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| PROPSICO | Ciclo 3 | Volume 1 |


INTERVENÇÕES EM
COMPORTAMENTOS
DE AUTOAGRESSÃO
E AUTOESTIMULAÇÃO
EM PESSOAS COM TRANSTORNO
DO ESPECTRO AUTISTA
ANDRÉ A. B. VARELLA

■■ INTRODUÇÃO
Indivíduos diagnosticados com transtorno do espectro autista (TEA) apresentam uma diversidade
de características comportamentais classificadas em dois eixos. De modo geral, essas pessoas
apresentam1 prejuízos nas habilidades de comunicação e interação social e padrões de
comportamentos repetitivos e restritos.

As dificuldades em desenvolver habilidades de comunicação e de interação social das pessoas


com TEA podem acarretar atrasos no desenvolvimento da fala (ou até mesmo sua ausência),
poucas iniciativas de conversação, dificuldades de manter diálogo e pouco interesse em pessoas.
No que se referem aos padrões comportamentais repetitivos e restritos, indivíduos com TEA
podem apresentar movimentos, falas e brincadeiras repetitivas, persistência em rotinas, interesses
e fixações anormais em intensidade e foco, além de uma hiperreatividade ou hiporreatividade a
estímulos sensoriais.

Esses padrões comportamentais podem se apresentar como agito das mãos atípico, pronúncia
de sons ou frases de forma repetitiva e fora de contexto, alinhamento ou organização de objetos,
fixação em rotinas e/ou presença de rituais, além de reações exacerbadas ou inexistentes a sons,
toques, odores ou algum outro estímulo do ambiente.

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Além do amplo espectro de características observadas no TEA, que varia bastante de
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indivíduo para indivíduo, observa-se, também, a ocorrência de problemas de comportamento


potencialmente perigosos, tanto para o próprio indivíduo quanto para o seu meio social.
Pessoas diagnosticadas com TEA podem desenvolver diferentes tipos de comportamentos
autoagressivos/autoestimulatórios, além das estereotipias já mencionadas, tais como:

■■ dar tapas e socos no próprio rosto;


■■ introduzir os dedos nas cavidades oculares;
■■ cabecear paredes ou superfícies perigosas;
■■ morder partes do corpo;
■■ arranhar ou remover pedaços da pele;
■■ introduzir as mãos ou objetos na boca;

LEMBRAR
Apesar de frequentes, comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios não são
exclusivos do TEA, podendo também ocorrer em indivíduos com outros distúrbios
do desenvolvimento. Intervir em problemas de comportamento é fundamental para
garantir a integridade física, social e psicológica dessas pessoas.

A intervenção psicológica em pessoas com TEA deve acontecer, preferencialmente, a partir de


uma abordagem interdisciplinar, com o objetivo de descartar a hipótese de influência de condições
de natureza médica na ocorrência de determinados comportamentos (distúrbios neurológicos,
sensoriais, problemas do sono etc.). Não raro, esses comportamentos podem ter uma “função
de comunicação”, uma vez que pessoas com TEA apresentam limitações em suas habilidades
comunicativas, e, por vezes, esses comportamentos se desenvolvem como formas alternativas
(e perigosas) de se expressar.

Neste artigo, serão discutidos alguns aspectos da atuação do psicólogo diante de comportamentos
de autoagressão e autoestimulação. Primeiramente, serão apresentados conceitos relevantes
para a compreensão desses comportamentos, para o planejamento e para a intervenção diante
desses problemas.

A intervenção psicológica em problemas de autoagressão e de autoestimulação está intimamente


relacionada com a identificação de possíveis causas ligadas a esses comportamentos; assim, serão
apresentadas algumas avaliações que auxiliam na identificação das razões (funções) de ocorrência
dos comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios. Em seguida, serão discutidas algumas
possibilidades de intervenção, desenvolvidas a partir dos resultados dessas avaliações. Ao final,
será apresentado um exemplo clínico para ilustrar algumas das intervenções abordadas no texto.

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■■ OBJETIVOS

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Ao final da leitura deste artigo, o leitor será capaz de

■■ conhecer os conceitos de comportamento operante e de análise funcional;


■■ definir o que são comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios;
■■ caracterizar o que é uma avaliação funcional do comportamento e identificar as principais
características da avaliação indireta, da avaliação descritiva e da análise funcional experimental;
■■ compreender a necessidade de se identificar as funções do comportamento para planejar
a intervenção;
■■ caracterizar algumas possibilidades de intervenções para reduzir ou interromper a ocorrência
de comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios.

■■ ESQUEMA CONCEITUAL

Conceito de
comportamento operante
Autoagressão
e autoestimulação enquanto Exemplo clínico 1
comportamento problema
O comportamento e sua função

Análise funcional experimental


Identificação das funções
de comportamentos Avaliação descritiva
autoagressivos/autoestimulatórios
Avaliação indireta

Intervenções baseadas
em antecedentes
Intervenções com base na função Exemplo clínico 2
Exemplo clínico 3

Intervenções baseadas
em consequência
(ou baseadas na função)

Exemplo clínico 4

Conclusão

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■■ AUTOAGRESSÃO E AUTOESTIMULAÇÃO
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ENQUANTO COMPORTAMENTO PROBLEMA


As expressões “problemas de comportamento” ou “comportamento problema” são bastante
amplas e frequentemente utilizadas na área da Psicologia para designar comportamentos que podem
trazer riscos à saúde da própria pessoa e/ou de outras pessoas ao redor.2 No campo do tratamento
do TEA, tais expressões podem designar uma ampla gama de comportamentos, como, por exemplo:

■■ agressões;
■■ autoagressões;
■■ frequente engajamento em estereotipias por longos períodos;
■■ ingestão de substâncias perigosas ou não comestíveis.

Problemas de comportamento podem ocorrer das mais variadas formas, nas mais
diversas etapas da vida. Considerar tal aspecto implica dizer que sua ocorrência não se
deve pelo fato de o indivíduo estar em uma determinada faixa etária (quando se diz, por
exemplo, que “birras são normais da infância”). Mas quais razões levariam um indivíduo
a se agredir, a ponto de lesionar o próprio corpo? O que faz alguém passar uma parcela
substancial do dia se autoestimulando?

Apesar de parecer um contrassenso, existem explicações para os fenômenos de autoagressão e


de autoestímulo. Uma melhor compreensão dos problemas de comportamento requer do psicólogo
uma noção mais ampla sobre como esses comportamentos se relacionam com o meio social no
qual o indivíduo está inserido.

CONCEITO DE COMPORTAMENTO OPERANTE


A ideia de que comportamentos de autoagressão e autoestimulação poderiam ser compreendidos
como comportamentos operantes surgiu na década de 1970. Carr3 realizou um estudo em que
analisou a literatura da época sobre intervenções em comportamentos de autoagressão, buscando
compreender possíveis fatores motivacionais para tais comportamentos.

A partir dessa análise, Carr levantou algumas hipóteses, sendo três delas especialmente importantes
para a questão: os comportamentos autoagressivos poderiam ser comportamentos mantidos por
reforço social, pela interrupção de estimulação aversiva ou por produzirem autoestimulação. 3

As hipóteses de Carr contribuíram para avançar o entendimento de que comportamentos


autoagressivos/autoestimulatórios seriam sensíveis às contingências operantes. Tanto a pesquisa
quanto a prática clínica mostraram que o conceito de comportamento operante se mostrava bastante
útil para entender como um problema de comportamento se desenvolve, por quais razões ele
continua a ocorrer e como planejar intervenções eficazes para atenuar ou evitar esses problemas. 3

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De maneira geral, o comportamento operante é um tipo de relação que o indivíduo estabelece

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com o seu ambiente. O operante não é apenas a ação do indivíduo propriamente dita. A ação ou
resposta é apenas uma parte da noção de comportamento operante, que pode ser um evento
observável por várias pessoas diferentes (tal como um aceno de mão) ou encoberto, observável
apenas por quem se comporta (quando se pensa sobre algum acontecimento qualquer).
A definição de comportamento operante enquanto uma relação do indivíduo com o ambiente
implica a ideia de que ambos se relacionam mutuamente e se modificam.

O comportamento operante é um tipo de comportamento que ocorre em determinado


contexto ou ambiente e produz certos efeitos nele.

No comportamento operante, os efeitos produzidos pelas respostas do organismo modificam


as chances de essas respostas ocorrerem novamente no futuro. Em outras palavras, são as
alterações no ambiente (produzidas pela resposta) que tornam o contexto importante para quem
se comporta, influenciando o comportamento do indivíduo em situações semelhantes no futuro.

O comportamento do indivíduo altera o seu ambiente, e o ambiente alterado, por sua vez, modifica
o indivíduo em termos comportamentais: aumentam-se ou diminuem-se as chances de o indivíduo
se comportar daquela forma em situações similares.

Por exemplo, uma criança que explora um aplicativo no celular pela primeira vez poderá entrar
em contato com alguma animação ou com algum vídeo interessante. A resposta de explorar o
aplicativo produziu efeitos no ambiente da criança: ao se comportar dessa maneira, a criança
acabou descobrindo e visualizando um novo vídeo.

