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Regulação dos portos no Brasil:

evolução e perspectivas

Eduardo Augusto Guimarães


02/09/2013
Antecedentes da reforma de 1993

 Base legal: decretos de 1934 (antes: concessão regulada por lei de 1869)
 Sistema portuário basicamente estatal
 prevista exploração (não construção) do portos por Estados ou entidades
privadas – sem consequências
 participação do setor privado restrita a instalações portuárias para uso
próprio — movimentação de cargas de terceiros apenas em casos de
congestionamento nos portos organizados e previamente autorizada (a
partir de 1966 e 1969)
 Gestão centralizada - Portobrás (a partir de 1975)
 Regulamentação extremamente rígida das relações de trabalho na atividade
portuária
 contratação reservada a “operários estivadores, ...de preferência
sindicalizados”, matriculados, com regulação da demanda, oferta e preço
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O processo da reforma portuária

 Etapas
o abril de 1990 - extinção da Portobrás
o fevereiro de 1991 - de projeto de lei
o fevereiro de 1993 – aprovação da Lei 8.630

 Forte resistência à reforma: correntes ideológicas favoráveis ao controle estatal


e grupos de interesses afetados.

 Lei dos Portos - focos principais:


 menor presença do Estado no sistema portuário, com transferência da
exploração dos portos para o setor privado > induzir investimento e melhorar
gestão; e
 flexibilizar as normas sobre relações de trabalho < principal fonte de
ineficiência e custos elevados na atividade portuária

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Lei 8.630: participação do setor privado no sistema portuário

 NO PORTO ORGANIZADO (em terreno do qual União é titular do domínio útil):

 Administração do Porto: União ou concessionário


 arrendatário de terminal de uso público com gestão privada

 operador portuário - pessoa jurídica pré-qualificada junto à Administração do Porto,


responsável pela movimentação / armazenagem de mercadorias

 EM TERRENO DO QUAL ENTE PRIVADO É TITULAR DO DOMÍNIO ÚTIL:

 autorizatário de terminal de uso privativo (TUP), o qual pode assumir duas modalidades:
o exclusivo, para movimentação de carga própria;
o misto, para movimentação de carga própria e de terceiros
 A lei não estabelece qualquer restrição, quanto à quantidade ou à proporção de cargas
próprias e de terceiros a serem movimentadas no terminal misto
 Os órgãos responsáveis pela regulação da atividade portuária também não impuseram
nenhuma restrição à criação e operação TUP mistos

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Lei 8.630: regulamentação das relações de trabalho

 NO PORTO ORGANIZADO

 O trabalho portuário executado por


 trabalhadores portuários com vínculo empregatício a prazo indeterminado e
 trabalhadores portuários avulsos.
 Contratação dos primeiros exclusivamente dentre os trabalhadores avulsos..
 Fornecimento da mão-de-obra administrado por um órgão de gestão de mão-de-
obra do trabalho portuário - OGMO, constituído pelos operadores portuários

 NO TUP

 autorizada a contratação de trabalhadores a prazo indeterminado,


 mas instalações existentes devem manter a proporção entre trabalhadores com
vínculo empregatício e trabalhadores avulsos/

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Problemas da Lei dos Portos que afetaram o novo modelo

 Heranças do regime anterior e necessidade de acomodar interesses afetados:


 flexibilização significativa, mas apenas parcial das normas relativas ao porto
organizado
 preservação de nomenclatura e conceitos: carga de uso próprio X carga de
terceiros e modalidades exclusivo X misto
o diferenciação entre carga própria e de terceiros não tem nenhuma
funcionalidade, a não ser estabelecer o critério de distinção entre as duas
modalidades
o não existe na lei nenhuma distinção entre as duas modalidades

 O caráter pioneiro da Lei:


 antecedeu o novo arcabouço legal do regime de concessão (Lei 8.987/95) e a
criação das agências reguladoras do setor (Lei 10.233/01)
 por isso, criou seu próprio marco regulatório: a função de regulação, em alguns
casos, permanece vaga e, em outros, está referida à órgão existentes ou a
entidades criadas pela lei (Administração do Porto e CAP)
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A implementação incompleta do novo modelo

 As Administrações dos Portos não foram transferidas para o setor privado


 em 1996, o Governo Federal incluiu as Docas e os portos
correspondentes no Programa Nacional de Desestatização,
 essa decisão não foi implementada
 em 2008, a decisão foi revertida por decreto que excluiu as Docas do
PND.

