência, nossos nervos.
Além da rima e do metro há outros processos intensificadores da musicalidade. Vamos
conhecer alguns deles?
5 Reiteração
É a repetição de uma mesma palavra ao longo do poema. Esse recurso intensifica
determinados significados do poema, o sentido do texto. Vejam um exemplo clássico de
autoria de Cruz e Sousa:
Cristo De Bronze
6 Anáfora
É a reiteração de uma palavra no início dos versos de um poema. Pode ser
constituída por um único termo ou mais. Ela também atua como elemento intensificador
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UNIDADE 2
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do sentido do texto. Observem algo que é muito importante. Todos esses recursos vistos
até agora precisam ser interpretados. O plano da expressão está intimamente ligado ao
plano do conteúdo. Forma e significado são uma totalidade. Portanto, sempre que vocês
lerem um poema é importante buscar sentido para os recursos estilísticos. Vimos isso no
poema do Nejar, o “Sísifo”. Vocês se lembram? Nesse texto, o ritmo indicava o sentido do
texto. Como exemplo de Anáfora, leia esse texto do poeta português Ruy Belo:
7 Aliteração e assonância
A reiteração do som consonantal, ou seja, a repetição de uma determinada
consoante é chamada de aliteração. Já a reiteração das vogais é chamada de assonância.
Com esses recursos, o poeta intensifica a musicalidade do poema. Vejamos um exemplo
no poema de Eugênio de Andrade, notando a reincisão da consoante “V” e da vogal “E”.
8 Onomatopeia
Repetição de sons com o intuito de imitar um determinado ruído. Vejamos no
poema de Manuel Bandeira outro exemplo:
9 Paralelismo
Repetição de uma linha poética ou de uma ideia ao longo do poema. Há dois
tipos de paralelismos:
Reiteração sintática
10 Refrão
Reiteração de um mesmo verso no início ou no fim de uma estrofe. Esse recurso é
muito usado nas cantigas populares. Vejamos um exemplo no poema de Jorge de Lima:
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Batatais – Claretiano
UNIDADE 2
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
Retorno que não está muito distante de ligações com a batida do tantã com que
os selvagens nas matas acompanham danças e cerimoniais religiosos, e que se
liga ao rito das encantações mágicas. A finalidade dessas repetições rítmicas é
ao mesmo tempo a de excitar e de embalar, o que pode parecer contraditório.
A verdade, porém, é essa. A poesia deve predispor uma parte de nosso ser
ao torpor a fim de despertar e de excitar uma ou outra parte. Ela adormece
a parte de nosso ser que raciocina e discute, mas desperta a que se recorda,
se comove e imagina. Nessa dupla função de adormecimento e de despertar a
repetição dos sons é para a poesia um poderoso instrumento (LEWIS; PERES
apud COELHO, 1974, p. 74).
11 Referências bibliográficas
BUENO, Alexei; SILVA, Alberto da Costa. Antologia da poesia portuguesa contemporânea:
um panorama. Rio de Janeiro: Lacerda, 1999.
CARPI, Maria. As sombras da vinha: poemas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.
GUIMARAENS, Alphonsus de. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2001.
LISBOA, Henriqueta. Obras completas – I: poesia geral (1929-1983). São Paulo: Duas
Cidades, 1985.
Objetivos
• Apreender e descrever o caráter epifânico e sagrado da
poesia.
Conteúdos
• Caráter sagrado da poesia.
• Comparação.
• Metáfora.
UNIDADE 3
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
1 Introdução
“Um poema pode se elaborar sem a intervenção de um metro ou de rimas,
enquanto não pode nascer sem aquela magia interior que se manifesta sob a forma de
imagens ou de metáforas” (LEWIS; PERES apud COELHO, 1974, p. 74).
Já estudamos os recursos sonoros da poesia. Foi difícil chegar até aqui? Calma,
aos poucos vocês irão tomando intimidade com o fenômeno poético. Mas ainda há muito
o que aprender. Vamos continuar?
Poderíamos com segurança responder que não. Muitos poetas fazem joguinhos
com as palavras, combinações sonoras desprovidas de sentido, de verdade humana.
Nesses casos, o poema perde qualidade, aliás, isso revela a falta de habilidade do poeta.
Com isso, podemos então afirmar que o poema é a combinação entre forma e conteúdo,
combinação esta feita de maneira tão harmônica quanto perfeita, que um não existe sem
o outro. Por isso é tão difícil traduzir um poema.
2 Processos imagísticos
Voltando um pouco ao assunto, podemos afirmar que a poesia é, além de música,
imagem. Eis a grande magia da poesia, transformar a realidade (o real) em imagem, em
INFORMAÇÃO:
arte. Esse processo não pertence somente à lírica, mas também às artes plásticas. Se
Sugerimos que você faça sua
biblioteca pessoal. Além de lembrarmos, por exemplo, dos trigais pintados por Van Gogh, ou dos famosos nenúfares
ser importante para sua vida de Monet, somos tomados por uma comoção, por uma aura, que pertencem apenas ao
acadêmica, ajudará você a
ampliar o seu conhecimento sentimento estético.
sobre a literatura e o estimulará
a ler mais. Para tanto, seguem
É diferente, porém, quando olhamos um trigal verdadeiro, especialmente ao cair
de sugestão os livros citados
nas bibliografias. Vá até lá e boa da tarde, sentiremos também emoção. Contudo, no primeiro caso, somos arrebatados
leitura! por um sentimento advindo de uma criação humana. Sentimos, portanto, diante da
grande arte, arrebatamento, entusiasmo, porque testemunhamos, sobretudo, a arte da
imaginação, do engenho humano levados aos seus níveis sublimes. Comovemo-nos pelo
que há de humano na arte. E isso enriquece nosso olhar, nosso espírito. Tanto é assim que,
após o efeito da arte, nós nos tornamos outros. Após olhar um nenúfar do Monet, todos os
nenúfares do mundo serão maiores e mais perfeitos. O mundo torna-se maior pela arte.
