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02/10/2021 13:00 Pesquisas mostram que a inteligência do ser humano está regredindo | VEJA

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Ciência

Pesquisas mostram que a inteligência do ser


humano está regredindo
O tempo desperdiçado nas redes sociais e a polarização política são alguns dos
principais responsáveis pelo recuo, depois de décadas de evolução
Por Ernesto Neves, Caio Saad Atualizado em 1 out 2021, 18h44 - Publicado em 1 out 2021, 06h00

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Objeto de análise desde os primórdios da civilização, a inteligência humana


é um mistério tão intrigante quanto a origem do universo. Na cultura
ocidental, sua primeira definição remonta à Ilíada, o poema do século VIII
a.C. em que Homero narra a história do herói Aquiles e da Guerra de Troia e
faz referência à psuche, origem do termo psique, no clássico grego uma
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força superior àquela que dá vida ao restante dos seres. As dúvidas sobre o
que faz os indivíduos serem mais ou menos inteligentes permanecem, mas,
ao longo de milênios, o conceito foi sendo destrinchado em estudos
científicos sobre os mecanismos que movem o intelecto até se chegar a uma
forma de medição padronizada — o teste de Q.I. (quociente de inteligência)
— amplamente reconhecida e aceita.

Entra década, sai década, em boa parte do século XX os países mais


avançados, principalmente, puderam bater no peito e anunciar com orgulho
que o Q.I. médio de seus habitantes subia consistentemente — até a curva
começar a cair e a inteligência engatar marcha a ré a partir dos anos 2000.
Em sólidos levantamentos, descobriu-se algo constrangedor para a
civilização: pela primeira vez, os filhos passaram a ter mentes menos afiadas
do que a de seus pais. E como fugir da lembrança de movimentos da
atualidade desprovidos de massa cinzenta, como os antivacina, os anti-­-
instituições democráticas e os anticiência que compõem o lado escuro da
polarização ideológica que varre o planeta?

OLHO VIVO - Realidade virtual ao alcance das crianças: é preciso dosar a exposição dos jovens ao mundo
digital – iStock/Getty Images

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O esforço de tentar entender e reverter esse quadro tem sido tema de uma
série de estudos e publicações recentes capitaneados por pesos-pesados da
área, intrigados com o fenômeno. No livro A Fábrica de Cretinos Digitais,
que acaba de ser lançado no Brasil, o renomado neurocientista francês
Michel Desmurget, diretor de pesquisas do Instituto Nacional de Saúde da
França, aponta as baterias de combate ao estado atual de estagnação
intelectual para o que afirma ser sua maior causa: o excesso de tempo
passado diante da tela dos mais variados aparelhos digitais. “A tela, em si,
não representa um mal, mas o número de horas despendidas na sua frente é
assustador”, ressaltou Desmurget a VEJA. “O uso de computadores e
celulares por pré-­adolescentes é três vezes maior para se divertir do que para
fazer trabalhos escolares. No caso dos adolescentes, o número sobe para
oito”.

No trecho em que se debruça sobre o desenvolvimento de crianças


pequenas, o especialista adverte que internet e aplicativos de redes sociais
em demasia afetam negativamente as interações, a linguagem e a
concentração, os três pilares básicos do progresso cognitivo em qualquer
idade, mas de excepcional importância nos cinco primeiros anos da
existência. É justamente nesse período-chave que se observa o auge da
plasticidade — nome dado à frenética formação de sinapses que nunca mais
se repetirá e que resulta na evolução ultra-acelerada do potencial do cérebro.
“Até o humor do meu filho piorou com o tempo excessivo na frente do
celular”, reconhece a assistente administrativa Hanna Ueda, 27 anos, de São
Paulo. Ela restringiu o uso e, junto com o marido, Giovanni, passou a sentar
todo dia com Pedro, 4 anos, para ler um livro e assim motivar sua
curiosidade. “No caso das crianças pequenas, celular é um entretenimento
passivo, sem reflexão ou desafios. Não passa de uma diversão viciante”,
alerta Claudio Serfaty, do Programa de Pós-Gra­duação em Neurociências na
Universidade Federal Fluminense.