 A manutenção das Docas na Administração dos Portos acarretou:


 continuidade dos problemas de gestão empresarial e da politização da
administração portuária
 volume de investimento insuficiente para atender à expansão do
comércio exterior do país.

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Investimento das Companhias Docas – 2002 e 2008-2012

1904ral

1903ral
1903ral

1903ral

1902ral
1902ral

1902ral
1902ral
1901ral
613
1901ral

29%
1901ral
28% 36%
1900ral 29%
177,1141767
1900ral
47%

1900ral
1905ral 1905ral 1905ral 1905ral 1905ral 1905ral 1905ral 1905ral 1905ral 1905ral 1905ral

Dotação (R$ milhões) Investimento realizado (%)

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Participação dos terminais de uso privativo na movimentação de carga

 disseminação significativa de TUPs de graneis líquidos e sólidos


 expansão de TUPs de carga geral (e contêineres) menos expressiva
 em meados da década passada, interesse crescente de investidores por projetos de
infraestrutura no Brasil se reflete em projetos de investimento em TUPs, sobretudo de
contêineres
90%

77% 79%
80%
69%
70% 66%

60%

50%

40% 36%

30%

20%
18% 18%

10%
1%
0%
Graneis líquidos Graneis sólidos Carga geral Conteiner
2005 2012

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Concorrência e insegurança jurídica

 2005: norma da ANTAQ: pleito de autorização de TUP deve especificar movimentação


anual mínima de cargas próprias que justifique, por si só, a implantação; esse
quantitativo constitui obrigação cujo descumprimento acarreta multa
 Resolução questionada junto a ANTAQ > no processo, o Procurador-Geral da
Agência se manifestou pela eliminação da restrição > a resolução não foi
reformulada, mas o questionamento permaneceu em aberto.

 abril de 2008: ABRATEC propôs, ao STF, uma Arguição de Descumprimento de Preceito


Fundamental – ADPF, requerendo que
o movimentação de cargas de terceiros sejam realizadas primordialmente por meio
de instalações portuárias de uso público;
o TUPs realizem a movimentação de cargas de terceiros apenas de modo acessório
ou secundário
 STF não se pronunciou ainda quanto ao mérito
 A incerteza jurídica provocada por essas duas iniciativas manteve em suspenso os
projetos em fase de elaboração e implantação.
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A contra reforma de 2008
 O Executivo arbitra a controvérsia jurídica em favor dos terminais de contêineres de uso
público.
 Decreto 6.620, de outubro de 2008, incorpora a Resolução ANTAQ e a tese defendida pela
ABRATEC:
 instalações portuárias de uso privativo: movimentação preponderante de carga própria
e, em caráter subsidiário e eventual, de terceiros, em TUP misto
 carga própria: deve justificar por si só, técnica e economicamente, a implantação e a
operação da instalação portuária
 carga de terceiros: limitada àquelas com as mesmas características de armazenamento
e movimentação, e a mesma natureza da carga própria; sua operação deve ser eventual
e subsidiária
 Consequências:
 dificulta a implantação de TUPs mistos em geral e Inviabiliza a implantação de TUPs de
contêineres > constitui barreira à entrada e afeta a concorrência
 os projetos em novos terminais que permaneciam em suspenso em função da incerteza
jurídica foram finalmente abandonados
 Memo: decreto de 2008 excluiu as Docas do PND
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O significado da MP 595 / Lei 12.815

