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A família, a lei e a escola

Sandra Teixeira de Mello e Guérula Mello Viero

Introdução
Na sociedade atual, o arranjo familiar engloba a responsabilidade de garantir as condições para a sobrevivência,
o atendimento às necessidades básicas e o desenvolvimento do indivíduo em seu processo de formação físico,
motor, cognitivo, social, cultural, emocional. É no contexto familiar que se inicia a interação da criança com a
sociedade, pois a família a insere no ambiente da cultura local, ensina-lhe valores e crenças, amplia suas
vivências e conhecimentos e apresenta-lhe normas para o adequado convívio social. Qual é o papel da sociedade
e do Estado em relação à proteção da criança e do adolescente? Qual é a importância dessas duas ações
educativas, família e instituição escolar, no processo de desenvolvimento e ensino-aprendizagem da criança e do
adolescente?
Ao final desta aula, você será capaz de:
• Compreender a relação existente entre lei, escola e família.

Família: aspectos iniciais


A família é a primeira instituição social responsável pela efetivação dos direitos básicos da criança, conforme o
Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90). Por isso , cabe às instituições construírem parceria com
as famílias num espaço aberto de diálogo , no processo escolar. Para tanto, é necessário respeitar a diversidade e
tipos de família , sua estrutura , contexto social e cultural.

Concepção de família
Nos seus estudos iconográficos, Ariès (1978) aponta o lugar da criança na família e, dessa forma, indica como foi,
por volta dos séculos XVI e XVII, se constituindo um sentimento de família da forma como conhecemos hoje, uma
instituição baseada em sentimentos, que envolve o afeto e a emoção e, sobretudo, o reconhecimento da criança
como parte da família.

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SAIBA MAIS
Com base na análise iconográfica representada nos quadros da Idade Média, Ariès (1978)
aponta o sentimento de família, no formato que conhecemos hoje. Aprofunde este tema no
livro: “História social da criança e da família”.

Até então, o único sentimento existente era o da linhagem, caracterizado pela descendência entre as pessoas.
Recorde-se que a expressão família é derivada etimologicamente do latim fâmulos, e essa expressão quer dizer
entidade familiar.

Família e o surgimento da escola


Não se considerava a criança como pertencente ao seio familiar, pois nos séculos passados, as taxas de
mortalidade infantil eram elevadas, por isso, esperava-se passar pela idade crítica estabelecida nos anos iniciais
de sua vida e, após esse período, a aprendizagem das crianças se dava por meio da prática de serviços
domésticos; os mais velhos repassavam para elas as experiências e conhecimentos adquiridos.

Figura 1 - O surgimento da escola


Fonte: Marzolino, Shutterstock, 2019.

Assim, há o surgimento da escola, que se torna a responsável por educar as crianças, se transformando em
instrumento essencial para iniciar os indivíduos na sociedade, auxiliando “[...] na passagem do estado da
infância ao do adulto.” (DESTRO, 2017, p. 240).

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Família: diferentes arranjos
Existem várias configurações familiares e não há mais um conceito único atribuído à família. “O conceito de
família pode ser considerado até certo ponto subjetivo, pois depende de quem o define, do contexto social,
político e familiar em que está inserido.” (SIMIONATO; OLIVEIRA, 2003, p. 57). Assim, as famílias são formadas
por pessoas com laços sanguíneos ou não. Atualmente, a família deixou de ser composta pelo pai, mãe e filhos e
se constitui de diversas formas.

Figura 2 - A família como primeira instituição social


Fonte: powerofforever, iStock, 2019.

No entanto, há um ponto em comum: a união existente entre os membros integrantes da família, sejam com ou
sem laços consanguíneos, o qual se dá “[...] a partir da intimidade, do respeito mútuo, da amizade, da troca e do
enriquecimento conjunto.” (SIMIONATO; OLIVEIRA, 2003, p. 58).
São grupos formados por pais, por mães que cuidam de seus filhos sem a figura masculina, criados por avós, tios;
a união de homossexuais também forma novos arranjos familiares, porém, ainda não são reconhecidos pela lei.
Essa concepção atual ocorre com base no afeto. “É considerada por uma constelação de pessoas
interdependentes girando em torno de um ‘eixo comum’.” (SZYMANSKY, 2007, p. 64).

