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Santa Rosa
2016
ARLAN LOPES DA VEIGA
Santa Rosa
2016
DEDICATÓRIA
The main objective of this work is to question the (in) efficiency of the State in
the promotion of public safety and the possibility of a return to private revenge. It's
not from today that exist a constant social conflict about the applicability of criminal
rules and the true sense of justice. Society has been practicing acts of violence
against possible criminals. Seeking to effect out what it considers to be the most fair,
committing in this way, what is called justice with own hands. So, it is questioned if
these attitudes can generate a negative vicious cycle of violence and a return to
private revenge. The general objective of the research is to analyze the responsibility
and capacity of the State of provide public security for society as well as the main
deficits in the pursuit of this duty. Besides that, it is verified if the inefficiency by the
part of the State can generate the feeling of private revenge. The subject approached
in this work becomes more and more relevant in the measure that there are daily
reports of cases from private revenge in Brazil, in the most varied types. In this way,
we realize a change of paradigms from part of the society, mainly as to the sense of
justice and the accomplishment of the criminal norms. The work was created from the
theoretical perspective, with the accomplishment of research of qualitative nature and
with descriptive purposes. Its datas were obtained from indirect documentation,
through researches on bibliographies, articles, doctrines, laws, and news from the
most varied media. Its method of approach was the hypothetical-deductive, and the
procedures methods are the historical and functionalist. The first chapter will make a
historical return to the origin of criminal norms and their relationship with the
development of society. Moreover, it will show how happened the evolution of the
criminal law and its influence in the national schools. The second chapter will bring
the real situation of public security in Brazil, its consequences for society and the
applicability of the Law on Criminal Executions, beyond of the relationship between
the media and its target public with the creation of a feeling of insecurity. At the end
of the present research, it is concluded that the country lives in a complete chaos
when refers to public security and the applicability of the criminal law. The Law of
Criminal Executions is totally inapplicable in Brazilian penitentiaries and the individual
who enters there, save rare exceptions, has no possibility of resocializing him.
§ - Parágrafos
CF – Constituição Federal
FEMA – Fundação Educacional Machado de Assis
n°. – número
LEP – Lei de Execução Penal
CP – Código Penal
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................... 12
CONCLUSÃO .....................................................................................................76
REFERÊNCIAS .................................................................................................. 80
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INTRODUÇÃO
[...] como os homens não podem engendrar novas forças, mas apenas unir
e dirigir aquelas existentes, não lhes resta outro meio, para se conservar,
senão formando por agregação uma soma de forças que possa leva-los à
resistência, coloca-los em movimento por um único móvel e fazê-los agir de
comum acordo. (ROUSSEAU, 2008, p. 30).
[...] encontrar uma forma de associação que defenda e proteja com toda a
força comum a pessoa e os bens de cada associado e pela qual cada um,
unindo-se a todos, não obedeça portanto senão a si mesmo e permaneça
tão livre como anteriormente. (ROUSSEAU, 2008, p. 30).
a assembleia tem devotos, o qual recebe desse mesmo ato sua unidade, seu eu
comum, sua vida e sua vontade.” (ROUSSEAU, 2008, p. 32).
Ainda, segundo o entendimento de Rousseau,
[...] essa pessoa pública, formada assim pela união de todas as outras,
tomava outrora o nome de cidade e hoje recebe o nome de república ou de
corpo político, o qual é chamado por seus membros Estado, quando é
passivo, Soberano quando é ativo, poder quando comparado a seus
semelhantes. Com relação aos associados, adquirem coletivamente o nome
de povo e se chamam particularmente cidadãos, como partícipes da
autoridade soberana e súditos, quando sujeitos às leis do Estado. Esses
termos, contudo, muitas vezes se confundem e são tomados um pelo outro.
(ROUSSEAU, 2008, p. 32).
[...] O vínculo existente entre os membros de um grupo era dado pelo totem
(estátuas em forma de animais ou vegetais), que era o antepassado comum
do clã: ao mesmo tempo, era o seu espírito guardião e auxiliar, que lhe
enviava oráculos, e embora perigoso para os outros, reconhecia e poupava
seus próprios filhos. (NUCCI, 2009, p.60).
[...] a justiça com as próprias mãos nunca teve sucesso, pois implicava, na
essência, em autêntica forma de agressão. Diante disso, terminava gerando
uma contrarreação e o círculo vicioso tendia a levar ao extermínio de clãs e
grupos. (NUCCI, 2009, p.60).
