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DE PENSAR A EDUCAÇÃO
RESUMO
Introdução
Toda mudança de ocorre no interior das escolas implica questionamentos sobre sua relevância
e aplicabilidade no contexto escolar. Essa proposta de mudança deve estar em consonância com os
interesses e necessidades da comunidade institucional. Almeida (2000) destaca que projetos
inovadores devem supor a tomada de consciência quanto a três aspectos do currículo: formal, real e
oculto. Para autora, o currículo formal é constituído por programas, grade curricular e normas, o
currículo real está relacionado à vivência dos sujeitos envolvidos na instituição (alunos – professores –
funcionários) e o currículo oculto caracteriza o “modo de vida” da instituição, as representações e
crenças e o modo prático informal de fazer o saber escolar. (ALMEIDA, 2000, p.124)
A maioria dos programas de ensino segue a perspectiva de grade curricular (currículo formal),
geralmente definida por especialistas ligados ao poder educacional. Quando surge um novo tema, a
instituição é pressionada a incluí-la na sua grade curricular, sem a preocupação de integrá-la aos
conhecimentos já estudados e sem verificar se esta inclusão atende às necessidades da comunidade
local.
Na concepção de Sacristán (2000, p.134), intervir no currículo real implica em modificar o
ambiente escolar considerando três dimensões: “físicas (arquitetura e disposição do espaço mobiliário),
organizativas (formas de organizar os alunos/as na escola, dentro das aulas, distribuição de tempo) e
pedagógicas (relações entre professores/as, entre estes e os alunos/as, entre alunos/as, etc)”.
A introdução de recursos tecnológicos inovadores no contexto escolar pode exigir o
redimensionamento de práticas, análise e comprometimento coletivo (professores – alunos) e
institucional (direção) para que o processo ensino-aprendizagem tenha progresso. Para Hutmacher
(apud ALMEIDA, 2000, p.123), “as novas práticas são inventadas, conquistadas, construídas
coletivamente, e não no isolamento individual”.
Para Moreira (1999, p.14), “teorizar sobre currículo e pedagogia implica em teorizar sobre
prática escolar”, ou seja, os estudiosos curriculares devem refletir mais ativamente sobre as práticas
escolares, participando ativamente nas políticas públicas para efetivar a implementação de novas
propostas.
Almeida (2000, p.125) ressalta que o projeto pedagógico das instituições deve ser flexível para
possibilitar a inclusão de atividades de forma reflexiva exigindo a conscientização de toda comunidade
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escolar. Koo Hok-chun1 (2002, p.56) destaca que o estudo do currículo envolve conceitos complexos e
ideologias.
Para analisarmos o currículo atual, temos que compreender as concepções teóricas que
marcam a modernidade. Hargreaves, citado em Koo Hok-chun (2002, p. 57), destaca que a
modernidade é uma condição social marcada e sustentada pela crença no progresso científico. Segundo
o autor, as mudanças da modernidade também atingem a vida escolar.
Hargreaves (2004), estudioso do currículo na Inglaterra, destaca que só ocorrerá
transformação educacional, se nos engajarmos na crença de que a cultura inovadora poderá favorecer
parcerias construtivas. E ainda destaca “[...] a inovação pode ser considerada motivadora e essencial
para o progresso das escolas”. (HARGREAVES2, 2004, p.01)
O grande problema implícito nas propostas de currículo é que elas exprimem mais desejos do
que ações, ressalta Sacristán (2000, p.137). Segundo ele, é na interação do currículo com a realidade
que entendemos o que de fato acontece na escola e o que os alunos realmente aprendem.
Para Hargreaves (2004), o currículo é movido por forças políticas e as mudanças curriculares
devem propor novas possibilidades de qualidade de ensino. Assim, a introdução de mudanças no ensino
deve ser acompanhada de “indicadores” que mostram o quanto à inovação foi aceita no meio escolar
(professores e alunos) e se esta inovação foi positiva (qualidade de ensino). Esses indicadores podem
garantir a permanência da mudança frente ao currículo formal. Hargreaves3 (2004), ainda destaca que
ensinar numa perspectiva de mudança curricular é acreditar que “[...] nós precisamos de
desenvolvimento, questionamento e pesquisa para inovação”.
