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Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

I. JUSTIÇA EUROCOMUNITÁRIA ................................................................................................... 3

União Europeia de Direito ........................................................................................................ 4

Um Sistema Completo – perspetiva de tutela jurisdicional efetiva ....................................... 5

Tratado de Lisboa ..................................................................................................................... 5

Crise de Identidade da UE ........................................................................................................ 6

II. ESTRUTURA JUDICIÁRIA DA UNIÃO EUROPEIA ....................................................................... 7

1. Tribunal de Justiça ................................................................................................................ 8

2. Tribunal Geral ..................................................................................................................... 13

3. Tribunais Especializados ..................................................................................................... 15

DIREITO PROCESSUAL DA UE ................................................................................................. 15

Como se relaciona com o Direito Processual dos Estados-Membros? ............................... 19

III. REENVIO PREJUDICIAL ........................................................................................................... 20

Tabela de Jurisprudência Reenvio Prejudicial ....................................................................... 32

IV. CONTENCIOSO DA LEGALIDADE ........................................................................................... 36

Recurso de Anulação .............................................................................................................. 36

Recurso por Omissão .............................................................................................................. 47

Exceção de Ilegalidade ........................................................................................................... 52

V. CONTENCIOSO DO INCUMPRIMENTO ................................................................................... 55

Ação por Incumprimento ....................................................................................................... 57

VI. CONTENCIOSO DA RESPONSABILIDADE ............................................................................... 69

Responsabilidade Contratual ................................................................................................. 69

Responsabilidade Extracontratual da UNIÃO EUROPEIA ...................................................... 69

Responsabilidade Extracontratual dos ESTADOS-MEMBROS ............................................... 77

Lei 67/2007, à luz do dever de interpretação conforme com DUE .................................... 79

VII. MEDIDAS PROCESSUAIS DE TUTELA PROVISÓRIA .............................................................. 81

VIII. RECURSO DAS DECISÕES DO TG PARA O TJ ....................................................................... 89

CEDH e TEDH ............................................................................................................................... 92

BREXIT ......................................................................................................................................... 94

+ Páginas dos casos falados em aula teórica:

Regência: MARIA LUÍSA DUARTE


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I. JUSTIÇA EUROCOMUNITÁRIA

DIREITO DO CONTENCIOSO DA UNIÃO EUROPEIA estuda o conjunto das vias de Direito e os


meios processuais através dos quais se realiza esta justiça eurocomunitária, que interpreta e
aplica o Direito da União Europeia1
• Noção ampla de CUE, pois nela cabe a atuação dos Tribunais Nacionais.
• Numa noção restrita: CUE = conjunto das vias de Direito e os meios processuais através
os tribunais organicamente eurocomunitários interpretam e aplicam o DUE.

Desde a CECA que o projeto de integração europeia conta com a existência de um tribunal
permanente, dotado de jurisdição obrigatória.
➢ Instituído em 1952 como Tribunal de Justiça da CECA2, foi alargado às outras duas
comunidades em 1958, sob a designação de Tribunal de Justiça das Comunidades
Europeias (TJCE).

Sistema de justiça da UE pode ser caracterizado por 3 critérios, complementares e


interdependentes:
• Critério Orgânico – art. 13º TUE; uma instituição judicial, vários tribunais; tribunais
organicamente comunitários (por oposição aos tribunais dos Estados-membros que
coexistem com os tribunais organicamente eurocomunitários como intérpretes e
aplicadores do DUE – art. 274º TFUE)
• Critério Funcional – art. 19º/1 TUE; têm de garantir o respeito do Direito na
interpretação e aplicação de todos os princípios e normas que formam o bloco de
juridicidade da UE (que, ao mesmo tempo, legitima e limita a ação da UE no exercício
dos respetivos poderes).
o Objetivo de, mediante a intervenção de um tribunal, assegurar o respeito pela
tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pela UE. Art. 47º CDFUE – o
tribunal pode ser o TJUE, se a sua competência resultar das vias processuais
expressamente tipificadas nos Tratados, nos demais casos são os tribunais dos
Estados-membros.
o A imperatividade do princípio da tutela judicial efetiva é fonte de uma obrigação
para todos os Estados-membros, tendo de criar uma estrutura judiciária
adequada à garantia da efetividade plena do DUE.
• Critério Processual – art. 19º/3 TUE; interpretação e aplicação do DUE é no quadro das
vias de direito expressamente previstas, identificadas por referência a 3 modalidades –
recursos interpostos por Estados-membros, instituições ou particulares (vias
contenciosas diretas); processo das questões prejudiciais; outros casos previstos nos
Tratados.

Limitado pelo princípio da competência de atribuição – art. 5º/1, 2 + art. 13º/1, 2 TUE

1
Os tribunais organicamente da UE (TJ e TG) interpretam e aplicam o DUE no âmbito das competências
que estão expressamente tipificadas nos Tratados.
➢ MLD: à partida não há poderes implícitos
2
Esta instituição existe como tribunal de jurisdição obrigatória desde o Tratado de Paris (1951)

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Ao TJUE compete garantir a todos e a cada um o exercício judicial do direito invocado, no quadro
das vias processuais instituídas pelos Tratados. Se não for possível invocar o TJUE, a competência
residual pertence aos tribunais nacionais (art. 274º TFUE).

Aceção restrita: justiça eurocomunitária é assegurada pelos tribunais orgânicos da UE, através
do sistema das formas processuais instituídas pelos Tratados com vista a garantir a tutela
jurisdicional efetiva do Direito da União Europeia

União Europeia de Direito


UE é uma estrutura política de Direito
TJUE, “Os Verdes”, 23/4/86 – as comunidades europeias devem funcionar como uma
comunidade de direito.

Esta União Europeia de Direito é reafirmada no art. 2º TUE e implica uma dupla dimensão:
• SUBSTANTIVA/MATERIAL – UE está obrigada a respeitar o Direito, sob a forma de
normas adotadas pelas instituições da União competentes, normas e princípios
resultantes dos Tratados e princípios gerais de Direito.
o Vinculação normativa que sujeita e enquadra a ação da UE é (analogamente ao
Estado Soberano) a garantia da limitação jurídica do poder e da prevenção de
derivas autoritárias e anti-democráticas.
• JUDICIÁRIA – numa vertente orgânico-institucional e jurídico-processual que assegure
o ubi ius ibi remedium.
o É a vertente instrumental relativamente ao primado axiológico do direito como
“bloco de juridicidade”.
o É instrumental mas necessária, pois a cada direito há-de corresponder uma via
processual de salvaguarda adequada e vocacionada para garantir a realização
plena da tutela jurisdicional efetiva (art. 47º CDFUE).

