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Original

Degradação In Vitro de Implante Biorreabsorvível em Poli


(L-Lactide) para Artrodese de Coluna Lombar
In Vitro Degradation of Bioresorbable Implant in Poly
(L-Lactide) for Lumbar Spine Arthrodesis
Marcelo Simoni Simões1
Sandra Maria Oliveira Einloft2
Ana Paula Testa Pezzin3

SINOPSE ABSTRACT
Objetivo: Estudar o perfil de degradação de um implante Objective: This study traces the degradation profile of a
de coluna em poli(ácido lático) produzido por processos spinal implant produced in PLLA by industrial processes and
industriais e comparar os resultados com os obtidos em compares it with results obtained from experiments made in
estudos de modelos experimentais, produzidos por processos laboratory models.
de laboratório.
Materials and Methods: A bioabsorbable interbody spinal
Materiais e Métodos: Um implante absorvível para artrodese
intersomática de coluna foi desenvolvido e produzido por implant was developed and produced by an industrial injection
injeção, em ambiente industrial. As peças foram degradadas process. The specimens were degraded in vitro by one year,
in vitro por um ano, acompanhando-se o processo com ensaios with the evolution monitored by tests of mass loss and water
de perda de massa e penetração de água, cromatografia por absortion, gel permeation chromatography, diferential scaning
permeação em gel, calorimetria exploratória diferencial, calorimetry, mechanical compression tests and electron
ensaios mecânicos de compressão e microscopia eletrônica scanning microscopy.
de varredura.
Results: The degradation in one year was insignificant,
Resultados: O implante apresentou degradação insignificante without changes in mass, volume or mechanical behaviour.
em um ano, praticamente sem alterações da massa, The different tests showed a minimal water absortion by the
volume e características mecânicas. Os diferentes ensaios specimens, without bulk hydrolysis, but only loss of the small
caracterizaram uma baixíssima penetração de água nas
polymer chains of the surface and a major rise in cristalinity,
peças, sem ocorrência de hidrólise da massa, mas apenas
com perda das cadeias poliméricas da superfície e grande probably by an aging process.
aumento do grau de cristalinidade, provavelmente por um Conclusions: The implant performed very differently from
processo de envelhecimento do polímero. the small laboratory pieces, with insignificant degradation.
Conclusões: O implante se comportou de modo diferente do It is possible to anticipate that, in clinical settings, it could
descrito em peças pequenas de laboratório, apresentando originate long lasting crystalline residues.
degradação insignificante. É possível projetar que, em uso
Keywords: PLA, resorbable implants, polymers, degradation.
clínico, o implante originaria resíduos cristalinos perenes.
Palavras-chave: PLA, implantes, polímeros, degradação.

1 - Cirurgião de coluna, membro da Sociedade Brasileira de Coluna , Mestre em Engenharia e Tecnologia de Materiais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul –
PUCRS – Porto Alegre (RS), Brasil.
2 - Pós-doutora em Química, Professora Titular , Faculdade de Química , Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS – Porto Alegre (RS), Brasil.
3 - Pós-doutora em Química, Professora Titular , Universidade da Região de Joinville - UNIVILLE - Joinville (SC), Brasil.
Recebido em agosto 2010, aceito em setembro 2010

Simões MS, Einloft SMO, Pezzin APT - Degradação In Vitro de Implante Biorreabsorvível em Poli (L-Lactide) para Artrodese de Coluna Lombar J Bras Neurocirurg 21 (4): 208-214, 2010
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Polímeros biodegradáveis são os que ficam instáveis quando


