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Com o advento da pandemia de Covid-19 as mulheres trabalhadoras têm sido expostas a um papel
ainda mais intenso no cuidado. Embora o avanço do vírus afete a todos, a pandemia não se manifesta
da mesma forma para os diferentes grupos e classes sociais. Deste modo, as mulheres podem ser
consideradas o grupo social mais afetado pela pandemia, uma vez que constituem o grupo majoritário
dos empregos mais precários ou informais, estando obrigadas ainda a fazer as tarefas do cuidado de
casa, da economia doméstica, dos filhos e a prezar pela saúde de todos. Dito isso, o objetivo deste
trabalho é verificar como a pandemia vêm atingindo a classe feminina brasileira, além de trazer à lume
discussões acerca da desigualdade de gênero no país. Para tanto, a metodologia utilizada foi a de
revisão utilizada, com a utilização de artigos científicos, estudos acerca da desigualdade de gênero,
bem como dados contidos no estudo realizado pelo IBGE em 2018. Verificou-se que a classe feminina
merece cuidados especiais neste momento tão delicado causado pela pandemia, além de que a
existência de machismo estrutural presente na sociedade dificulta os avanços na luta por igualdade.
Por fim, os governos, bem como a esfera pública e social devem tomar providências a fim de diminuir
esse impacto sofrido pela classe.
ABSTRACT
With the advent of the Covid-19 pandemic, working women have been exposed to an even more
intense role in care. Although the spread of the virus affects everyone, the pandemic does not manifest
itself in the same way for different groups and social classes. In this way, women can be considered
the social group most affected by the pandemic, since they constitute the majority group of the most
precarious or informal jobs, being still obliged to do the tasks of caring for the home, the domestic
economy, children and cherish everyone's health. That said, the objective of this paper is to verify how
the pandemic has been affecting the Brazilian female class, besides bringing to light discussions about
gender inequality in the country. For that, the methodology used was the review used, with the use of
scientific articles, studies on gender inequality, as well as data contained in the study carried out by
IBGE in 2018. Finally, it was found that the female class deserves special care in this delicate moment
caused by the pandemic, in addition to the fact that the existence of structural machismo present in
society hinders progress in the fight for equality. Finally, governments, as well as the public and social
spheres, must take steps to reduce this impact suffered by the class.
1 INTRODUÇÃO
2 DESENVOLVIMENTO
Sendo assim, compreende-se que mesmo com a crescente atuação das mulheres nas
arenas públicas, sobretudo nos espaços relacionados à cultura, à educação, à política e ao
mercado de trabalho, ainda há uma luta árdua pela frente a fim de se conseguir a plenitude da
igualdade almejada entre homens e mulheres.
Durante muito tempo os homens eram os detentores do saber, das tomadas de
decisões, dos espaços políticos e da voz na sociedade, ao passo que as mulheres eram
submissas a seus maridos, sem garantias de muitos direitos, sem oportunidades iguais de
trabalho, sendo fadadas aos encargos provenientes das tarefas domésticas e aos cuidados dos
filhos.
Esse panorama foi sendo mudado com o surgimento das lutas sociais almejando
condições igualitárias entre os gêneros. Com isso, os papeis das mulheres na sociedade foram
se modificando, de modo que as oportunidades que anteriormente eram concedidas apenas aos
homens, passaram a ser também concedidas às mulheres.
Questões ligadas à desigualdade dos gêneros geram grande repercussão, pois ainda
há muitas transformações que merecem ser realizadas para que seja erradicada da sociedade
atual. Os embates travados entre a cultura mais conservadora e aquelas mais progressistas só
serão solucionados com a destradicionalização nas percepções de gênero.
Ou seja, significa dizer que para que seja exterminada essa predominância masculina
sobre a feminina, configurando o machismo existente na sociedade, necessário se faz
aumentar a força do movimento feminista no país, por ser a mola propulsora para avanços e
transformações nas questões de gênero.