Agora, leia esse texto da poeta Dora Ferreira da Silva:
Sótão
II
Isso parece difícil, mas não é. Pense um pouquinho. O tempo em que ficamos na
fila de um banco é o mesmo tempo do encontro amoroso? Quando vamos pagar nossas
contas, ficamos sufocados, parece que o tempo não passa. Agora quando nós vemos o
ser do amor, o corpo lateja, a respiração fica ofegante, então surge o abraço, a alegria
viva de estar vivo. Esse tempo parece eterno e ao mesmo tempo intensamente veloz. É
o tempo do sagrado, o tempo do amor, o tempo da poesia. Quando lemos um poema,
nós atingimos esse instante mítico, esse momento da epifania. Agora ficou mais fácil
compreender esse processo? Veja então o que Mircea Eliade afirma:
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Batatais – Claretiano
UNIDADE 3
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
Prestem atenção! Eu preciso ver essa roseira para percebê-la? Não! Pois eu
a vejo com os olhos da alma, com os olhos da imaginação. Esta é a função da imagem
poética: mostrar pela palavra as coisas do mundo. Mas, cuidado! Essa percepção é uma
percepção especial. Não basta, para o poeta, ver a roseira apenas. Ele a percebe com
olhos alumbrados, olhos de encanto, como se a visse pela primeira vez. O poeta vê o
espetáculo do mundo com olhos de criança. Por isso, a roseira tornou-se algo magnífico,
pois o poeta observa, na verdade, um milagre.
Aliás, o mundo é um milagre. Como pode existir tanta cor, tantas formas e
contornos? A realidade das coisas é verdadeiramente um mistério, e o poeta se encanta por
esse mundo. A “hora das coisas” é essa grande hora em que o mundo torna-se epifania,
torna-se aparição do sagrado. A roseira de Adélia leva-me em direção a algo muito maior, à
presença do sagrado. Esse sentimento sublime faz com que a poeta elabore as magníficas
metáforas: as rosas são joias vivas. Calma, em breve nós iremos estudar as metáforas.
Fiquem apenas com esta verdade: a poesia é uma forma especial de ver o mundo.
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UNIDADE 3
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
3 Comparação
INFORMAÇÃO:
José Paulo Paes foi poeta,
ensaísta, crítico literário e É quando um dado objeto (ou ser) é comparado a outro. Ambos os elementos
tradutor de poetas, bem como comparados estão unidos sempre por uma partícula comparativa: “como”, “tal como”,
de algumas prosas. Leia seu
livro Melhores poemas (veja “assim como”, “tal qual”. Vejamos o exemplo no poema de José Paulo Paes:
Referências Bibliográficas). Caso
queira saber mais sobre esse Madrigal
poeta paulista, acesse o site
<www.cce.ufsc.br/~nupill/ensino/
paes.htm>. Meu amor é simples, Dora,
Como a água e o pão.
Notem que o amor é comparado à água, ao pão, ao azul espelhado nos olhos
de um cão. O poeta, de forma pungente e arrebatadora, revela-nos a simplicidade desse
sentir raro e absoluto que é o amor. A pureza da água, o sabor do pão, a cor dos céus,
transfiguram o sentimento humano, objetivando-o, ou melhor, cosmicizando-o.
ATENÇÃO!
Se você gostou desse poema, Mas o que significa tudo isso? Calma, vamos tentar entender o que significa
veja a referência ao livro de Olga essa expressão “cosmicizar”. Em primeiro lugar trata-se de um neologismo criado por
Savary e leia-o na íntegra. Vale
um filósofo francês muito importante, Gaston Bachelard. “Cosmicizar” significa espelhar
a pena!
os sentimentos em objetos da natureza. Ora, o sentimento do homem, enraizado nas
profundezas do espírito, dá-se ao mundo, pois revela-se por meio de elementos externos
ao corpo. Com isso, o que é subjetivo (espiritual) torna-se objetivo (material). Essa é uma
INFORMAÇÃO: outra característica da imagem poética: tornar palpável, ou seja, tornar material o que
Olga Savary é poeta, contista,
é subjetivo e espiritual. Por isso, a poesia diz o indizível. Muitos críticos afirmam que a
romancista, crítica e ensaísta,
tradutora e jornalista. Ela tem poesia possui o dom de exprimir sensações difusas, imprecisas. A linguagem da poesia,
inúmeros livros publicados, tendo sensorial e tátil, exprime realidades misteriosas, regiões inacessíveis à razão.
sido agraciada com vários dos
principais prêmios nacionais de
literatura, dentre eles, prêmio Leiam agora esse trecho do poema de Olga Savary, para que possamos
Jabuti de autor revelação pelo
livro Espelho provisório. Saiba
compreender melhor esse processo:
mais, acessando o site <www.
releituras.com/olsavary_menu. 2
asp>. Pituna-Ara
[...]
4 Metáfora
INFORMAÇÃO:
Na metáfora, os elementos comparados sofrem uma consubstanciação, ou seja, Lya Luft, gaúcha, professora
eles passam a se identificar tão profundamente que um passa a ser o outro. Nesse caso, as de literatura, é mestre em
Linguística e Literatura Brasileira.
partículas comparativas desaparecem. Nem sempre esses dois elementos aparecem. Um Sua atividade literária inclui a
deles pode ficar subentendido no texto. Vejamos agora um poema de autoria de Lya Luft: tradução, especialmente de
autores de língua inglesa e
alemã. Escreve mensalmente
Canção Para A Mulher Que Canta para a revista Veja. Consulte
(para Maria Bethânia) mais sobre essa poetisa no
site <http://www.releituras.com/
lyaluft_bio.asp>.
Mulher que és pássaro e és fonte,
teu canto lança as redes da beleza
sobre nós, que em penumbra e espanto
contemplamos teu vôo.
Teu fervor vai bordando uma paisagem
onde seremos deuses, cravada
a tua voz em nossa alma.