[...] jus talions (direito de talião), não permitindo que o revide ultrapassasse
a medida da ofensa, constitui sem dúvida um progresso. A um olho
arrancado, somente outro; a um dente, outro dente. O Código de Hamurabi
e a Lei das XII Tábuas acolheram este princípio. (COSTA JÚNIOR, 2009,
p.12).
Nesta fase, os processos eram sigilosos e o réu não sabia sequer qual era a
imputação feita contra ele, uma vez que o entendimento era o de que uma vez
inocente o mesmo não necessitava de defesa, se fosse culpado ele não teria direito
algum.
Nucci afirma que, se a Lei de Talião teve algum mérito, certamente foi o de
“reduzir a extensão da punição e evitar a infindável onda de vingança privada.”
(NUCCI, 2009, p. 61).
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[...] o primeiro código romano escrito foi a Lei das XII Tábuas (séc. V a.C.),
resultante do trabalho dos decenviri legibus scribendis. Com ela, inicia-se o
período de vigência legislativa, com a consequente limitação da vingança
privada, pelo talião e pela composição. (PRADO, 2014, p. 78).
O Direito Germânico era visto como uma solução dos conflitos sociais,
objetiva sempre a ordem e a paz social. Aquele que descumpria as normas pré-
estabelecidas trazia transtornos para os demais, ao mesmo tempo em que causava
uma ruptura no bem estar social.
As leis baseadas nessa Escola Penal eram consideradas bárbaras, momento
em que, as punições ou sanções eram estabelecidas conforme as qualidades gerais
do infrator, por exemplo: o sexo da pessoa, a idade, o local e a espécie do delito
cometido. Aqueles que não tinham condições remuneratórias de pagar suas dívidas,
se assim fosse possível, quitavam as dívidas com penas corporais.
Com a finalidade de buscar a justiça e a punição do transgressor,
A Escola Penal nasceu sobre os ideais iluministas, sendo que, para seus
idealizadores, a pena era um mal imposto a determinado indivíduo, que de forma
consciente e voluntária, cometia algum fato previsto como crime. Esta escola era
contrária à pena de morte e às penas cruéis, sustentando que a sanção penal
deveria ser proporcional ao fato criminoso cometido pelo seu agente infrator.
Segundo Nucci (2009), os clássicos visualizavam a responsabilidade penal do
criminoso com base no livre-arbítrio. Nas palavras de Antonio Moniz Sodré de
Aragão,
Portanto, ser criminoso e contrário às normas sociais seria uma opção, uma
decisão tomada pelo próprio particular, por meio de seu livre arbítrio e
liberdade/autonomia de escolha.
O autor Costa Júnior cita em sua obra Curso de Direito Penal, os princípios
fundamentais da escola clássica, que se dividem nos seguintes:
Para Costa Júnior, o maior penalista de todos os tempos desta fase foi
Francesco Carrara que
Para ele, o crime era cometido por meio de duas origens, duas forças, quais
sejam, o movimento, ação, corpórea de um corpo somado a uma vontade moral,
consciente, premeditada, de realizá-lo.
Anos mais tarde esta tese fora tida como falha, no entanto, serviu para o
lançamento da semente do que seria a atual antropologia e psicologia criminal.
Em um segundo momento, posteriormente a Lombroso,
Além disso, para ele, o objetivo da ação penal é a prevenção dos crimes, em
que deve a pena ser ajustada ao delinquente, e ao fato, além de visar reajustá-lo ao
convívio social.
Outrossim, a tríade positivista se encerra com
[...] dar relevo à teoria surgida nas últimas décadas, denominada de teoria
da prevenção geral positiva, reafirmando que a pena não serve para
intimidar criminosos, mas apenas para reafirmar a “consciência social da
norma”, demonstrando a sua vigência por meio da aplicação da sanção
penal. A teoria da prevenção geral positiva divide-se em: a) fundamentadora
(Jakobs, Wenzel), sustentando que a aplicação da pena tem o poder de
evidenciar que o agente do crime não se conduziu corretamente, servindo
de orientação aos cidadãos para o cumprimento das normas em geral, com
função educativa. Por isso, é contrária ao Direito Penal mínimo; b)
limitadora (Roxin, Mir Puig, Silva Sánchez, Muñoz Conde), reafirmando as
bases da anterior, embora pregando que a intervenção do Estado deve ser
limitada. (NUCCI, 2009, p. 67).
