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A CRIMINALIZAÇÃO DA POBREZA NO SISTEMA CAPITALISTA: uma reflexão sobre o

sistema prisional brasileiro


Raquel dos Santos1

RESUMO: Este artigo procura demostrar à funcionalidade do


sistema prisional brasileiro na sociedade capitalista. A prisão,
configura-se como mecanismo fundamental à ordem capitalista
para vigiar e punir a superpopulação relativa - “classe
perigosa”.Com isso, partimos do viés que o Estado penal
assume como política de “tolerância zero”, vem utilizando a
repressão como uma forma do Estado responder às
expressões da questão social. E assim, o encarceramento em
massa exercido pelo Estado vem assumindo um caráter
funcional à consolidação legitimação do capitalismo, além de
ser uma justificativa utilizada para as ações de privatização dos
presídios, tendo como parceria o setor público /privado.
Palavras-chave: Prisão. Capitalismo. Classe perigosa.

ABSTRACT: This article seeks to demonstrate the functionality


of the Brazilian prison system in capitalist society. Prison is a
fundamental mechanism for the capitalist order to monitor and
punish the relative overpopulation - "dangerous class" .With this
we start from the bias that the criminal state assumes as a
"zero tolerance" policy, it has been using repression as a way of
responding to the expressions of the social question. Thus, the
mass incarceration exercised by the state has been assuming a
functional character to the consolidation of capitalism
legitimacy, besides being a justification used for the
privatization of the prisons, having as a partnership the public /
private sector.
Keywords: Prison. Capitalism. Dangerous class

1 INTRODUÇÃO
Partimos da compreensão que o cárcere se tornou fábrica de proletariado
considerado como “classe perigosa”, com isso, prisão tornou um instrumento fundamental à
ordem capitalista. Nesta direção, os presídios brasileiro passa a ser um controle seletivo,
próprio do modelo capitalista que sempre produziu uma massa de exército industrial de
reserva de excluídos.

1
Assistente Social e Mestranda em Serviço Social pela Universidade Federal de Alagoas. E-mail:
s.raqueldos@gmail.com. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES).
1
Desse modo, nota-se que “a sociedade burguesa, é baseada numa forma de
exploração do homem pelo homem que mistifica as relações sociais” (MARX, ENGLES,
2009, p.9-10). Assim, a
Condições, no seio das quais podem ser aplicadas determinadas
forças de produção, [estas] são as condições do domínio de uma
determinada classe da sociedade, cujo poder social, decorrente da
sua propriedade, tem sua expressão prático-idealista na respectiva
forma de Estado [...] (MARX; ENGELS, 2009, p.56).

É na relação orgânica entre o Estado e o capital que estão baseadas as


transformações da sociedade no capitalismo. Assim, os trabalhadores denominados exército
industrial de reserva, sem empregos, para sobreviver passam a trabalhar de maneira
informais/temporários e encontram na criminalização um meio de garantir sua sobrevivência
e de sua família (ENGLES, 2010). Assim,
na medida em que as populações não têm condições de subsistência, procurarão de
algum modo uma alternativa. E se não há trabalho, ou melhor - trabalho há- se não
há emprego (e decente), as pessoas vão fazer o que é possível em prol de
estratégias de sobrevivência, entre elas os trabalhos e/ou empregos informais, mas
também as atividades ilícitas (FORTI, 2012, p.84).

Todavia, o advento do capitalismo traz várias transformações, inclusive, o


aparecimento do crime como processo histórico da própria sociedade. Assim, Netto e Braz
(2006, p.134) classificam como lumpemproletariado, “parcela degradada do proletariado:
vagabundos, criminosos”, reflexo de uma lógica destrutiva do capital.
Desta forma, tornou-se cada vez mais latente a presença de trabalhadores
desempregados nos grandes centros urbanos, ou seja, as famílias em condições de
extrema pobreza que lutam pela sobrevivência. Nota-se que
a lógica do capital procura adotar na produção, no decorrer de sua história, todas as
medidas adequadas ao aumento do excedente extraído através da mais-valia, e
para isso tem que provocar um aumento crescente da produtividade (e das forças
produtivas), ao mesmo tempo em que elimina trabalho vivo, ou seja, o trabalhador
(PANEAGO, s/ano, p.03).