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Relação família e escola
A partir do pressuposto de que o indivíduo aprende a partir das relações mediadas pelo outro e a escola se
constitui como instituição fundamental para o desenvolvimento da criança, que tem como principal objetivo o
ato educativo, torna-se possível emergir ao desenvolvimento humano. Conforme Bock, Furtado e Teixeira
(1999), a escola é local de aprendizagem, pois promove o contato com a cultura de forma intencional e
planejada. Nesse sentido, os docentes e os colegas atuam como mediadores no desenvolvimento da criança.

FIQUE ATENTO
De acordo com o Conselho Nacional dos Direitos da criança e do adolescente, “[...] o ECA
estabeleceu a criação de uma rede de proteção, responsável por garantir e zelar pelos
cumprimentos dos direitos da criança e do adolescente.” (CONANDA, 2007, p. 8).

Dessa forma, é necessário estabelecer parceria entre família e escola de forma efetiva e contínua para que
possam se responsabilizar pelo processo educativo da criança, pois o envolvimento dos pais no cotidiano escolar
dos filhos é instrumento essencial para o sucesso do trabalho escolar. Como define a Lei de Diretrizes e Bases
para a Educação Nacional, Lei nº 9394/96 art. 12, os estabelecimentos de ensino devem: “VI- articular-se com as
famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola; VII- informar os pais e
responsáveis sobre a frequência e o rendimento dos alunos, bem como a execução de sua proposta pedagógica.”
(BRASIL, 1996).

Figura 3 - A escola como propulsora do conhecimento


Fonte: Katrina Brown, Shutterstock, 2019.

As mudanças nas instituições familiares fortalecem a ideia de uma nação complexa, formada a partir de diversos

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As mudanças nas instituições familiares fortalecem a ideia de uma nação complexa, formada a partir de diversos
modelos de famílias, diferenciadas por classes, culturas, regiões e outros critérios. As interferências que ocorrem
em torno da família tornam cada vez mais desafiante definir sua natureza, o que reflete nas relações
estabelecidas entre os pais e a escola. Portanto, a escola precisa conhecer a família e o contexto social em que ela
está inserida.

FIQUE ATENTO
A escola deve proporcionar espaços de diálogos com as famílias, criando situações para que
ocorra comunicação mais eficiente, buscando, de forma coletiva, encontrar estratégias para o
andamento do trabalho pedagógico, em busca de melhorias no processo educativo das crianças

e adolescentes.

As instituições escolares , juntamente com os docentes e os demais profissionais, devem desenvolver inter-
relação num exercício de alteridade: ouvindo, observando e trocando com as famílias. Contudo, possibilitar que a
participação das famílias ocorra de maneira efetiva, visando a um projeto institucional de envolvimento e
integração escola-família- comunidade .

Aspectos legais
A família e a escola exercem um papel importante na vida das pessoas. A família tem a responsabilidade
essencial pela formação do indivíduo, promovendo saúde, alimentação e educação. Já a escola tem o dever de
prover o desenvolvimento da criança, oferecendo educação de qualidade, reconhecendo o indivíduo como
sujeito histórico, social e de direitos. E a sociedade e o Estado também têm papel essencial na proteção da
criança e do adolescente e no desenvolvimento de políticas e ações que possam melhorar suas condições de vida.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, no art. 4º, dispõe sobre essas obrigações, ao destacar que os direitos
inerentes ao ser humano devem ser assegurados pela família, pela comunidade, sociedade em geral e poder
público (BRASIL, 1990).

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Figura 4 - A família, a lei e a escola
Fonte: sal73it, iStock, 2019.