Segundo NUCCI,
No entanto, segundo este autor, a mais longa delas – 1603 a 1830 – foram as
Ordenações Filipinas, que previam penas cruéis e desproporcionais, sem qualquer
sistematização. Somente com a edição do Código Criminal do Império (1830),
advindo do projeto elaborado por Bernardo Pereira de Vascolcellos, conseguiu-se
uma legislação penal mais humanizada e sistematizada. “Constituiu-se um avanço
notável, criando institutos (como, por exemplo, o dia-multa) até hoje utilizados pelo
direito brasileiro e também por legislação estrangeira”. (NUCCI, 2009, p. 68).
Execuções penais que perduram até os dias de hoje, como exemplifica Nucci,
segundo o qual,
[...] essa missão principal do legislador vem se tornado cada vez mais difícil,
diante do constante desafio de produzir/alterar leis para uma sociedade de
relações complexas e multifacetadas, características marcantes de Estado
da pós-modernidade. O ofício da produção das Leis deve ser orientado por
um processo legislativo baseado em níveis de racionalidades suficientes
para criar normas possíveis de serem aplicadas em um recorte temporal de
modernidade tardia, em que os ventos do Estado de Direito ainda não
sopram plenamente. (LIRA, 2015, p. 47).
[...] a solução para inexistência da lei para o caso concreto está, conforme,
Dworkin, na utilização de um conjunto de princípios para melhor
interpretação da estrutura política e da doutrina jurídica da comunidade.
Neste tocante, a prática do Juiz está alicerçada em argumentos de
princípios, enquanto que o labor do legislador é alumiado por argumentos
de política. Dworkin sustenta que “el positivismo no consegue ver que el
Derecho no es tan solamente un sistema de reglas, por tanto, y que ahí hay
algo más, los princípios, cuya forma de aplicación es distinta de la de las
reglas”. Pois bem, parece claro que o Direito não significa tão-somente um
conjunto de regras. Por outro lado, também parece evidente que as regras
constituem o Direito; por isso a importância de uma Teoria da Legislação
para orientar o processo de produção das leis. Essa teoria, porém, tem de
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cuidar dos princípios, como procura fazer a Teoria de Dworkin. Até porque
os princípios devem integrar a feitura da lei. (LIRA, 2015, p. 61).
Além do mais, este autor preconiza que “o que se deseja é uma atuação
legislativa orientada também pelo princípio da integridade como se quer na
aplicação da legislação ‘pronta’.” (LIRA, 2015, p. 61).
Assim, inevitavelmente
Portanto, as Leis não podem ser criadas de qualquer forma, uma vez que
afetam diretamente a vida de todos aqueles que estiverem sob seus efeitos.
Segundo Lira, citando Kildare Gonçalves Carvalho,
Já a precisão procura “evitar ‘fórmulas genéricas’ nos textos das leis, a fim de
não causar no destinatário da norma incertezas em relação aos seus direitos e
deveres.” (LIRA, 2015, p. 69).
Além dos elementos abordados anteriormente, o direito adquirido, o ato
jurídico perfeito e a coisa julgada também visam reforçar a segurança jurídica.
Conforme Lira, “no sistema do Brasil, a formação da lei abrange a proposição
– iniciativa –, o exame pelas comissões, a revisão do projeto, a sanção, a
promulgação e a publicação.” (LIRA, 2015, p. 71).
Segundo o art. 59 da Constituição da República Federativa do Brasil, o
processo legislativo compreende a elaboração de: (1) emendas à Constituição; (2)
leis complementares; (3) leis ordinárias; (4) leis delegadas; (5) medidas provisórias;
(6) decretos legislativos; (7) resoluções. (BRASIL, 1988).
Ao abordar esse assunto, Lira argumenta que,
Ademais, o art. 61 do mesmo diploma legal explana que a iniciativa das leis
complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou comissão da Câmara dos
Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da
República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-
Geral da República e aos Cidadãos.
Conforme determina o art. 61, § 2°, da CF, os cidadãos podem dar iniciativa à
criação de leis por meio da iniciativa popular, que pode ser exercida pela
apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo,
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um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com
não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles.
Contudo, em caso de relevância e urgência, o Presidente da República
poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, e deve submetê-las de imediato
ao Congresso Nacional, conforme art. 62 da Lei Magna.