TJUE sempre tomou como rumo “uma certa ideia de Europa”, impondo uma leitura axiológica
dos Tratados.
Configuração substancialista devido à perceção dos Tratados como uma “carta constitucional de
uma Comunidade de Direito” – Parecer 1/91 (14/12/1991) – e devido à jurisprudência relativa à
proteção dos direitos fundamentais que supriu a ausência de uma cláusula específica.

Visão de síntese sobre o papel do TJUE: desde os anos 60 até hoje, a decisão judicial foi – e
continua a ser – um instrumento privilegiado de realização e ampliação do paradigma da
União de Direito.
➢ A jurisprudência do TJUE, desde sempre que foi o motor da evolução ao interpretar as
normas dos Tratados num sentido favorável ao alargamento das competências das
instituições da UE.
➢ Houve um certo ativismo judiciário por parte do TJUE – muito premente no âmbito dos
direitos humanos e no reconhecimento de posições jurídicas aos particulares, que
podem ser opostas aos Estados ou a outros particulares.

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Um Sistema Completo – perspetiva de tutela jurisdicional efetiva


TJUE tem feito uma interpretação finalística dos Tratados com o objetivo de garantir o
funcionamento de um sistema completo e coerente de vias processuais de realização concreta
do direito.
➢ Tribunal existe com uma função utilitária: assegurar efeito útil do DUE

Os Verdes (249/83, 1986): nem os Estados-Membros nem as Instituições estão isentos da


fiscalização da conformidade dos seus atos com a carta constitucional de base que é o Tratado,
que estabeleceu um sistema completo de vias de recurso e de procedimentos destinados a
confiar ao TJUE a fiscalização da legalidade dos atos das Instituições.
Unión de Pequeños Agricultores (C-50/00 P, 2002): contrariamente ao caso Os Verdes, o TJUE
manteve o entendimento restritivo sobre o âmbito da sua jurisdição contenciosa e o direito de
recurso dos particulares contra atos de alcance geral e abstrato – interpretação restritiva do
recurso de anulação na ótica da legitimidade ativa dos particulares.
• MLD: poderia por em causa o princípio da tutela jurisdicional efetiva, mas, assim não o
é devido a uma articulação coerente entre vias diretas e indiretas de controlo da
legalidade e a uma engrenagem oleada entre o TJUE e os tribunais nacionais.
• Do caso resulta que na ausência de solução expressamente consagrada nos textos dos
Tratados, a responsabilidade pelo funcionamento coerente e sem falhas, evitando a
denegação de justiça, recai sobre o legislador nacional que tem de estabelecer vias de
recurso.

Pluralidade de Vias de Direito


➢ Alia-se ao princípio da tutela jurisdicional efetiva (art. 19º/1/§2 TUE e art. 47º CDFUE)

Perspetiva de Autonomia: garantem aos recorrentes o direito de acionar uma determinada via
processual sem que lhe possa ser oposta ressalva de recurso a outra via processual.
Perspetiva de Complementaridade: permitem ao TJUE uma leitura diferente da articulação
entre as diferentes vias processuais, avaliadas na sua função compensatória.

Tratado de Lisboa
Deu continuidade a um processo iniciado 20 anos antes, com a criação do Tribunal de Primeira
Instância, que foi seguido nos sucessivos projetos de revisão e visa:
1) Reforço dos poderes de controlo jurisdicional pela Instituição TJUE
2) Alargamento das competências do TPI, rebatizado Tribunal Geral, de modo a agilizar os
tempos de pendência judicial e dando respostas satisfatórias ao problema crónico dos
atrasos da resposta processual

Principais alterações:
• Art. 13º/1, 19º/1 TUE – Uma instituição, vários tribunais
• Art. 19º/1 TUE; Art. 256º/2, 257º/§3 TFUE– Princípio da unidade institucional do sistema
eurocomunitário de tutela com a garantia de um duplo grau de jurisdição
• Art. 255º TFUE – seleção dos membros do TJ e TG é feita com intervenção de comité
• Art. 6º/2 TUE – adesão da UE à CEDH
o Não se verificou dado o veredicto negativo do próprio TJUE – Parecer 2/13

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• Robusteceu-se o método comunitário de integração com o reconhecimento do TJUE


como uma instância de jurisdição obrigatória tanto no controlo dos atos jurídicos da UE
como no controlo do decisor nacional quando aplica DUE.
o Todo o funcionamento deveria obedecer à lógica de um pilar único, o pilar
comunitário.
o Mas,
▪ 2º Pilar: art. 24º/1, 40º TUE; art. 275º TFUE
▪ 3º Pilar: art. 67º-89º, 276º TFUE
• Alterações cirúrgicas no regime das vias processuais existentes
o Recurso de Anulação: menor exigência na admissibilidade do pedido pelos
particulares
o Ação por Incumprimento: dispensa-se a propositura de uma segunda ação para
aplicação de sanções pecuniárias no caso de incumprimento do dever de
comunicar
o Reenvio Prejudicial: esclareceu-se a competência do TJUE para interpretação
dos atos institutivos dos organismos e apreciação da validade dos seus atos
(codifica Demouche, 152/83)

Crise de Identidade da UE
Influência e visibilidade do TJUE
1ª Fase: anos 1960
➢ Jurisprudência criativa, aproveitado a evolução contínua e solar do projeto de
integração europeia, impulsionada pela prosperidade económica e estabilidade dos
Tratados

2ª Fase: pós Tratado de Maastricht (1992)


➢ Incerteza sobre o novo modelo jurídico-institucional da UE leva a uma margem mais
estreita de decisão do TJUE

3ª Fase: pós Tratado de Lisboa (2007)


➢ Põe-se fim a um longo e difícil período de desacordo entre os Estados-Membros sobre
a opção constitucional da UE e surge como oportunidade para TJUE recuperar a
autoridade passada.
➢ Tal não aconteceu e encerrado o capítulo da revisão dos Tratados, a UE enfrenta muitos
desafios quanto à capacidade de decisão das Instituições e à vontade dos Estados-
Membros de permanecerem unidos.
o O que antes era adquirido hoje é posto em causa, numa crise profunda que
abala os alicerces ideológicos, económicos, sociais e políticos da UE.
o MLD: jurisprudência do TJUE vai continuar a refletir uma interpretação sensível
aos equilíbrios políticos e institucionais dos quais depende a sobrevivência da UE
enquanto projeto de integração jurídica. TJUE não é um ator politicamente
neutro e cabe-lhe declarar o direito aplicável, com observância das boas práticas
hermenêuticas, mas sem descurar a repercussão política das suas decisões às
quais tem de permanecer atendo.