Logo, aqueles que não pertencem a essa lógica, sem função na reprodução do
capital são considerados descartáveis ou até mesmo classificados como “classe perigosa”, e
neste cenário, Ruiz e Pequeno (2016, p.34) afirmam que na “sociedade capitalista a forma
como se dá a divisão do trabalho faz com que o processo de humanização ocorra em
condições absolutamente desiguais”.
Através desse estudo, abordaremos o sistema punitivo na sociedade capitalista, que
se dá em face aos processos econômicos do mercado, e neste caso, a prisão vem
assumindo a função de um instrumento de controle social da pobreza. Desse modo, a prisão
termina sendo uma empresa produtiva para os capitalistas e o encarceramento em massa

2
passa a ser uma política de controle social (SILVA, 2014). Ocorre, no entanto, que, a prisão
tem se tornado um mercado para obtenção de superlucros, através das privatizações e o
Estado passa a vender essa segurança. Aqui se verifica, que “o Estado se utiliza cada vez
mais da polícia e das instituições penais para conter a desordem produzida pelo
desemprego em massa, a imposição do trabalho e o encolhimento da proteção social”
(WACQUANT, 2008, p.96), fato este que o encarceramento em massa se torna o principal
meio repressivo, atreves da punição estatal com advento do sistema capitalista.
Assim, a prisão tem se tornado, cada vez mais, um campo de ampliação das
desigualdades sociais e econômicas e os presídios brasileiros torna-se uma máquina de
gerar lucro.
2 CRIMINALIZAÇÃO DA POBREZA: UM DEBATE SOBRE O ENCARCERAMENTO EM
MASSA NA SOCIEDADE CAPITALISTA

Na sociedade capitalista, o sistema prisional passa a ser caracterizado como uma


instituição de controle social para controlar as “classes perigosas” e esconde os problemas
sociais. Por outro lado,
a prisão realiza papel fundamental de controle, participando decisivamente no
processo de exploração, que, ao ser realizado no cárcere, ainda mais é aviltado se
comparado ao trabalho explorado extramuros, pois apresenta o adendo da opressão
(SILVA, 2014, p.13).

Outro aspecto que importa mencionar associado à prisão, é que seu o surgimento
está relacionado com o advento do surgimento da sociedade, e a criminalização se expande
com o processo de industrialização e vem se tonando uma fábrica punitiva/ produtiva que
objetiva extrair a mais valia, e ao mesmo tempo espera “transformar o criminoso não
proprietário no proletário não criminoso” (MELOSSI; PAVARINI, 2006, p.08). Nesta direção,
as prisões são funcionais ao capital e o aprisionamento passa ser um instrumento punitivo
do Estado.
Neste contexto, o sistema prisional passa a ter como função punitiva e atende à
demanda posta pelos capitalistas de vigiar a “classe perigosa”, ou seja, os ”usuários do
sistema prisional são pessoas que ao longo da vida experimentaram toda sorte de violação
de direitos, e que ao chegarem à prisão, apenas darão seguimento a esse processo”
(TOLEDO, 2010, p. 39).
Fica evidente que essa lógica de mercado (prisão) é para controlar aqueles pobres
que em sua maioria nem estão inseridos no mercado de trabalho informal. Com isso, Torres
afirma que
diante da produção e reprodução das desigualdades sociais no sistema capitalista,
mundialmente é possível afirmar que, historicamente, as prisões representam a
3
manifestação da institucionalização dos processos de criminalização gerados pelos
conflitos sociais, exercidas pelo Estado e seu poder punitivo e repressivo. Associada
ao controle social das “classes perigosas”, as prisões, desde suas origens, confinam
pobres, excluídos e desempregados em sua imensa maioria. Na
contemporaneidade, a população encarcerada é composta por envolvidos com
crimes contra o patrimônio, associação com o tráfico de drogas e crimes violentos
contra a vida (TORRES, s/ano, p.01).