Hargreaves (2004) defende que o problema da educação não está em encontrar uma caixa de
sugestões com idéias de lições simples para serem utilizadas na sala de aula, mas encontrar grandes
idéias que certamente serão usadas fora dela.
O ensino com novas tecnologias pode se tornar a caixa de sugestões proposta por Hargreaves.
O professor pode propor mudanças curriculares inovadoras para complementar a aula presencial e fazer
que os alunos participem mais como co-autores da aprendizagem, estabelecendo contato (e-mail, redes
1
“[...] curriculum involves complex concepts and ideologies”. A tradução destes enunciados e dos demais enunciados
extraídos de textos em língua inglesa foram feitos pela autora do artigo.
2
“Innovation was described as energising and essential to move schools forward”.
3
“[...] we might need development, enquiry and research for innovation”
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de aprendizagem) com outros alunos e deixando de ser o mero expectador da aula presencial
tradicional. Hargreaves (2004), ressalta que os alunos podem exercer maior responsabilidade pela sua
aprendizagem desenvolvendo habilidades de trabalho em equipe e aprendendo a resolver problemas
fora do espaço escolar restrito à sala de aula. Assim, as comunidades de aprendizagem podem
promover o desenvolvimento de habilidades comunicativas que transcendem a formalidade restrita da
sala de aula presencial.
Segundo Harassim (2005, p.30), a rede de aprendizagem não pressupõe um currículo prescrito.
A aprendizagem ocorre através da interação das pessoas envolvidas. Há um conhecimento autodirigido
que é desenvolvido no decorrer das atividades.
O acesso às redes permite ao aluno, acessar novas culturas, novas idéias e informações
fazendo que ele construa novas perspectivas sobre um determinado tema. Desta forma, para garantir o
sucesso da aprendizagem mediada pelo computador exige do docente formação específica e domínio de
novas tecnologias. Segundo Sampaio e Leite (1999), o professor provido de “alfabetização
tecnológica4” será capaz de lidar com essas diversas tecnologias e analisar a relevância e a
aplicabilidade de outras formas de comunicação no contexto escolar. Libâneo (2001, p. 80), também
adverte que:
“[...] a escola de hoje precisa propor respostas educativas e metodológicas em relação a novas
exigências de formação postas pelas realidades contemporâneas como a capacitação
tecnológica, a diversidade cultural, a alfabetização tecnológica, a superinformação, o
relativismo ético, a consciência ecológica”.
Os meios não devem ser explorados pelas escolas como meros acessórios, eles podem ser
chamados, conforme Gadotti, “instrumentos indispensáveis de trabalho”. (apud SAMPAIO e LEITE,
1999, p.65).
Moran (2006, p. 08) comenta que “existem dificuldades sérias na aceitação da educação on-
line. A primeira é o peso da sala de aula”. A relação aprender/ensinar está associada ao modelo
convencional do espaço físico criado pela sala de aula. Os professores têm dificuldades em aceitar
novas formas de ensinar e aprender. Os alunos também estão acostumados a ficar ouvindo, de forma
4
O conceito de ‘alfabetização tecnológica’ envolve domínio contínuo e crescente das tecnologias que estão na escola e na
sociedade, considerando as relações críticas desse processo.
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passiva, sem interagir. O professor tem que ter um preparo pedagógico para envolver os alunos num
processo de ensino-aprendizagem participativo e que inspire confiança.