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➢ Aumentou a litigiosidade no TJUE devido a: garantia dos direitos fundamentais;


divergências entre Instituições e Estados-Membros3; aumento do Recurso de Anulação;
aumento do Procedimento Consultivo

TC Alemão fiscalizou a constitucionalidade do Tratado de Lisboa ao abrigo de assegurar a


identidade nacional.
➢ TC disse que era de acordo com a Constituição, se não violasse o núcleo identitário de
cada Estado-membro – como os limites de revisão da constitucionalidade e etc.

II. ESTRUTURA JUDICIÁRIA DA UNIÃO EUROPEIA


TRIBUNAIS DA UE
O Tribunal de Justiça foi criado com o primeiro tratado comunitário: Tratado CECA, 1951
(Tratado de Paris).
• A existência de um tribunal foi considerada necessária no quadro das duas Comunidades
(CEE e CEEA) instituídas com os Tratados de Roma de 1957.
• Primeiro Tratado de Fusão determinou que um único Tribunal exerceria as competência
que os dois Tratados de Roma atribuíram ao órgão jurisdicional e, este único tribunal,
substituiria o Tribunal criado no âmbito da CECA.

Ato Único Europeu criou Tribunal de Primeira Instância.

Tratado de Nice criou “câmaras jurisdicionais” que vieram a dar origem aos Tribunais
Especializados4.

Hoje em dia, o mote é “uma única instituição, dois tribunais”


➢ No futuro, o Parlamento Europeu e o Conselho podem rever a estratégia e criar tribunais
especializados (art. 257º TFUE) voltando ao modelo “uma instituição, vários tribunais”.
➢ Saber qual dos tribunais em concreto deve depender da aplicação das normas dos
Tratados e do Estatuto relativas à repartição de competências entre TG e TJ.

Existe uma relação de hierarquia entre os tribunais organicamente da UE: Tribunais


Especializados < Tribunal Geral < Tribunal de Justiça

As FONTES NORMATIVAS dos Tribunais são:


A. Tratados Institutivos
B. Protocolo relativo ao Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia5

3
Há posições algo entricheiradas entre Comissão e Parlamento contra Conselho e Estados-Membros: os
primeiros defendem uma leitura de bases jurídicas existentes nos Tratados que garantam à UE uma
autonomia de decisão; os segundos, ciosos das tradicionais prerrogativas de soberania dos Estados,
procuram travar o processo de comunitarização.
➢ O TJUE encontra-se no centro de uma disputa jurídico-institucional de recorte constitucional. Ex:
Parecer 3/15 deu veredicto favorável para que a UE tenha competência exclusiva em domínio de
vinculação internacional sobre propriedade intelectual e política comercial comum
4
Na UE, como tribunal especializado, apenas existiu o Tribunal da Função Pública da União Europeia entre
2004 e 2016
5
Tem o mesmo valor jurídico que os Tratados, por estar anexo a estes, ex vi art. 51º TUE

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C. Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral


D. Regulamento Adicional

Letra P nos casos = Recurso (pourvoi)


Letra R nos casos = Processo Cautelar (reféré)
Letra PPU nos casos = Procedimento de Urgência.
• Art. 267º TFUE permite que haja um processo de urgência, tendo em conta a matéria
no caso nacional.
• Dos 24 meses médio passam a 3 semanas – não há audiência dos interessados nem
pronúncia do Advoga-Geral.

1. Tribunal de Justiça
COMPOSIÇÃO
28 Juízes – 1 por cada Estado-Membro (art. 19º/2 TUE)

Função dos juízes não é a de representar o seu Estado-Membro de nacionalidade, do qual não
pode receber instruções – ele apenas representa um determinado sistema jurídico, na serventia
de o dar a conhecer e permitir, com base nesta revelação, a identificação de princípios gerais
comuns aos direitos dos Estados-Membros

Nomeação: comum acordo pelos Governos dos Estados-Membros por um período de 6 anos,
passível de renovação sem limites (art. 253º e 254º TFUE)
• São recrutados da esfera judicial, académica e diplomática
• Art. 255º TFUE – candidatos são sujeitos a um parecer, elaborado por um Comité de 7
personalidades, sobre a sua adequação ao exercício de funções.
o Introduzido com o Tratado de Lisboa, sujeita os candidatos a um escrutínio
prévio de idoneidade funcional.
o Surge por inspiração do Comité que existia, nestes termos, para o Tribunal da
Função Pública.
• Juiz Português atual é Nuno Piçarra, desde 2018

Secretário: é o próprio TJ que nomeia (art. 253º/§5 TFUE)

Presidente: escolhido pelos outros juízes por um período de 3 anos, reelegível (art. 253º/§3,
254º/§3 TFUE)
• Atual é o holandês Koen Lenaerts, desde 2015

Estatuto: tem um conjunto alargado de direitos e obrigações que visam tutelar o atributo de
independência e imparcialidade6
• Obrigações: prestação de juramento em audiência pública; fixação de residência no
Luxemburgo; proibição de exercer qualquer função política, administrativa ou
profissional

6
O que também está na base do secretismo das deliberações – art. 35º ETJUE

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• Direitos e Benefícios: imunidade jurisdicional total para qualquer ato durante o


mandato; inamovibilidade do mandado7; aplicação do Protocolo nº 7; falar a língua de
comunicação entre os juízes (francês).

11 Advogados-Gerais – aumentado em 2015 por decisão do Conselho (art. 252º TFUE)


• O Advogado-Geral analisa o litígio sub judice e propõe uma determinada solução jurídica
para o mesmo, devidamente fundamentada no adquirido jurisprudencial sobre a
matéria, ou numa interpretação divergente sobre a questão.
• É a expressão de uma opinião valiosa de um perito.
• É uma excelente síntese dos problemas jurídicos em análise, com uma leitura crítica ou
apenas retrospetiva da jurisprudência existente, podendo introduzir opiniões dos
académicos mais representativos do estado da arte.