O sistema prisional torna-se dessa forma um campo de concentração de um exército


industrial de reserva fora do mercado de trabalho. Portanto, no cárcere, “a luta de classe se
objetiva tanto nos moldes da pacificação via força e coerção, como também na eliminação
dos sujeitos, que se concretiza ainda pela denominada morte social” (SILVA, 2014, p.19),
com isso, a prisão vem assumindo o papel de indústria para fornecer mais valia ao
capitalista. Nesta direção, fica claro que o Estado penal apoia o Estado punitivo e o
encarceramento passa a ser uma política neoliberal de vigiar a “classe perigosa” e gerar
lucro. Assim,
há vários interesses econômicos, sociais, políticos, ideológicos: a indústria do medo
social e seus sensacionalismos; o imenso mercado da política de segurança privada;
o conservadorismo social presente em todas as classes sociais; o recrudescimento
penal e o poder carcerário do poder judiciário; as empreiteiras públicas e seus
serviços privados na construção e manutenção dos presídios ( TORRES, 2010, p.
44).
Nesta direção, a prisão assemelha-se às fábricas, quanto à disciplina na luta pela
liberdade e até mesmo na exploração do trabalho. Além disso, a prisão vem ampliando
como forma punitiva e que a reintegração do preso à sociedade está longe de acontecer,
tendo em vista que a prisão foi pensada para atender a logica capitalista, tornando uma
ferramenta de vigiar a “classe perigosa” dos meios de produção e o sistema de
“ressocialização” torna-se um sistema falido, com marcas evidentes da exclusão social
impostas pelo capital (SILVA, 2016).
Nesta lógica, Silva (2016, p.47) versa que
a privação de liberdade é a pena por excelência do sistema punitivo no modelo
capitalista neoliberal, fundamentando-se por intermédio do discurso legítimo de que
a prisão tem finalidade de prevenção geral e especial e que inibe o cometimento de
delitos pelo exemplo e respeito às leis .

O cárcere tona-se, assim, um negócio lucrativo com o encarceramento em


massa, além de ser um espaço horrendo de violência, superlotação, maus tratos, tortura e
de facções que predomina um tipo de feudalismo dentro das prisões (TORRES, 2001). Por
sua vez, os presídios vêm reafirmando como instrumento coercitivo que essa “reafirmação
da ordem social burguesa [...] deve educar (ou reeducar) o criminoso não proprietário a ser
proprietário socialmente e não perigoso [...] sem ameaçar a propriedade” (MELOSSI;
PAVARINI, 2006, p.216).

4
No caso do Brasil, podemos observar que a questão da punição está direcionada às
classes destituídas do usufruto da riqueza socialmente produzida, e o encarceramento
passa a atender a lógica burguesa como mecanismo de coerção e controle estatal.
Ademais, o sistema prisional brasileiro esteja legitimado pela Lei de Execução Penal – Lei nº
7210 de 1984 que prevê “ao condenado e ao internado [...] assegurados todos os direitos
não atingidos pela sentença ou pela lei”. Todavia, a “prisão acaba por constituir-se numa
possibilidade muito mais vinculada à condição sócio econômica do indivíduo delituoso”
(TORRES, s/ano, p.2). Nesta lógica, só reforça uma política voltada para repressão e
controle dos pobres.
O sistema carcerário brasileiro até dezembro de 2015 tinha 698.618,2 pessoas
privadas de liberdade, sendo que Brasil era considerando o quarto país em ritmo de
encarceramento em massa, ficando atrás dos, Estados Unidos, Rússia e China. No entanto,
o fluxo mudou e hoje o sistema prisional brasileiro, ostenta uma população de 726.7123
pessoas presas. Com esses dados, verificamos que o sistema prisional é considerado o
terceiro maior em números absoluto, em encarceramento em massa do mundo, atrás
apenas dos EUA e da China, de acordo com o censo do sistema de informações estatísticas
do sistema penitenciário brasileiro – INFOPEN do Departamento Nacional Penitenciário –
DEPEN, ligado ao Ministério da Justiça . Segue o ranking dos 20 países que mais
encanceram no mundo, conforme a tabela 1.

