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CAPÍTULO I

Ben-Sira (C. 190-170 AC)

UM FORTE ESPÍRITO de amor pela nação respira em alguns capítulos de Ben-Sira. A maior parte de
seu livro ainda está repleta do mesmo espírito universalista e amplamente humanitário que encontramos
em Provérbios, Jó e Eclesiastes, a tal ponto que os Judeus, como uma nacionalidade separada, quase não
têm lugar neles. Mas às vezes surge repentinamente em Ben-Sira, enquanto ele está estabelecendo amplos
preceitos éticos ou bons conselhos para viver, que não seriam relevantes para uma nação sozinha - uma
consciência do status peculiar de Israel entre as nações; e o zelo por sua nação arde como fogo em seu
coração. Assim, por exemplo, no Capítulo 35, enquanto está falando do "clamor dos pobres", isto é, do
indivíduo oprimido, que rasga as nuvens e "não descansa até que alcance" a Deus, e "não removerá até
que Deus visite e o justo Juiz execute o julgamento", ele repentinamente se volta para a nação oprimida,
que também clama pela intensidade de suas aflições e busca a justiça:

Sim, Deus não tradará, e como um guerreiro não se contem, até que golpeie os lombos dos impiedosos, e
sobre as nações recompensa a vingança; até que despoje o cetro do orgulho, e o cajado dos ímpios
totalmente cortado; (252-253) até que pleiteie a causa de seu povo, e os alegra com sua salvação (35:22-25).

Se a referência é a um tempo próximo ou distante, é difícil decidir. Mas existe aqui um selo
Messiânico. Isso é novamente mostrado pelo versículo a seguir:

Salvação (é apropriada) na hora da aflição, como nuvens de chuva na estação da seca (35:26).

Este solene versículo (em Siríaco começa, "seus inimigos serão envergonhados") mostra que também
nos versículos anteriores não se vê uma descrição do presente, mas uma visão do Século Vindouro. E
seguindo este versículo vem o Capítulo 36, metade do qual é a famosa oração da esperança de Ben-Sira,
completamente cheia de expectativas Messiânicas:

Salva-nos, ó Deus de todos, e (espalha) teu temor sobre todas as nações. Agite (Tua mão) contra os
povos estrangeiroas, para que vejam o teu poder. Assim como diante dos seus olhos mostraste em nós a
tua santidade, assim também, à nossa vista, mostra neles a tua grandeza; Que reconheçam, como
também nós reconhecemos, que fora de ti, Senhor, não há outro Deus. Renova os teus prodígios, faz
novos milagres, glorifica a tua mão e o teu braço direito, acende o teu furor e derrama a tua ira; destrói
o adversário e aniquila o inimigo. Apresse o fim e determine o tempo designado, Pois quem pode dizer a
Ti: “O que fazes Tu?" Seja consumido no fogo da ira o sobrevivente, e caiam na ruína aqueles que
maltratam o teu povo. Esmaga a cabeça dos chefes inimigos que dizem: «Não há ninguém como nós!»
Reúne todas as tribos de Jacó, toma-as como tua herança, como no princípio. Tem piedade, Senhor, do
teu povo, que foi chamado pelo teu nome, e de Israel, que trataste como filho primogénito. Tem piedade
da cidade do teu santuário, de Jerusalém, lugar do teu repouso. Enche Sião do louvor das tuas
maravilhas, e o teu povo com a tua glória. (254) Dá testemunho a favor daqueles que, desde o princípio,
são tuas criaturas, leva a efeito as profecias, em teu nome proferidas. Recompensa os que pacientemente
esperam em ti, a fim de que os teus profetas sejam acreditados. Ouve, Senhor, a súplica dos teus servos,
segundo a bênção de Aarão sobre o teu povo,. e todos sobre a terra reconhecerão que Tu és Senhor, o
Deus dos séculos (Eterno) (36:1-22).