Inspirada no modelo do “comissário do governo” que funciona junto do Conselho de Estado


francês e do Supremo Tribunal dos Países Baixos.

A sua função não se confunde com a do Ministério Público – não existe qualquer vínculo de
subordinação, não dependem de qualquer autoridade e não estão encarregados da defesa de
qualquer interesse que seja8.
As suas conclusões não são um parecer destinado aos juízes ou às partes.

Intervenção encerra a fase oral do processos e não admite contraditório


➢ Caso Bwin (C-42/07, 2009): Tribunal recusou a reabertura da fase oral para as partes
darem resposta às conclusões apresentadas pelo AG, pois o desacordo com este não é
fundamento justificativo para reabertura da fase oral.
o Por força da sua autoridade técnica, o AG ultrapassa o contexto do processo em
si e pode ascender ao papel de autor do adquirido jurisprudencial9 - pertence à
Instituição (TJUE) e daí não ter de haver contraditório.

Opiniões importantes, pois no TJUE existe regra do secretismo das decisões (art. 35º ETJUE) e a
fundamentação é feita pelo mínimo denominador comum – opinião AG mostra que outros
argumentos podiam estar a ser discutidos e quais fizeram vencimento e quais não.
AG não é parte.

NATUREZA DA JURISDIÇÃO
O Tribunal de Justiça exerce os seus poderes de “interpretação e aplicação” do DUE10 no âmbito
de uma jurisdição definida como:

i. Jurisdição de Atribuição
Art. 5º/1, 13º/2 TUE
Fonte de jurisdição do TJUE: art. 13º, 19º TUE e art. 251º TFUE

7
Só pode haver afastamento por decisão unânime dos outros juízes e Advogados-Gerais.
8
É a figura de um amicus curea – estuda o caso e dá a sua opinião sobre qual a melhor solução.
9
Ex: AG Maurice Lagrange, caso Comptoirs, 1960 – lançou a ideia fecunda dos princípios gerais de Direito
que o TJUE acolheu, 9 anos depois, no caso Stauder
10
Rui Lanceiro:
• Papel de “TC Federal” – TJUE resolve as questões emergentes dos Tratados.
• Papel de “STA” – TJUE resolve as questões da Administração da UE

9
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• Estatuto do TJUE é estabelecido pelo Protocolo nº3 e tem o mesmo valor jurídico dos
Tratados (que é a de valor hierárquico superior/constitucional).
• Outro nível de fontes: Regulamento de Processo + Regulamento Adicional

Mas não há monopólio de jurisdição do TJUE dado o Princípio da Descentralização da Função


Jurisdicional – tribunais dos Estados-Membros constituem a instância comum de aplicação do
DUE, beneficiando de uma competência de princípio (já desde o Tratado CECA).
➢ Tribunais nacionais convertem-se em tribunais eurocomunitários, no quadro das vias
processuais internas, quando são chamados a dirimir litígios que envolvem a aplicação
do normativo da UE.

Art. 291º TFUE – princípio que o DUE é aplicado pelos Estados-membros numa lógica de
cooperação leal.
➢ Rui Lanceiro: Lógica de Federalismo Executivo
o Lógica de desdobramento funcional: Tribunais dos Estados-membros também
são órgãos da UE – utilização instrumental dos órgãos dos Estados-membros
como órgãos de aplicação do DUE.
o Tribunais nacionais são Tribunais Comuns da UE – daí que a UE se preocupe
com a sua independência.

Não há hierarquia entre os tribunais nacionais e o TJUE – portanto não há recurso de nacionais
para o TJUE.
• Estes tribunais relacionam-se de forma cooperante.
• Mecanismo privilegiado é o das Questões Prejudiciais – mas essa relação não é de muito
diálogo, executa somente aquilo que está na sua competência.

Daí que,
Tribunais Eurocomunitários: TJ, TG e Tribunais Nacionais
Tribunais Organicamente Eurocomunitários: TJ e TG
➢ Jurisdição depende de uma norma do Tratado que defina o âmbito da sua
competência e a via processual adequada ao seu exercício

Relação é com base no Princípio da Cooperação, pois não existe uma relação de natureza
hierárquica entre os Tribunais nacionais e o Tribunal de Justiça.

ii. Jurisdição Obrigatória


Em virtude da condição de Estados-Membros da UE, os Estados estão submetidos à jurisdição do
TJUE.

TJUE goza de competência obrigatória para dirimir conflitos no âmbito dos artigos 258º, 259º,
263º, 264º, 265º, 268º
➢ Excluem-se os litígios que opõem os particulares aos Estados-Membros, cuja sede
judicial própria são os próprios Tribunais nacionais.

iii. Jurisdição Exclusiva


Quando estão em causa litígios entre Estados-Membros ou entre estes e Instituições da UE, os
Tratados reconhecem ao TJUE um monopólio de jurisdição – art. 344º TFUE
➢ Visa afastar o recurso aos tribunais internacionais

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➢ Justifica-se pela especificidade da UE no quadro do DIP – por razões de uniformidade e


exclusividade do DUE.

Monopólio estende-se aos litígios de caráter interinstitucional, que opõem uma instituição a
outra.

Discutido nas relações comerciais bilaterais entre os Estados-membros através de acordos


bilaterais que submetem os litígios a Tribunais Arbitrais de Comércio.
➢ Comissão tem vindo a combater esta fuga de jurisdição.

iv. Jurisdição de Pronúncia Definitiva/Última Instância


Decisões do TJ não são passíveis de recurso.

Há modalidades de recurso extraordinário que estão previstas no Estatuto.


➢ Não prejudicam a natureza definitiva da jurisdição do TJ pois são decididos por
reapreciação.

FUNÇÃO INTEGRADORA DA JURISPRUDÊNCIA


Juiz Pierre Pescatore: raciocínio do Tribunal mostra que os juízes têm “uma certa ideia de
Europa” que lhes é própria, e é esta ideia que é decisiva e não os argumentos decorrentes das
especificidades técnico-jurídicas.

Isto leva a uma prioridade interpretativa do espírito dos Tratados em detrimento da letra –
visão reconstrutiva dos textos normativos, como manifestação de algum ativismo judicial.
Interpretação praeter legem, mas nunca contra legem

O Tribunal tem moderado a sua pré-compreensão voluntarista e tem se preocupado em


desenvolver e consolidar os pressupostos jurídico-institucionais de uma União de Direito.