Como o tema é permeado de grandes e relevantes discussões, a fim de que o objetivo
do presente trabalho não se perca, o recorte na questão de desigualdade de gênero se dará no
que diz respeito à sobrecarga de trabalho doméstico comumente evidenciada pelas mulheres.
Diante disso, no tópico seguinte será abordado com mais especificidade acerca do
assunto, de modo a evidenciar como as mulheres enfrentam a sobrecarga de trabalho
doméstico e oneração de suas responsabilidades.
Em outras palavras, significa dizer que por muito tempo as mulheres foram
encarregadas de cuidar do lar e dos filhos, enquanto os homens proviam o sustento da família
financeiramente falando.
Deste modo, os espaços públicos e as outras esferas eram predominantemente
dominadas pelos homens, ao passo que as mulheres assumiam a responsabilidade de cuidar do
lar e educar s filhos.
Mister salientar que mesmo as mulheres tendo como obrigação gerir os interiores dos
lares, elas eram subordinadas às ordens e aos comandos dados pelos maridos, uma vez que
autonomia não era um direito das esposas. Entretanto, a partir do momento em que o trabalho
doméstico passou a ser como atividade de trabalho, tanto quanto o trabalho profissional,
caminhos foram abertos para pensar em termos de “divisão sexual do trabalho”.
Nesse sentido, explica Hirata e Kergoat (2007, p. 32) que “divisão sexual do trabalho
é fruto da divisão social estabelecida nas relações sociais entre os sexos, divisão essa
modulada histórica e socialmente e instrumento da sobrevivência da relação social entre os
sexos”.
Cabe ressaltar que sempre se atribuiu às mulheres a esfera reprodutiva, ao passo que
aos homens, a esfera produtiva, motivo pelo qual essa relação entre os sexos reproduziu
concomitantemente as desigualdades de papeis e funções na sociedade. Com isso, “as relações
sociais entre os sexos se apresentam desiguais, hierarquizadas, marcadas pela exploração e
opressão de um sexo em contraponto à supremacia do outro” (SOUSA; GUEDES, 2016, p.
125).
Essa divisão do trabalho que se estabeleceu entre os sexos, garantiu os cuidados do
lar à mulher, função esta, quando não invisível, tida como de pouco valor social, ao passo que
aos homens fora garantida a produção material, tarefa considerada de prestígio e que confere
poder dentro da sociedade.
Neste diapasão, revela-se que essa desigualdade evidenciada na divisão do trabalho
se deu especialmente dentro da sociedade capitalista, histórica e culturalmente, já que sempre
“coube à mulher a responsabilidade pelos cuidados com a casa e com a família,
independentemente de sua idade, condição de ocupação e nível de renda” (SOUSA;
GUEDES, 2016, p. 125).
O discurso que pode ser visto até hoje é de que as mulheres possuem naturalidade
feminina para o cuidado, por isso a elas incumbiam o dever de desempenhar as atividades
domésticas.
Ocorre que essa atribuição social de cuidado feminino, limitou a vida das mulheres
ao espaço privado e, posteriormente, com as transformações socioeconômicas e a busca de
independência feminina, evidenciou desvantagens em relação aos homens na atuação
econômica e social.
Com a inserção das mulheres no mundo econômico, as funções atribuídas aos sexos
não se equilibraram, pelo contrário, reforçou as desvantagens vividas pelo sexo feminino, que
compartilham com os homens, de forma quase unânime, o sustento financeiro da família,
além de ainda possuir a responsabilidade da esfera reprodutiva.
Mesmo com as conquistas cada vez mais visíveis no âmbito público, a revolução
ainda é incompleta, já que as mulheres ainda assumem praticamente sozinhas as atividades do
espaço privado, o que acentua ainda mais a desigual e desfavorável divisão sexual do trabalho
para elas (SOUSA; GUEDES, 2016).
De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em um
estudo realizado no ano de 2018 denominado “Estatísticas de Gênero: Indicadores sociais
das mulheres no Brasil”, as mulheres ainda sofrem muito com a desigualdade de gênero
enfrentada na sociedade.