Além do mais, conforme a mesma norma legal, em seu art. 62, § 3º, § 11º e §
12, que tratam respectivamente deste assunto,
Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo
voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei,
mediante:
I - plebiscito; (BRASIL, 1988).
Ao chegar nas mãos do Presidente da República tal projeto de Lei, este terá o
prazo de 15 dias para sancionar ou vetar, total ou parcialmente a sua redação. Em
caso de omissão por parte do Chefe do Poder Executivo, o projeto de lei se
considerará sancionado, conforme art. 66, § 3°, da CF. Em caso de veto (total ou
parcial), o projeto de lei deverá retornar às casas do Congresso Nacional, para que,
em sessão conjunta, no prazo de 30 dias a contar do seu recebimento, decida-se
pela manutenção do veto ou não. Vale destacar que para haver a rejeição do veto,
faz-se necessário a deliberação da maioria absoluta dos Deputados e Senadores em
favor de tal decisão.
Conforme art. 7° da Constituição Federal,
[...] Se a lei não for promulgada dentro de quarenta e oito horas pelo
Presidente da República, nos casos dos § 3º e § 5º, o Presidente do
Senado a promulgará, e, se este não o fizer em igual prazo, caberá ao Vice-
Presidente do Senado fazê-lo. (BRASIL, 1988).
decorrer da sua vigência, não sendo possível retroagir para prejudicar alguém que
tenha praticado determinado fato anteriormente a sua égide. Todavia, segundo
Nucci,
A fragmentariedade, por sua vez, significa que o Direito Penal é apenas uma
parcela do todo que é o ordenamento jurídico brasileiro. Portanto, deve se preocupar
apenas com as condutas delituosas mais graves até para que o mesmo não seja
banalizado.
Já o princípio da culpabilidade se refere ao fato de que ninguém será punido
se não agir com dolo ou culpa, ou seja, se tiver a intenção de cometer o crime ou se
o cometeu por imperícia, negligência ou imprudência.
A taxatividade, por seu turno, “significa que as condutas típicas, merecedoras
de punição, devem ser suficientemente claras e bem elaboradas, de modo a não
deixar dúvida por parte do destinatário da norma.” (NUCCI, 2009, p. 75).
Ainda, o principio da proporcionalidade, segundo Nucci, assevera que,
Por fim, a vedação da dupla punição pelo mesmo fato, como o próprio nome
já esclarece,
[...] ninguém deve ser processado e punido duas vezes pela prática da
mesma infração penal. Tal garantia está prevista implicitamente na
Convenção Americana sobre Direitos Humanos (art. 8º, n. 4). Se não há
possibilidade de processar novamente quem já foi absolvido, ainda que
surjam novas provas, é lógico que não é admissível punir o agente outra
vez pelo mesmo delito. (NUCCI, 2009, p. 76).
Todavia, vale ressaltar que o indivíduo pode ser punido em esferas diferentes
pelo mesmo fato, ou seja, tanto na esfera penal, quanto na cível e administrativa.
Para fins de exemplificação, o agente que comete o delito de estupro, pode ser
sentenciado criminalmente com a pena privativa de liberdade e concomitantemente
condenado a pagar danos morais à vítima na esfera cível.
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Para Wermuth, o que se vive hoje é uma sociedade de risco, sendo que,
parafraseando Beck, sustenta o professor brasileiro em sua obra Medo e Direito
Penal que,
Mostrando uma coisa diferente do que seria preciso mostrar caso se fizesse
o que supostamente se faz, isto é, informar; ou ainda mostrando o que é
preciso mostrar, mas de tal maneira que não é mostrado ou se torna
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A potencialização desse perigo vem do poder que a mídia tem de atingir uma
grande massa de espectadores, facilitando a mobilização e o consenso comum em
detrimento de uma única causa. Assim, para Wermuth, a mídia pode
Porém, aquilo que era previsto para as prisões em nada se coincidiam com a
realidade aplicada, as prisões eram imundas, pestilentas, ar infecto, os presos eram
tratados com desumanidade e desprezo.