COMPETÊNCIA
Art. 19º TUE dá amplas competências de controlo jurisdicional ao TJUE.

Com o objetivo de assegurar uma interpretação e aplicação uniforme do DUE favorece-se a


reserva de jurisdição eurocomunitária como corolário da autonomia e especificidade da ordem
jurídica da UE.

Função Declarativa: compete ao juiz da UE identificar e interpretar o Direito aplicável a um litígio


concreto pendente nos tribunais nacionais (art. 267º TFUE); compete ao juiz da UE fundamentar
a (in)compatibilidade de um projeto de acordo internacional (art. 218º TFUE).

Função Contenciosa: TJ está aberto aos litígios diretos resultantes de conflitos de interesses e
de direitos, cuja tutela é reclamada pelas partes no processo.

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TJ pode funcionar, dependendo da natureza dos litígios e dos atos de DUE a aplicar, como:
• Jurisdição Constitucional – vela pela inviolabilidade dos Tratados e proteção dos
Direitos Fundamentais (que é algo “materialmente constitucional”).
• Jurisdição Administrativa – tem poderes de controlo e condenação da autoridade
administrativa da UE, no âmbito do contencioso da Função Pública
• Jurisdição Internacional – tem poderes para apreciar litígios entre Estados-Membros,
que não perderam a sua qualidade de sujeitos de DIPúblico (art. 273º, 258º, 259º TFUE)
• Jurisdição Reguladora – responde aos tribunais nacionais quanto à interpretação e
validade do normativo da UE, velando por uma aplicação homogénea11

11
Não visa uniformizar a jurisprudência nacional, apenas estabelece parâmetros ou critérios aferidores
do grau admissível de flutuação decisória por parte do tribunal nacional como órgão competente para
aplicar DUE.

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O âmbito do controlo jurisdicional foi alargado a domínios em que não estava previsto e
reforçado noutras matérias.
➢ Evolução foi inevitável dado o abandono do anterior sistema de pilares, acompanhado
pela extensão do método comunitário à regulação da generalidade das matérias de
competência da UE, incluindo a garantia do controlo jurisdicional.
o Art. 275º e 276º TFUE

ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO
TJ tem poderes de auto-organização e estabelece o seu Regulamento de Processo –
condicionado à aprovação do Conselho (art. 253º/§6 TFUE)

Tem uma organização administrativa com 3 principais funções: apoio ao trabalho dos membros
do TJ; secretariado judicial; apoio administrativo geral

TJ delibera em secções12: art. 16º, 17º ETJUE


➢ Ignora-se a instituição do “juiz nacional” pelo que nenhum Estado-Membro pode
invocar a nacionalidade de um juiz ou ausência do juiz da sua nacionalidade para
solicitar uma modificação da composição do Tribunal.

Regulamento de Processo tem o regime linguístico: art. 36º e ss.

2. Tribunal Geral
Dado ao incremento dos processos nos anos 80, a duração média dos mesmos foi aumentando,
o que era preocupante e levou à criação de um novo tribunal: Tribunal de Primeira Instância
• Surge com o AUE e oficialmente instalou-se a 11 de outubro de 1989, tendo proferido o
seu primeiro acórdão em fevereiro de 1990.
• Com o Tratado de Lisboa passa a Tribunal Geral e considera-se uma instância intermédia
da estrutura jurisdicional da UE, competente para julgar a generalidade dos litígios em
primeira instância e também os recursos instaurados das decisões proferidas pelos
Tribunais Especializados.

COMPOSIÇÃO
Art. 19º/2 TUE: pelo menos 1 juiz por cada Estado-Membro
➢ Pode ser alterado por revisão do ETJUE (art. 254º TFUE) através do processo legislativo
ordinário, o que dispensa acordo unânime dos Estados-Membros (art. 281º/§2 TFUE)
➢ Art. 48º ETJUE estabelece que desde 1 setembro de 2019 existirão 2 juízes por Estado-
Membro

Mandato: 6 anos e renovável

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Divisão é conforme a complexidade do caso
• Plenário – 28 juízes – casos muito importantes e eleição do presidente
• Grande secção – 15 juízes
• Secção – de 5 ou 3 juízes

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Presidente: 3 anos, escolhido pelos pares

Não existe a figura do AG, mas qualquer membro do Tribunal pode apresentar conclusões
fundamentadas – art. 49º ETJUE

Secções: funciona por secções (art. 50º ETJUE)

Estabelece o seu Regulamento (art. 254º/§5 TFUE)

COMPETÊNCIAS
Em primeira instância:
• Recurso de Anulação (art. 263º TFUE)
• Recurso por Omissão (art. 265º TFUE)
• Ações de Indemnização (art. 268º TFUE)
• Ações no âmbito da Função Pública da UE (art. 270º TFU + Regulamento 2015/2422 e
2016/1192 + art. 50º-A ETJUE)
• Ações no âmbito da cláusula compromissória (art. 272º TFUE)
Há exceções no art. 51º ETJUE

Como instância de recurso:


• Decisões de tribunais especializados – já não é aplicável
• Decisões de algumas entidades – Instituto de Harmonização do Mercado Interno,
Instituto Comunitário das Variedades Vegetais e Agência Europeia dos Produtos
Químicos

Exclui-se o contencioso do incumprimento (art. 258º TFUE) que se mantém na esfera do TJ.

Ainda não se inclui a competência de conhecer Questões Prejudiciais (que o Tratado prevê:
art. 256º/3 TFUE).
➢ MLD concorda: é bom que se mantenha intacto o monopólio do TJ como decisor de
questões prejudiciais pois uma eventual competência do TG poderia levar a possíveis
conflitos de competência; retirada de importância do TJ; não garantiria um alívio da
sobrecarga processual.
o Um modelo de partilha de competências entre TJ e TG sobre questões
prejudiciais envolveria custos negativos associados à complexidade processual
do seu funcionamento sem garantia de verdadeira compensação do lado da
eficácia da resposta jurisprudencial.

DECISÕES
Decisões do TG podem ser objeto de recurso para o TJ, limitando-se às questões de Direito
(art. 256º/1/§2 TFUE.
➢ Justifica-se pelo princípio do duplo grau de jurisdição e com a garantia da uniformidade
da jurisprudência.