A seguir, com base nesse estudo, serão expostos os resultados nele obtidos para
confirmar como a desigualdade dos gêneros ainda é muito presente na contemporaneidade.
Homens Mulheres
Total 10,5 18,1
Branca 10,4 17,7
Preta ou parda 10,6 18,6
Fonte: Elaborado pelas autoras com base nos dados do IBGE (2018).
De acordo com o IBGE (2018), verificou-se que os homens, no geral, despendem de
seu tempo 10,5 horas semanais no desenvolvimento de afazeres domésticos e/ou cuidados de
pessoas; ao passo que as mulheres despendem de 18,1 horas semanais de seu tempo
desempenhando as mesmas funções.
Ainda, verifica-se que homens e mulheres brancos em relação aos homens e
mulheres pretos/pardos despendem de um tempo menor, qual seja: 10,4 horas semanais para
homens brancos e 17,7 horas semanais para mulheres brancas, enquanto homens
pretos/pardos gastam 10,6 horas semanais e mulheres pretas/pardas 18,6 horas semanais.
Através desse resultado, é notável o quanto mulheres se sobrecarregam mais em
trabalhos domésticos e cuidados do que os homens. Essa sobrecarga é ainda maior quando se
refere ao grupo de pessoas pretas/pardas.
Essa diferenciação também atinge outros recursos, como demonstrado na tabela
abaixo:
Tabela 02: Rendimento habitual médio mensal de todos os trabalhos - 2016
Homens Mulheres
R$ 2.306,00 R$ 1.764,00
Fonte: Elaborado pelas autoras com base nos dados do IBGE (2018).
Verifica-se com a informação acima que ainda existe uma desigualdade no que diz
respeito aos salários recebidos por ambos os sexos. Conforme depreende-se da tabela 02,
homens recebem, em média, 23,5% a mais do que as mulheres para desempenhar as mesmas
funções.
Nota-se que na tabela 02 não foi realizado um levantamento acerca da diferença
salarial entre homens e mulheres no que diz respeito aos aspectos raciais, como fora realizado
na tabela 01, por isso, a análise acaba se tornando limitada nesse ponto. Entretanto, é evidente
que as mulheres ainda lutam para conseguir a equidade salarial com relação aos homens.
Tabela 03: Educação – População de 25 anos ou mais de idade com ensino superior
completo – 2016
Homens Mulheres
Branca 20,7% 23,5%
Preta ou parda 7,0% 10,4%
Fonte: Elaborado pelas autoras com base nos dados do IBGE (2018).
Tabela 04: Educação – Taxa de Frequência escolar líquida ajustada no ensino médio
(pessoas no nível de ensino adequado à faixa etária) – 2016
Homens Mulheres
63,2% 73,5%
Fonte: Elaborado pelas autoras com base nos dados do IBGE (2018).
No que diz respeito à educação, o IBGE (2018) demonstrou que existem mais
mulheres com curso superior completo. Nota-se que nesse quesito fora realizada a análise
racial, no qual fora constatado que, enquanto 20,7% dos homens brancos possuem curso
superior completo, apenas 7,0% dos pretos ou pardos conseguem realizar esse feito.
Com relação ao sexo feminino, notou-se que 23,5% das mulheres brancas possuem
curso superior completo, enquanto apenas 10,4% de mulheres pretas ou pardas possuem o
mesmo grau de escolaridade.
Já no que diz respeito à educação de nível médio, a tabela 04 demonstra que é
composta por 73,5% de mulheres e de 63,2% de homens, não sendo, também, feito o
levantamento quanto às questões raciais.
Ainda, o estudo do IBGE (2018) realizou um levantamento acerca da vida pública e
tomada de decisão, conforme observa-se na tabela 05 abaixo transcrita.
Tabela 05: Vida pública e tomada de decisão – Representação política - 2017
Homens Mulheres
89,5% 10,5%
Fonte: Elaborado pelas autoras com base nos dados do IBGE (2018).