Introdução em meio orgânico, sofrendo degradação in vivo40. Dentre os
biodegradáveis, os polímeros biorreabsorvíveis são os que
Existem várias diferenças entre os implantes plásticos e degradam por quebra progressiva das cadeias, originando
metálicos. Os metálicos são constituídos de matérias primas monômeros que são eliminados do organismo sem deixar
padronizadas que sofrem apenas processos de modelagem, elementos residuais40. Atualmente, estes materiais vem sendo
utilizados em suturas, sistemas de liberação controlada de
de forma que as diferenças entre dois implantes de titânio
drogas, arcabouços para crescimento de tecidos (scaffolds)
dependem das diferenças em sua geometria. Nos implantes
e como implantes em cirurgias ortopédicas e crânio-maxilo-
plásticos, a matéria prima se constitui de um sistema de cadeias
faciais5,7,8,18,19,32.
de polímero que pode se organizar de diversas maneiras, de
modo que dois implantes de mesma geometria e mesmo tipo de Nos implantes biorreabsorvíveis, é crítico o tempo até
matéria prima, poli(ácido lático) (PLA), por exemplo, podem que ocorra a desestruturação e a consequente perda de
apresentar características diferentes, conforme as cadeias propriedades mecânicas do material. Todo cirurgião sabe que,
constituintes se arranjem de forma diferente dentro da peça9. embora os implantes devam degradar-se em um a três anos, é
muito comum que estes sejam encontrados quase totalmente
As características que mais influenciam o comportamento íntegros em revisões cirúrgicas realizadas anos depois de sua
mecânico e o perfil de degradação do material são o tamanho implantação.
e o grau de organização geométrica das cadeias. Na ciência
Embora já existam no mercado vários implantes
de polímeros, o tamanho das cadeias poliméricas que compõe biorreabsorvíveis para cirurgia ortopédica, esta tecnologia
uma determinada peça é expresso em termos de massas molares ainda não está completamente dominada, havendo controvérsia
médias. As massas molares são maiores quanto mais longas, quanto à adequação do material para aplicações de suporte de
mais ‘pesadas’, forem as cadeias constituintes. Como uma carga, como os dispositivos para artrodese intersomática de
peça nunca é composta de cadeias com tamanhos idênticos, coluna lombar (cages)13,15,26.
as massas sempre são expressas como médias, calculadas de
O polímero biorreabsorvível mais utilizado na confecção
diversas maneiras. Assim, uma peça teórica constituída de
de implantes estruturais é o poli(ácido lático) (PLA), que
10 cadeias de 10.000 g/mol e 10 cadeias de 1000 g/mol teria
apresenta excelentes propriedades mecânicas18,19, é altamente
uma massa numérica média (Mn) de 5500 g/mol, enquanto biocompatível17,21,24,27,28,31,36 e os produtos de sua degradação
outra peça, constituída de 20 cadeias de 5500 g/mol, teria são facilmente eliminados, pois seu monômero, o ácido
a mesma Mn, porém seria totalmente diferente do ponto de lático, está naturalmente presente no metabolismo humano,
vista estrutural. A medida da heterogeneidade de massas entre sendo transformado em CO2 e água6,12. As formas de PLA
as cadeias constituíntes de uma peça é a polidispersividade. mais utilizadas em medicina são o poli(L-lactide) (PLLA),
Numa peça onde todas as cadeias tivessem a mesma massa, a caracterizado por grande resistência mecânica e períodos
polidispersividade seria igual a 1,09,10. prolongados de degradação, e o poli(DL-lactide) (PDLLA),
mecanicamente menos resistente e de degradação mais rápida.
O grau de arranjo geométrico das cadeias poliméricas na
A alta resistência e a pouca deformabilidade à tensão fazem o
peça é expresso pelo grau de cristalinidade, que é tanto maior
PLLA mais elegível para aplicações estruturais11.
quanto mais organizadas as cadeias estejam. Materiais com
cadeias totalmente desorganizadas, de cristalinidade zero, Como os estudos de degradação dos implantes industralizados,
são chamados de amorfos. Os polímeros que se organizam realizados pelas empresas fabricantes, não costumam ser
formando fases cristalinas e amorfas são classificados como divulgados, é muito difícil encontrar na literatura dados
semi-cristalinos9,10. O grau de cristalinidade depende não só do confiáveis sobre a absorção do PLA na forma de produtos
comerciais. A maioria das publicações sobre a degradação
polímero propriamente dito, mas também dos processos por
do PLA utiliza como modelos peças de pequeno volume,
que ele passa na confecção da peça, com especial destaque
produzidas em laboratório, como lâminas, pinos, ou mesmo
para a história térmica40.
filmes. Várias características, como a massa e o grau de
Via de regra, quanto maior a massa molar, maior a resistência do cristalinidade, que definem o comportamento mecânico
material, e quanto maior o grau de cristalinidade, maior a rigidez e o perfil de degradação do PLA, são muito alteradas pelos
do material. Assim, implantes com aplicações estruturais, como processos pelos quais o polímero passa até obter-se o implante
placas, parafusos ou espaçadores intervertebrais, costumam em sua forma acabada41,42, de modo que os resultados de
ser confeccionados em polímeros semi-cristalinos com massas experimentos realizados em peças pequenas não podem ser
molares elevadas9,10. assumidos como verdadeiros para peças de maior volume e
produção industrial.