Gráfico 1: ranking dos 20 países com maior população carcerária.


Entretanto, a sociedade com medo, espera que a prisão seja um mecanismo de
controle social desta “classe perigosa”. Assim, o sistema penal por meio do controle penal
tem como um dos mecanismos de recrudescimento o aprisionamento em massa.

2
Disponível em <.http://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-
brasil/relatorio_2015_dezembro.pdf> . Acesso em janeiro de 2019.
3
Disponível em < http://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil>. Acesso em janeiro de
2019.
5
Ademais, o aumento do encarceramento em massa passa a ser um campo de
enfrentamento do Estado às contradições sociais do sistema do capital, além de ampliar
o lucro do capital, através de equipamento de segurança publico/privada, pois, quanto
mais preso, maior é o lucro.
Compreende-se, então, que o sistema prisional “não cumpre outra função diferente da
imposição de medo e extermínio direcionados às classes trabalhadoras, em geral
desprovidas dos robustos recursos necessários ao caminho de acesso da justiça burguesa”
(SILVA, 2014, p.3). Todavia, o processo de exploração existente na sociedade capitalista
nos leva a refletir o cárcere como uma instituição de controle social, que segrega e amplia a
exclusão social.
Desta maneira, basta observar o crescente aumento da população carcerária, o que
demonstra um sistema prisional completamente falido. Ao analisarmos o encarceramento
em massa no Brasil, podemos observar que o número de presos vem aumentando nos
últimos anos, basta observamos os anos de 2005 a 2016.

Gráfico 2: elevação da população carcerária no Brasil.


Com isso, fica evidente que a prisão passa a ser uma das formas do Estado exercer
o seu direito de punir e a criminalização da pobreza passa a ser operada através desse
sistema. Assim, as prisões interessam ao capital politicamente, pois, têm como controle
sobre determinados segmentos, ou seja, os perigosos para o capital. Também tem como
característica ideológica a identificação, ocultando reais razões de violência e desigualdade
6
e por fim, a econômica que traz profunda relação com a economia política, havendo assim
um investimento na segurança pública e armamento (PIMENTA, 2018).
Observamos também nesse estudo que o “Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN)4
repassou em 2016 e 2017, R$ 1,8 bilhão para todos os 26 Estados e o Distrito Federal investirem na
construção de novas vagas e na modernização de presídios”. Desta forma, essa análise parte da
lógica que quem lucra com as prisões são os capitalistas, considerando que o cárcere deixa
de ser uma questão de política pública e passa a ser uma questão de classe.
Diante deste contexto, “o sistema penal está direcionado à perseguição e à
repressão de uma forma especifica de criminalidade, típica das classes pobres, operando
através de um sistema de criminalização seletiva” (PIMENTA, 2018, p.126).
É neste cenário, que iremos fazer uma breve reflexão sobre as privatizações dos
presídios, tendo em vista que o surgimento do modelo prisional está associado ao modelo
de produção, ou seja, “a população carcerária neste espaço assume a característica
específica de mercadoria, mesmo sem realizar o trabalho explorado, pois suas existências
propiciam o lucro” (SILVA, 2014, p.116).
Nesta direção, é importante destacarmos que o projeto do neoliberalismo tem
intensificado a implementação de medidas, a exemplo, das privatizações como forma de
reestruturação do mercado do trabalho. Esse contexto neoliberal traz consequências no
desmonte dos direitos, sobretudo trabalhistas, além de trazer a ideia de privatização,
centralização e focalização das políticas sociais, e não podemos deixar de destacar a prisão
como necessidade econômicas para a burguesia, sobretudo com o desenvolvimento
capitalista.
Por sua vez, Netto e Braz, versa que as ideologias neoliberais partem de
uma concepção de sociedade (tomada como um agregado fortuito, meio de o
indivíduo realizar seus propósitos privados) fundada na ideia da natural e necessária
desigualdade entre os homens e uma noção rasteira da liberdade (vista como
função da liberdade de mercado) (NETTO; BRAZ, 2006, p. 226).