Todo esse texto de Lya Luft está repleto de metáforas. Inicialmente, ela nomeia
a cantora com as palavras “pássaro” e “fonte”. Essas duas metáforas revelam justamente
a leveza da cantora e a pureza de sua voz. Outra metáfora é a voz que lança rede. Sentir-
-se encantado por uma voz é sentir-se preso a ela. A voz “borda” uma paisagem, ou seja,
ela faz nascer um lugar novo. O canto possui essa magia: fazer as coisas ficarem belas,
tornar os lugares sempre novos e encantadores. Depois, a cantora torna-se “rio” e “ponte”,
ou seja, torna-se passagem, nos remetendo para o outro lado dessa ponte. Essa metáfora
da ponte revela o quanto essa voz faz transcender quem a ouve. Quem escuta esse
canto é transportado para o cerne da própria beleza. Vejam, em todas essas metáforas
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UNIDADE 3
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os seus cabelos
são
uma lâmpada de querosene
acesa
as suas espáduas são
o martelo dos meus prazeres
as suas costas
são o
olho de vidro
do mar
o arado
dos falsos ideogramas
apita
aflitivamente
na sua cintura
nas suas nádegas
são
cola de peixe
as suas pernas
são como relâmpagos
(EGGONÓPOULOS apud PAES, 1997).
Vejam que texto doido!!! Mas fiquem tranquilos, nenhum texto é capaz de nos
vencer! Há uma importante informação que não podemos ignorar. Eggonópoulos era um
poeta surrealista. Os poetas surrealistas buscavam visões oníricas, visões de sonho no real.
Com isso, eles intentavam desarticular a realidade, revelando o que ela tinha de absurdo.
Dizer que um pescoço é um cavalo pode não ficar tão esquisito se nós aceitarmos o jogo.
Há um tipo de metáfora que perde essa força, torna-se clichê. Peguemos como
exemplo a seguinte metáfora: “arranha-céu”. Nós já nem percebemos mais as unhas
roçando o infinito azul. Logo nos vem à mente a imagem de um prédio. A analogia deixou
de existir. “Arranha-céu” passa a ser sinônimo de prédio. Esse tipo de metáfora não é, de
forma alguma, poética. Muitas pessoas (sem imaginação), que se julgam poetas, repetem
uma série de metáforas como essas, intituladas “metáforas gastas”, e se acham grandes
criadoras. Isso revela uma coisa importante: pessoas assim não são leitoras.
Eis a importância da imaginação para o processo metafórico: é ele que liga, por
exemplo, a estrela à pedra, formando a seguinte metáfora: “a pedra do infinito despencou
no abismo do eu”. É lógico que a “pedra do infinito” é a estrela cadente e o “abismo do
eu” é o sentimento de entusiasmo que esse fenômeno causou no poeta. E veja, a estrela
já nem sequer cai em algum chão do mundo, mas no interior do eu. O sentimento de
felicidade é tão grande, que o poeta imagina a estrela despencando dentro do próprio
peito. É claro que a estrela não adentra a carne. Entretanto, é preciso fazer de conta.
Se aceitarmos esse jogo, nos apaixonamos pelo poema! E tudo isso graças à “Rainha das
faculdades”.
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“as pérolas de sua boca”: sema em comum – a cor branca dos dentes e das
pérolas.
“o rio que nos leva para a morte”: sema em comum – o movimento do rio e o
movimento do tempo que leva os seres vivos para o fim de si mesmos.
Nem sempre essas metáforas são clichês. Há algumas delas que são muito
utilizadas pelos poetas. Entretanto, quando se trata de um bom poeta, ele sempre as
utiliza com bom senso e sensibilidade.
É importante notar que, nesses casos, o sema é que nos permite encontrar o
sentido da metáfora. Tal fato é que facilita a decifração dessas figuras, pois há nelas um
percurso lógico, capaz de orientar o leitor: a característica em comum.
E agora José, como nós vamos identificar o significado dessa metáfora? Bem,
ângelus são as badaladas de um sino. Isso nos remete a uma atmosfera religiosa. O
som do sino simboliza muitas coisas: a morte de alguém, a hora de uma missa ou do
encontro com Deus. Agora, note uma coisa interessante. O som do sino é azul! Como isso
é possível? Calma, nós somos detetives perspicazes, logo encontraremos a solução dessa
charada. Além de metáfora, essa expressão é uma sinestesia. Mas o que é uma sinestesia,
meu Deus?! Sinestesia (nós iremos estudá-la mais detalhadamente logo, logo) é a fusão
de sensações diferentes. Nesse caso, temos uma cor (azul) e um som (o badalo do sino).
Visão e audição confundem-se e fundem-se.
Agora, se imaginarmos o lugar onde o sino fica a metáfora se revela. O sino não
fica nas torres das igrejas, perto do azul dos céus. Pois então! O poeta ao ouvir o sino
olhou para o céu e viu a cor azul. Intuitivamente ele inventou essa metáfora, misturando
imagens distantes, mas ao mesmo tempo muito próximas.
Ufa!!! Essa metáfora foi complicada, você não achou? Mas, calma. Com jeitinho,
nós iremos nos acostumando, até tudo tornar-se mais acessível. Lembre-se de que
o gostoso da poesia é justamente esse susto, esse estranhamento. Para que ler algo
monótono e sem aventura?! Sobre esse tipo de metáfora, veja o que afirma Nelly:
No Meio Do Caminho
Nossa mestra, Nelly Novaes Coelho, revela-nos o quanto essa pedra é enigmática,
explicitando os vários sentidos dessa palavra. Vamos dar uma olhadinha:
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UNIDADE 3
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
metáfora para a morte? Mas é claro que sim. E para confirmar a minha leitura, bastaria eu
citar o que os críticos afirmam. Assim, eu estaria embasando a minha leitura e evitando a
superinterpretação ou a análise equivocada.
5 E-Referências
Chamada numérica
6 Referências Bibliográficas
ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992.
______. Todas as horas e antes: poesia reunida. São Paulo: A Girafa, 2004.
BOSI, Alfredo. O ser e o tempo da poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
COELHO, Nelly Novaes. Literatura e linguagem. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974.
ELIADE, Mircea. Imagens e símbolos: ensaio sobre o simbolismo mágico religioso. Tradução
de Sonia Cristina Tamer. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
MOURA, Emílio. Itinerário poético: poemas reunidos. Belo Horizonte: UFMG, 2002.