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O presente estudo apresenta a caracterização e o perfil de calorimetria exploratória diferencial (DSC) e compressão
degradação in vitro de um implante para artrodese intersomática estática. As amostras não degradadas e degradadas por 6 e 12
de coluna lombo-sacra (PLIF) fabricado em PLLA com meses também foram submetidas a microscopia eletrônica de
técnicas de produção industrial. varredura (MEV).
As medidas de massa e absorção de água foram realizadas
utilizando-se balança digital de precisão, antes e após a secagem
dos mesmos em dessecador à vácuo com sílica gel. Foram
calculados o percentual de perda de massa37, o percentual de
Materiais e Métodos absorção de água25 e o percentual de absorção de água corrigido
pela perda de massa37.
Um espaçador para artrodese intersomática lombar por via A medida das massas molares e polidispersividade foi em
posterior foi projetado, utilizando-se os softwares de desenho aparelho de GPC com bomba HLPC, coluna Styragel™,
assistido por computador (CAD) AutoCAD Inventor™ versão detector de índice de refração e software Breeze™ (Waters
9 (Autodesk®) e de ensaios virtuais através de análise de Instruments® – USA), com clorofórmio como solvente.
elementos finitos (FEA) ANSIS workbench 9.0™ (Autodesk®).
Os implantes foram confeccionados em PLLA PURASORB™ Para o DSC foi utilizado um aparelho TA Q100™ V7.0 Build
(PURAC biochem® – USA), em conformidade com a norma 244 (TA Instruments® – USA). Os ensaios foram realizados
ASTM F 1925-993, utilizando-se uma injetora Arburg 60™ com ciclos de dois aquecimentos até 200ºC, conforme a norma
(Arburg Spritzgieβmaschinen® – Deutschland), instalada em ASTM D34181. O grau de cristalinidade das amostras foi
uma sala limpa de classe 10000(30) (Bioteck® – RS, Brasil). calculado pela entalpia de fusão cristalina do implante (ΔHm),
usando-se a equação [Cristalinidade percentual = (ΔHm /
O ciclo de injeção teve temperatura máxima da matéria-prima
93,7)100%], onde 93,7 é o valor atribuído à entalpia de fusão
de 210ºC e tempo de resfriamento na matriz de 30 segundos a
do PLLA 100% cristalino20.
55ºC.
Os ensaios de compressão estática foram realizados em uma
Os implantes têm 23mm de comprimento, 14mm de largura
máquina universal EMIC®, seguindo as premissas da norma
e altura de 10mm, com uma abertura central para colocação
ASTM F 20774. Foram testados 3 implantes em cada tempo de
do enxerto ósseo. O volume das peças é de 1471.57mm3 e a
degradação.
área de superficie é de 1360.6mm2 (fig. 1). A esterilização foi
feita em óxido de etileno, em conformidade com a norma ISO Para as observações com MEV foi utilizado um microscópio
11135-122. eletrônico de varredura XL 30™ (Phillips® – Germany).
As peças receberam recobrimento metálico por sputtering de
ouro-paládio.