Explorar o aplicativo do celular, em contrapartida, aconteceu em certo contexto: quando tal efeito
ocorreu (a visualização de um vídeo interessante), diversos estímulos faziam parte do ambiente
da criança, tais como o celular (com suas características físicas – cor, forma, tamanho), além do
ícone do aplicativo. Como a resposta de explorar o aplicativo resultou na visualização do vídeo, tal
resposta tende a se tornar gradativamente mais frequente e provável de acontecer na medida em
que a resposta for produzindo esse efeito. Além disso, esse efeito também faz com que alguns
aspectos do contexto passem a influenciar o comportamento de explorar o aplicativo: a presença
do celular e a visualização do ícone do aplicativo irão aumentar as chances de a criança tocar a
tela do celular em um local específico.

Denomina-se reforço qualquer efeito de uma resposta que a torne mais provável de
acontecer no futuro, e se denomina estímulo discriminativo (SD) qualquer aspecto
do ambiente que influencie a ocorrência da resposta do indivíduo (por ter estado
presente no contexto quando a resposta produziu tais efeitos). Essa mesma análise
operante também se aplicaria aos comportamentos agressivos e autoestimulatórios.

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EXEMPLO CLÍNICO 1
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Paulo, uma criança com TEA, que não aprendeu a falar, está interagindo com diversos
objetos e brinquedos no quarto. Seus pais estão no mesmo cômodo, conversando
entre si a respeito de um assunto importante. Ao brincar com algumas peças de
encaixe, Paulo inseriu uma peça no local errado, o que acabou por prendê-la no
encaixe errado.

Paulo quer muito concluir o encaixe de todas as peças e, após algumas tentativas sem sucesso
de remover a peça, começa a resmungar e a choramingar. Os pais continuam conversando entre
si. Paulo tenta outras vezes remover a peça do encaixe, mas não consegue. Incomodado com a
situação, ele cerra os dentes e aproxima as mãos da boca. Os pais interrompem a conversa por
poucos segundos e perguntam: “O que você quer, Paulo?”.

As respostas de Paulo de cerrar os dentes e aproximar as mãos da boca resultaram em um breve


período de atenção dos pais. Segundos após retornar a conversa, os pais notam novamente que
Paulo está com os dentes cerrados e as mãos próximas à boca, olhando para os brinquedos.
Os pais assistem à cena e concluem, ao observar as expressões faciais de Paulo, que “ele está
irritado com alguma coisa”. Paulo continua com os dentes cerrados e toca a boca com as duas
mãos. Preocupado, o pai se assenta ao lado de Paulo, retira o brinquedo de encaixe de suas mãos
e mostra outros brinquedos a ele, na tentativa de distraí-lo.

Por alguns segundos, Paulo observa os brinquedos, e o pai retoma a conversa com a mãe. Ao
perceber o pai se levantar, Paulo começa a gritar, aproxima as mãos da boca, colocando-as
dentro dela e cerrando os dentes. Nesse instante, pai e mãe interrompem imediatamente a
conversa ao perceberem Paulo mordendo a mão. Na tentativa de “acalmar” o filho, ambos se
aproximam e começam a interagir com ele. A mãe, por um acaso, pega o objeto de encaixe,
remove as peças (inclusive a peça que estava mal encaixada) e chama Paulo para brincar. Ele
interrompe as mordidas e os gritos, olha para o brinquedo e começa a brincar novamente com
seu brinquedo predileto.

O comportamento de Paulo, de cerrar os dentes e aproximar as mãos da boca, resultou na


atenção dos pais. Naquela ocasião, essa atenção era importante para Paulo, pois ele precisava
de ajuda e não sabia como pedi-la, uma vez que não sabia se expressar por meio da linguagem
para pedir auxílio.

Ainda, ao introduzir as mãos na boca e mordê-la, pai e mãe interromperam a conversa imediatamente
e deram bastante atenção a Paulo. A mãe, inclusive, retirou a peça presa no brinquedo (resolvendo o
problema) e brincou com Paulo, mesmo sem saber que o brinquedo era parte do problema.

Nesse exemplo trivial, o comportamento de morder as mãos produziu mudanças no ambiente


de Paulo: atenção dos pais e resolução da situação problemática envolvendo o brinquedo, que
funcionaram como reforço para o comportamento de morder as mãos, tornando ele mais provável
de ocorrer. Nas ocasiões futuras em que Paulo necessitar de atenção dos pais e/ou de auxílio
para resolver alguma questão, a presença dos pais e alguma situação que ele não consiga
resolver sozinho podem funcionar como aspectos do ambiente que influenciam a ocorrência do
comportamento de morder as mãos.

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O exemplo clínico ilustra também outro conceito que auxilia no entendimento sobre como

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alguns problemas de comportamento podem se desenvolver. Em grande parte dos casos,
comportamentos vão gradativamente se modificando, passando por etapas, até se tornarem,
de fato, um comportamento problema. Assim como acontece com outros comportamentos, o
comportamento problema também pode passar por processo chamado modelagem.4

A Figura 1 ilustra um exemplo em que o comportamento de morder de Paulo foi modelado, sendo
modificado aos poucos.

Resmungar Ausência de reforço

Cerrar os dentes Atenção dos pais


/mãos próximas à boca (reforço) Momento 1

Resmungar Ausência de reforço


Cerrar os dentes
Ausência de reforço
/mãos próximas à boca
Cerrar os dentes Atenção dos pais
/tocar a boca com as mãos (reforço) Momento 2

Resmungar Ausência de reforço


Cerrar os dentes
Ausência de reforço
/mãos próximas à boca
Cerrar os dentes
Ausência de reforço
/tocar a boca com as mãos
Atenção dos pais
Morder as mãos
(reforço) Momento 3

Figura 1 — Exemplo de modelagem do comportamento. Os momentos 1, 2 e 3 ilustram como as


consequências podem modificar gradativamente um comportamento, à medida que novas formas vão
produzindo consequências reforçadoras.
Fonte: Elaborada pelo autor.

Abaixo, os três momentos relacionados aos comportamentos ilustrados na Figura 1:

■■ momento 1 – o comportamento de resmungar não produzia reforço, enquanto o de cerrar os


dentes e aproximar as mãos da boca resultava em reforço (a atenção dos pais em um momento
em que Paulo precisava de ajuda);
■■ momento 2 – a atenção dos pais passou a ser produzida, inclusive em maior magnitude,
quando Paulo cerrava os dentes e tocava a boca com as mãos, e não mais quando resmungava
ou apenas aproximava as mãos da boca;
■■ momento 3 – uma quantidade maior de atenção e a resolução final do problema envolvendo
o brinquedo foram produzidas logo após Paulo morder as mãos. A modelagem é o processo
que leva a essa mudança gradativa no comportamento, podendo assumir novas formas (ou
topografias), à medida que essas novas formas passam a produzir mudanças no ambiente.
O comportamento problema também pode passar por uma modelagem, apresentando-se,
inclusive, de forma mais severa e perigosa.

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O COMPORTAMENTO E SUA FUNÇÃO
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Para entender por que um problema de comportamento acontece e se mantém, deve-se fazer uma
análise de sua função. Quando se fala em função do comportamento, a referência é em relação
aos aspectos do ambiente que o influenciam.4

Dois tipos de mudanças no ambiente são importantes para compreender a função do problema
de comportamento. O primeiro tipo de mudança ambiental diz respeito ao que acontece após
o comportamento ocorrer, ou seja, os efeitos ou as consequências que o comportamento
produz (reforçadores).4

Os reforçadores são as consequências que aumentam a frequência de um comportamento,


tornam sua ocorrência mais provável em certas situações e o mantêm ocorrendo.4

O segundo tipo de mudança ambiental, que influencia o comportamento, são as mudanças no


contexto que o comportamento ocorre, isto é, os antecedentes do comportamento. O ambiente
ao redor das pessoas muda constantemente; certos aspectos dele, quando presentes, podem
funcionar como SDs, influenciando a ocorrência do comportamento.

A influência dos estímulos do ambiente acontece pelo fato de que tais estímulos estavam
presentes nas ocasiões passadas quando o comportamento ocorreu e produziu as consequências
reforçadoras. Ainda, o comportamento problema também pode acontecer em situações novas.
Quanto mais semelhante essa nova situação for àquela em que o comportamento normalmente
ocorre, maior será a chance de também acontecer (generalização).

Quando o psicólogo analisa quais são as consequências do comportamento (ou seja,


quando identifica os reforçadores) e quais são os estímulos do ambiente que antecedem
sua ocorrência (ou seja, quando identifica os SDs), um importante passo é dado para
se manejar de forma eficaz os comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios.
Denomina-se essa avaliação de análise funcional do comportamento.4

A Figura 2 ilustra uma análise funcional simples, mas elucidativa, do comportamento de Paulo, de
morder suas mãos, demonstrado anteriormente. Nesse exemplo, pode-se dizer que uma das funções
desse comportamento problema era a de obter atenção dos pais quando eles estavam próximos.

Essa função foi adquirida pelo fato de o comportamento de morder as mãos ter produzido atenção
ao longo da história de interação de Paulo com o ambiente. Mas, em muitos casos, problemas de
comportamento podem ter mais de uma função.

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Antecedente Comportamento Consequência
do comportamento ou resposta do comportamento

■ Estar próximo aos pais Atenção dos pais


■ Estar sem atenção dos pais

Morder as mãos

■ Estar próximo aos pais


■ Necessidade de ajuda
Ajuda dos pais
(situação problemática)

Figura 2 — Análise funcional do comportamento de morder as mãos.


Fonte: Elaborada pelo autor.

Como pode ser observado na Figura 2, o comportamento de morder as mãos tinha dupla função:

■■ obter atenção dos pais quando Paulo estava diante deles;


■■ obter ajuda em situações nas quais Paulo precisava de auxílio.