PAES, José Paulo. Melhores poemas. Seleção de Davi Arrigucci Júnior. São Paulo: Global,
2000.
SAVARY, Olga. Repertório selvagem: obra reunida. São Paulo: Multimais, 1998.
SILVA, Dora Ferreira da. Poesia reunida. Rio de Janeiro: Topbooks, 1999.
UNIDADE 4
LINGUAGEM POÉTICA: LINGUAGEM
IMAGÍSTICA DA POESIA II
Objetivo
• Identificar e distinguir os seguintes recursos imagísticos da
poesia: metonímia, sinestesia, antítese, paradoxo.
Conteúdos
• Metonímia.
• Sinestesia.
• Antítese.
• Paradoxo.
UNIDADE 4
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
1 Introdução
Na Unidade 3, pudemos conhecer alguns processos imagísticos na poesia, como
a comparação e a metáfora.
2 Metonímia
A metonímia é muito confundida com a metáfora. Assim como esta última,
a metonímia também é uma “transnomeação”, ou seja, designamos algo usando outro
nome, expressamos um elemento por meio da nomeação de um outro que lhe é distinto.
Entretanto, no caso da metonímia, há uma ligação essencial entre os dois termos postos
em questão.
A metonímia responde [...] à fórmula lógica pars por parte (parte por partes),
em que algo é citado por algumas das relações mantidas com o verdadeiro
fenômeno ou objeto que ele substitui (de causa a efeito, de matéria a objeto,
de continente a conteúdo, de ação a sujeito, do genérico ao específico, etc.)
(COELHO, 1974, p. 79, grifos nossos).
Assédio
fechar portas
sem deixar frestas
trancar
cerrar trincos
passar ferrolhos
lacrar
contra
os sobressaltos
do receptáculo
onde entra
o inseto sub-reptício
o susto
palpitações
e vêm
Agora, leiam esse poema da maravilhosa Lara de Lemos, poeta gaúcha que,
infelizmente, é pouco lida. Antes, porém, de lhes revelar o poema, é necessário um
comentário. Infelizmente, o Brasil possui poucos leitores de poesia. Até mesmo os leitores
INFORMAÇÃO:
especializados tornam-se omissos, pois eles sempre estão lendo os mesmos autores. Há
Lara de Lemos é outra poeta,
grandes poetas, vivos e mortos, que precisam ser descobertos. É o caso de Emílio Moura assim como Hilda Hilst, que tem
(que vocês já conhecem), poeta do modernismo mineiro e grande parceiro de Drummond, grande participação em nossa
literatura. Utilizamos o poema
escritor muito importante e que é um verdadeiro fantasma no Brasil. Reminiscências, que está no seu
último livro Dividendos do tempo,
da editora L&PM. Uma obra que
Imagine os poetas vivos. A grande massa lê apenas o que vira celebridade. Isso
vale a pena conferir na íntegra.
é ótimo, pois dentre esses autores estão, por exemplo, um Drummond, uma Adélia Prado, São da mesma poeta Canto
grandes poetas, escritores espetaculares. Entretanto, há muita gente boa escrevendo, breve e Poço das águas vivas.
mas, que quase ninguém se interessa por autores desconhecidos. Uma grande poeta,
Hilda Hilst, vivia reclamando, e com razão, que ninguém a lia. Então vamos conhecer uma
autora fantástica que merece a nossa atenção: Lara de Lemos.
Reminiscências
1 – Do avô – as botas,
o rifle de caçar
perdizes e codornas.
2 – Da avó – vasilhas
fumegantes de salsa
e mangerona.
5 – Depois, lágrimas
em água e sal
sorvidas
(LEMOS, 1995, p. 23).
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Batatais – Claretiano
UNIDADE 4
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
As estrofes um, dois, três e quatro possuem uma mesma estrutura. São, na
verdade, estrofes paralelísticas, semelhantes. Nessas estrofes, sempre é enunciado um
substantivo, um nome de alguém querido, e depois um travessão seguido de algumas
palavras. São versos densos, constituídos por termos maciços e concretos (substantivos
concretos). Tudo o que vem após o travessão são metonímias dos seres amados (o avô,
a avó...). Portanto, a estrofe parte do todo e vai em direção às partes constituintes dos
seres queridos. Por exemplo, as botas, o rifle, as perdizes são metonímias do avô.
Essas metonímias vão sempre do todo para as partes que a constituem (o ser =
a veste; o ser = ao objeto que lhe pertencia; o ser = a uma parte de seu corpo). Se lermos
o título, verificaremos que tudo o que está enunciado nesses versos pertence ao passado
do eu lírico. O eu se lembra dos seres queridos. Portanto, as quatro primeiras estrofes são
do domínio de um tempo distante.
Quando lemos a última estrofe, nos deparamos com um “Depois”. Com isso,
podemos afirmar que o momento dessa última estrofe vem depois do passado. Trata-
-se, portanto, do presente da enunciação, momento do agora. E por que tanta tristeza
nesse eu que recorda e chora? Simples, o eu lírico é, na verdade, um sobrevivente. Os
seres queridos já não mais existem, eles morreram. O travessão acentua essa ideia: são
seres atravessados ao meio, cortados, tal como as estrofes são cortadas pelos travessões.
Depois há outro fator que confirma isso. As metonímias são fragmentos desses seres,
restos. Da totalidade do ser amado só sobraram restolhos, coisas velhas.
O coração da gente bate mais forte, não é mesmo? Afinal, tal poema está
repleto de verdade humana. Nós nos enxergamos nele, pois também temos seres amados
que já não mais existem. Ao ler esse poema de Lara, encontramos uma voz amiga que
sofre junto com a nossa. Vejam, essa é a grande alegria da poesia: encontrar o humano
universal que há em todos nós.
3 Sinestesia
A sinestesia, como já vimos, é a figura em que ocorre a mistura de sensações.
Um exemplo banal seria algo como “perfume doce”. Usa-se uma sensação do paladar para
indicar uma outra, olfativa. A poesia moderna quebrou todas as regras da poesia clássica.