Vale salientar que foi a partir dos anos 1980, que surge o processo de contrarreforma
destinada à redução dos gastos sociais (BEHRING, BOSCHETTI, 2011). Com isso, surge a
privatização e terceirização dos serviços, principalmente os da esfera pública. Assim, iremos
sinalizar brevemente sobre as privatização dos presídios e a Pareceria Público Privado –
PPP, fato este que fundamenta a nossa discussão, em que as prisões passam a ser a
fábrica de gerar lucro para os burguês.
2.1 Privatização dos presídios: uma forma de vender segurança

4
Disponível em https://g1.globo.com/politica/noticia/desde-2016-uniao-repassou-r-18-bilhao-aos-estados-para-
ampliar-e-modernizar-presidios-mas-nenhuma-vaga-foi-criada-ate-agora.ghtml. Acesso em março de 2019.
7
De acordo com Netto e Braz “a ideologia neoliberal está sustentada na necessidade
de diminuir, ou seja, o “Estado cortar as suas “gorduras”, justifica o ataque que o grande
capital vem movendo contra as dimensões democráticas da intervenção do Estado na
economia” (NETTO; BRAZ, 2006, p.227).
É nesta direção, que as grandes empresas na sociedade capitalista se utilizam das
ideias neoliberais para privatizar as instituições públicas, a exemplo dos presídios brasileiro,
e para isso, vêm mostrando o fracasso da prisão como instituição ressocializadora, desde os
motins (brigas de facções), fugas, entre outras condições precárias em que o preso se
encontra. Com isso, a prisão vem servindo de apoio para o desenvolvimento do capitalismo,
e assim o Estado requisita das empresas privadas alguns serviços fundamentais como:
alimentação dos internos e dos funcionários, limpeza, sistema de vigilância e informação.
As privatizações dos presídios brasileiros têm como estratégia do capital em
transformar a força de trabalho carcerária em lucro. Assim, as empresas de segurança
privadas, através da Lei n° 8.666/1993 instituem normas para licitações e contratos da
Administração Pública. O Estado passa ser o co-gestor entre o Poder Público e a iniciativa
privada, nos moldes da Lei 11.079/2004 - Parcerias Público-Privadas –PPP. Essa parceria
com PPP vai desde administração dos presídios, como alimentação, câmeras de vigilância,
entre outros. De acordo com o artigo 2º , §4 da Lei é vedada a celebração de contrato “I -
cujo valor do contrato seja inferior a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais)5; II – cujo
período de prestação do serviço seja inferior a 5 (cinco) anos; ou III – que tenha como objeto
único o fornecimento de mão-de-obra, o fornecimento e instalação de equipamentos ou a
execução de obra pública”. Com isso, fica evidente no artigo 9, inciso 4º “fica vedado à
Administração Pública ser titular da maioria do capital votante das sociedades de que trata
este Capítulo”. Com isso, o Estado transfere a responsabilidade para as PPPs, a exemplo
da administração dos presídios brasileiros, e assim a segurança transforma-se em
mercadoria.
Logo, o sistema prisional vai parar nas mãos do setor privado, podendo salientar
que “a privatização de presídios faz parte de um modelo de controle penal adotado pelo
Estados Unidos da América em nome do eficientismo penal neoliberal [...] que emergiu na
passagem da década de 1980 para a década de 1990” (SILVA, 2016, p.60). Neste ínterim,
podemos constatar que os presídios privatizados tornam-se uma mercadoria para os capitalistas,
cujo o único objetivo é o lucro em nome da segurança, com isso, as empresas recebem por cada
preso, o que evidencia que não terá vaga ociosa, e essa dinâmica neoliberal é sustentada com base