Fonte: Elaborado pelas autoras com base nos dados do IBGE (2018).
Conforme corrobora-se na tabela 05, 10,5% dos assentos da câmara dos deputados
são ocupados por mulheres. Essa discrepância não faz o menor sentido, quando se contempla
os outros dados discutidos anteriormente, no qual constatou-se que as mulheres são maioria
nas universidades e nas escolas. No mundo, as mulheres ocupavam 23,6% dos assentos em
2017 (IBGE, 2018).
A realidade é que os cargos de alto escalão sempre foram ocupados por homens,
pois, como já dito anteriormente, eram eles que possuíam o direito de participarem da esfera
pública, ao passo que as mulheres ficavam a cargo dos deveres a serem desempenhados nos
lares, isto é, na esfera privada.
Além disso, em 2016, no que diz respeito aos cargos gerenciais, os resultados não
são diferentes daqueles já vistos acima. Na tabela 06, constata-se que 60,9% deles eram
ocupados por homens e 39,1% por mulheres.
Através da pesquisa e dos dados apresentados, percebe-se que o período que as
mulheres estiveram restritas ao espaço domésticos, tendo seu direito de interagir nos espaços
políticos e nas questões sociais cerceados, acarretam até os dias atuais grandes desigualdades
entre os sexos masculino e feminino.
Ainda, conforme observou-se na tabela 01, a sobrecarga enfrentada pelas mulheres
no que diz respeito aos afazeres domésticos ainda continua predominantemente latente na
realidade feminina.
Ainda, no quesito educação constatou-se que no Brasil existem mais mulheres que
possuem curso superior e estão cursando o nível médio do que os homens e, mesmo assim,
ocupam menos cargos políticos e gerenciais do que os homens e, quando exercem, ainda
encontram a disparidade no quesito salarial.
As conquistas feministas ao longo do tempo foram de grande valia para que os
direitos das mulheres fossem sendo exercidos por elas, mas ainda há um grande caminho para
que a igualdade de gênero em todos os setores, não somente nesses apresentados pela
pesquisa do IBGE, seja alcançada.
Como é sabido, com o advento da pandemia de Covid-19 essas questões de
desigualdade de gênero ficaram ainda mais evidentes. As mulheres que, como constatado,
sofrem com a sobrecarga de trabalho doméstico, ainda precisam enfrentar as dificuldades
ocasionadas pela pandemia. Por isso, no próximo tópico serão discutidos os impactos trazidos
pela pandemia às mulheres no ano de 2020, voltando-se à perspectiva do trabalho doméstico e
como o movimento feminista atinge diferentemente os grupos femininos.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com os dados apresentados nas pesquisas citadas no presente artigo, viu-
se que ainda é muito existente um machismo estrutural na sociedade brasileira. Ainda ficou
demonstrado que as mulheres desempenham mais atividades domésticas do que os homens, o
que acabam por sobrecarregá-las de obrigações e responsabilidades.
No que tange o trabalho doméstico, evidenciou-se que as mulheres que precisam
trabalhar foram muito atingidas pela pandemia, já que não podem cumprir as medidas de
isolamento recomendadas pela OMS ficando ainda mais vulneráveis, uma vez que o privilégio
de poder ficar em casa não abarca a todas.
Entretanto, para solucionar esse problema, necessário, primeiramente combater os
dogmas do patriarcado ainda vigentes, o machismo estrutural para que a desigualdade de
gênero seja superada, bem como o investimento do governo federal, da esfera privada e da
sociedade, através de um esforço comum, para garantir às mulheres vulneráveis pelas medidas
drásticas de isolamento maior apoio e estrutura.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
COUTO, Márcia; SCHRAIBER, Lilia. Machismo hoje no Brasil: uma análise de gênero das
percepções de homens e mulheres. 2013. 47-61 p. Disponível em:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/937202/mod_resource/content/1/COUTO%20e
%20SCHRAIBER%20Machismo%20hoje%20no%20Brasil%20.pdf. Acesso em 09 jul. 2020.