O ECA, bem como a LDB, entre outros documentos e diretrizes, apontam caminhos, direcionam e organizam a
estrutura escolar, para que todos possam atender as demandas necessárias do processo educativo de cada
indivíduo, desde a mais tenra idade até se tornar adulto, passando pelas etapas da infância e da adolescência. De
acordo com o ECA (BRASIL, 1990), no art. 3º: “[...] a criança e o adolescente gozam de todos os direitos
fundamentais inerentes a pessoa humana, [...], assegurando-lhes por lei ou por outros meios, todas as
oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em
condições de liberdade e dignidade.”
Além disso, o ECA garante direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à
cultura, à liberdade e ao convívio familiar. De acordo com essa legislação, existe ainda, dentro de cada município
brasileiro, o Conselho tutelar.

EXEMPLO
Cada escola deve elaborar seu Projeto Político Pedagógico juntamente com a participação dos
alunos e famílias, pois esse documento tem por finalidade estabelecer, em linhas gerais, as
regras e condutas necessárias para o convívio social, bem como apresenta os objetivos,
fundamentos teóricos e encaminhamentos metodológicos necessários para o desenvolvimento

de um trabalho pedagógico de qualidade.

Segundo o ECA (1990), em seu artigo 131, “o Conselho Tutelar é um órgão permanente e autônomo, não
jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente,
definidos nesta Lei”. O Conselho Tutelar deve garantir que as leis criadas pelo ECA saiam do papel e se
concretizem em prática sociais educativas, bem como de apoio às crianças e aos adolescentes, quando lhes
faltam a família ou quando expostas a situações de abuso. O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do

Adolescente diz que a missão consiste em zelar pelo efetivo cumprimento dos direitos inerentes às crianças e aos

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Adolescente diz que a missão consiste em zelar pelo efetivo cumprimento dos direitos inerentes às crianças e aos
adolescentes, atuando de forma concreta nos momentos em que houver ameaça ou violação a esses direitos.
Nesse sentido, o Conselho Tutelar atua de modo a executar as atribuições dadas pelo Estado para cumprir com
eficácia suas diretrizes (CONANDA, 2007).

Fechamento
Não há um único responsável pela educação integral de cada indivíduo inserido na sociedade. É a família que
tem que educar e conduzir as crianças e adolescentes, agindo como mediadoras e inserindo-as no contexto
social. A escola, que assume com intencionalidade o compromisso de permitir a aprendizagem e o
desenvolvimento de seus alunos, ainda conta com a participação e intervenção do Estado no processo
educacional, garantindo a assistência necessária e todos os direitos estabelecidos por lei. Neste tema, você teve a
oportunidade de entrar em contato com o conceito de família, perceber a importância das instituições, família e
escola para o processo de desenvolvimento e aprendizagem.

Referências
ARIÈS, P. História social da criança e da família. 2. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1978.
BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. T. Psicologias: uma introdução ao estudo da psicologia. 13. ed. São
Paulo: Saraiva, 1999.
BRASIL. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.
htm. Acesso em: 15 jan. 2019.
BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis
/l9394.htm. Acesso em: 15 jan. 2019.
BRASIL. Conselho Nacional dos Direitos das Crianças e do Adolescente (Conanda). Orientações para criação e
funcionamento. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Brasília, 2007.
DESTRO, E. Relação família e Instituição de Educação Infantil: concepção das professoras. In: PINTO, R. B.;
RAUPP, M. D. (orgs). Educação infantil e formação de professores. Florianópolis: NUP/UFSC, 2017.
FONSECA, C. A história social no estudo da família: uma excursão interdisciplinar. BIB, n. 27, pp. 51-73. Rio de
Janeiro, 1999.
SIMIONATO, M. A. W.; OLIVEIRA, R. G. Fundações e transformações das famílias ao longo dos anos. In: I Encontro
Paranaense de Psicopedagogia (ABPppr), nov./2003.
SZYMANSKY, H. Relação família/escola: desafios e perspectivas. 2. ed. Brasília: Liber Livro, 2007.

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