Resultados
Ensaios de perda de massa e absorção de água: A perda
de massa das amostras foi de aproximadamente 0,2% até os 9
meses de degradação, aumentando para 0,6% aos 12 meses. O
Figura 1.
percentual de absorção de água para todas as peças, degradadas
Os implantes foram degradados em solução de tampão fosfato ou não, foi insignificante, abaixo de 0,5%. A perda de massa
com pH mantido em 7,4±0,2 e temperatura fixada em 37±1ºC, foi tão pequena que os valores do percentual de absorção de
com base nas orientações das normas ASTM F 1635-04(2) e água corrigidos foram iguais aos não corrigidos.
NBR ISO 1378129.
Cromatografia por permeação em gel (GPC): Os ensaios
Foram ensaiados um total de 24 implantes, sendo feita no implante não degradado mostraram uma Mw de 65.202 g/
caracterização de amostras não degradadas e degradadas por mol. Ao contrário do esperado, durante a degradação houve um
períodos de 3, 6, 9 e 12 meses, decorridos do tempo zero. A discreto aumento nas massas molares médias e uma pequena
cada intervalo foram realizados ensaios de perda de massa e redução na polidispersividade, indicando uma redução no
absorção de água, cromatografia de permeação em gel (GPC), número das cadeias menores (fig. 2).

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Calorimetria exploratória diferencial (DSC): A Microscopia eletrônica de varredura: Nas peças não
cristalinidade do implante não degradado e não estéril foi de degradadas e degradadas por 6 meses, observou-se uma
22%, aumentando para 24% após a esterilização. Nas amostras superfície de fratura lisa sob aumentos menores (fig. 4A) que,
em degradação, houve um aumento do grau de cristalinidade com aumentos maiores (fig. 4B), mostrou grande número de
até os 6 meses, seguido de uma estabilização até os 12 meses. áreas de orientação concêntrica do polímero por toda a extensão
Ao fim de um ano de degradação, o grau de cristalinidade do implante, sugerindo focos de cristalização e esferulitos. Nas
passou de 24 para 36%, sendo a característica que sofreu maior amostras de 12 meses houve um aumento na irregularidade da
alteração durante o experimento, da ordem de 50% (fig. 2). superfície externa da peça, que tomou um aspecto heterogêneo,
com áreas de verdadeira porosidade por erosão superficial
(fig. 4C). A superfície de fratura dessas peças também foi
heterogênea, observando-se diferenças entre as partes próximas
à superfície externa e as zonas mais centrais, do interior do
implante (fig. 4D). Comparando as amostras não degradadas
com as degradadas por 6 e 12 meses, não foram observadas
alterações grosseiras secundárias a degradação, demonstrando
que o processo se deu principalmente na superfície da peça e
de forma pouco intensa.
Figura 2.

Ensaio de compressão estática: Os implantes não degradados


suportaram cargas bastante elevadas, acima de 10000 N. A
falha sempre ocorreu por deformação plástica, sem fratura do
material. A curva de tensão-deformação (fig. 3) mostrou um
comportamento quase linear durante a fase elástica. A variação
das propriedades mecânicas do implante durante o processo
de degradação foi muito pequena, observando-se um aumento
da rigidez nos primeiros 6 meses de degradação, seguida por
um retorno às características iniciais. O módulo de elasticidade
dos implantes mostrou variação entre 0,99 GPa, nos implantes
não degradados, até o máximo de 1,04 GPa, nos degradados
por 6 meses. A

Figura 4A.

Figura 3. Figura 4B.