A sinestesia foi uma figura muito usada pelos poetas modernos, pois ela propiciava uma
visão singular da vida. Vejam o que afirma Nelly:
Essa figura tornou-se famosa entre os poetas de uma escola literária surgida no
fim do século 19, o simbolismo. Na verdade, os simbolistas encontraram na experiência
da sinestesia um importante exercício poético. Tal exercício possui raiz na obra de um
importante poeta francês, Charles Baudelaire. Os simbolistas eram seguidores desse
grande escritor, o autor das Flores do mal. De acordo com Baudelaire, a visão se dava pela
fusão de todas as sensações. Percebia-se o mundo pelo olhar, mas nessa experiência o
corpo todo estava em atividade, em exercício. Via-se o mundo pelo corpo todo: pelo tato,
pela audição, pelo olfato, pelo paladar. Esse olhar especial está bem descrito no famoso
poema Correspondências:
Correspondências
Agora, vejam que o poeta mistura muitas sensações: “aromas frescos”, “Doces
como o oboé”, “verdes como a campina”. Como pode um aroma ter frescura (sensação
tátil), ser doce (paladar) como a música (som do instrumento musical oboé) e ter cor
(verde)? Tudo isso são sinestesias. Figura de linguagem que revela, portanto, o olhar
especial do poeta.
4 Antítese
A antítese é a confrontação de elementos opostos, em tempos distintos. Por
exemplo: Às vezes, choro, em outras, rio. Um exemplo célebre de antítese podemos
encontrar no poema de Vinícius de Moraes, Poética I:
Poética I
De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.
A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O este é meu norte.
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UNIDADE 4
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
Nasço amanhã
Ando onde há espaço
– Meu tempo é quando
(MORAES, 1985, p. 277).
5 Paradoxo
Figura que expressa ambiguidade, a dualidade inerente a certas realidades
ou fenômenos. No paradoxo, acontecimentos, ou elementos opostos, convivem
consubstanciados. Vejamos agora um poema de Emílio Moura:
É Preciso
6 Prosopopeia
INFORMAÇÃO:
Donizete Galvão, poeta mineiro,
A prosopopeia, ou personificação, ocorre quando atribuímos características
é autor do poema Sopro, que
está inserido no seu livro Carne humanas a coisas inanimadas ou a animais. Vejamos um excerto do poema Sopro, de
e o tempo, da editora Nankin. Donizete Galvão:
Carne e o tempo foi indicado
para o Prêmio Jabuti em 1998.
Sopro
o vento
balança
a amoreira
joga
amoras
que sangram
no chão
o vento
arrepia
a água
enruga
o açude
que remonta
sua mandala
o vento
espicaça
os pavões
entorta
as caudas
que encerram
sua majestade
o vento
benze
a nuca
lambe
o corpo
que aspira
seu frescor
(GALVÃO, 1997, p. 23).
Olhem! Como é possível as amoras terem sangue? Temos, nessa imagem, uma
característica de um ser vivo (sangrar) dada a objetos inanimados (amoras). Observem
também a disposição gráfica do poema.
Por que será que o poeta Donizete Galvão dispôs os versos em desalinho? Ora,
ele não está descrevendo determinados acontecimentos nos quais o vento é enfocado?
Pois bem, os versos estão em desordem como se estivessem voejando como o vento,
balançando graças ao sopro do vento. E afinal, por que o autor iria lidar com algo tão
banal? Evidentemente essa banalidade é aparente.
Vamos nos atentar para a mensagem profunda do texto? Pois bem, o vento é
uma metáfora! Mas metáfora do quê? Observem: o vento não se movimenta e faz sangrar,
morrer as amoras? Agora pensem. São as amoras, verdadeiramente, que morrem? Lógico
que não. Esse papel cabe aos seres vivos. Qual é o vento que aniquila a vida? Qual
a correnteza que leva a vida embora? Eis a resposta do enigma: o tempo, chamado
pelo famoso filósofo pré-socrático, Heráclito, de Tempo Rei. Enfim, o tempo faz a vida
despencar e sangrar. O tempo movimenta o mundo, faz girar os acontecimentos. Agora,
água tem rugas? Também não.
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UNIDADE 4
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
INFORMAÇÃO: exemplo, em rostos magníficos, como os de Greta Garbo, Audrey Hepburn. Enfim, o tempo
Para realizar a atividade desta
unidade, utilizaremos um poema
leva embora o vigor da juventude. Por fim, a epifania: apesar da ruína e da morte, há o
da poeta carioca Denise Emmer, frescor, o sentimento sublime de sentir o vento (agora, sim, o verdadeiro vento) roçar o
Cantiga triste, que se encontra nosso rosto.
na sua obra Poesia reunida,
da editora Ediouro. Além de
uma excelente poeta, Denise é
flautista, cantora, violoncelista
e já tocou com a Orquestra
de Câmara da Escola Villa
Lobos. Consulte o Caderno de
8 Referências bibliográficas
atividades e interatividades para
interar-se do assunto. Saiba mais
sobre Denise Emmer acessando ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992.
o site: <http://www.palavrarte.
com/Equipe/equipe_demmer. BAUDELAIRE, Charles. Poesia e prosa. Organização de Ivo Barroso. Rio de Janeiro: Nova
htm>.
Aguilar, 2002.
COELHO, Nelly Novaes. Literatura e linguagem. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974.
GALVÃO, Donizete. A carne e o tempo. São Paulo: Nankin, 1997. (Coleção Janela do
Caos).
LEITE, Sebastião Uchoa. A regra secreta. São Paulo: Landy, 2002. (Coleção Alguidar).
MORAES, Vinícius de. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1985.
MOURA, Emílio. Itinerário poético: poemas reunidos. Belo Horizonte: UFMG, 2002.
Objetivos
• Compreender e explicar a importância da poesia como
fenômeno da linguagem.
Conteúdos
• Aspecto formal do poema.