O professor que atua no século XXI tem ao seu dispor muitas informações e diferentes visões
de mundo que estão a disposição pelos mais variados meios de comunicação (TV, vídeos,
computadores). Mas como utilizá-los? Alguns professores se utilizam as tecnologias como
complemento do conteúdo da aula presencial como mero suporte ilustrativo. Mas educar neste século
implica em mudar o paradigma instrucional de aprendizagem para uma abordagem mais
‘construtivista’. Como destaca Moran (2004, p. 245) “[...] precisamos repensar todo o processo,
reaprender a ensinar, a estar com os alunos, a orientar atividades, a definir o que vale a pena fazer para
aprender, juntos ou separados”. Desta forma, as tecnologias podem ser novas possibilidades de
aprendizagem dentro e fora da sala de aula.
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (1999, p.112):
Resende e Fusari, apud Libâneo (2001, p.71), destacam que diante das relações complexas do
mundo contemporâneo, os educadores precisam “aprender a pensar e a praticar comunicações
midiatizadas” como requisito para a construção da cidadania.
Segundo Giroux, apud Garcia (2003, p. 08), o professor deve transcender a esfera tecnicista de
educador e tornar-se um “intelectual público”, que tem “poder” de determinar suas condições de
trabalho, participar na elaboração do currículo e tentar adaptar sua prática aos interesses concretos de
seus alunos. Isso pressupõe dar aos docentes “poder” para que possam trabalhar coletivamente
desenvolvendo trabalho inter-pares, inter-relacionando aluno-escola-comunidade.
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O que ser percebe hoje é que educar na era da globalização implica em repensar novas
racionalidades do processo ensino-aprendizagem que acompanham a aquisição do conhecimento. O
desenvolvimento do aprender a aprender é um desafio no campo do currículo. A esse respeito, Santos
(1994) apud Libâneo (2001, p.82), escreve:
“Um dos grandes desafios que se põe ao desenvolvimento do currículo [...] é o de contemplar
experiências de aprendizagem que permitam construir estratégias que ajudem o aluno a utilizar
de forma consciente, produtiva e racional o seu potencial de pensamento e que permitam torna-
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lo consciente das estratégias de aprendizagem a que recorre para construir (reconstruir) os seus
conceitos, atitudes e valores”.
O professor que atua na sala de aula das nossas escolas reproduz na sua prática, crenças e
valores internalizados pela sua vivência e pela sua formação. Muitas vezes a necessidade de repensar
uma nova metodologia ou inserir um suporte tecnológico no contexto pedagógico traz estranheza,
bloqueio e medo. Muitos docentes vêem o computador como um rival que pode vir à substituí-lo num
futuro próximo. Gomes (2001, p.04), esclarece que “[...] os professores têm dificuldades de incorporar
as tecnologias de informação e comunicação (TIC) no seu fazer pedagógico por desconhecerem as
possibilidades inovadoras que elas representam”.
Porém, conforme afirma Belloni (2002), o professor deve estar preparado para utilizar
tecnologias e integrá-las na sua prática pedagógica. Pimenta e Anastasiou (2002, p.187), também
ressaltam que “[...] é necessário considerar professores como sujeitos, agentes que interpretam as
propostas, as idéias, e como tradutores de conteúdos, como atores de projetos curriculares flexíveis”. É
na observação do que está oculto no currículo, que o professor cresce e repensa sua prática. Não
adianta mais os professores ignorarem as potencialidades das tecnologias. As universidades, o mercado
de trabalho e a formação escolar estão rodeados de informação. Como destaca Sampaio e Leite (1999,
p.44):
“[...] O perfil do profissional que interessa ao mercado de trabalho hoje contém habilidades como
capacidade analítica; condições de atuar em equipe e em várias áreas; cultura ampla com
formação generalista; noção de línguas estrangeiras; capacidade de buscar novas técnicas;
atualização constante em relação às transformações trazidas pelo avanço tecnológico na
organização social”.
A modernidade tem trazido novos conceitos, novas racionalidades para o saber e novas
possibilidades de acesso à informação. Cabe a nós, formadores das gerações futuras, direcionar o uso
dessa informação para a produção do conhecimento produtivo.
2127
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