O desenvolvimento penitenciário se manteve nessa constante, pois, para
Carvalho Filho,
[...] o primeiro deles diz respeito aos graves problemas de saúde no sistema
penitenciário. A superlotação das celas, seus ambientes precários e
insalubres tornam as prisões um ambiente propício à disseminação de
epidemias e ao contágio de doenças. Além desses fatores que incidem
diretamente na saúde dos presos e contribuem de sobremaneira na
fragilização do estado de saúde dos apenados, há, ainda, má-alimentação,
sedentarismo, uso de drogas, falta de higiene, promiscuidade, violência
sexual e homossexualismo. Pesquisas estimam em vinte por cento o índice
de infectados por HIV, além de serem comuns doenças respiratórias, como,
pneumonias e tuberculose. (ASSIS, 2007, p. 75 apud PIES, 2012, p. 20).
[...] rebeliões e fugas, que, segundo o autor, são consequência dos demais
fatores negativos já elencados nos itens anteriores, combinados com a falta
de trabalho. As rebeliões e fugas nada mais são do que uma forma de
alertar as autoridades sobre a situação subumana a que são submetidos os
apenados em nossos estabelecimentos prisionais. (ASSIS, 2007, p. 75 apud
PIES, 2012, p. 21).
O quarto ponto trazido por Pies (2012) diz respeito à política prisional do País,
que, segundo ele, está falida, com escasso investimento estatal, muito pelo fato de
que os presidiários não votam para eleger os seus governantes políticos e estão à
margem da sociedade em geral, não resta qualquer interesse nos representantes
eleitos pelo povo do legislativo e executivo. Até porque, em um país em que falta
recursos para saúde, educação, transporte público, infra estrutura, para muitos, o
menor dos problemas e o último lugar a se pensar em investimentos é nos presídios.
Como quinto e último aspecto relevante da atual situação carcerária brasileira,
Assis aponta a
Os presídios são espaços onde, a rigor, não penetra a “luz pública”. Seu
cotidiano, os fatos que ali sucedem e o drama vivido pelos que vivem e
pelos que ali trabalham parecem não dizer respeito à sociedade e
permanecem, via de regra, imersos em uma profunda obscuridade. Esta
circunstância especial de isolamento, só é quebrada em momentos de
crises agudas como nas rebeliões, estimula e protege o que há de pior na
agencia humana. (ROLIM, 2007, p. 105, 106).
Nucci, fala das precárias condições da execução penal brasileira, disserta que
dificilmente o sistema penitenciário brasileiro recuperará alguém, sendo que
A dignidade vem sendo considerada (mesmo que para muitos e mesmo que
não exclusivamente) qualidade intrínseca e indissociável de todo e qualquer
ser humano e certo de que a destruição de um implicaria a destruição do
outro, e que o respeito e a proteção da dignidade da pessoa (de cada uma e
de todas as pessoas) constituem-se (ou, ao menos, assim o deveriam) em
meta permanente da humanidade, do Estado e do Direito. (SARLET, 2012,
p.31).
[...] naquele dia estava eu lá numa cela fria, com estrutura que mais parecia
uma masmorra medieval, uma cama com uns três colchões e cobertas
sujas, num espaço de 8 metros quadrados, lugar úmido, com vaso sanitário
entupido, que exalava um cheiro insuportável, lá estava eu, sozinho, jogado
pior que um lixo. (SANTOS, 2014, p. 07).
perguntasse a respeito do fato era pra dizer que não vi e não sabia de nada,
a tal lei do silêncio que reina no cárcere. (SANTOS, 2014, p. 09).
Outro fato que infelizmente acontece nos presídios do país, e que fora
relatado pelo autor em seu livro, se refere ao consumo de drogas ilícitas no interior
das penitenciárias, já que, além do mal que causa aos seus usuários, conforme
apresenta Santos,
A droga faz coisas na vida das pessoas que nem imaginamos. Só para
ilustrar, num outro dia escutei um detento falando no telefone com seus
filhos, dizia ele que recebeu o pecúlio (benefício que o detento recebe
durante ou no final de sua pena, caso tenha realizado alguma atividade
laboral no cárcere). Não sei precisar o valor que havia recebido, sei apenas
que estava guardando o montante para repassar a família no dia da visita,
para que pudessem comprar vestuário, calçados, alimentos, material
escolar para as crianças. Mas no dia anterior a visita, mais precisamente à
noite, esta pessoa utilizou todo o dinheiro do pecúlio para adquirir algumas
pedrinhas de crack. Fumou-as na minha frente em curto espaço de tempo,
lembro que aquela substância tinha um cheiro muito repugnante. (SANTOS,
2014, p. 10).
disfarçar, fazer de conta que não estava nem aí, mas estava apavorado e
preocupado. Não sabia a reação de um drogado após fazer uso daquela
substância. Era tarde da noite deitei na cama e fiquei embaixo das cobertas.