1 Introdução
E aí, vamos continuar? Nas unidades anteriores, vimos o quanto a imagem é
fundamental para o poema. É verdade: ela é a essência de um poema. Não existe um
texto poético sem figuras que apelam para as nossas sensações. O olhar, o olfato, o tato,
todo o nosso corpo está centrado na leitura do poema. Não usamos apenas os olhos na
leitura do texto lírico, mas todo o corpo. Nosso corpo, em sua completude, trepida na hora
da leitura. Somos arrebatados por completo. Nesse processo, o poema atinge, pelo nosso
corpo, o centro de nós mesmos, o coração, os nossos sentimentos.
Agora vamos nos ater à leitura do poema. Como deve ocorrer a leitura de um
texto? Antes de mais nada, é preciso esclarecer que, para nós, estudantes de Letras,
o fundamental é o texto. Hoje, vigora uma nova corrente crítica, chamada Estudos
Culturais, que usam o texto para ilustrar teorias alheias à teoria da literatura. Por exemplo,
um psicólogo vai estudar o complexo de Édipo na obra da Hilda Hilst. Meu Deus! Ele vai
encontrar muito material para a sua pesquisa, pois toda a obra da Hilda trava um contato,
um diálogo com o pai. Dessa forma, o psicólogo usa o poema para exemplificar sua tese,
sua pesquisa. Isso seria um estudo do poema, ou um estudo de psicologia? Com certeza,
de psicologia, pois o poema não foi considerado em sua riqueza, em sua singularidade. O
poema não foi considerado como linguagem, forma.
E agora, esse tipo de estudo é válido? Com certeza, mas não podemos nos
restringir somente a esse tipo de leitura. Precisamos pluralizar as leituras, provocar
dilemas, problematizar. Nós, como estudantes de Letras, temos que encarar o fenômeno
literário como um fenômeno da linguagem. Por isso, foi necessário estudar, nas unidades
anteriores, todas aquelas figuras, pois são elas que imprimem poeticidade ao texto. São
elas que transformam um texto em poema.
Por que nós, necessariamente, temos que buscar a doença do poeta no texto?
Em nenhum momento, tal informação está descrita, objetivamente, no poema. O que o
poeta sentia, o que o poeta vivia no momento em que ele escreveu o texto perdeu-se, não
há como descobrir. Vejam que ele não indicou, em nenhum momento, no Soneto inglês nº
2, as causas do seu sofrimento. Pode até ser a dor causada pela enfermidade. Mas quem
pode afirmar isso com 100% de certeza? Ninguém. O poeta foi mais esperto. Ao ocultar a
causa da dor, ele tornou essa dor universal. Pode ser a dor da mãe que perdeu um filho,
a dor da amante abandonada pelo grande amor, a dor dos solitários, dos perdedores, dos
fracassados. É a dor de todo ser humano. Vejam, o poema abre perspectivas mil, para
que limitá-lo, fechá-lo na rotina comezinha, no cotidiano do autor? Precisamos, ao fazer
a análise desse texto, nos ater à beleza dele, à sua beleza em si: suas metáforas, sua
musicalidade. Descobrir as relações entre forma e conteúdo. Observem o que o crítico
francês Mikel Duffrene afirma sobre tudo isso que comentamos: “a verdade do poeta deve
ser procurada no poema e não alhures” (DUFFRENE, 1969, p. 117). Dessa forma, o poeta
torna-se, em seu texto, um ator, um fingidor. Ele pode falar da dor sem estar sofrendo,
falar da fome sem sentir fome. Observem o que afirma Dufrene:
[...] o poeta pode falar de si, ser, como já o dissemos, o assunto do poema.
Mas então não é como autor que ele entra em cena, é como ator. [...] não
devemos decifrar essa obra para remontar, à força de induções, como num
inquérito policial, a um autor real; não se trata de descobrir, interrogar ou
submeter a uma psicanálise um determinado indivíduo distinto da obra
e a respeito do qual essa nos daria uma informação entre outras tantas.
O poeta está aqui, se ousamos dizê-lo, rigorosamente coextensivo ao
poema; é desse que tira toda a sua realidade [...] (DUFFRENE, 1969, p.
118-119).
Por que buscar a vida do autor no poema? Basta ler a biografia dele. Outra coisa
importante: o eu que se expressa no poema não é a voz do autor, mas a do eu lírico. Por
isso, não podemos escrever dessa forma: no poema de Drummond, há esta pergunta
a todo instante: “E agora José?”. Quem pergunta é o eu lírico, não Drummond. Essa
distinção é importantíssima, pois ela pontua a dramaticidade do eu do texto. O eu lírico é
um eu inventado, um eu imaginário. Com esse recurso, o poeta sente-se livre para soltar
a imaginação, transformar-se em outros eus. Um exemplo típico disso podemos encontrar
em Chico Buarque. Vamos ler um texto dele?
Folhetim
Se acaso me quiseres
Sou dessas mulheres
Que só dizem sim
Por uma coisa à toa
Uma noitada boa
Um cinema, um botequim
E se tiveres renda
Aceito uma prenda
Qualquer coisa assim
Como uma pedra falsa
Um sonho de valsa
Ou um corte de cetim
E eu te farei as vontades
Direi meias verdades
Sempre à meia-lua
E te farei, vaidoso, supor
Que és o maior
E que me possuis
Faz sentido falar que a voz que se expressa no texto é a do Chico? Lógico que
não! Chico, como grande conhecedor da alma feminina, como grande amante da alma
feminina, capta, dramaticamente, como um ator, a voz de uma mulher. Portanto, a voz do
texto é a voz lírica, jamais a voz do autor. Por isso, não podemos buscar a vida do escritor
em suas palavras. Certo?
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43
Batatais – Claretiano
UNIDADE 5
Letras - Habilitações em Língua Portuguesa e Língua Inglesa
Agora, iremos analisar alguns poemas. Vejam que nessas análises nós
consideramos a forma do texto, os recursos que transformam a linguagem em arte.
Observem: como nós já vimos nas unidades anteriores, todo poema possui
cadência, ritmo. Esse texto do Alberto da Costa e Silva é, inteiro, uma partitura musical.