Pode-se dizer que o comportamento de Paulo é influenciado, no primeiro caso, pela presença dos
pais e pela falta de atenção (antecedentes) e por produzir atenção (consequência reforçadora),
e, no segundo caso, é influenciado por situações em que ele precisa de ajuda (antecedentes) e
consegue resolver alguma necessidade (consequência reforçadora).

Uma vez compreendido o conceito de função comportamental, uma importante distinção entre
comportamento autoagressivo e comportamento autoestimulatório pode ser estabelecida. Não
necessariamente um comportamento autoagressivo é autoestimulatório, ou vice-versa.

Comportamentos autoagressivos se caracterizam por se apresentarem com potencial de produzir


danos físicos.5 Remover fios de cabelo, arranhar o braço, abocanhar as mãos, entre outras formas
de comportamento, poderiam entrar nessa definição.

Comportamentos autoestimulatórios, em contrapartida, são entendidos a partir da sua função, ou


seja, são comportamentos operantes mantidos por reforço automático, um tipo de consequência
não social produzida diretamente pelo comportamento.6

Remover fios de cabelo, por exemplo, também poderia ser um comportamento autoestimulatório, desde
que seu reforçador seja a sensação produzida no couro cabeludo, uma consequência não social que
resulta automaticamente do comportamento. Caso o reforçador que mantenha o comportamento de
remover fios de cabelo for escapar de alguma tarefa escolar (um reforçador social e não automático),
remover fios de cabelo seria um comportamento autoagressivo, e não autoestimulatório.

Repetir sons ou palavras constantes (estereotipias vocais), se mantido pela estimulação produzida
pela vocalização (o reforçador enquanto o próprio som da voz), se caracterizaria como um
comportamento autoestimulatório, e não agressivo.

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A análise funcional é exatamente a identificação das relações entre determinado
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comportamento que se queira compreender e o ambiente (antes e depois) quando


o comportamento normalmente acontece. Essa análise funcional é relevante para
as intervenções em problemas de comportamento porque permite identificar as
consequências reforçadoras que mantém o comportamento ocorrendo, bem como os
aspectos do contexto (estímulos discriminativos) que influenciam a ocorrência dele.7

Intervenções realizadas com base na função do comportamento apresentam chances de sucesso


substancialmente maiores, se comparadas às intervenções planejadas que desconsideram as
funções do comportamento em questão.7

A seguir, serão discutidas algumas maneiras de identificar a função do comportamento problema,


que servirão de base para o planejamento das intervenções.

ATIVIDADES

1. Quais características comportamentais são comumente demostradas por indivíduos


diagnosticados com TEA?

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............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
Resposta no final do artigo

2. Observe as afirmativas sobre os diferentes tipos de comportamentos autoagressivos/


autoestimulatórios que podem ser, frequentemente, adotados por pessoas
diagnosticadas com TEA.

I – Coçar a cabeça em momentos de dúvida.


II – Dar tapas e socos no próprio rosto.
III – Arranhar ou remover pedaços da pele.
IV – Mostrar o dedo em riste para ameaçar pessoas.

Quais estão corretas?

A) Apenas a I e a II.
B) Apenas a I e a IV.
C) Apenas a II e a III.
D) Apenas a III e a IV.
Resposta no final do artigo

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3. Observe as afirmativas que apresentam perguntas que poderiam ajudar a nortear

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investigações sobre problemas de comportamento.

I – Quais razões levariam um indivíduo a se agredir a ponto de lesionar o próprio corpo?


II – O que faz alguém passar uma parcela substancial do dia se autoestimulando?
III – As atitudes de autoagressão e autoestimulação assumidas pelo indivíduo são
congruentes com sua faixa etária?

Quais estão corretas?

A) Apenas a I e a II.
B) Apenas a I e a III.
C) Apenas a II e a III.
D) A I, a II e a III.
Resposta no final do artigo

4. Sobre o comportamento operante, é correto afirmar que

A) ocorre por causa de estímulos apresentados antes dele.


B) ocorre pelo fato de produzir mudanças no ambiente. Essas mudanças ocorrem em
um contexto, que passa a influenciar o comportamento.
C) comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios não são comportamentos operantes.
D) é explicado pela relação estímulo-resposta.
Resposta no final do artigo

5. Explique a diferença conceitual entre os efeitos comportamentais denominados


“reforço” e “SD”.

............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
Resposta no final do artigo

6. Em que consiste a análise funcional do comportamento? Qual a sua relevância para


intervenções em comportamentos de autoagressão e autoestimulação em pessoas
com TEA?

............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
Resposta no final do artigo

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7. Sobre os comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios, assinale a
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alternativa correta.

A) Arranhar o braço, abocanhar as mãos, entre outras formas de comportamento,


poderiam ser enquadrados como comportamentos autoestimulatórios.
B) Comportamentos autoagressivos se caracterizam por comportamentos com potencial
de produzir danos materiais.
C) Comportamentos autoestimulatórios são entendidos a partir da sua função, ou
seja, são comportamentos operantes mantidos por reforço automático, um tipo de
consequência não social produzida diretamente pelo comportamento.
D) Remover fios de cabelo também poderia ser um comportamento autoagressivo, desde
que seu reforçador seja a sensação produzida no couro cabeludo.
Resposta no final do artigo

■■ IDENTIFICAÇÃO DAS FUNÇÕES DOS COMPORTAMENTOS


AUTOAGRESSIVOS/AUTOESTIMULATÓRIOS
O processo de avaliação utilizado para identificar as funções dos comportamentos autoagressivos/
autoestimulatórios é denominado avaliação funcional do comportamento. De acordo com Hanley,8
existem basicamente três tipos de avaliações funcionais do comportamento: a avaliação indireta,
a avaliação descritiva e a análise funcional experimental.
A avaliação indireta consiste na aplicação de escalas para identificar a função de um
comportamento-alvo qualquer (um comportamento problema em que se deseja intervir).
A avaliação descritiva se caracteriza pela observação do comportamento em situações
naturais, ou seja, nos contextos em que ele normalmente ocorre. Por fim, a análise
funcional experimental se apresenta como a metodologia de avaliação de funções
comportamentais mais precisa e completa que existe.

Com exceção da avaliação indireta, que consiste em aplicações de escalas e prescinde de


observações diretas dos comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios, os métodos de
avaliação descritiva e de análise funcional experimental requerem a observação do comportamento
e a mensuração de algum aspecto.

As medidas são importantes para verificar se a intervenção implementada está produzindo os efeitos
esperados. O psicólogo poderá medir diversos aspectos do comportamento, como, entre outros:

■■ a frequência (a contagem do comportamento em determinado período de tempo);


■■ a duração (tempo relativo ao início e ao término do comportamento);
■■ a latência (período de tempo entre a apresentação de um SD e o início do comportamento);
■■ a magnitude (intensidade do comportamento).

Para saber mais:

Para uma discussão detalhada sobre mensuração de comportamentos, ver o capítulo


Defining and measuring behavior do livro Handbook of applied behavior analysis.

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Os métodos de avaliação do comportamento discutidos brevemente, a seguir, apresentam vantagens

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e desvantagens. A escolha do método de avaliação deverá considerar a situação envolvida em cada
caso e os recursos e as condições disponíveis ao profissional.

Primeiramente, será descrito o método de análise funcional experimental, em virtude de ser o


método mais completo e preciso para identificação de funções comportamentais. Em seguida,
serão descritos os métodos de avaliação descritiva e indireta.

ANÁLISE FUNCIONAL EXPERIMENTAL


Até o início da década de 1980, as intervenções comportamentais eram conduzidas sem identificar
precisamente as funções do comportamento. Até esse momento, as técnicas comportamentais
de modificação de comportamento eram implementadas na tentativa de evitar comportamentos
autoagressivos/autoestimulatórios. Por vezes, as intervenções eram bem-sucedidas, mas em
outras vezes não.

A análise funcional experimental foi desenvolvida por Iwata e colaboradores9 como sendo uma
forma de avaliar o efeito de variáveis ambientais sobre os comportamentos autoagressivos.

Essa análise funcional experimental representou um avanço importantíssimo, por permitir


identificar mais precisamente quais aspectos do ambiente estão relacionados ao comportamento
problema e favorecer o desenvolvimento de intervenções com base na função do comportamento.

A lógica da análise funcional experimental é relativamente simples: observar a ocorrência


do comportamento em diferentes condições, cuidadosamente planejadas e de curta
duração (geralmente, de 5 a 10 minutos). A observação é realizada várias vezes, até
que se torne claro, pelas medidas comportamentais, que, em certas condições, o
comportamento ocorre com maior frequência.

As condições diferem entre si por aspectos específicos, que são manipulados (por essa razão se
chama análise “experimental”, pois envolve manipulação de variáveis). Comportamentos que ocorrem
mais em certas condições indicariam uma relação funcional entre eles e a variável presente na condição.

A análise funcional experimental pode envolver várias condições diferentes, a depender do que se
deseja avaliar. As mais comuns são:

■■ atenção social;
■■ fuga de demandas;
■■ sozinho/ignorado;
■■ uma condição de brincadeira (condição controle).

A condição de atenção social avalia se esse aspecto do ambiente (a atenção dispendida por
pessoas) está relacionado ao comportamento problema. Em outras palavras, a condição verifica
se a atenção social é um reforçador para o comportamento.