Noite fria de agosto de 2010, o rádio tocava com som muito alto, a luz acesa
e muitas conversas aconteciam, era uma confusão, enfim, eram “dias de
droga na galeria”, sempre eram assim. (SANTOS, 2014, p. 10, 11).
A vida foi muito difícil na época da superlotação [...]. No pátio, todos os dias
ouviam-se conversas de presos que falavam de fazer uma rebelião para
chamar a atenção do juiz de modo que fosse resolver aquela situação de
superlotação. Foram dias de conversas, até que ficou combinado entre
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todos os presos do regime fechado das duas galerias, que no próximo dia
de visitas seria o dia do motim. (SANTOS, 2014, p. 11).
Nossos familiares não fazem a mínima ideia do que é a vida atrás das
grades, talvez até você que está lendo esse livro não faça, mas se você
acredita em mudança, muito em, eu que convivi com presos de alta
periculosidade, afirmo e é triste dizer, mas 70 % dos presos não mudam e
nem se quer pensam em mudar. Diariamente ouço histórias de roubos,
planos de assalto, de homicídio, tráfico. Aqui é uma escola do crime, o que
a pessoa não sabe, aprende, mas quem quer mudança consegue, com a
ajuda de Deus e das pessoas dispostas a ajudar tornar-se possível.
(SANTOS, 2014, p. 23, 24).
Com a finalidade de exemplificar ainda mais o que fora relatado pelo autor
anteriormente, faz-se uma ilação com as notícias de outros estabelecimentos
carcerários dentro do Brasil, como por exemplo, alguns fatos envolvendo o Presídio
de Pedrinhas, localizado no Estado do Maranhão, a Casa de Detenção Carandiru,
localizada no Estado de São Paulo, bem como o Presídio Central de Porto Alegre,
no Rio Grande do Sul, que deixam cada vez mais evidente o fato das penitenciárias
brasileiras não conseguirem cumprir o que especifica a Lei de Execuções Penais.
No Presídio de Pedrinhas, segundo site do G1 Maranhão, após o
desentendimento entre 6 (seis) presos, um deles acabou sendo torturado,
condenado a morte a facadas, e logo após esquartejado, tendo o seu fígado
arrancado e servido de alimentação para os demais.
Segundo reportagem noticiada no mencionado site,
Tendo ciência a este fato, é lastimável que violências como esta aconteçam
em locais onde o que deveria prevalecer é o Estado de Direito, sempre com o
objetivo de buscar a ressocialização do condenado à sociedade.
Outro acontecimento que tomou âmbito nacional e mundial como um dos
mais famosos e sangrentos da história das penitenciárias mundiais, segundo
reportagem de Henrique Camargo (2005), veiculada pela Revista Superinteressante,
ocorreu em 2 (dois) de outubro de 1992, em São Paulo, na Casa de Detenção
Carandiru, onde aproximadamente 111 presos foram mortos e 130 detentos feridos
pela Polícia Militar do Estado de São Paulo. Neste dia, a polícia militar entrou no
presídio com a finalidade de acalmar uma rebelião que acabara de eclodir. Naquela
ocasião, houve represálias por parte dos condenados, o que gerou uma série de
atitudes, que até hoje são discutidas, por parte da Polícia Estadual de São Paulo,
dando como consequência a morte de diversos presos.
Já o Presídio Central de Porto Alegre, no Estado do Rio Grande do Sul, é um
dos maiores presídios do Brasil. Também conhecido por Casarão, pelas suas
grandes dimensões e capacidade de abrigar detentos, é também um dos complexos
prisionais mais deteriorados e em total incapacitação de recuperar detentos de
qualquer espécie.
No dia 06 (seis) de novembro de 2016, fora noticiado pela mídia local do Rio
Grande do Sul, Jornal Zero Hora, que uma facção criminosa de dentro do Presídio
Central não autorizou a saída de um detento para ser levado a um Tribunal do Júri.
O motivo estaria ligado à abertura de novas vagas para presos que estavam nos
chamados “bretes”, sem tomar banho de sol no pátio do presídio e sem receber
visitas.
Sem dúvida alguma tal atitude constitui em uma afronta ao Poder Judiciário e
à ordem Institucional Brasileira.