Mas como? Que metáfora é essa? Um texto pode ser partitura? Nesse caso sim, pois ele todo
é sinfônico, ele todo é composto por sonoridades em harmonia. Vejam, em contrapartida,
a mensagem do texto é arrebatadora, toca o coração de quem lê, pois o poeta trabalha
com atributos universais do homem: a efemeridade da vida, a melancolia da saudade, a
força emocional da memória. Agora, essa verdade só toca o leitor porque ela vem ritmada,
ela é expressa por um discurso musical. A expressividade do texto desperta, no leitor, uma
melancolia. E quais são esses recursos? Vamos identificá-los?
baseia na reiteração de uma mesma estrutura. Aqui, no caso, temos uma reiteração de
substantivos: “ruas”, “sombras”, “meninas”, “árvores”. O eu lírico vai enumerando como
se ele estivesse acionando a memória, colocando-a em funcionamento. Essa enumeração
corresponde àquele primeiro momento da recordação, em que ficamos repetindo algumas
palavras, com o intuito de compor um dado acontecimento, ou lugar.
Vamos dar um exemplo. Muitas vezes repetimos para nós mesmos: “como foi
mesmo”, “era um bar”, “tinha um cantor de tangos”, “tinha muita bebida”. Então vem
a eureca: “Ah, sim, foi no bar do Mané onde eu vi, pela primeira vez, o amor da minha
vida!”. A lembrança vem inteira, mas antes foi preciso enumerar: “bar”, “cantor”, “bebida”.
A enumeração vai compondo, pelo detalhe, a totalidade do acontecimento transcorrido. É
o que acontece no texto, o eu lírico vai delineando, pela memória, um espaço, a cidade de
Fortaleza. Notem, há reiterações de outras estruturas: “infância que foi / tão triste e tão
pouca” (tão triste / tão pouca). Depois há a reiteração de uma mesma estrutura oracional,
composta por verbos no particípio: “entregue”, “embalado”, “cansado”.
Vocês se lembram quando foi afirmado que, para se fazer uma boa análise, é
preciso ler os ensaios dos críticos literários? Realmente, é preciso ler o que os críticos
afirmam sobre a obra do autor que estamos lendo. Para dar riqueza à leitura, recorremos
ao texto crítico, a fim de dar embasamento à leitura. Vejam, vamos inserir um fragmento
de um texto sobre a obra de Silva (2000):
Alberto declarou certa vez que sua obra toda seria o rascunho de um só extenso
poema, “que recuperasse uma determinada luz de sua infância... a voz do pai
poeta... e a descoberta do amor”. Que tomasse “posse da lembrança”. Chamado
de poeta da memória, Alberto celebra a infância e dignamente lamenta suas
perdas pessoais sem que o particular vivido, o confessional, se sobreponha ao que
é universal nessas perdas, ao que é de todo homem nas recordações de menino.
Pensemos no que já nos disse Heidegger, que toda poesia nasce da devoção da
lembrança. Dessa devoção, extrema, deriva sua poesia (Disponível em: <http://
www.secrel.com.br/jpoesia/izacyl8.html>. Acesso em: 13 jun. 2005).
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Tudo o que Bosi afirmou pode ser aplicado ao texto. A memória do eu lírico é
uma memória que fica à margem do capitalismo, portanto, trata-se de uma memória
humanizada, uma memória repleta de valores humanos de grande importância. Em uma
sociedade em que os modismos são frequentes, em que a memória quase não existe, o
autor lida com temas de suma importância.
Viram, foi difícil? Nunca se esqueçam: ler é a tarefa principal daquele que gosta
de poesia. Vejam o que afirma o crítico Flávio Carneiro:
[...] o crítico é como um detetive que tenta decifrar um enigma, ainda que não
haja enigma. É um aventureiro que se move entre os textos perseguindo um
segredo que, às vezes, não existe. Nesse sentido, o prazer da crítica – ou, de
um modo geral, da leitura – estaria não num objetivo final, o de desvendar o
mistério, mas nas próprias conjecturas, nas formulações possíveis (CARNEIRO,
2005, p. 37).
Desejasse
Escapar de sua casa que é o rio
E deslizando apenas, nem tocar a margem.
Esse é um dos poemas mais belos de Hilda. Nesse texto, a autora usa a
simbologia da água e da terra para designar os corpos dos amantes. Inicialmente, isso
se dá pela comparação: “E era como se a água desejasse...”. Nessa comparação, há
uma prosopopeia: a água deseja. Observem que nessa simbologia, o homem fecunda a
mulher. Por isso, o homem é água que deseja, água que tem sede. A prosopopeia remete
o leitor às faculdades físicas do homem: realmente, no ato amoroso, é o homem que
fertiliza a mulher. Depois a comparação torna-se metáfora: “sou terra” (2o verso da 3a
estrofe), “teu corpo de água” (4o verso da 3a estrofe). A água nem chega a deslizar no rio,
rio esse metaforizado pela palavra casa. O que significa isso? O desejo do amado torna-se
tão intenso, tão grande que ele arrebenta os limites, extravasa para além das margens.
Há, com toda certeza, forte conotação erótica nesse fragmento, pois o eu lírico nos
remete ao momento de êxtase do encontro amoroso, em que o desejo rompe os limites do
corpo, na comunhão dos amados. O mais belo no texto é que tudo isso nasce da imaginação
do eu lírico, pois ele se imagina no lugar do amado: “Olhei-me a mim, como se tu me
olhasses” (3o verso). É como se esse eu feminino se mirasse em um espelho e, ao invés de
ver o próprio rosto, ele visse o rosto do amado. Nisso, já temos uma hipérbole, uma figura
de exagero. O amor é tão intenso, tão grande, que a mulher se torna o ser amado.
Para a leitura ficar completa, é preciso buscar a voz do crítico. Ei-la novamente,
a soberba crítica Nelly Novaes Coelho. Nesse livro de Hilda, chamado Júbilo, memória,
noviciado da paixão, ao qual pertencem os “Dez chamamentos ao amigo”, a mulher, tal
como “uma sacerdotisa a cumprir um ritual [..], exorta o Homem à união, segura da
verdade e da essencialidade da experiência amorosa que lhe oferece. Da primeira à última
página, Júbilo... é um chamamento erótico, na mais alta significação do termo [...]”, com
isso, “a poeta afirma o papel que a Mulher sempre desempenhou junto ao homem: o de
mediadora entre ele e a plenitude da Vida, através do Amor” (COELHO apud HILST, 1980,
p. 313-314).
