DEPARTAMENTO DE SOCIOLOGIA E CIÊNCIA POLÍTICA CURSO DE GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
Epistemologia das Ciências Sociais – CSO7304
Docente: Rodrigo da Rosa Bordignon Discente: Laura Battisti
RESUMO DO CAPÍTULO “A COLONIALIDADE DO SABER:
EUROCENTRISMO E CIÊNCIAS SOCIAIS”
Edgardo Lander é um sociólogo venezuelano, nascido em 1942. Em sua vida
acadêmica, voltou suas pesquisas para as áreas de teoria da democracia e em movimentos na América Latina. Este organizou um livro de grande importância para a descolonização do pensamento: “A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas Latino- americanas”. O livro apresenta artigos de diversos autores, incluindo a apresentação do organizador em seu texto “Ciências Sociais: saberes coloniais e eurocêntricos''. De maneira geral, este mostra como a dominação e a colonialidade continuam presentes mesmo após o fim do colonialismo. Dessa forma, as análises críticas do pensamento social são cercadas desse pensamento eurocêntrico, o qual procura-se refletir neste trabalho. Além disso, questiona-se o quanto a episteme européia consegue abranger as distintas formações sociais que constituem as múltiplas regiões do planeta. Assim, há uma sofisticada análise da dominação de padrões de investigação e ensinamento no campo das ideias, influenciadas por inúmeras estruturas de poder derivadas das relações coloniais e resultantes de uma perspectiva hegemônica que rejeita o desenvolvimento de outras epistemes. Inicialmente, Lander apresenta o objetivo de seu artigo: buscar alternativas de dimensões constitutivas dos saberes. Isto porque, há uma força hegemônica do pensamento neoliberal na formulação de teorias, o qual declara uma capacidade de conhecimento objetivo, científico e universal. Ainda, este considera e naturaliza a sociedade moderna como a forma mais avançada de experiência humana. Contudo, este raciocínio está apoiado em condições histórico culturais específicas, nas quais formulou-se uma narrativa de que a sociedade denominada como moderna é vista como uma tendência natural do desenvolvimento histórico da sociedade. Todavia, esta narrativa não vislumbra as desigualdades existentes no mundo moderno e alternativas são necessárias para desconstruir este caráter universal e naturalizado da sociedade capitalista-liberal. Para tal, deve-se questionar o conjunto de saberes das ciências sociais e seus instrumentos de naturalização e legitimação, os quais têm a intenção de serem objetivos e neutros. No Ocidente, diversas separações foram feitas e, ao contrário de outras culturas, criou- se uma “fissura ontológica entre a razão e o mundo” (Apffel-Marglin, 1996:6). Em outras palavras, a origem do conhecimento descontextualizado são estas separações que pretendem tornar universal e objetivo todo saber. Ainda, há uma articulação entre essas desassociações e o contraste entre o ocidente (o moderno) e os Outros (restante das culturas). Esta conformação colonial alcança o mundo físico e intelectual, atingindo as memórias, linguagens e saberes dos países colonizados, como os do continente Americano. A partir disso, há uma organização da totalidade do espaço e do tempo. Nesta ordenação, a Europa é o centro geográfico e o auge do movimento temporal - visto que nesta narrativa há um movimento evolucionista. Assim, incorpora-se todas as culturas, povos e territórios, do passado e do presente, nesta narrativa universal, as quais visam alcançar o continente Europeu. Derivam desse universalismo, uma exclusão com relação aos direitos dos povos, já que uma ordem de direitos universais de todos os indivíduos nega soberania e autonomia aos povos não ocidentais europeus. Dessa forma, a consolidação da hierarquia ocorreu por meio da submissão dos outros povos por parte das potências europeias. Isto é, o modo de vida liberal e as relações de produção capitalista só conseguiram se estabelecer e se denominar portadores históricos da razão universal devido às práticas coloniais e imperialistas realizadas nos outros continentes. Atualmente, este processo é pouco associado ao caráter das formas naturais de vida social impostos pela hegemonia do projeto liberal. Entretanto, o autor aponta que para que hoje haja esta naturalização foi preciso um longo regime de normatização e disciplina. Logo, os indivíduos dos séculos XVIII e XIX que presenciaram as transformações necessárias para a criação da força de trabalho - como a imposição da disciplina do trabalho fabril - sofreram com esta ruptura forçada. As ciências sociais não presenciaram essas rupturas, se constituíram em cinco países liberais industriais, na segunda metade do século XIX, nascendo apenas após a hegemonia do pensamento eurocêntrico. Assim, ao não presenciar a resistência às condições de criação do modelo liberal, esta absorve o imaginário histórico-cultural europeu. Neste contexto, os pressupostos fundacionais são constituídos, tendo como eixo principal a ideia de modernidade, definida em quatro ideias: história dos países associada ao progresso (primitivo até o moderno), naturalização do modelo de vida liberal-capitalista, naturalização das múltiplas separações feitas e a superioridade da ciência em relação às outras formas de conhecimento. Dessa forma, nota-se que todas as outras culturas e povos devem atingir a sociedade moderna, caso contrário, segundo a norma universal, estão destinados a desaparecer. Assim como o curso da história é apenas um, o conhecimento para compreender essa sociedade também. Em outras palavras, as ciências sociais estão inseridas na lógica do universalismo e objetivismo europeu. Nesta construção eurocêntrica, convertem-se as categorias, conceitos e perspectivas em proposições normativas do que ser para todos os povos. Assim, a partir do conhecimento destes pode-se analisar o atraso dos mesmos, os quais ainda não atingiram a dita modernidade - o padrão de referência superior e universal. Constata-se então que as ciências sociais são um dispositivo do conhecimento colonial, o qual por meio do processo da cientifização, objetivação e universalização, torna naturalizado a sociedade liberal e as separações dos conhecimentos sociais entre a sociedade moderna e as outras culturas, visto que esta sociedade é a que possui a “verdade”. Assim, até mesmo os autores que se submetem a estudar a especificidade histórico-cultural de outros países, comparam com a experiência ocidental. Percebe-se diversos recursos utilizados para legitimar a missão civilizadora europeia, entre a definição de conjuntos de conhecimentos válidos/superiores (europeu) e os outros descartáveis (outros). Para finalizar, Lander apresenta alternativas atuais ao pensamento eurocêntrico- colonial na América Latina e apresenta as principais contribuições para a episteme latino- americana. Entre estas, está a desnaturalização das formas de “aprender-construir-ser”, mobilizando a consciência para uma concepção de pluralidade epistêmica, através da revisão de métodos (suas contribuições e transformações). Assim, uma possibilidade é analisar o caráter relativo do conhecimento e reconhecer a tensão entre as minorias e maiorias e os seus modos de fazer-conhecer. Ainda, os autores que se destacam são Montero (teologia da libertação), Paulo Freire, Orlando Fals Borda (1959;1978) e Alejandro Moreno (1995). Além destes, há três contribuições atuais importantes: Michel-Rolph Trouillot, Arturo Escobar e Fernando Coronil. Todos estes desenvolveram produções teóricas visando uma perspectiva crítica do conhecimento eurocêntrico colonial e reinterpretações, mediante outras suposições, da realidade latino-americana. REFERÊNCIAS LANDER, E. A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino- americanas. Colección Sur-Sur, CLACSO: Buenos Aires, Argentina, 2005. (p. 8-24)