Em um trecho de sua obra, Santos afirma que,
A partir desse relato, é possível demonstrar que falta por parte do Estado, não
apenas uma melhor execução penal, mas também políticas públicas que auxiliem a
ressocialização do apenado, uma vez que, conforme Santos,
Assim, a aplicação da pena torna-se completamente sem efeito, uma vez que
o apenado retorna ao convívio social muitas vezes sem qualquer perspectiva de
futuro ou engajado na missão de trabalhar junto a um dono de tráfico, por exemplo,
que porventura tenha conhecido na prisão, além de haver o visível preconceito
quanto aos ex-presidiários na grande maioria das áreas profissionais.
Os “jagunços”, por sua vez, são pessoas contratadas, geralmente por grandes
proprietários de terras, para que desobstruam seus caminhos econômicos e políticos
bem como façam a proteção da propriedade privada. São conhecidos também por
“Pistoleiros” ou “capangas” que,
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2.4.1 Milícias
Ilustração 4: Homem foi encontrado por agentes da Draco após ser torturado e
ameaçado de morte por milicianos da Favela do Aço, Zona Oeste do Rio
Foto: Reprodução/TV Globo
[...] as milícias existem desde a década de 70, mas começaram a ganhar força
no Rio nos anos 90. Em 2005, a imprensa começou a denunciar os abusos
cometidos por esses grupos e em 2008 eles chegaram a torturar uma dupla de
repórteres de um jornal carioca na comunidade do Batan, na Zona Oeste.
Atualmente as milícias fazem transporte irregular, e cobram taxas de moradores
para fornecer serviços ilegais de TV a cabo, botijão de gás, cesta básica e
segurança local. (CARVALHO, 2016).
O fato é que existe uma disputa pelo poder, tanto por parte de milícias, traficantes
ou estas contra o Estado, representado pelos seus órgãos de segurança pública. O
maior prejudicado desse cenário social é o cidadão, que sofre diretamente as
consequências destes conflitos próprios de características de uma “guerra civil”.
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Importante registrar que não é apenas no Estado carioca que a milícia atua,
pois, no Rio grande do Sul, por exemplo, no dia 05 de abril de 2016, o Ministério
Público Estadual realizou a Operação "Braço Forte" na Zona Sul do Estado do Rio
Grande do Sul. Esta Operação ocasionou a prisão de 16 (dezesseis) pessoas e
apreensão de 21 (vinte e um) veículos, armas de fogo, armas brancas, porretes,
algemas, celulares e computadores, consoante ilustrações abaixo.
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Quase 200 policiais federais e militares foram às ruas ontem (8) pela manhã para
prender 15 pessoas, sendo quase todas elas membros da Polícia Militar do RN, e
cumprir 25 mandados de busca e a apreensão sob a acusação de formação de
um grupo de extermínio com atuação na Região Metropolitana de Natal entre
2011 e 2015. Dentre os presos estão membros de pelo menos três batalhões da
PM que atuam na capital do estado. (NASCIMENTO, 2015).
Ilustração 8: Diogo Farias Souza, de 20 anos tinha dívida há três meses com
traficantes na Favela do Rola.
Foto: Herculano Barreto Filho/Extra
Ilustração 10: Sociólogo critica ‘limpeza social’ durante Copa e cobra criação de
políticas públicas
Foto: Da Redação- Priscilla Silva
[...] quando as pessoas estão apenas nas periferias não são um problema
para os governantes e a administração pública, passam a ser motivo de
preocupação quando começam a migrar para o centro das cidades.
Segundo ele, o governo municipal tenta criar uma fachada, dando a
entender que está tudo bem, obrigando a saída dos moradores de rua das
ruas de grande circulação de turistas. (SILVA. 2014).
Ainda, para ele, é necessário buscar uma solução para resolver o problema e
não simplesmente remediar, fazendo como se essas pessoas não existissem e
como se suas vidas fossem descartáveis facilmente.
2.4.5 Linchamento
Ilustração 11: Adolescente foi acorrentado nu após ser agredido a pauladas no Rio
de Janeiro
Foto: Yvonne Mello
Pelo fato de o Estado não ser onipresente, este acaba por permitir a
autodefesa por parte de seus membros quando não houver outro meio para tal
finalidade.
Ainda, para este doutrinador, a legítima defesa consiste na presença de
vários requisitos, como por exemplo: “a agressão injusta; atual ou iminente; a direito
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CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
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