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Educação e o Direito

Natália Cristine Cavalcanti de Oliveira

Introdução
É importante analisar o desenrolar do cotidiano educacional brasileiro perpassando pelo que se procura
construir como a compreensão humana e da sociedade, bem como o desdobrar das relações sociais, do ponto de
desinteresse jurídico pela matéria até a sua completa proteção. Aqui, portanto, vamos tratar da base legal que
regulamenta o funcionamento da educação e seus desdobramentos, seu surgimento, importância e interfaces do
direito educacional. Como foi introduzido o direito à educação? Qual a é importância da educação e sua
proteção? Há diferenciação da proteção legislativa para o direito educacional? Esses são quesitos que devem ser
analisados a partir de um contexto específico.
Ao final desta aula, você será capaz de:
• Identificar a relação entre Direito e Educação.

O surgimento do Direito Educacional


A educação no Brasil não foi valorizada no período da colonização pelos portugueses. Àquela época, mais
importante do que passar conhecimento e valores por meio do ensino era imprescindível sobreviver resistindo
às febres, animais e habitantes locais – índios. As crianças que nasciam aqui eram, normalmente, resultantes de
estupros dos portugueses para com índias ou escravas e à época a concepção de filhos fora do casamento
resultava em crianças abandonadas que passavam a ser criadas pelos padres jesuítas. Foram os mesmo padres
jesuı́tas que começaram os primeiros colégios para o ensino de português, tupi e línguas de forma geral para a
comunicação. Assim, as crianças serviam aos interesses da Igreja, já que o ensino era primordialmente religioso
(CASTILHO, 2016). Com a expulsão dos jesuítas em 1759 pelo Marques de Pombal, os governantes locais tiveram
que implementar escolas que não mais possuíam laços religiosos, mas tão somente o interesse do Estado. Mesmo
assim, a oficialização de escolas no Brasil só veio a ocorrer efetivamente após a independência de Portugal. Com a
Constituição de 1824 dois projetos foram apresentados: o tratado de educação para a mocidade brasileira e outro
para a criação de universalidade brasileira. O tratado de educação para a mocidade brasileira criava escolas
públicas de primeiro grau com métodos pedagógicos baseados na pedagogia francesa com obras do Marquês de
Condorcet. Para Dom Pedro I havia a necessidade de sistematizar a educação, começando as escolas de primeiras
letras e, posteriormente, as universidades (CASTILHO, 2016).

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Figura 1 - Colonizadores desvalorizavam a educação
Fonte: John Copland, Shutterstock, 2020.

Apesar dessa iniciativa, a ocorrência de um golpe de estado em 1823 na assembleia constituinte fez com que
esses projetos não fossem aprovados, mantendo-se os dois graus de ensino já existentes: a formação da elite e a
educação popular. Mesmo não expressa na Constituição de 1824, o artigo 179 trazia a educação como um direito
do cidadão e dever do Estado. Com a Constituição Republicana de 1988, a adoção do modelo federalista fez com
que as competências educacionais fossem discriminadas para a União e os Estados. Caberia à União legislar
sobre o ensino superior e para os Estados a competência sobre o ensino secundário e primário (CASTILHO,
2016).
O direito à educação de maneira expressa só veio com a Constituição de 1934 no seu artigo 140, no qual
afirmava ser a educação um direito de todos e devia ser ministrada pela família e pelos poderes públicos.
Instaurava-se, assim, a educação como um direito constitucionalmente declarado. A Constituição Federal de
1988 representa a retomada da democracia e já traz no seu início a educação como um direito social, dedicando
ao tema ampla cobertura do artigo 205 ao 214. Há uma vasta legislação infraconstitucional para regulamentar o
tema educação, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, os atos normativos do Conselho Nacional
de Educação (CNE), o programa de Legislação Educacional Integrada (ProLei) e o Plano Nacional de Educação
(PNE) (CASTILHO, 2016).

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Figura 2 - Estrutura legal da educação no Brasil
Fonte: TOLEDO, 2016, p. 11.

Já no plano internacional, há o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais que foi
promulgado pelo Brasil com do Decreto nº 591 em 6 de julho de 1992 pelo então Presidente da República
Fernando Henrique Cardoso (TOLEDO, 2016).

FIQUE ATENTO
A legislação nacional reconhece o direito de toda pessoa à educação, concordando que a
educação deverá visar ao pleno desenvolvimento da personalidade humana e do sentido de
sua dignidade e fortalecer o respeito pelos direitos humanos e liberdades fundamentais.

Em suma, com a Constituição Federal de 1988 a educação foi inserida no mundo jurídico como direito de todos,
gratuita, democrática, comunitária e de elevado nível de qualidade.

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A importância do Direito Educacional
Atualmente, mesmo com todos os esforços para fazer a educação parte do cotidiano de crianças, jovens e adultos,
ela ainda é inacessível para grande parte das pessoas, o que significa que crianças não estão na escola quando
deveriam e jovens e adultos são analfabetos.

Figura 3 - Muitas crianças estão fora da escola


Fonte: maxim ibragimov, Shutterstock, 2020.

Para tentar transformar a educação em uma realidade, em novembro de 1960 houve a elaboração da Convenção
Relativa à Luta Contra a Discriminação no Campo do Ensino em Paris, sendo ratificada pelo Brasil em 19 de julho
de 1968 por meio de decreto do então presidente da República Artur Costa e Silva. Mesmo assim, não há
nenhuma garantia de cumprimento dessa convenção (CASTILHO, 2016).