14
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

3. Tribunais Especializados
Através do processo legislativo ordinário, o Parlamento Europeu e o Conselho podem criar
Tribunais Especializados – art. 257º/§1 TFUE

Apesar do Tribunal da Função Pública ter sido extinto em setembro 2016, nada impede uma
reavalização e uma mudança de posição.
➢ Esta opção surgiu por motivos políticos (igualdade entre Estados-Membros no número
de juízes indicados para o TJ e TG) e não por razões orçamentais.
➢ Opção de terminar o Tribunal da Função Pública foi dos Estados-membros, de forma a
fortalecer o Tribunal Geral.
o MLD: há maior expetativa de coerência jurisprudencial se houver apenas 2
tribunais, nomeadamente sendo um deles Geral. Deixa de ser um processo tão
lento pois há uma celeridade potenciada por uma estrutura mais harmónica.

Aos tribunais especializados são aplicáveis as disposições dos Tratados e do Estatuto relativas
ao TJUE – sendo imperativo as regras do Título I (estatuto dos juízes e AG) e art. 64º ETJUE
(regime linguístico)

DIREITO PROCESSUAL DA UE
Rege a atuação da instituição Tribunal de Justiça da União Europeia
➢ Constitui um conjunto complexo e voluminoso de regras jurídicas, tanto para o TJ como
para o TG.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
A. Fonte Primária – art. 13º e 19º TUE; 251º e ss. TFUE; ETJUE (Protocolo 3)
B. Fonte Derivada – Regulamento de Processo
C. Fonte Informal – Condições de utilização da e-Curia aplicáveis aos representantes das
partes.

TRIBUNAL GERAL:
A. Fonte Primária – art. 13º e 19º TUE; 251º e ss. (254º, 256º, 257º) TFUE; ETJUE (art 47º
e ss.)
B. Fonte Derivada – Regulamento de Processo
C. Fonte Informal – Condições de utilização da e-Curia aplicáveis aos representantes das
partes.

FORMA DOS ATOS JUDICIAIS

15
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Todas as deliberações são e permanecem secretas (art. 35º ETJUE).


➢ MLD: visa garantir a independência dos juízes e salvaguardar a coesão no seio do TJUE
como pressupostos necessários da autonomia da sua jurisprudência relativamente a
possíveis pressões.

Acórdãos são sempre fundamentados e mencionam os nomes dos juízes que participam na
deliberação (art. 36º ETJUE) – estes são decisões tomadas pelo TJUE em formação de
julgamento.
Despachos são proferidos pelo presidente ou vice-presidente (art. 131º/e RPTJUE) ou em
formação coletiva (art. 99º RPTJUE).

Regulamento de Processo TJUE


Foi revisto em 2012 visando adaptar as regras processuais em função e relevância do processo
do reenvio prejudicial; aceleração da marcha processual; reestruturação da lógica de
desenvolvimento da tramitação processual13 (de forma a ser mais simples e claro).

Tutela Jurisdicional Efetiva


A todo o direito corresponde uma via processual adequada à sua invocação e efetivação.
A dimensão processual deste princípio justifica e enquadra as soluções adotadas sobre dois
pilares:
1º. IGUALDADE – toda a pessoa tem direito a uma ação perante um tribunal, incluindo o
TJUE quando os Tratados o prevejam. Projeta-se processualmente em:
a. Princípio do Contraditório: concretiza-se na existência de 4 articulados na fase
escrita, organização da audiência de modo a garantir aos representantes das
partes e interessados o exercício de direito de resposta e etc.
b. Língua do Processo: todos se podem dirigir ao TJUE na sua própria língua (art.
37º RPTJUE) e Estados-Membros podem usar a sua língua oficial (art. 38º)
c. Gratuitidade do Processo e Regime de Assistência Judiciária: processo no TJUE
é gratuito (art. 143º). O Tribunal decide sobre as despesas e condena a parte
vencida ao pagamento de despesas se a vencedora o tiver solicitado (art. 138º).
Estados-Membros e Instituições suportam as suas próprias despesas (art. 140º).
• MLD: processo no TJUE não tem custas, mas tem custos e estes podem
ser avultados. Está previsto o benefício da assistência judiciária (art.
115º/1).
2º. EFETIVIDADE – a decisão judicial tem de ser adotada em tempo razoável14 (art. 47º/§2
CDFUE e princípio geral de Direito).
a. Caso Eurofood, C-341/04
b. Caso Baustahlgewebe, C-185/95 P: o prazo razoável tem de ser apreciado de
modo casuístico atendendo
• Importância do litígio para o interessado;
• Complexidade do processo;

13
Estrutura de base dualista: disposições processuais comuns (art. 43º a 92º) e disposições quanto a
procedimentos específicos (art. 93º e ss.)
14
Em caso de violação de violação do prazo razoável pelo TG, pode instaurar-se ação de indemnização
junto do TG: Gascogne, C-40/12 P; Kendrion, C-50/12 P
Se quem violar for o TJ, cujas decisões são insuscetíveis de recurso, se houver lesão de direitos
fundamentais, o particular pode sempre fazer queixa ao TEDH, dado o triângulo judicial europeu (MLD).

16
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

• Comportamento do interessado
• Comportamento das autoridades competentes.

Em especial,
Quanto ao Regime Linguístico
Art. 36º, 37º e 38º RPTJUE; art. 342º TFUE
Eventuais alterações exigem o acordo de todos os Estados-Membros – deliberação do Conselho
por unanimidade, art. 64º ETJUE

Representação das Partes


Art. 119º RPTJUE – particulares
Art. 19º ETJUE – instituições e Estados-Membros

17
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Interpretação estrita do art. 19º ETJUE exclui a possibilidade de uma parte assegurar a sua
própria representação, com exceção do art. 47º/2 RPTJUE – confirmado pelo Caso Correia de
Matos, C-200/05 P

Intervenção
Art. 40º ETJUE
Pode haver pedidos de intervenção de partes acessórias – art. 130º/1 RPTJUE

Tramitação Acelerada e Urgente


Art. 23º-A ETJUE
Art. 105º, 106º e 107º RPTJUE

Prazos Processuais
• No Tratado – insuscetíveis de prorrogação
• No ETJUE
• No RPTJUE – passíveis de prorrogação se tal for expressamente previsto (art. 76º/1)

Os fixados pelo próprio Tribunal, em aplicação do Regulamento, podem ser prorrogados, por
decisão do presidente (ou secretário, se delegado – art. 52º).

Pedidos de prorrogação devem ser fundamentados.