Aqui temos em linhas gerais todas as expectativas Messiânicas dos livros dos profetas e dos Salmos: a
humilhação ou mesmo a destruição dos opressores de Israel, a santificação do nome divino pela elevação
da condição humilde da nação, a realização de sinais e milagres, que é parte inseparável das obras do
Messias ("os sinais do Messias"), a reunião dos exilados, a glorificação de Jerusalém e do Templo (não
somente a sua reconstrução, visto que já existiam restabelecido no tempo de Ben-Sira), recompensa
("recompensa" no sentido de "Eis que a sua recompensa está com ele, e a sua recompensa diante dele", Is.
40:10) para os justos juntamente com a punição para os ímpios, e o cumprimento da visão dos profetas.
Somente não há nada aqui sobre o governo da casa de Davi, e não há necessidade de falar do Messias
individual. Esta última ideia está faltando em Ben-Sira, como está faltando no resto dos livros Apócrifos,
como dito acima. Mas sobre a casa de Davi e sua preservação, Ben-Sira fala várias vezes. Ao relatar as
grandes realizações políticas de Davi, e também suas reformas religiosas (segundo Ben-Sira, como
segundo o autor de Crônicas, Davi ordenou a música no Templo e também "os festivais no decorrer do
ano"), diz que como recompensa por isso, Deus lhe deu "o decreto do reino e estabeleceu o seu trono
sobre Jerusalém" (47:11); e depois de falar de Salomão e seus pecados com um excesso de mulheres, e da
divisão do reino em dois, acrescenta:
(No entanto,) Deus não abandonará sua misericórdia, nem permitará que alguma de suas palavras caia
no chão; não irá (cortar) a posteridade de seus (escolhidos), e a (descendência daqueles que o amam).
Ele não destruirá: (255) mas dará a (Jacó um remanescente), e para (Davi uma raiz dele)1 (47:22).

E como o governo da casa de Davi é um governo eterno, também o sacerdócio de Arão é eterno, de
acordo com Ben-Sira, um sacerdócio eterno:

E Ele exaltou um santo, até mesmo Arão da tribo de Levi, e fez dele uma ordenança eterna (45:6-7).

E maias tarde acrescenta:

Antes (dele) nunca houve (tais coisas), (nunca) um estranho (os colocaria). Assim, Ele confiou (nele e)
em seus filhos, e assim sua descendência ao longo de suas gerações (45:13).

E quando fala de Simeão, filho de Joanã, o Sumo Sacerdote, conclui seu elogio com estas palavras:

Que sua misericórdia seja estabelecida com Simeão, e que Ele eleve para ele a aliança de Finéias; que
ninguém seja cortado dela, e quanto à sua semente, que seja como os dias do céu (50:24).

Ben-Sira acredita, portanto, na perpetuidade do sacerdócio entregue à semente de Arão e à casa de


Zadoque, assim como acredita na perpetuidade do reino entregue à casa de Davi. Isso é ainda mais
surpreendente, na medida em que Ben-Sira é um crente em uma república teocrática, como o era antes o
profeta Oseias, e suas opiniões sobre a realeza são semelhantes às que os Antigos Profetas atribuem ao
profeta Samuel: "Acima de todos as nações Ele nomeou governantes" (ou, de acordo com o texto Grego:
"Para cada nação Ele designou governante"), "mas a porção de Deus é Israel” (Ben-Sira, Siríaco e
Grego, 17:17). A crença no trono de Davi e no sacerdócio de Arão já havia se enraizado na nação, e Ben-
Sira acreditava em ambos igualmente e em sua preservação até o futuro. Então, é claro, que os dois várias
vezes aparecem juntos em seu livro. Quando fala de Finéias, o zeloso, diz:
(256)
Portanto, também para ele, Ele estabeleceu uma ordenança, uma aliança eterna para manter o
santuário; isso para ele e para sua semente pertencerá o sumo sacerdócio para sempre. Além disso, sua
aliança era com Davi, o filho de Jessé, da tribo de Judá; uma herança de fogo perante a sua glória,
enquanto a herança de Arão pertence a todos os seus descendentes (45:24-25).