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ocorrer hidrólise deve haver difusão de água pelo implante,


de forma que ela possa reagir quimicamente com o polímero.
Como a difusão se dá mais facilmente nas regiões amorfas, a
taxa de absorção do polímero está intimamente ligada ao seu
grau de cristalinidade32. Quanto maior a cristalinidade, mais
demorada a degradação23,32.
Embora a hidrólise seja um processo químico, com tendência
natural de ocorrer de modo mais acelerado na superfície, Vert et
al.40 mostraram que ela ocorre mais rapidamente no interior da
peça. A clivagem das cadeias origina oligômeros com função
de ácidos, que aceleram a degradação. Os ácidos da superfície
são liberados, mas os originados no centro se acumulam,
C reduzem o pH interno e autocatalisam a hidrólise no interior
da peça. Esse comportamento, conhecido como hidrólise de
Figura 4C.
massa (bulk hidrolisis), ocorre em proporção que depende da
geometria da peça polimérica e do pH do meio de degradação40.
O grau de cristalinidade do polímero costuma aumentar durante
a degradação, pois a fase amorfa é absorvida mais rápido.
Discussão Alem disso, as cadeias menores formadas na degradação tem
mais mobilidade, que facilita a formação de novos cristais14.
O teste de degradação in vitro estima grosseiramente o Tsuji et al. observaram que a cristalização do PLLA aumenta
comportamento do material depois de sua implantação, pois a proporcionalmente à redução da massa molar38,39.
situação in vivo envolve uma série de fatores que vão desde as Na maioria dos trabalhos a taxa de perda de massa da amostra
tensões a que o polímero vai ser submetido até a existência de é inversamente proporcional à massa molar do polímero e ao
respostas inflamatórias, pH do meio e grau de vascularização seu grau de cristalinidade. Como a redução na massa molar
do local implantado18,26,35, que não são reprodutíveis em é acompanhada de um aumento no grau de cristalinidade, os
laboratório. Por essas variações, há relatos de degradação de fenômenos se compensam parcialmente, pelo menos até haver
PLLA em períodos que vão de 80 a 296 semanas11. uma grande perda na integridade da peça.
A degradação in vitro do PLA pode ser feita em qualquer meio Além do grau de cristalinidade e da massa molar, outras
aquoso, mas o uso da solução tamponada em temperatura de características relacionadas à absorção do PLLA, como a
37ºC permite uma avaliação mais aproximada do in vivo23,40, orientação das cadeias, distribuição das massas molares,
uma vez que as taxas de degradação são muito sensíveis à presença de impurezas, percentual de monômeros não reagidos
temperatura e PH do meio. A solução utilizada deve poder ou outros radicais livres, volume e geometria do material,
neutralizar os radicais ácidos liberados do implante, que relação entre área superficial e volume do implante, história
provocariam uma aceleração geral na degradação34. Claes et térmica, e assim por diante, são dependentes do processamento
al.13 realizaram a degradação do PLLA a 37ºC e a 70ºC, notando do polímero até o produto final11,41, de modo que dados
uma degradação 132 vezes mais rápida com a duplicação da experimentais não podem ser aplicados a peças diferentes.
temperatura. O percentual de aumento na taxa de degradação
com o aumento da temperatura não é previsível, de modo que No presente trabalho, acompanhando a degradação de um
uma relação entre temperatura e taxa de degradação não pode implante de volume significativo, produzido com técnicas
ser feita de maneira confiável13. industriais, de produção em massa, pode-se dizer que, de
um ponto de vista prático, a perda de massa apresentada foi
O PLLA tem períodos de absorção longos, com a perda das insignificante, podendo-se projetar que, em uma aplicação
propriedades medida em semanas e o desaparecimento do clínica, o implante não se degradaria de forma adequada,
polímero em anos. A primeira mudança observada costuma apresentando uma grande tendência à formação de resíduos
ser a perda de massa molar, seguida por perda de resistência perenes.
mecânica e, finalmente, redução de volume42. A quebra das
cadeias de PLLA ocorre por cisão hidrolítica das ligações éster, Estes resultados mostram um grande desacordo com a
originando oligômeros e, finalmente, unidades monoméricas de literatura, que relata perdas de massa geralmente entre 30 e
ácido lático, que serão metabolizadas pelo organismo27,32. Para 40%, com períodos e condições de degradação similares
aos utilizados16,33,34,37,38, entretanto, nenhum destes trabalhos