Prazos são calculados pelos critérios do art. 49º, 50º e 51º RPTJUE

Força Obrigatória do Acórdão


Art. 91º RPTJUE

Art. 263º TFUE – não tem título executivo


Art. 267º TFUE – não tem título executivo

Art. 258º e ss. TFUE – tem título executivo?


Doutrina discute se art. 260º TFUE é título executivo.
➢ MLD: remissão do art. 280º para o 299º não será compatível com a qualificação da
sentença condenatória do Estado-Membro como título executivo, apesar de isso
poder vir a ser alterado em futura revisão dos Tratados.
o Art. 299º TFUE delimita o respetivo âmbito de aplicação e dele exclui os Estados-
Membros.
o TJUE carece de competência executória, pelo que a execução das suas decisões
condenatórias ao pagamento de obrigações pecuniárias deve ser solicitada
junto dos tribunais nacionais – a execução das obrigações pecuniárias é
regulada pelo direito processual civil em vigor no Estado-Membro em que tal
for solicitado15.

15
Exemplo do funcionamento descentralizado e cooperativo do contencioso da UE

18
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Notificação Eletrónica
Notificações processuais são feitas para o domicílio forense do destinatário – art. 48º RPTJUE
➢ e-Curia (após reforma 2016) tornou possível a apresentação e notificação por via
eletrónica.

Como se relaciona com o Direito Processual dos Estados-Membros?


Os Tribunais nacionais também aplicam e interpretam DUE, mas, fazem-no no quadro do
respetivo direito processual – é soberania dos Estados-Membros definir a sua estrutura
judiciária e quais as vias processuais adequadas.
➢ Na falta de regulamentação eurocomunitária sobre o assunto, cabe a cada Estado-
Membro determinar quais os órgãos jurisdicionais e quais as vias para garantir aos
cidadãos a efetividade dos direitos concedidos pela UE.

Tribunal de Justiça definiu critérios/requisitos limitadores do princípio da autonomia


processual dos Estados-Membros – CASO REWE (1976)
1. EQUIVALÊNCIA de Meios – regras processuais relativas às ações de garantia dos direitos
que resultam de DUE não podem ser menos favoráveis do que as modalidades relativas
a ações análogas de natureza interna, cujo direito em causa é uma norma interna16.
2. EFETIVIDADE da via processual – condições fixadas pela legislação processual nacional
aplicável não podem ser definidas de modo a tornar praticamente impossível ou
excessivamente difícil o reconhecimento do direito em causa17.
• Na ausência de harmonização das legislações nacionais não cabe ao TJUE impor
um standard processual comum – o objetivo é de neutralidade processual ou
não discriminação processual entre a garantia da norma interna e a da norma
eurocomunitária.
3. Proteção dos Direitos Fundamentais – o respeito pelos direitos fundamentais é um dos
limites impostos ao princípio da autonomia processual (estabelecido pelo caso
Steffensen, C-275/01; reafirmado por Silva e Brito, C-160/14).

16
Caso Comet, 46/76
17
Essa análise tem de ser caso a caso, tendo em conta a colocação das disposições em causa no conjunto
do processo, a tramitação deste e as suas particularidades nas instâncias nacionais – caso Peterbroeck, C-
312/93

19
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

- VIAS PROCESSUAIS COMUNS -


III. REENVIO PREJUDICIAL
O art. 267º TFUE resistiu às sucessivas revisões dos Tratados, mantendo um enunciado que, no
essencial, corresponde à versão originária do Tratado de Roma de 195718.

Depois do Tratado de Lisboa o TJUE dispõe de competência de decisão a título prejudicial sobre
todas as matérias abrangidas pelos Tratados, obrigatória e independentemente da aceitação
prévia ou seletiva, exceto a exceção do art. 24º TUE.

Até hoje o TJ mantém o monopólio de decisão sobre o reenvio prejudicial – decisor judicial
único sobre questões prejudiciais tem a finalidade de garantir a uniformidade na interpretação
e aplicação do DUE.

Esta figura tem uma relevância fundamental no contencioso da UE, afirmando a centralidade
atípica do TJ no sistema de justiça da UE19.

Tem antecedentes nos direitos nacionais dos Estados-Membros.


➢ Em Portugal, o direito processual interno consagra há muito a solução das questões
prejudiciais para garantir a respetiva reserva de jurisdição material na relação entre
tribunais civis, penais e administrativos (art. 92º CPC; art. 15º CPTA) – mas não é um
mecanismo como do art. 267º TFUE, pois a iniciativa pertence às partes20.

Especificidades do Processo do Reenvio Prejudicial


1. ESPECIFICIDADE ESTRUTURAL
• Não é uma via contenciosa de recurso.
• Começa com um incidente de instância que interrompe, por decisão do juiz nacional, o
processo que corre no tribunal de um Estado-Membro.
• Processo sem partes em que os atores principais são os juízes.
• Cooperação horizontal entre juízes – “diálogo juiz a juiz” (caso Kempter, C-2/06)
• Processo com fases subsequentes:
1º. Juiz Nacional – decide se há lugar ao reenvio, à luz da cooperação leal e
apreciação prudencial
2º. Juiz da UE – responde ao pedido nacional, algo que é da competência exclusiva
do TJ
3º. Juiz Nacional – conhecida a decisão TJ, fica vinculado a esta e tem de observar
estritamente o entendimento proferido a título prejudicial.
• C-416/17, 4 de outubro 2018 – 1ª vez que TJUE decide que Estado-membro está em
incumprimento por uma jurisdição superior não ter respeitado o dever de reenvio.

18
Em 1951 e depois em 1957 não era expectável esta sua importância.
➢ Demonstra a dimensão pretoriana do DUE – law in action
o DUE é de fonte escrita e de fonte jurisprudencial, principalmente.
19
A jurisprudência densificou as normas de DUE – há realidades inerentes à identidade do DUE que não
estão nos Tratados (como o Primado e outros princípios idiossincráticos da UE). Mesmo a Declaração 17
remete para a jurisprudência.
➢ Maior parte dos mecanismos do DUE foram construídos com base nas Questões Prejudiciais.
20
E tudo isto é diferente do regime da Consulta do art. 93º CPTA.