Para fins de exemplo, o comportamento de estapear o rosto será considerado a seguir. Um


terapeuta treinado prepara uma sala disponibilizando alguns brinquedos ou materiais para a
pessoa. O terapeuta interage muito brevemente com a pessoa e, em seguida, suspende a atenção
social (normalmente, o terapeuta se senta em uma poltrona, pega algum jornal, revista ou engaja
em alguma atividade sozinho). Ao fazer isso, o terapeuta simula um contexto de ausência de
atenção, sinalizando claramente uma indisponibilidade para interação social.

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Se a pessoa estapear o rosto, o terapeuta reage dando atenção social (geralmente, dizendo
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“Fulano, não faça isso, você pode se machucar.”). A reação do terapeuta, portanto, é um tipo
de alteração no ambiente que o comportamento de estapear o rosto produziu (reforço social
positivo). Se a atenção social for o reforçador, exposições sucessivas mostrarão uma frequência
substancialmente maior de estapear o rosto nessa condição em comparação com outras.

A condição de fuga de demanda avalia se o comportamento está relacionado com a interrupção


de alguma demanda (em geral, tarefas ou atividades). Nessa condição, normalmente, o
experimentador seleciona algumas atividades e se senta a uma mesa com a pessoa (apresentando,
dessa forma, estímulos característicos de um contexto de realização de tarefas).

O terapeuta solicita à pessoa a realização da tarefa. Se o comportamento de estapear o rosto ocorrer, o


terapeuta interrompe imediatamente a atividade por um curto período (aproximadamente 30 segundos)
e, em seguida, reinicia. Novas ocorrências do comportamento resultarão em novas interrupções.
Frequências altas nessa condição indicam função de fuga de demandas (reforço social negativo).

A condição de sozinho/ignorado é estruturada para avaliar se o comportamento é mantido por


reforço automático, não social (comportamento autoestimulatório). Para avaliar essa possibilidade,
o terapeuta deve simular um ambiente pobre em estimulação, de forma a criar um contexto que
torne a autoestimulação possível. Assim, durante essa condição, não há itens interessantes com
que a pessoa possa se engajar e se entreter, nem pessoas disponíveis para interação social.

O terapeuta, então, observa a ocorrência do comportamento de estapear o rosto. Uma alta


frequência nessa situação indicaria que o reforço não é de natureza social, sendo, possivelmente,
automático: produção de estimulação sensorial no rosto ou nas mãos (reforço automático positivo)
ou redução da intensidade de estímulos aversivos percebidos, como dores ou incômodos (reforço
automático negativo).

A condição de brincadeira é planejada para avaliar a ocorrência do comportamento em situações


em que vários reforçadores em potencial estão disponíveis: atenção social em abundância,
brinquedos, objetos de interesse e ausência completa de demandas. A lógica é essa ser uma
condição controle, de comparação com as outras condições.

Simula-se um ambiente rico em estimulação, o que, tecnicamente, reduziria a motivação para


se engajar em comportamentos autoagressivos. O terapeuta prepara uma sala com diversos
brinquedos e objetos interessantes, brinca, proporciona interção com a pessoa e não apresenta
nenhum tipo de demanda ou solicitação a ela.

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23
Exatamente por manipular variáveis nas diferentes condições e observar seus efeitos sobre o

| PROPSICO | Ciclo 3 | Volume 1 |


comportamento, a análise funcional experimental é o procedimento mais eficiente para identificar as
variáveis que influenciam o comportamento problema, além de ser a metodologia mais recomendada.8,10

No entanto, conduzir uma análise funcional experimental requer recursos para sua aplicação, tais
como pessoas devidamente treinadas para executar os procedimentos e tomar as medidas de
comportamento corretamente, um local apropriado para a sua condução, assim como os materiais
necessários. Ainda, a análise funcional experimental, frequentemente, leva muitas sessões para
ser concluída. Esses aspectos devem ser considerados na escolha desse método.

AVALIAÇÃO DESCRITIVA
A avaliação descritiva é um tipo de avaliação funcional que tem como característica a observação
direta do comportamento do indivíduo em seu ambiente natural. Na avaliação descritiva,
o terapeuta não manipula variáveis, ele observa o comportamento e realiza registros de sua
ocorrência e dos eventos ambientais que ocorrem temporalmente próximos.

Nesse sentido, a avaliação descritiva não permite inferir relações funcionais, apenas correlações entre
eventos que ocorrem no ambiente e a ocorrência (ou não) do comportamento. Portanto, a escolha e o
uso desse método deve ser feito com cautela, pois seus resultados podem não ser conclusivos.11

Um dos tipos de análise descritiva mais frequente é o Registro de antecedentes (A), resposta (B)
e consequência (C) (ABC). O termo “ABC” (do inglês antecedent, behavior and consequence) é
uma menção ao conceito de tríplice contingência, que descreve as relações entre esses aspectos.

Nesse tipo de registro, são fornecidos dados sobre eventos ambientais que antecedem a
ocorrência do comportamento, uma descrição do comportamento-alvo e as consequências do
comportamento. Algumas versões de Registro ABC também especificam data e hora em que o
comportamento ocorreu, oferecendo uma melhor estimativa da forma ocorreu e em que período
de tempo ocorreu.

Sobre o Registro ABC, são pontos importantes:

■■ definir o comportamento de forma objetiva, com base no que possa ser observado;
■■ descrever o comportamento de forma clara, sem ambiguidades;
■■ definir o comportamento de forma completa – deixar claro aquilo que ele é e o que não é;
■■ evitar interpretar o comportamento (inferir causas, emoções ou intenções).

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24
O Quadro 1 apresenta exemplo de Registro ABC, feito por um cuidador.
| INTERVENÇÕES EM COMPORTAMENTOS DE AUTOAGRESSÃO E AUTOESTIMULAÇÃO EM PESSOAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

Quadro 1

REGISTRO DE ANTECEDENTES, RESPOSTA E CONSEQUÊNCIA


Nome: J. H. Comportamento: arranhar-se
Definição do comportamento: tocar a superfície do próprio corpo com as unhas da mão, friccionando-as
a ponto de deixar marcas visíveis.
Data e hora Antecedentes Resposta Consequência
22/3/2016, 12h43min Na sala de estar, sozinho, Arranhou a perna Falei para J. H. parar
a TV exibia o jornal. esquerda com e mudei de canal.
a mão direita.
22/3/2016, 12h48min Na sala de estar, Arranhou o braço Perguntei o que J. H.
sozinho, a TV exibia esquerdo com queria e desliguei a TV.
um desenho animado. a mão direita.
22/3/2016, 13h05min Sentado à mesa de Arranhou a perna O irmão chamava
jantar, comigo, com esquerda com o pai dizendo que J.
o irmão e com o pai. a mão esquerda. H. estava nervoso.
Ignorei e arrumei
a mesa para o almoço.
24/3/2016, 18h17min No carro, no banco Arranhou a perna Falei que ia contar
traseiro, voltando da esquerda com para o avô se ele
escola. Tive que passar a mão direita. fizesse de novo.
no banco (saí da rotina).
Fonte: Elaborado pelo autor.

Na primeira coluna do Quadro 1 (da esquerda para direita), informações sobre a data e a hora
em que o comportamento ocorreu são apresentadas. A segunda coluna especifica informações
detalhadas sobre o contexto em que o comportamento ocorreu, ou seja, a situação momentos
antes de sua ocorrência.

A terceira coluna do Quadro 1 especifica a resposta emitida pelo indivíduo observado, que deve
sempre ser definida operacionalmente antes de se iniciar os registros. Essa definição é relevante
para permitir que dois ou mais observadores registrem o mesmo comportamento e que um mesmo
observador faça registros mais fidedignos.

Na análise descritiva, “Querer sair da sala” não é uma boa definição de comportamento, visto
que, para registrá-la, o observador deve interpretar os indícios que denotariam a pessoa
“querer” ou “não querer” sair da sala. Definir o comportamento como “levantar da cadeira e
sair sem permissão” é uma forma mais apropriada e fácil de registrar corretamente.

A quarta e última coluna do Quadro 1 oferece um espaço para especificar as consequências do


comportamento, que podem ser desde a reação das pessoas ao redor (por exemplo, tentativas
de conter o comportamento) até possíveis mudanças de ambiente (por exemplo, sair de um local
com muito barulho).

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AVALIAÇÃO INDIRETA

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A avaliação indireta é o método de avaliação de funções comportamentais baseado em entrevistas
e em aplicações de escalas (pelo próprio observador ou cuidador) para identificar os aspectos do
ambiente que possam estar relacionados com o comportamento em questão. A avaliação indireta
apresenta algumas vantagens importantes:

■■ não exige muito treinamento;


■■ leva pouco tempo para ser concluída;
■■ pode ser utilizada em diversos contextos distintos.

Conforme apontam Kelley e colaboradores,12 apesar dessas vantagens, a avaliação indireta pode
oferecer resultados pouco precisos (e, por vezes, equivocados) sobre as funções comportamentais,
uma vez que as informações obtidas são baseadas no relato de pais e/ou de cuidadores, não há
observação direta do comportamento e não há manipulação de alguns aspectos do ambiente para
aferir se há, realmente, alguma relação entre eles e o comportamento.

A entrevista é um importante aspecto de qualquer avaliação funcional do


comportamento, mas, no caso da avaliação indireta, a entrevista ocupa um papel
especialmente importante. Uma boa entrevista poderá resultar na obtenção de
informações relevantes sobre o histórico de ocorrência do comportamento, os
contextos em que ele ocorre e em que não ocorre, as formas com que o comportamento
se apresenta (isto é, sua topografia), o que, no ambiente natural, normalmente produz
a interrupção do comportamento, como as pessoas que convivem com o indivíduo
reagem ao comportamento autoagressivo/autoestimulatório, entre outras.