E claro, é preciso ler o que os pensadores falam sobre o amor. É preciso saber o
que os filósofos, psicólogos, antropólogos, sociólogos pensam sobre esse sentimento tão
importante para o homem. Vejam o que afirma o crítico literário Edgar Morin:
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uma necessidade tão grande de amor que, por vezes, um encontro, num
momento propício – ou mesmo num momento mau – deslancha o processo da
fulminação e da fascinação (MORIN, 2003).
Com certeza, a água é um elemento simbólico para mim, bem como para todo
humano. Ela é o princípio da vida, a origem do próprio corpo humano. Então, para celebrar
a vida, eu nomeio o mundo (feito também de terra) com a palavra água. É isso que o
poeta faz: nomeia o mundo pela força do seu afeto e de sua imaginação. É o que Ferreira
Gullar fez com o Galo. Será que realmente esse galo é galo? Vamos decifrar a significação
desse galo misterioso?
O poema inicia-se com uma descrição: um galo a passear por um saguão. Uma
luta esboça-se: o galo é um guerreiro que peleja contra a morte. Mas como isso é possível,
se dentre os seres vivos apenas o homem possui a consciência da morte? Já estamos
muito próximos de decifrar a natureza desse galo.
Para compreendermos melhor essa ave guerreira, vamos buscar a ajuda de uma
psicóloga: Monique Augras (1986, p. 22). Ela empreendeu importantes reflexões sobre a
consciência que o homem possui da morte. De acordo com a autora, com base na obra de
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Vejam, se o galo tem consciência, com certeza ele não é um galo, mas um
humano. Sim! O galo é um humano. Na verdade, temos nessa ave uma prosopopeia,
ou seja, um animal que é humanizado. Entretanto, o galo é um humano especial. Que
humano seria esse? Calma. Daqui a pouco vamos descobrir mais sobre essa charada.
No poema, o galo se questiona: “que faço entre coisas?”, “de que me defendo?”.
Um galo filosófico! Pois bem, esse já é um predicado, uma característica desse galo-
-humano: trata-se de um humano (raro entre a maior parte dos humanos) que empreende
reflexões existenciais. Após esses questionamentos, surge outra prosopopeia: “O cimento
esquece/ o seu último passo”. O que isso pode significar? A falta de memória do cimento
metaforiza a ausência de pegadas. Graças à natureza compacta e maciça do cimento, os
passos não ficam gravados em sua argamassa. Ao afirmar isso, o poeta quer exprimir a
seguinte mensagem: a vida não permanece, pois somos seres passageiros e efêmeros.
Em contrapartida, o galo contém em seu íntimo o canto. Qual ser humano possui
o dom do canto? Já se tornou lugar comum, em nossa cultura, afirmar que os poetas
cantam as glórias e os sofrimentos dos homens. Pois bem, o galo já foi decifrado: ele
representa a própria figura do poeta! Com isso, nós também deciframos o título do poema.
De maneira irônica, o poeta usa o próprio substantivo galo como adjetivo. Com isso,
temos um galo que é galo. Um galo cujas características encontram-se intensificadas,
sublinhadas. Entretanto, ironicamente, de galo, o galo nada tem.
Há, portanto, no texto de Ferreira Gullar, uma concepção de poesia. Qual seria?
Ora, o canto do galo se torna grito. Por que se grita? O grito pode ser tanto o desabafo
de uma dor como um pedido de socorro. Pois bem, eis a concepção de poesia de Gullar:
o poema é um grito de alerta. O poeta alerta seus leitores para as verdades existenciais
do homem: a morte, a efemeridade da vida. O poema, portanto, tem que ser um apelo à
consciência, uma reflexão filosófica. E Gullar tem razão, o grande poema precisa ser um
mergulho na condição humana. Além de um apelo, o poema também extravasa a dor da
existência. É um grito que revela o sofrimento e a fragilidade da vida. Ufa! Conseguimos!
Interpretamos o poema!
5 E-Referências
Chamadas numéricas
6 Considerações finais
Vimos o quanto a poesia é fundamental para o enriquecimento da alma humana.
Nós descobrimos que o poema é um tipo especial de linguagem: música e imagem. Para
tornar a linguagem musical, o poeta usa a rima, a contagem de sílabas poéticas e muitos
outros recursos. Entretanto, observamos que o ritmo é o mais importante dos recursos
fônicos da poesia, pois não existe poesia sem ritmo.
Conhecemos grandes poetas e, com isso, nos emocionamos diante de textos belos
e encantados. Portanto, não se esqueça: a leitura é fundamental para o prosseguimento
dos seus estudos. Há no final do Guia de disciplina uma bibliografia para aqueles que
desejam aprofundar o estudo da poética. Portanto, essa apostila é apenas o início da
caminhada. Há ainda muito para aprender e crescer. O convite está lançado: vamos ler
mais poemas e mais textos críticos? Cabe agora a você a tarefa de se engrandecer e de
conquistar novas vitórias.
7 Referências bibliográficas
AUGRAS, Monique. O ser da compreensão: fenomenologia da situação de psicodiagnóstico.
3. ed. Petrópolis: Vozes, 1986.
CARNEIRO, Flávio. No país do presente: ficção brasileira no início do século XXI. Rio de
Janeiro: Rocco, 2005.
FILHO, Ruy Espinheira. Poesia reunida e inéditos. Rio de Janeiro: Record, 1998.
MORIN, Edgar. Amor poesia sabedoria. São Paulo: Bertrand Brasil, 2003.
OLIVEIRA, Marly de. Antologia poética. Organização e prefácio de João Cabral de Melo
Neto. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997.
RODRIGUES, Antônio Medina. Sonetos de Camões: roteiro de leitura. São Paulo: Ática,
1993.
SILVA, Alberto da Costa e. Poemas reunidos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000.
TREVISAN, Armindo. Nova antologia poética 1967-2001. Porto Alegre: Sulina, 2001.
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Anotações