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Colocada dessa maneira, parece que a tecnologia é um mal. Longe disso. O


foguete do progresso tecnológico transportou a humanidade para um novo
patamar de conhecimento, criatividade, bem-estar e longevidade, com
nítidos e incontáveis benefícios em todas as áreas — inclusive no estudo da
inteligência. O ruim é o exagero. Esse ramo da ciência, de aferição cognitiva,
ganhou impulso no século XIX, quando o antropólogo inglês Francis Galton
(1822-1911) esmiuçou a teoria da evolução formulada por seu primo, Charles
Darwin (1809-1882). Galton concluiu que a inteligência é uma característica
hereditária e desenvolveu, em 1884, o primeiro método de medida do
intelecto humano — um conjunto rudimentar de testes físicos e psicológicos.
Três décadas depois, foi a vez de o psicólogo alemão Wilhelm Stern elaborar
o quociente de inteligência, só que em uma fórmula muito complexa. Coube
a Lewis Terman, especialista em psicologia educacional da Universidade
Stanford, simplificar o teste e popularizar a sigla Q.I. Foi Terman quem
sedimentou o padrão médio de Q.I. no número 100, criando a escala
Stanford-Binet, usada até hoje.

À medida que a ciência evolui, escorada pelos avanços da computação, o


componente hereditário da inteligência identificado por Galton vai
ganhando a companhia de outros fatores. Em pesquisa publicada em 1984, o
educador americano James Flynn (1934-2020), tomando por base o avanço
constante do Q.I. médio nos países mais prósperos — que atingiu seu ápice
na década de 1970, com altas anuais de três pontos —, demonstrou que as
melhorias alcançadas na medicina, na educação e no pensamento crítico
haviam contribuído decisivamente para tornar a população mais inteligente,
um fenômeno que ganhou o nome de “efeito Flynn”. Problema: passado o
apogeu, as conquistas no Q.I. foram sendo cada vez menores até
estacionarem e, na entrada do século XXI, começarem a deslizar ladeira

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abaixo, devagar e sempre, acendendo o sinal amarelo. E a trajetória segue


em queda na capacidade cognitiva.

INCENTIVO - Os pais leem para Pedro, 4 anos: a linguagem é um pilar da cognição – Egberto Nogueira/
Ímãfotogaleria/.

Um dos estudos mais incisivos sobre esse refluxo intelectual, realizado por
pesquisadores da Noruega, analisou 730 000 testes de Q.I. aplicados em
jovens convocados para o serviço militar obrigatório nos últimos quarenta
anos. Sua conclusão: os aumentos anuais do Q.I. dos noruegueses baixaram
para 2 pontos nos anos 1980, para 1,3 ponto nos 1990 e se transmutaram em
recuo de 0,2 ponto neste século. Processo semelhante foi detectado no Reino
Unido e na Dinamarca. Pesquisas como essas reforçam o alerta dos
especialistas para mudanças no estilo de vida que, segundo eles, estão por
trás do retrocesso — aí incluída, em lugar de destaque, a imersão constante e
indiscriminada nos eletrônicos. As plataformas de vídeos, as redes sociais e
os aplicativos de mensagem alimentam as discussões embotadoras, nas
quais crenças se sobrepõem à razão e a ideologia impede o confronto de
ideias enriquecido pelo saber científico — aquele que não se atém às
primeiras linhas de um texto, mas se ampara nele inteiro. “As pessoas
entram nas chamadas bolhas de filtragem, onde são expostas a olhares
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condizentes com seu perfil e blindadas de pontos de vista destoantes”,


afirma Philip Boucher, pesquisador do Scientific Foresight Unit, instituto
ligado ao Parlamento Europeu.