Tais informações obtidas por meio da entrevista oferecem pistas importantes sobre as funções
do comportamento analisado. Mesmo que uma entrevista bem realizada não seja suficiente
para identificar precisamente as funções do comportamento,12 visto que todo relato é passível
de distorções, ela ainda é útil por permitir levantar hipóteses mais próximas sobre as funções
comportamentais envolvidas e descartar hipóteses improváveis, resultando em um importante
ganho de tempo.

O processo avaliação indireta também se dá por meio de aplicação de escalas desenvolvidas para
essa finalidade. Uma das escalas mais utilizadas é a Functional Analysis Screening Tool (Fast).13

A Fast é um instrumento composto de três seções: a primeira consiste em orientações de


aplicação, a segunda, de um questionário de 16 itens com respostas do tipo “sim” e “não” para
questões sobre os antecedentes e as consequências do comportamento e a terceira sumariza os
resultados das respostas da segunda seção.

As 16 questões da Fast avaliam quatro tipos de funções diferentes, sendo quatro perguntas para
cada. As funções avaliadas são:

■■ reforço social positivo (em forma de atenção social ou obtenção de itens de interesse);
■■ reforço social negativo (em forma de fuga de tarefas ou de atividades);
■■ reforço automático positivo (produção de estimulação sensorial);
■■ reforço automático negativo (atenuação de algum tipo de estímulo sensorial, como dor,
por exemplo).

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26
A depender da quantidade de respostas “sim”, ao final da aplicação do questionário da Fast,
| INTERVENÇÕES EM COMPORTAMENTOS DE AUTOAGRESSÃO E AUTOESTIMULAÇÃO EM PESSOAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

tem-se uma sugestão de quais funções podem estar envolvidas no problema de comportamento.

A Questions About Behavioral Function (QABF)14 também é uma escala de fácil aplicação,
que pode sugerir possíveis funções para os comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios.
É composta por 25 itens, com respostas em escala tipo Likert (0 – nunca; 1 – raramente; 2 –
algumas vezes; 3 – frequentemente). Assim como a Fast, o instrumento apresenta questões
que descrevem situações que sugerem algumas funções. Por exemplo, a questão “engaja-se
no comportamento para tentar obter alguma reação sua” sugeriria um comportamento mantido
por atenção social.

As funções avaliadas pela QABF são:14

■■ atenção;
■■ fuga;
■■ não social;
■■ física;
■■ tangível.

Depois de aplicar a QABF, o avaliador faz uma soma dos escores para cada uma das funções,
e o número final sugere uma ou mais funções comportamentais possíveis. Além da QABF e da
Fast, existem outras escalas similares, mas uma descrição detalhada desses instrumentos foge
do escopo deste artigo.

De modo geral, escalas e entrevistas podem sempre ser conduzidas. No entanto, é


importante entender as limitações desses métodos e utilizar essas informações como
um ponto de partida. A análise funcional experimental é o método reconhecidamente
mais preciso para identificar funções comportamentais.13 No entanto, sua escolha deve
considerar se há profissionais devidamente treinados para realizar a análise funcional
experimental e se eles dispõem de uma infraestrutura necessária para tal.

A avaliação descritiva, por sua vez, pode ser mais apropriada se a avaliação em contextos
naturais for a única alternativa ou a mais viável (como escolas e ambientes sociais, tais como
praças, supermercados etc.). As avaliações devem fornecer informações conclusivas sobre as
funções do comportamento.

De posse dessas informações, hipóteses podem ser formuladas sobre quais aspectos do
ambiente influenciam o comportamento antes de ele ocorrer (SDs) e quais consequências do
comportamento o mantém (sejam as consequências sociais ou automáticas). A partir de então,
o planejamento da intervenção é feito com base nessas hipóteses, levando-se em conta as
funções apontadas pelas avaliações.

■■ INTERVENÇÕES COM BASE NA FUNÇÃO


Como discutido até o presente momento, o comportamento é influenciado por aspectos do ambiente
que o antecede e pelos efeitos que o comportamento produz como consequência. Intervenções
baseadas nos resultados de análises funcionais são mais eficazes do que intervenções que não
são precedidas de uma análise funcional.7

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27
De modo geral, as intervenções consistem em alterar alguns aspectos do ambiente do indivíduo,

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para que se obtenham mudanças em seu comportamento, sejam de aspectos que antecedem a
ocorrência do comportamento, sejam de aspectos relacionados à consequência do comportamento.

INTERVENÇÕES BASEADAS EM ANTECEDENTES

Algumas intervenções podem ser feitas antes de o comportamento autoagressivo/autoestimulatório


ocorrer, produzindo importantes mudanças nas relações do comportamento com o ambiente.
Há dois aspectos importantes dos antecedentes do comportamento que merecem consideração:
os SDs e as operações motivadoras (OMs).15

Os SDs são os estímulos presentes no ambiente que influenciam o comportamento,


pois, quando estão presentes, eles sinalizam a possibilidade de um comportamento
produzir reforço. As OMs são eventos que aumentam ou diminuem momentaneamente
o valor reforçador de certas consequências do comportamento, além de aumentarem
ou diminuírem a probabilidade dos comportamentos que, no passado, produziram
essas consequências.15

EXEMPLO CLÍNICO 2
Léo é uma criança com TEA, que frequenta a sala regular de uma escola. Ele
frequentemente é demandado a realizar tarefas; as instruções da professora e os
materiais da tarefa são os SDs, que indicam que o comportamento de realizar tarefa
pode produzir reforço (por exemplo, atenção da professora ou a conclusão da tarefa
por si). Se Léo não dormiu bem na noite passada por alguma razão, tal privação
de sono (OM) diminuirá momentaneamente o valor reforçador (sua motivação) de
realizar tarefas escolares. Nesse caso, espera-se que Léo apresente resistência em
realizar a tarefa.

Imaginando-se que, em contextos de realização de tarefas escolares (antecedente do comportamento),


Léo tenha apresentado comportamentos de socar o rosto diante da professora, é natural que, em
algumas ocasiões, a professora tenha suspendido as atividades de Léo ou, até mesmo, retirado
ele da sala de aula, em uma tentativa de acalmá-lo. A consequência de socar o rosto produziu o
adiamento da tarefa ou sua interrupção. Nesse caso, pode-se supor que, por alguma razão e em
outro momento, Léo não esteja motivado a fazer a tarefa.

O comportamento que, em sua história, produziu interrupção ou adiamento da tarefa foi socar o
rosto, e essa consequência tornará o comportamento mais provável e frequente nesses contextos
(realizar tarefas). Mas como intervir se o comportamento de Léo adquiriu função de adiar ou
interromper tarefas escolares? O comportamento de Léo pode ser tomado como um indício de que
a situação de fazer tarefas seja aversiva para ele, em algum grau. Nesse caso, uma possibilidade
de intervenção antecedente seria alterar os estímulos (SDs) do ambiente.

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28
Um primeiro passo, portanto, seria identificar quais estímulos (aspectos do contexto da tarefa)
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estariam relacionados com o comportamento de socar o rosto. É possível que alguns tipos
específicos de tarefa influenciem a probabilidade de o comportamento ocorrer. Se o comportamento
de Léo ocorre com maior frequência em tarefas de pareamento, por exemplo, uma alternativa é
retirar os materiais utilizados (que podem funcionar como SDs para o comportamento de socar o
rosto) e substituí-los por materiais diferentes, preferencialmente, por materiais de alguma temática
de interesse de Léo (por exemplo, utilizar figuras de animais, caso ele goste de animais).

O terapeuta, ainda, poderia combinar essas modificações de materiais com uma outra estratégia,
conhecida como sequência de alta probabilidade (alta-p).16 Essa intervenção consiste em
estruturar a atividade em uma sequência com instruções de dois tipos: instruções de alta-p e de
baixa probabilidade (baixa-p) de serem seguidas. A atividade se inicia com algumas instruções
de alta-p, seguida, imediatamente, de uma instrução de baixa-p (a que apresenta mais recusa em
realizar, ou aquela em que o comportamento problema ocorre).

O terapeuta poderia, nesse caso, solicitar a Léo a realização de três instruções com alta-p de
serem seguidas (por exemplo, “Léo, coloque o pino na caixa”, “Me dê o cartão” e “Aponte para seu
nariz”). Após realizar as três instruções, o terapeuta solicitaria uma quarta instrução, de baixa-p,
que seria uma tentativa de pareamento com os novos materiais. Gradativamente, o terapeuta
pode ir aumentando a quantidade de instruções baixa-p à medida que mantém baixas frequências
do comportamento problema.

LEMBRAR
Há também OMs que aumentam o valor reforçador de certas consequências. Por
exemplo, à medida que se fica muito tempo sem comer a comida preferida, o seu
valor reforçador tende a aumentar. Como efeito, os comportamentos que no passado
resultaram no acesso à comida aumentam de probabilidade. Portanto, o valor
reforçador é algo dinâmico: nem sempre a atenção da professora funcionará como
reforçador, assim como nem sempre um chocolate, um jogo de celular, brinquedos,
entre outros, funcionarão como reforçadores.

Uma intervenção antecedente, que pode produzir efeitos nos fatores motivacionais do comportamento,
é o reforço não contingente (RNC).17 O RNC consiste em disponibilizar o reforçador de tempos em
tempos, independentemente de o comportamento ocorrer.