SAIBA MAIS
A Constituição junto com o Estatuto da Criança e do Adolescente traz à baila três objetivos da
educação nacional: o compromisso com o pleno desenvolvimento da pessoa, a formação para a
cidadania e a qualificação para o trabalho. Para ampliar o conhecimento sobre o tema,
recomenda-se a leitura da unidade 1 do livro de “Direito Educacional” (TOLEDO, 2016).

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Temos que ter em mente que o legislador não pode ser visto como educador, sendo assim, toda contribuição à
educação por meio jurídico veio com base na colaboração de educadores e cientistas aos deputados e senadores.

FIQUE ATENTO
A educação é um direito humano fundamental! Sua importância vem sendo expressa desde a
Declaração do Homem e do Cidadão – Convenção Nacional Francesa de 1793 – assegurando
que a instrução é indispensável a todos e a sociedade deve favorecer o progresso da
inteligência pública disponibilizando-a a todos os cidadãos.

Esses especialistas da área ajudaram a criar o direito à educação que se constitui como direito subjetivo trazido
pela Constituição Federal de 1988, sendo um tema constitucional presente no capítulo terceiro, seção um, que
abrange os artigos 205 a 214. Todas as demais leis que tratam do assunto estão subordinadas à Constituição. Por
isso, toda a legislação educacional deve estar em consonância com os princípios constitucionais (TOLEDO, 2016).

As interfaces do Direito Educacional


Direito educacional é a ramificação do Direito voltado exclusivamente para o regulamento do conjunto de leis e
normas legais que vai oferecer base legal à educação no país, prescrevendo o vínculo entre os elementos que a
integram: os sujeitos (professor, aluno, técnicos), as instituições (escolas/órgãos de supervisão), tendo por
finalidade a garantia do direito à educação. Diferente, portanto, da legislação do ensino, já que apenas elabora
normas sobre educação, enquanto o direito educacional sistematiza regras e instrumentos jurídicos para
disciplinar a conduta das pessoas em relação à educação (TOLEDO, 2016).

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Figura 4 - Direito educacional
Fonte: Roman Motizov, Shutterstock, 2020.

Por ser uma disciplina relativamente nova no Brasil, o primeiro encontro de juristas para debate do tema
aconteceu apenas em outubro de 1977 na cidade de Campinas, realizado no Primeiro Seminário de Direito
Educacional. Foi nesse encontro que o direito educacional foi efetivamente proposto como disciplina acadêmica.
Três principais pontos foram discutidos: a) recomendação ao MEC em relação à criação de recursos e de
condições para a realização de estudos destinados à análise científica do direito educacional; b) apoio à criação,
nas universidades e nos estabelecimentos isolados de ensino superior, de órgãos destinados ao estudo do direito
educacional e; c) estímulo à inclusão da disciplina direito educacional, em caráter opcional, nos cursos regulares
de graduação, que não a têm em caráter obrigatório (TOLEDO, 2016).
Hoje, a principal fonte de direito educacional que dispomos é a Constituição Federal, mas além dela existem as
fontes jurisprudenciais – decisões de tribunais, acórdãos e súmulas – bem como as decisões dos conselhos de
educação municipais, estaduais e federais. Na esfera administrativa há os pareceres de entidades educacionais
que possuem fora de jurisprudência administrativa.

Fechamento
Podemos ver que, ao longo dos anos, fez-se necessária a implantação do ensino na sociedade como forma de
desenvolvimento social, bem como da própria tecnologia e informação. Fácil perceber sua evolução, passando
das escolas jesuíticas para os colégios de elite, percorrendo a implementação do ensino público e das
universidades.

Grande papel nessa história foi a proteção jurídica dada, primeiramente pelas Constituições desde o período do

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Grande papel nessa história foi a proteção jurídica dada, primeiramente pelas Constituições desde o período do
Império, perpassando por todas as Constituições até chegar à atual com plena proteção da educação como
direito social – ou seja, um direito fundamental – bem como a obrigação da prestação desse serviço,
compulsoriamente por parte do Estado. Mesmo assim, é necessária a ação conjunta da família, estado e sociedade
para que o todo possa crescer e elevar de patamar não apenas a educação no sentido estrito, mas também a
educação da sociedade, levando-a a ser mais justa e igualitária.

Referências
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: introdução aos parâmetros
curriculares nacionais / Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília: MEC/SEF, 1997. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf. Acesso em: 23 jan. 2020.
BRASIL. Ministério da Educação / Secretaria da Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. Orientações
e Ações para Educação das Relações Étnico-Raciais. Brasília: SECAD, 2006. Disponível em: http://portal.mec.
gov.br/dmdocuments/orientacoes_etnicoraciais.pdf. Acesso em: 23 jan. 2020.
BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica. Brasília: MEC, SEB,
DICEI, 2013. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?
option=com_docman&view=download&alias=13448-diretrizes-curiculares-nacionais-2013-
pdf&category_slug=junho-2013-pdf&Itemid=30192. Acesso em: 23 jan. 2020.
CASTILHO, R. Educação e direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2016.

NOVELINO, M. Curso de Direito Constitucional. Salvador: Ed. Juspodium, 2016.

TOLEDO, M. Direito educacional. São Paulo: Cengage, 2016.

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