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foi realizado utilizando implantes, mas sim amostras na concordantes e complementares entre sí, permitindo traçar
forma de filmes ou peças pequenas, específicas para ensaios para o implante em PLLA um perfil de degradação de 12
laboratoriais. meses in vitro totalmente diferente do esperado pelos dados
de literatura, caracterizado por ser um processo de superfície,
A pouca afinidade do implante pela água deve ter sido um dos
envolvendo as cadeias poliméricas menores, sem ocorrência
fatores responsáveis pela degradação muito abaixo dos níveis
de hidrólise de massa ou autocatálise, acompanhado de um
esperados. Possíveis responsáveis por esta baixa penetração
rearranjo das cadeias em forma de cristais, como em um
devem ter sido o alto grau de cristalinidade e o tamanho e forma
processo de envelhecimento do polímero.
da peça, principalmente no que concerne à proporção volume/
superfície. O MEV mostrou apenas uma erosão superficial do Mesmo sabendo que a degradação in vivo é maior que a in vitro,
implante, ao invés da esperada degradação na massa. Isso está pode-se traçar uma tendência clara do implante em arranjar-se
em concordância com uma baixa penetração de líquidos. na forma de resíduos altamente cristalinos e não degradar-se,
fato comumente observado em implantes de uso comercial.
A GPC nos dá uma idéia dos efeitos da degradação a
nível molecular, mostrando as alterações no tamanho e
distribuição das cadeias. A perda de massa insignificante
e a redução da polidispersividade falam a favor da hipótese
de desaparecimento das cadeias menores, superficiais. Esse Referências
mesmo tipo de comportamento foi descrito por Tsuji38, em seu
experimento com amostras altamente cristalinas.
1 ASTM D 3418 – Standard Test Method for Transition
O DSC foi o método eleito para acompanhar o grau de Temperatures and Enthalpies of Fusion and Crystalization
of Polymers by Differential Scanning Calorimetry. West
cristalinidade. O aumento era esperado, mas deveria ser Conshohocken, PA: American Society for Testing and Materials
conseqüência de uma redução da massa molar e de uma maior International; 2008
penetração de água na peça, fatos que não ocorreram neste 2. ASTM F 1635-04 – Standart Test Method for in vitro Degradation
experimento. Assim, pode-se imaginar que o aumento da Testing of Hydrolytically Degradable Polymer Resins and
cristalinidade tenha ocorrido de forma mais semelhante ao que Fabricated Forms for Surgical Implants. West Conshohocken,
acontece no processo de envelhecimento do polímero, como PA: American Society for Testing and Materials International;
2004
descrito por Liao25, onde existe apenas um relaxamento das
cadeias a seco e com temperaturas relativamente baixas. 3. ASTM F 1925-99 – Standart Specification for Virgin Poly(L-
Lactic Acid) Resin for Surgical Implants. West Conshohocken,
Os resultados dos testes de compressão foram muito PA: American Society for Testing and Materials International;
semelhantes nos implantes degradados ou não, mostrando a 2004
degradação insignificante. A única diferença observada foi uma 4. ASTM F 2077-03 – Test Methods for Intervertebral Body Fusion
variação da rigidez, que pode ser justificada pelas variações da Devices. West Conshohocken, PA: American Society for Testing
and Materials International; 2004
cristalinidade durante o processo de degradação.
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A perda de massa do implante foi praticamente inexistente Fundamentals of materials science and engineering. New York:
e as massas molares médias sofreram aumento durante a J Wiley and Sons; 2005. p. 76-99
degradação. O grau de cristalinidade do polímero foi muito alto
10. Canevarolo Jr SV. Cromatografia de Exclusão por Tamanho.
e sofreu aumento significativo durante o período de teste, de 24 In: Canevarolo SV, organizador. Técnicas de Caracterização de
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mecânica e MEV, conseguimos encontrar dados que foram
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