Normalmente, no início da intervenção, o reforçador é disponibilizado frequentemente e, em


seguida, sua apresentação é gradativamente diminuída. Ou seja, o indivíduo obterá o reforço
gratuitamente (sem precisar se engajar em nenhum comportamento) após a passagem de um
tempo fixo (por exemplo, de 5 em 5 minutos, exatamente) ou médio (a cada cinco minutos, em
média). Esse tempo em que o reforçador é apresentado aumenta gradativamente à medida em
que o comportamento se mantém em frequências baixas.

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EXEMPLO CLÍNICO 3

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Suponha-se que Lucas, uma criança diagnosticada com TEA, esteja engajando em
comportamentos de arrancar os fios de cabelo. Após uma análise funcional, o terapeuta
identificou que o comportamento provavelmente era mantido por reforço automático: a
sensação dos fios de cabelo nas mãos poderia ser o reforçador (tratando-se, portanto, de
um comportamento autoestimulatório). Além disso, observou-se que o comportamento
ocorria quase sempre na parte da noite, quando Lucas ficava sozinho (de manhã ele
ficava na escola e à tarde, com os terapeutas).

Uma intervenção possível para Lucas seria o RNC: a partir das 18h, uma quantidade de longos
fios de cabelo, removidos de uma boneca de brinquedo, seria disponibilizada a Lucas, a cada 15
minutos, marcados em um cronômetro. Era permitido a Lucas ficar com os fios de cabelo durante
10 minutos. Um critério foi estabelecido para aumentar o tempo no cronômetro: se após uma noite
inteira Lucas não emitisse o comportamento, cinco minutos seriam adicionados no tempo para
entregar os fios de cabelo da boneca (de 15 em 15 minutos para de 20 em 20 minutos, de 25 em
25 minutos, de 30 em 30 minutos e assim por diante).

Um dos prováveis efeitos do RNC é o de alterar a motivação para o comportamento ocorrer.


Em virtude de o reforçador ser frequentemente disponibilizado, seu valor como reforçador é
reduzido, produzindo uma baixa probabilidade de o comportamento ocorrer.18 Em um raciocínio
análogo, é como se a abundância de reforçadores reduzisse a motivação para o comportamento
que o produz.

O RNC também pode ser utilizado com outros tipos de reforçadores, diferentes daqueles identificados
em avaliações funcionais. Por exemplo, em vez de se utilizar os fios de cabelo, o terapeuta poderia
ter utilizado massas de modelar. Entretanto, a eficácia do procedimento dependeria de se os outros
reforçadores fossem mais preferidos em comparação com o reforçador que mantém o problema de
comportamento (Lucas deveria preferir manipular massas de modelar em vez de fios de cabelo).

Avaliações de preferência, portanto, podem auxiliar na escolha de reforçadores para o procedimento


de RNC, especialmente quando há uma dificuldade em identificar a consequência em questão, em
geral, quando se trata de uma consequência sensorial.19

INTERVENÇÕES BASEADAS EM CONSEQUÊNCIA (OU BASEADAS NA FUNÇÃO)

As intervenções baseadas em consequência modificam os aspectos referentes às consequências


do comportamento, ou seja, ocorrem depois de o problema de comportamento ter acontecido.
Uma forma bastante frequente de intervenção baseada na consequência é conhecida como
ignorar o comportamento problema.

No exemplo de Léo, um terapeuta poderia recomendar que a professora ignorasse seu comportamento,
sem realizar previamente uma análise funcional. A prática de ignorar um comportamento poderia ser
sugerida pelo fato de que a interrupção do reforço de um comportamento levaria a uma redução
gradual de sua frequência, até ele deixar de ocorrer.

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O nome dado à suspensão do reforço de um comportamento é extinção. Entretanto, ao
| INTERVENÇÕES EM COMPORTAMENTOS DE AUTOAGRESSÃO E AUTOESTIMULAÇÃO EM PESSOAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

intervir no comportamento dessa forma, o terapeuta estaria supondo (sem uma análise prévia) que
a atenção da professora seria a consequência reforçadora do comportamento. O que aconteceria
com o comportamento de Léo se a extinção fosse implementada como intervenção?

Se o terapeuta orientar a professora a ignorar o comportamento de Léo (por exemplo, virar-se de


costas para a criança e parar de conversar com ela), ele estará orientando a professora a reforçar
esse comportamento, uma vez que, ao socar o rosto, Léo continuará produzindo o adiamento
ou a interrupção das tarefas escolares. Nesse caso, a prática de ignorar estaria reforçando o
comportamento de socar o rosto, tornando-o mais frequente e expondo a criança a uma situação
de risco para sua saúde.

Apesar de a extinção ser um componente importante nas intervenções, seu uso isolado, assim
como descrito nesse exemplo, não é recomendado.4

Para o exemplo de Léo, uma possibilidade de intervenção baseada na consequência, e que


emprega a extinção como um componente, é o treino de comunicação funcional (TCF).20
Essa intervenção consiste em ensinar uma resposta alternativa com função comunicativa e,
simultaneamente, não reforçar o comportamento problema (extinção). Essa nova resposta,
portanto, deve resultar na mesma consequência produzida pelo comportamento problema.

Um TCF poderia, por exemplo, estabelecer duas situações: na primeira, em contextos de


realização de tarefa, Léo seria ensinado a entregar uma ficha específica com a palavra “pausa”
impressa. Sempre que o fizer, Léo terá imediatamente 30 segundos de pausa, sem que nenhuma
demanda seja apresentada. Após esse período, as atividades seriam retomadas; na segunda
situação, todas as vezes em que Léo se engajasse no comportamento de socar o rosto, a
professora não adiaria ou interromperia a atividade. Léo poderia ser auxiliado a concluir a atividade
e auxiliado a entregar a ficha de “pausa”, mas o comportamento de socar o rosto não deve produzir
a consequência de adiamento ou a interrupção de tarefas.

A escolha de respostas alternativas simples é recomendada para facilitar a aprendizagem – por


exemplo, para algumas pessoas com TEA, é mais fácil entregar uma ficha do que dizer “Preciso
de uma pausa”.

LEMBRAR
Aproximadamente 61% dos indivíduos com TEA apresentam estereotipias, que são
comportamentos motores ou vocais caracterizados como repetitivos, padronizados,
coordenados, involuntários e não mediados por estímulos sociais.21 A maioria das
estereotipias é mantida por reforço automático; todavia, aspectos do ambiente social
também podem influenciar na ocorrência de estereotipias.6

O fato de comportamentos serem mantidos por reforço automático implica que produzir esse tipo
de consequência sensorial é importante para o indivíduo. Algumas intervenções para estereotipias
se propõem a disponibilizar ao indivíduo uma estimulação do mesmo tipo que ele produz
automaticamente quando se engaja no comportamento (estimulação combinada).22

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Por exemplo, ao intervir em estereotipias vocais, o terapeuta deveria utilizar estímulos auditivos

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(vozes) por se assemelharem aos sons produzidos pela estereotipia vocal. Um tipo de intervenção
baseada na consequência, que tem obtido bons resultados na redução de estereotipias vocais, é
a interrupção de respostas e redirecionamento (IRR),23 que consistia em interromper a estereotipia
vocal da pessoa e direcioná-la para a emissão de alguma vocalização socialmente apropriada.

Suponha-se que Luiza, uma garota com TEA, esteja se engajando frequentemente em
estereotipias vocais, que foram previamente definidas pelo terapeuta enquanto qualquer
vocalização fora de contexto. Vocalizações apropriadas de Luiza, tais como perguntas
ou comentários, eram sempre reforçadas.

Entretanto, quando Luiza se engajava em alguma estereotipia vocal, como, por exemplo,
dizer “Sai que é sua!”, o terapeuta interrompia a vocalização imediatamente com
uma pergunta, como, por exemplo, “Que cor é a minha camisa?” As perguntas eram
escolhidas cuidadosamente, de modo que Luiza sabia dar as respostas (por exemplo,
ela conhecia as cores e sabia identificá-las).

ATIVIDADES

8. Sobre os aspectos que poderão ser mensurados pelo psicólogo na avaliação funcional
do comportamento, marque (V) verdadeiro ou (F) falso.

( ) Resiliência (resistência em não persistir praticando o comportamento).


( ) Magnitude (intensidade do comportamento).
( ) Estado anímico (quantidade de vezes em que o indivíduo demonstra alegria ou
tristeza ao adotar o comportamento).
( ) Latência (período de tempo entre a apresentação de um SD e o início do comportamento).

Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta.

A) V–F–V–F
B) V–V–F–F
C) F–F–V–V
D) F–V–F–V
Resposta no final do artigo

9. Sobre a avaliação funcional do comportamento, assinale a alternativa correta.

A) É um conjunto de metodologias para se identificar as funções do comportamento.


B) É uma avaliação que consiste em observar o comportamento diretamente.
C) É uma avaliação feita após as intervenções serem conduzidas, com a finalidade de
verificar seus efeitos.
D) É quando se observa o comportamento em ambiente natural.
Resposta no final do artigo

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10. Explique em que consiste o método da análise funcional experimental.
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............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
Resposta no final do artigo

11. Quais são as funções mais comuns do comportamento problema?

............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
Resposta no final do artigo

12. Observe as providências relacionadas ao Registro ABC, um dos tipos de análise


descritiva utilizado por psicólogos.

I – Interpretar o comportamento, lançando inferências sobre causas, emoções ou intenções.