 MP 595: revoga e reescreve a Lei 8.630 > promove, na verdade, a sua restauração,
reafirmando as principais preocupações presentes em 1993
 inclui entre suas diretrizes maior participação do setor privado e o estímulo à
concorrência
o mantém a possibilidade de concessão da Administração dos Portos ao setor
privado
o elimina as barreiras à implantação de novos TUPs introduzidas pelo decreto
6.620
 avança (pouco) na flexibilização das relações de trabalho.
o remove a exigência dos TUPs já existentes em 1993 manterem a proporção entre
trabalhadores a prazo indeterminado e avulsos então observada.
 A tramitação da MP 595 suscitou, como sua antecessora, forte oposição de grupos de
interesse afetados
 resistência acarretou a incorporação ao texto aprovado pelo Congresso de
emendas que afetavam o propósito da MP de restaurar a Lei 8.630
 essa emendas foram objeto de vetos da Presidência da República
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A Lei 12.815 e os TUPs

 A Lei 12.815 elimina dispositivos e conceitos da Lei 8.630 cuja ambiguidade ou falta
de definição pudessem dar origem a interpretações controversas

 Porto Organizado é caracterizado como bem público

 exploração do porto organizado e de instalações portuárias nele localizadas,


envolve a concessão e arrendamento de bem público por prazo determinado e
como tal deve ser precedida de licitação

 instalações portuárias localizadas fora da área do porto organizado [TUP], em


terreno do qual o titular do direito de uso e fruição é o ente privado, depende
de autorização, precedida de chamada e processo seletivo públicos, com prazo
prorrogável por períodos sucessivos

 Não há na Lei 12.815 qualquer referência a cargas própria e de terceiros e a


terminais exclusivos e mistos

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A autorização dos TUPs
No setor de transporte em geral (Lei 10.233) No caso dos portos (Lei 12.815)
independe de licitação será precedida de chamada ou anúncio públicos e,
quando for o caso, processo seletivo público
é exercida em liberdade de preços e em ambiente de livre e aberta competição
não prevê prazo de vigência ou termo final, prazo de até 25 anos, prorrogável por períodos
extinguindo-se pela sua plena eficácia, por renúncia, sucessivos, desde que a atividade portuária seja
anulação ou cassação mantida e investimentos necessários para expansão e
modernização realizados

 A Lei 12.815 prevê dois caminhos para a construção e exploração de novo TUP em
determinada região geográfica:
 requerimento de interessado, o qual deverá ser seguido de anúncio público
para identificar a existência de outros interessados na obtenção de autorização
na mesma região
 chamada pública pela ANTAQ para identificar a existência de interessados na
obtenção de autorização de TUP em determinada da região geográfica
 A autorização prescindirá de processo seletivo se, havendo mais de um
interessado, à implantação física de todas as propostas não gerar impedimento
operacional a qualquer uma delas.

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Ajuste do marco regulatório e o futuro das Docas

 A Lei 12.815 compatibiliza a regulação do sistema portuário ao marco


institucional e regulatório do país, revendo a Lei 8.630 e a Lei 10.213 – em
particular:
 retira da Administração do Porto atribuições típicas de regulador que
ainda subsistiam (como licitação e contratação do arrendamento)
 transforma o Conselho de Administração Portuária em conselho
consultivo

 A Lei 12.815 mantem a possibilidade de concessão da Administração dos


Portos, mas reflete o fato de que o governo não pretende recorrer a essa
alternativa:
 determina que as Cias. Docas firmem, com a Secretaria de Portos,
compromissos de metas e desempenho empresarial e que sejam
estabelecidos critérios para a profissionalização de sua gestão
 Na Lei 8.630 não há qualquer referência às Cias. Docas.
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A questão dos arrendamentos vencidos

 Cerca de 80 contratos de arrendamento firmados antes da entrada em


vigor da Lei 8.630 com prazos de vigência estão vencidos ou vencem em
2013

 A MP estabeleceu que tais contratos devem ser licitados.

 Texto aprovado pelo Congresso substituiu essa determinação por artigo


que estabelece a prorrogação automática desses contratos por período
não inferior ao prazo consignado no contrato.

 O veto presidencial a esse artigo implicou a omissão da lei sobre essa


questão, mas tornou explícita a intenção do governo de fazer valer o
prazo previsto em contrato.

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