O último versículo [duas linhas] de acordo com a versão Siríaca é: "A herança de um rei somente ele
herdou, enquanto a herança de Arão pertence a todos os seus descendentes." E de acordo com a versão
Grega: “A herança do filho do rei é somente do filho” (talvez uma alteração Cristã), ou, de acordo com a
leitura de Levi Israel em seu texto Hebraico com base no Grego: “A herança do rei é apenas de seu filho."
Existem alguns que lêem "a herança de um homem (îsh)" em vez de "uma herança de fogo (êsh)". Seja
como for, o significado aqui não é que a realeza da casa de Davi pertence somente a Davi ou a seu filho,
as que, como princípio geral, a realeza é uma coisa que o filho recebe pela autoridade de seu pai (e todos
os descendentes de Davi pela autoridade de Davi), enquanto o sacerdócio foi entregue a Arão e a todos os
seus filhos - toda a sua semente - "como uma herança diretamente de Deus”. 2 Já vimos que Ben-Sira
pronuncia uma invocação em Simeão, filho de Joanã, que Deus "levantará para ele a aliança de Finéias".
Em outra passagem ainda, Davi e Arão aparecem lado a lado: no "ações de Graças", que vem depois
da oração de Ben-Sira no Capítulo 51, e que não está nem na versão Grega, nem na Siríaca. Depois de
"Dá graças àquele que fez brotar um chifre para a casa de Davi, porque a sua misericórdia dura para
sempre", vem: "Dai graças àquele que escolheu os filhos de Zadoque para serem sacerdotes, porque a sua
misericórdia dura para sempre" (51:12, versículos suplementares viii e ix). Que depois da queda política e
religiosa dos Zadoquitas na época dos decretos de Antíoco, quando os Asmoneus os substituíram como
sumos sacerdotes e governantes temporais, teria sido (257) impossível encontrar alguém que teria
acrescentado um versículo sobre o status preferencial dos filhos de Zadoque ao texto Hebraico - isso está
claro. Portanto, é necessário supor que todas essas "ações de graças" foram omitidas pelos tradutores,
Grego e Siríaco, porque este versículo sobre os filhos de Zadoque lhes pareciam estranhos; especialmente
porque todo o resto dessas "ações de graças" também não estava de acordo com o espírito do tradutor
Grego (de quem o transator Siríaco derivou sua tradução), um espírito próximo ao dos Helenistas
posteriores ou dos Saduceus conservadores.
Aqui, nestas ações de graças, há muito das Dezoito Bênçãos (Shemoneh Esreh) e das bênçãos que as
precedem (não há nenhuma bênção dAquele "que vivifica os mortos"), incluindo a maioria das
expectativas Messiânicas: "Dai graças àquele que reúne os rejeitados de Seu povo Israel" - a reunião de
exilados; “Dai graças àquele que edifica a sua cidade e o seu santuário” - a reconstrução de Jerusalém e
do Templo depois da primeira destruição; "Dai graças àquele que faz brotar um chifre para a casa de
Davi" - Messias, filho de Davi; “Dai graças ao Redentor de Israel” - a idéia da redenção em sua
totalidade; "Dai graças àquele que escolheu os filhos de Zadoque para serem sacerdotes" - pela eternidade
do serviço no Templo e do sacerdócio de Arão; "Dai graças àquele que escolheu Sião" - a restauração de
Sião (51:12, versículos suplementares v-ix, xiii). Aqui temos a substância e a maior parte das expectativas
Messiânicas mais importantes (exceto a personalidade do Messias).
Mas há em Ben-Sira ainda outra importante expectativa Messiânica: a chegada de Elias na era
Messiânica. Depois de uma descrição poética maravilhosa e elevada da vida, caráter e feitos poderosos de
Elias, Ben-Sira diz, em alusão ao final do Livro de Malaquias (3:23-24 Eng. 4:5-6):

Que estão escritos como prontos para o tempo, para acalmar a ira perante (raiva feroz), para converter
o coração dos pais aos filhos, e para restaurar as tribos (de Israel) (48:10).

Aqui temos a crença Talmúdico-Midrasica no profeta Elias, que vem como o arauto do Messias, como
um criador da paz entre (258) famílias, e como o ajuntador das tribos de Israel dos quatro cantos da terra.
E junto com a crença na eternidade do sacerdócio e do reino da casa de Davi, encontramos aqui uma
forte fé na eternidade de todo o povo de Israel:

A vida de um homem leva poucos dias, mas a vida do povo de Israel é de dias incontáveis (37:25).

Ben-Sira reconhece não só a eternidade do povo de Israel, mas também sua condição de Povo Eleito,
em sua expectativa espiritual de que será uma luz dos Gentios, e também em sua expectativa política de
que se espalhe por todo o mundo, literalmente ou pela influência de seu ensino. Quando fala sobre Abraão
e a prova (Ben-Sira chama de "prova") que Abraão suportou, junta-se ao Pentateuco com os Profetas, 3 e o
povo de Israel com o Messias, dizendo:

Portanto, com um juramento que Ele lhe prometeu, para abençoar as nações em sua semente; para fazer
com que eles herdem de um mar a outro, e do Rio até os confins da terra (44:21).

Da mesma forma, a Sabedoria [personificada], que é retratada no Livro de Ben-Sira com fervor ainda
maior do que em Provérbios, terá "uma morada em Jacó e se estabelecerá em Israel". “No santo
tabernáculo” ela ministra perante Ele, ela é “estabelecida em Sião, na cidade amada de seus pais”, e
Jerusalém é “a cidade de sua autoridade”. Ela "se enraizou entre um povo honrado, na porção do
SENHOR e da sua herança, Israel"; e ela está presente no "livro da aliança do Deus Altíssimo", na "Lei
que Moisés ordenou como herança para as assembleias de Jacó" (24:8, 10-12, 23, de acordo com as
versão Siríaca e a Grega).
Esta é a visão profética junto com todas as suas expansões no Hagiógrafa. Nada de novo será
encontrado aqui, mas o pouco que é encontrado testemunha a vitalidade da ideia Messiânica na época de
tempestade que precedeu o levante Asmoneu.

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