II – Descrever o comportamento de forma subjetiva, a fim de estudar suas ambiguidades.
III – Definir o comportamento de forma completa, deixando claro aquilo que ele é e o
que não é.

Qual(is) está(ão) corretas?

A) Apenas a I.
B) Apenas a II.
C) Apenas a III.
D) Apenas a II e a III.
Resposta no final do artigo

13. Destaque as vantagens proporcionadas pela avaliação indireta, um dos métodos


empregados na avaliação de funções comportamentais.

............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
............................................................................................................................................
Resposta no final do artigo

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14. A respeito das avaliações funcionais, é correto afirmar que

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A) a análise funcional experimental é a metodologia menos eficaz, pois não parte da
observação direta do comportamento.
B) as entrevistas e as aplicações de escala são sempre importantes, mas não devem
ser utilizadas sozinhas.
C) a aplicação de escalas é suficiente para identificar as funções do comportamento.
D) a avaliação descritiva é o melhor método.
Resposta no final do artigo

15. Sobre o RNC, assinale a alternativa correta.

A) Consiste em reforçar todos os comportamentos apropriados a qualquer hora.


B) Caracteriza-se por alterar os SDs que influenciam o comportamento.
C) Um de seus possíveis efeitos é o de reduzir a motivação para o comportamento
problema ocorrer.
D) Consiste em ensinar respostas alternativas de obtenção de atenção.
Resposta no final do artigo

16. Sobre o TCF, assinale a alternativa correta.

A) Necessita da identificação do reforçador que mantém o comportamento problema


para, então, ensinar uma forma alternativa de se obtê-lo.
B) Deve levar em consideração o reforçador de maior valor do indivíduo.
C) Ele se propõe a ensinar respostas complexas com a mesma função do
comportamento problema.
D) Requer uma avaliação de preferência.
Resposta no final do artigo

■■ EXEMPLO CLÍNICO 4
Para ilustrar alguns dos aspectos abordados no artigo, será descrito, a seguir, o caso de
Éder, um adulto de 23 anos de idade, aluno de uma escola especial, a qual ele frequentava
diariamente. Éder tinha diagnóstico de TEA e deficiência intelectual, comunicava-se de forma
bem rudimentar, apenas com base em gestos de apontar, não conseguindo vocalizar nenhuma
palavra de forma articulada.

A queixa inicial sobre Éder veio da escola, que solicitou ao terapeuta auxílio para lidar com vários
problemas de comportamento. De acordo com os profissionais da escola, Éder apresentava
autoagressão em forma de tapas no rosto, batidas com a cabeça na parede, tapas na mesa,
mordidas na mão, além de episódios de agressão, como chutes, socos, tapas e cuspes em
professores e em funcionários da escola. O primeiro passo foi o de realizar uma entrevista com a
professora, com a equipe técnica da escola e com o responsável por Éder.

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Na entrevista inicial, a professora relatou uma alta frequência desses comportamentos, bem
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como grande dificuldade de conter o rapaz. Éder, que era adulto, dispunha de significativa força
física, e os profissionais da escola mencionavam grande dificuldade em acalmá-lo. A professora
disse ter dificuldade em dar aula para os outros alunos, pois, quando Éder começava com os
comportamentos, ela precisava tentar contê-lo rapidamente.

A equipe técnica da escola mencionou que quando Éder apresentava alguns de seus
comportamentos, alguns funcionários da escola imediatamente apareciam na porta da sala
para “ver o que estava acontecendo”. Essas informações foram relevantes para levantar a
possibilidade de que a atenção social pudesse ser um aspecto do ambiente relacionado ao
comportamento de Éder.

Na conversa com o responsável, outra informação relevante surgiu: os comportamentos relatados


pelos funcionários da escola raramente ocorriam em casa. O responsável, inclusive, mostrou-se
surpreso e disse que, apesar de não estar em casa em boa parte do dia, a pessoa que passava o
dia com Éder nunca relatou problemas de comportamento dessa natureza. Segundo o responsável,
Éder passa o dia tranquilo, assistindo a vídeos e DVDs na televisão.

ATIVIDADE

17. O que as informações baseadas na entrevista sugerem em relação ao caso de Éder?


Por que elas não são suficientes para que se possa chegar a uma conclusão?

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Resposta no final do artigo

Após as entrevistas, a aplicação da escala Fast foi realizada com a professora, apontou, além
de função de atenção social, uma possibilidade de função de fuga de demandas. De acordo com
os resultados da Fast, a função de reforço automática era improvável. Essa possibilidade era
consistente com as informações de que em casa o comportamento não ocorria mesmo o rapaz
estando sozinho e ocioso.

Considerando que o comportamento de Éder ocorria em contexto escolar, uma análise funcional
experimental não era viável. Optou-se, portanto, por uma avaliação descritiva, com registros do
tipo ABC. Foram realizadas oito sessões de observação, com duração que variava de 1h–1h30min,
em horários distintos do período escolar.

Durante as observações, foram feitos registros da frequência dos comportamentos de Éder de


morder a mão, estapear o rosto, estapear a mesa e bater a cabeça na parede. As observações
ocorreram na sala de aula, sem que Éder percebesse a presença do terapeuta, na hora do lanche
e na hora do intervalo.

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Um aspecto que chamou atenção do terapeuta foi uma das tarefas realizadas por Éder. Ele estava

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há muitas semanas realizando a mesma atividade, sem obter progressos. Durante as observações,
Éder apresentou alguns comportamentos de jogar os materiais no chão e arremessá-los na
professora, que, prontamente, pegava os materiais e os deixava em sua própria mesa (e, assim,
fora da mesa de Éder, que ficava vazia).

Os registros ABC sugeriram uma possibilidade de comportamentos mantidos por fuga de


demandas e também por atenção social. Frequentemente, Éder olhava para a porta quando emitia
os problemas de comportamento e, em algumas vezes, funcionários que transitavam pelo corredor
paravam para olhar para ele.

As hipóteses sobre as funções comportamentais foram levantadas e, para abordar a possível


dupla função, um pacote de intervenções foi planejado e implementado. O objetivo da intervenção
era duplo também: reduzir os comportamentos autoagressivos e restabelecer o comportamento
cooperativo de Éder para realizar as atividades. Para tanto, o pacote consistiu em quatro
intervenções (Quadro 2).

Quadro 2

PACOTE DE INTERVENÇÕES
Treino de comunicação funcional Abordou a função de fuga de demandas. O objetivo foi ensinar uma
resposta alternativa para que Éder solicitasse uma pausa em suas
atividades, que era algo importante para ele. Éder foi ensinado a
entregar um cartão que produzia um minuto de descanso. Nenhum
comportamento autoagressivo resultava em interrupção de
atividades. Quando Éder jogava os materiais no chão, a professora
recolhia imediatamente e os apresentava logo em seguida.
Modificação das tarefas As atividades de Éder passaram a apresentar temáticas de seu
interesse (futebol e o distintivo do time Santos). O objetivo dessa
modificação era a redução do caráter aversivo que as atividades
supostamente haviam adquirido.
Reforço de comportamentos de Avaliações de preferência foram realizadas regularmente, e a
cooperação (reforço diferencial professora foi instruída a disponibilizar reforços comestíveis de alta
de comportamento alternativo) preferência de Éder, à medida que ele se engajava na realização das
atividades (comportamento alternativo), sem emitir comportamentos
autoagressivos. No início, as atividades apresentavam curta duração
(1 minuto) e eram todas reforçadas. Aumentos gradativos no tempo
de atividade eram realizados à medida que Éder cooperava, sem
emitir o comportamento problema. Os reforçadores comestíveis
eram gradualmente removidos.
Reforço não contingente A professora foi instruída a se aproximar e fazer comentários
de atenção social positivos sobre Éder a cada 2 minutos. Os funcionários da escola
faziam o mesmo, exceto nos momentos em que Éder se encontrava
em sala de aula. Um planejamento foi feito de modo que, à medida
que Éder emitisse no máximo um comportamento autoagressivo por
hora, o tempo era aumentado de 2 em 2 minutos

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As quatro intervenções foram implementadas simultaneamente no caso de Éder, após treinamento
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dos profissionais da escola. Na primeira semana, foi observada uma redução significativa do
comportamento de todas as topografias, em especial, do comportamento de morder as mãos, que
não ocorreu mais a partir do terceiro dia. O comportamento de bater a cabeça e estapear o rosto
foi interrompido após quatro semanas de intervenção. O único comportamento que foi reduzido,
mas que ainda ocorria, era o de dar tapas na mesa.

O exemplo de Éder ilustra a importância que uma avaliação funcional tem na formulação de
intervenções em comportamentos autoagressivos. Obviamente, o comportamento de dar tapas
na mesa e também algumas topografias de agressão ainda precisaram de outras intervenções,
provavelmente, por exercerem outras funções comportamentais.

Por exemplo, no caso de Éder, levantou-se uma hipótese de um possível papel do reforço
automático no comportamento de dar tapas na mesa (estimulação sensorial do som da batida
ou sensação da batida nas mãos). Destaca-se, também, a importância de monitorar as pessoas
envolvidas na intervenção, de modo a aumentar as garantias de que os procedimentos estão
sendo conduzidos de maneira correta.

■■ CONCLUSÃO
O presente artigo procurou apresentar, de forma simples e didática, alguns conceitos básicos
que sustentam a avaliação das causas de comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios,
além de explicitar como esses resultados devem orientar o planejamento das intervenções. O
entendimento dos comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios se dá com base na sua
função, e isso implica que intervenções não devem ser pensadas a partir da forma (topografia) do
comportamento, mas, sim, a partir de sua função.