5
Redação dada pela Lei nº 13.529, de 2017. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
2018/2017/Lei/L13529.htm#art6>.Acesso em abril de 2019.
8
no lucro e na manutenção da segurança., a exemplo do Complexo de Pedrinha no estado do
Maranhão e Complexo de Ribeirão das Neves, no estado de Minas Gerais e o do Girau do
Ponciano estado de Alagoas, ambos administrados por uma empresa terceirizada.

O presídio do Girau do Ponciano de Alagoas é administrado por uma empresa de cogestão,


denominada REVIVER, com capacidade prevista para 789 detentos (masculinos), cuja a
capacidade atual é 960 presos, sendo 360 julgados condenados, e 591 como presos provisórios,
totalizando 951 presos, de acordo com o mapa6 diário da população carcerária de
16/04/2019 a 17/04/2019, reforçando assim a lógica do lucro. No caso de Alagoas, por
exemplo, fica claro que “temos um conflito de interesse entre os agentes privados que
comandam o Estado e as demandas da maioria da população que sempre ficam à margem
da ação deste Estado” (MENEZES, 2017, s/p).
É nesta direção as PPPs servem para a exploração dos presos por meio do uso da
mão de obra barata e do trabalho forçado e com isso o encarceramento em massa passa a
ser um mecanismo do capitalista, pois, lucra-se com os presos. Essas mudanças foram
ocasionadas pelo ajuste neoliberal e consequentemente teve mudanças na condução na
política penal brasileira (SILVA, 2016).
Vale salientar que essa medida vai contra o que versa no artigo 144, da
Constituição da República Federativa de 1988, que estabelece que é dever do Estado a
gestão da segurança pública, ou seja, “para preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio”. Embora haja uma portaria nº 495/20167, do
Ministério da Justiça que prevê estratégias para o enfrentamento ao encarceramento em
massa, porém os presídios brasileiro mostra um sistema completamente falido, basta ver o
perfil dos aprisionados, grande parte pobre, jovens, negros, entre outros.
Diante dessa exposição, faz-se necessário brevemente o efeito da PEC 55 e a
política de segurança. Nota-se que a PEC 55 tem como objetivo o congelamento dos
gastos públicos por um período de 20 anos, o que irá trazer consequência drástica,
acarretando no aumento do desemprego e/ou na redução de salários, além da proteção
social vinculada ao trabalho. Dessa maneira, a PEC 55 visa acelerar o processo de
privatizações para prestação de serviço público, inclusive isso irá refletir na segurança
pública, a exemplo dos presídios. Vale salientar que
o desmonte das políticas sociais e públicas pelos Estados neoliberais, substituídas
pelo incremento da regulação penal e carcerária, retrata cada vez mais os

6
http://www.seris.al.gov.br/arquivos/MAPA%2012_19.09.2018%20A%2020.09.2018.pdf.Acesso em abril de
2019.
7
Disponível em <http://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/22785957/do1-2016-
05-02-portaria-n-495-de-28-de-abril-de-2016-22785887>. Acesso em abril de 2019.
9
investimentos sociais sendo transferidos para a punição, segurança, vigilância e
encarceramento (TORRES, s/ano, p.1)