A turma mais nova, como bem aponta o francês Desmurget, é presa fácil dos
efeitos deletérios do excesso digital. Estudo da Universidade de Alberta, no
Canadá, mostrou que crianças de 5 anos ou menos que passam mais de duas
horas por dia on-line têm chance cinco vezes maior de apresentar
dificuldade de concentração e sete vezes mais risco de exibir sintomas de
transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH). “Até 2 anos, o
tempo de tela recomendado é zero, a não ser em bate-papos virtuais com a
família”, decreta a psicóloga Sheri Madigan, da também canadense
Universidade de Calgary. Entre 2 e 5 anos, a janela de conexão não deve
passar de uma hora diária, com foco em programas educacionais e jogos.
“E os pais precisam estar do lado, para ajudar na compreensão do que está
acontecendo”, diz.

Fatores comportamentais, sabe-se agora, também são determinantes na


evolução da inteligência. O pleno desenvolvimento intelectual na infância
exige interação social, engajamento em brincadeiras e, conforme a idade,
também o enfrentamento de problemas e discussões que transcorrem fora
das telas. “Há evidências crescentes de que investir na prática de disciplina e
autocontrole tem efeito positivo tanto no nível acadêmico quanto no Q.I. dos
pequenos”, diz Adriana Melibeu, especialista em neurobiologia da
Universidade Federal Fluminense (UFF). Uma boa formação escolar é
imprescindível, bem como atividades extracurriculares que puxem o cérebro
e sirvam de desafio — o que vale também para os adultos (veja o quadro
acima), já que instigar a curiosidade é terreno fértil para o crescimento
intelectual de qualquer pessoa.

Conta pontos positivos apaixonar-se por algum assunto, especialmente se ele


exige conhecimento profundo, como astronomia ou grego antigo,
proporcionando um mergulho no tipo de exercício que afia a atenção,
estimula a perseverança e aprimora habilidades como processamento de
informações e análise. “Inteligência não é só a bagagem que adquirimos,
mas a capacidade de interpretar e de se lançar rumo ao novo, ao
desconhecido”, ensina Chris Frith, psicólogo da University College London.

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A prática de esportes é outra atividade relacionada à expansão do intelecto


porque aumenta a oxigenação do cérebro, o que por sua vez incrementa a
conectividade neuronal— processo que se repete na alimentação
equilibrada. Consumir ovos, peixes, legumes e verduras potencializa a
produção de neurotransmissores e ajuda no desempenho cognitivo.

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De tanto investigar os segredos da mente, pesquisadores e cientistas não


param de identificar novas ramificações para a inteligência: espacial, lógica,
linguística e mais uma infinidade de variações. Há uma reflexão, inclusive,
quanto à escala de valor das habilidades. “As mais importantes são
relacionadas à inteligência adaptativa, como a criatividade, o bom senso, a
empatia e a destreza analítica”, afirma o psicólogo Robert Sternberg, da
Universidade Cornell. Outra variante, a inteligência emocional, definida
como a capacidade de entender e lidar com sentimentos próprios e alheios,
fincou pé no glossário do intelecto graças à publicação do best-­seller de
mesmo nome, do jornalista Daniel Goleman, em 1995. Nessa sopa de
designações, até a mente privilegiada dos gênios (veja as ponderações de
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alguns deles acima) pode escorregar. Albert Einstein (1879-1955), que nunca
fez teste mas teve seu Q.I. avaliado postumamente em extraordinários 140 a
145 pontos, seria reprovado no exame de inteligência emocional: o primeiro
casamento, com Mileva Maric, foi desastroso e o segundo, com Elsa
Löwenthal, ficou marcado pelas infidelidades. Seja qual for a medida
utilizada para definir a inteligência, o essencial é que ela seja cultivada,
porque só assim a humanidade caminhará para a frente, sem as
radicalizações comportamentais que alimentam atualmente a estupidez dos
cabeças-ocas.

Publicado em VEJA de 6 de outubro de 2021, edição nº 2758

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