A pergunta a ser feita não é “Como lidar com o comportamento de se agredir?”, mas “Qual é a
relação do comportamento de se agredir com o ambiente social e não social dessa pessoa, no
que se refere ao contexto em que ocorre e as consequências que produz?” Responder à segunda
pergunta pode apontar ao psicólogo o caminho para lidar com o problema e ajudá-lo a entender
que o comportamento autoagressivo pode ter função de comunicação.

Por razões culturais, existe uma tendência de se explicar comportamentos fazendo uso de termos
que envolvem ideia de intenção (ele fez isso para/por causa de) ou causas emocionais (Estava
frustrado, então ele...), além de se definir o comportamento de forma imprecisa (por exemplo,
Fulano ficou bravo).

A compreensão das emoções do indivíduo é, sem dúvida, muito importante, especialmente pelo
fato de ela indicar que a pessoa com TEA, dada as suas reduzidas capacidades comunicativas,
pode estar passando por situações, muitas vezes, bastante desconfortáveis, sem conseguir
se expressar. Entretanto, interpretações dessa natureza podem levar a registros imprecisos
(superestimados ou subestimados), induzindo a decisões equivocadas sobre as intervenções e
alguns de seus parâmetros.

As análises e as intervenções não ignoram os sentimentos da pessoa; elas se concentram nas


variáveis que influenciam o comportamento e, inclusive, nos sentimentos da pessoa, uma vez que
eles também são entendidos como comportamentos.

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O presente artigo demonstrou como é possível reduzir problemas de comportamento com base

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em estratégias de reforço. O uso de punição, enquanto um processo comportamental (que é
diferente de “castigo”), também poderia levar a uma redução da frequência de um comportamento.
Entretanto, essas estratégias não são recomendadas, por uma série de aspectos, tanto éticos quanto
comportamentais.4 Psicólogos devem utilizar todos os recursos disponíveis com base em reforço.

Naturalmente, as informações apresentadas neste texto estão bem distantes de esgotar


a extensa literatura sobre avaliação funcional e sobre intervenções em comportamentos
autoagressivos/autoestimulatórios. Existe uma grande variedade de procedimentos
não mencionados no presente texto (para discussões mais detalhadas, ver Doehring e
colaboradores2), todavia, as informações aqui apresentadas podem servir de orientação para
a prática de profissionais que precisam lidar com esses problemas frequentemente, utilizando
procedimentos que foram avaliados por estudos metodologicamente adequados.24

O compromisso com o resultado é uma questão ética, visto que comportamentos autoagressivos/
autoestimulatórios podem produzir prejuízos substanciais na saúde da própria pessoa, e
intervenções eficazes devem ser rapidamente implementadas.

■■ RESPOSTAS ÀS ATIVIDADES E COMENTÁRIOS


Atividade 1
Resposta: Indivíduos diagnosticados com TEA apresentam uma diversidade de características
comportamentais classificada em dois eixos. De modo geral, essas pessoas apresentam prejuízos nas
habilidades de comunicação e interação social, padrões de comportamentos repetitivos e restritos.

Atividade 2
Resposta: C
Comentário: Pessoas diagnosticadas com TEA podem se engajar em diferentes tipos de
comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios, tais como tapas e socos no próprio rosto;
introdução dos dedos nas cavidades oculares; cabecear paredes ou superfícies perigosas; morder
partes do corpo; arranhar ou remover pedaços da pele; introduzir as mãos ou objetos na boca; e
vocalizações.

Atividade 3
Resposta: A
Comentário: Problemas de comportamento podem ocorrer das mais variadas formas, nas mais
diversas etapas da vida. Considerar tal aspecto implica dizer que sua ocorrência não se deve pelo
fato de o indivíduo estar em uma determinada faixa etária (quando se diz, por exemplo, que “birras
são normais da infância”). Assim, as questões que ajudam na investigação são: “Mas quais razões
levariam um indivíduo a se agredir, a ponto de lesionar o próprio corpo?” “O que faz alguém passar
uma parcela substancial do dia se autoestimulando?”.

Atividade 4
Resposta: B
Comentário: O comportamento é a relação entre eventos ambientais que antecedem o
comportamento e os eventos gerados como efeito do comportamento.

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Atividade 5
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Resposta: Denomina-se reforço qualquer efeito de uma resposta que a torne mais provável
de acontecer no futuro, e se denomina SD qualquer aspecto do ambiente que influencie a
ocorrência da resposta do indivíduo (por ter estado presente no contexto, quando a resposta
produziu tais efeitos).

Atividade 6
Resposta: Quando o psicólogo analisa quais são as consequências do comportamento (ou
seja, quando identifica os reforçadores) e quais são os estímulos do ambiente que antecedem
sua ocorrência (ou seja, quando identifica os SDs), um importante passo é dado para se
manejar de forma eficaz os comportamentos autoagressivos/autoestimulatórios. Tal análise
é denominada análise funcional do comportamento; ela é relevante para as intervenções
em problemas de comportamento porque permite identificar as consequências reforçadoras
que mantêm o comportamento ocorrendo, bem como os aspectos do contexto (SDs) que
influenciam a sua ocorrência.

Atividade 7
Resposta: C
Comentário: Comportamentos autoagressivos se caracterizam por comportamentos com
potencial de produzir danos físicos. Remover fios de cabelo, arranhar o braço, abocanhar
as mãos, entre outras formas de comportamento, poderiam entrar nessa definição.
Comportamentos autoestimulatórios, em contrapartida, são entendidos a partir da sua
função, ou seja, são comportamentos operantes mantidos por reforço automático, um tipo
de consequência não social produzida diretamente pelo comportamento. Remover fios de
cabelo, por exemplo, também poderia ser um comportamento autoestimulatório, desde que
seu reforçador seja a sensação produzida no couro cabeludo, uma consequência não social
que resulta automaticamente do comportamento.

Atividade 8
Resposta: D
Comentário: Na avaliação funcional do comportamento, o psicólogo poderá medir diversos
aspectos, como, entre outros, a frequência (a contagem do comportamento em determinado
período de tempo), a duração (tempo relativo ao início e ao término do comportamento), a latência
(período de tempo entre a apresentação de um SD e o início do comportamento) e a magnitude
(intensidade do comportamento).

Atividade 9
Resposta: A
Comentário: A avaliação funcional do comportamento é composta por avaliação indireta, avaliação
descritiva e análise funcional experimental.

Atividade 10
Resposta: A lógica da análise funcional experimental é relativamente simples – observar a
ocorrência do comportamento em diferentes condições, cuidadosamente planejadas e de curta
duração (geralmente, de 5 a 10 minutos). A observação é realizada várias vezes, até que se torne
claro, pelas medidas comportamentais, que, em certas condições, o comportamento ocorre com
maior frequência.

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Atividade 11

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Resposta: As funções mais comuns do comportamento problema são atenção social, fuga de
demandas, obtenção de tangíveis e reforço automático.

Atividade 12
Resposta: C
Comentário: Sobre o Registro ABC, são dicas importantes – definir o comportamento de forma
objetiva, com base no que possa ser observado; descrever o comportamento de forma clara, sem
ambiguidades; definir o comportamento de forma completa: deixar claro aquilo que ele é e o que
não é; evitar interpretar o comportamento (inferir causas, emoções ou intenções).

Atividade 13
Resposta: A avaliação indireta é o método de avaliação de funções comportamentais baseado
em entrevistas e em aplicações de escalas (pelo próprio observador ou cuidador) para identificar
os aspectos do ambiente que possam estar relacionados com o comportamento em questão. A
avaliação indireta apresenta algumas vantagens importantes, como não exigir muito treinamento,
levar pouco tempo para ser concluída e ser utilizada em diversos contextos distintos.

Atividade 14
Resposta: B
Comentário: Entrevistas e aplicações de escala não permitem observar o comportamento e estão
sujeitas a distorções. Elas sempre devem vir acompanhadas de métodos de observação direta
(avaliação descritiva ou análise funcional experimental).

Atividade 15
Resposta: C
Comentário: A exposição abundante do reforçador abranda a motivação para a produção desse
reforçador, diminuindo a probabilidade de o comportamento ocorrer.

Atividade 16
Resposta: A
Comentário: No TCF, sem se identificar o reforçador que mantém o problema de comportamento,
não há como estabelecer um comportamento com função de comunicação para produzi-lo.

Atividade 17
Resposta: As informações baseadas na entrevista sugeriam uma possível função de atenção
social. Entretanto, essas informações não eram suficientes para conclusão, pois não era possível
confirmar uma função de atenção social nem descartar outras possíveis funções. Por exemplo,
de acordo com as informações obtidas, o comportamento ocorria apenas na escola, relacionando,
assim, aspectos no contexto escolar ligados ao comportamento autoagressivo, que não existem
no contexto familiar.

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■■ REFERÊNCIAS
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Como citar este documento

Varella, A. A. B. (2017). Intervenções em comportamentos de autoagressão e autoestimulação


em pessoas com transtorno do espectro autista. In Sociedade Brasileira de Psicologia,
Gorayeb, R., Miyazaki, M. C., & Teodoro, M. (Orgs.). PROPSICO Programa de Atualização
em Psicologia Clínica e da Saúde: Ciclo 1. (pp. 9–41). Porto Alegre: Artmed Panamericana.
(Sistema de Educação Continuada a Distância, v. 3).

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| TITULO ARTIGO

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