Assim, o Estado para resolver a crise do capital vem adotando o modelo das PPPs
que nada mais é que uma forma privatizada, em que o governo estadual vem utilizando para
reduzir custos com a gestão do cárcere, e passa a atender aos interesses do capital. Isso se
deu através o processo de restauração do capital e as ideias do projeto neoliberal, fazendo
com que a PEC 55 legitime um “fim do mundo” de precarização e flexibilização das
condições de trabalho, e isso é notório nos presídios brasileiro que além de legitimar em um
sistema falido, reforçam um estado penal de controle social.
Seguindo essa análise , constatou-se que a PEC do teto de gastos (241/2016) ou
PEC 55 e a Lei de terceirização nº 13.429/2017 Lei 513/2011, por exemplo, podem agravar
ainda mais a questão social no Brasil. Sendo que essas mediadas neoliberais tendem a
aumentar a criminalização da pobreza, podendo induzir em altas taxas de encarceramento
em massa. Desta forma, a burguesia buscará através da criminalização da pobreza uma
forma de transformar em mercadoria, e essa realidade é notória nos presídios brasileiros,
em que os presos passam a vender sua força de trabalho de forma precária (sem direitos), e
com isso o sistema prisional passa a ser a escravidão do século XXI.
No entanto, o capitalismo ataca e tenta mostrar através das privatizações dos
presídios e do encarceramento em massa que a única forma de deter a marginalização é
vender segurança e que “o valor da força de trabalho não se altera, somente varia o seu
preço”. Nesta direção ,fica evidente que essas parcerias com a PPPs e outras normativas de
terceirização vão contra a Lei 79 de 1994 que afirma a existência da criação do Fundo
Nacional Penitenciário – FUNPEN que rege sobre a manutenção dos presídios brasileiro.
Assim, a “prisão só contribui para intensificar a pobreza, a desigualdade e a exclusão social
e tem a caraterística de uma bomba social: ela devolve à sociedade indivíduos destruídos
pelo encarceramento” (TORRES, 2014, p. 128).
3 CONCLUSÃO
A principal contribuição desse artigo constitui em ressaltar que a principal função do
sistema prisional brasileiro é segregar e punir a classe trabalhadora empobrecida, inerente
à expansão das forças produtivas e as relações sociais na formação modo de produção
capitalista. Nesta lógica, o sistema punitivo acompanha o desenvolvimento da sociabilidade
burguesa e o Estado tenta manter através do controle penal repressivo os grupos
subalternos, denominado “classes perigosas”. Dentro deste contexto, observa-se que
punição e produção são algo característico de um processo neoliberal e que a crise do

10
sistema prisional só serve para fomentar a privatização e terceirização. Com isso, “a política
criminal atende aos interesses dos neoliberais” (SILVA, 2016, p.16).
Nessa direção, as empresas vêm assumindo as ideias neoliberais, incorporando o
processo de privatização, caracterizando o controle da pobreza operado através do sistema
penal. Nesta lógica, entende-se que a política estatal assume a função do Estado penal
máximo para punir a classe pobre, pois, lucra-se com as prisões.
Conclui-se que a relação cárcere e mercado de trabalho têm colocado para a sociedade
como estratégia para privatizar os presídios brasileiros, uma vez que as prisões têm se
tornando um sistema fabril do século XXI. Logo, o preso vem tendo a função de valor de uso
(mercadoria), obviamente pertencerá ao capitalista, através do mercado privado de
segurança.
Por fim, é preciso pensar para além das prisões, considerando que a lógica capitalista
para a “classe perigosa” que está fora do mercado de trabalho será o controle penal em
nome do medo/insegurança e com isso, vende-se segurança através da intensificação da
força repressora do Estado.
Contundo, o encarceramento em massa se torna o principal meio punitivo no modo
de produção capitalista. Além disso, o aprisionamento vem crescendo e a pena de prisão
passa a ser um mecanismo do Estado penal x Estado social. Por isso, Todavia, o
enriquecimento privado do lado x empobrecimento social do outro. Assim, pensar numa
sociedade sem prisões, é pensar em uma sociedade para além do capital.
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