20
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

➢ MLD: não gosta da decisão, pois colide com a ideia basilar de cooperação dos
tribunais, num diálogo “juiz a juiz” – não pode haver diálogos forçados.
a) Tentativa de federalização ilegítima (com ativismo excessivo do TJUE).
b) No art. 267º temos um dever prudencial, devido ao objetivo de tutela
jurisdicional – se não for assim, TJUE funcionaliza os Tribunais Nacionais
(que têm igual dignidade) e desvirtua o diálogo.
c) Difícil fazer executar a sentença, pois Governo não pode dar ordens aos
Tribunais.

2. ESPECIFICIDADE FUNCIONAL
• Surge para dar resposta ao problema colocado pelo risco sério de divergência
jurisprudencial entre os tribunais dos Estados-Membros a propósito do significado e
validade das normas DUE
• Garante a uniformidade de jurisprudência relativa à interpretação e apreciação de
validade de atos, normativos ou não normativos, da UE
• Função Supletiva, derivada da praxis, de suprir as deficiências e lacunas de garantia do
direito e da tutela jurisdicional efetiva que resultam das limitações processuais das vias
contenciosas nos Tratados.
o Particular pode, por via do juiz nacional, obter o afastamento da norma interna
contrária, equivalente a ação por incumprimento (que não pode instaurar),
tenho um resultado direto e imediato de desaplicação da norma interna.
o Particular pode não impugnar diretamente o ato normativo e tal surgir por via
incidental (Unión de Pequeños Agricultores, C-50/00)

Mecanismo de Integração
➢ O Reenvio Prejudicial é a ferramenta multifunções da construção
pretoriana do tecido normativo do qual depende a própria existência da
União Europeia.

Objeto do Processo de Questões Prejudiciais


Noção Relevante de “Questão Prejudicial”: aquela cuja resposta ou resolução é necessária e
condiciona, como etapa prévia ou antecedente, a solução do litígio concreto.
➢ Mecanismo processual que permite a intervenção de outro tribunal, devido à sua
competência.

No TJ existe o princípio geral de presunção de pertinência21: juiz nacional tem conhecimento


direto dos factos e melhor pode verificar a necessidade de uma questão prejudicial, que vincula
o TJ no dever de decidir (Gmurzyuska, C-231/89)
Mas, a presunção de pertinência já foi afastada:
• Questão não tinha qualquer relação com o objeto do litígio concreto (Lourenço Dias,
C-343/90) – o Despacho de Reenvio tem que conter os factos e as normas internas, bem
como o DUE potencialmente aplicável. Só assim o TJUE consegue perceber se aquelas
questões estão relacionadas com DUE.

21
MLD: expressão mais adequada é a da pertinência da questão – na generalidade, a questão é pertinente
pois TJUE adota um princípio de in dúbio pro questione

21
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

• Questão surge por litígio forçado/forjado entre as partes no processo nacional (Foglia
c. Novello, 244/80)
• Questão coloca o TJ como instância consultiva, emitindo somente parecer sobre
questões hipotéticas (Robbards, 143/83; Kleiwort Benson, C-346/93)
• Questão carecia de justificação e informação suficiente sobre as circunstâncias de
facto e de direito (Wallonie, C-41/11)
• Questão refere-se à validade de norma nacional (CentroEuropa 7, C-380/05) – quando
a questão é colocada num litígio puramente interno e não há qualquer elemento de
conexão com a Ordem Jurídica eurocomunitária.
o Tem de ser apurado quanto à matéria de facto.
o Exceção que se aplica cada vez menos, pois o DUE tem se expandido muito e
atinge qualquer aspeto relevante da vida jurídica.
• Questão refere-se à interpretação de norma nacional (Krizan, C-416/10)

Gauweiler, C-62/14: TJ reafirmou a competência de resposta no caso concreto, dizendo que um


seu acórdão vincula o juiz nacional quanto à interpretação e/ou validade dos atos da UE para a
resolução do litígio no processo principal.
➢ Amparado pela presunção de pertinência, invocando o dever de contribuir de modo útil
para a administração da justiça, o TJ limita a recusa de resposta para casos manifestos
e excecionais de falta de pertinência, havendo uma predisposição favorável à
necessidade de resposta.

Questão Prejudicial de INTERPRETAÇÃO


Pode ser acerca de:
• Direito Primário
• Direito Secundário – não necessariamente de atos tipificados no art. 288º TFUE (caso
Schlüter, 9/73).
• Acordos Internacionais – interpretação é quanto ao ato unilateral do Conselho de
aprovação/celebração do convénio internacional; no caso de acordos mistos, só tem
competência quanto à matéria imputável à UE; mesmo em casos de outros acordos
entre Estados-Membros em que a matéria esteja relacionada com a aplicação do
normativo da UE.
• Normas de DUE Indiretamente Aplicáveis – disposições legislativas ou cláusulas
contratuais que remetam para DUE (Dzodzi, C-297/88)
• Princípios Gerais de Direito
• Acórdãos do TJUE – pode sempre recolocar-se a questão sobre o alcance do acórdão
proferido a título prejudicial (Pretori di Salò, C-14/86), ou de outras vias processuais
(Waterkeyn, 314/81).

Questão Prejudicial de VALIDADE


Pode ser acerca de22:
• Atos das instituições, órgãos e organismos
o Há muitos casos de fronteira:

22
Mais restrito quanto ao âmbito de aplicação do que a questão de interpretação

22
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

▪ Distinção entre ato vinculativo e ato não vinculativo – TJ não adere a


abordagem formalista e prefere considerar a relevância do ato
contestado, mesmo que seja uma mera recomendação, para resolver o
litígio concreto23 (Grimaldi, C-322/88)
▪ Decisão do Conselho Europeu, com base no art. 48º/6 TUE, é
materialmente uma revisão de Direito Primário, mas pode ser objeto de
reenvio prejudicial como ato de uma instituição (Pringel, C-370/12)
▪ Paralelismo com recurso de anulação tem levado o TJ a concluir pela
inadmissibilidade de questão prejudicial de validade quando o ato
poderia ter sido impugnado pelo recurso de anulação (Deggendorf, C-
188/92)
➢ TJ tem invertido o raciocínio (Bavaria, C-343/07)
➢ MLD: entendimento restritivo do TJ tem 2 consequências
negativas: limita o espaço de decisão do juiz nacional para
colocar a questão prejudicial, o que, conjugado com Foto-Frost,
o obriga a decidir o litígio sem controlo de legalidade do ato
comunitário aplicável; introduz elemento adicional de incerteza
em relação ao particular, que para acautelar situações futuras
teria sempre de acionar o mecanismo de anulação.
• Acordos Internacionais

Autor da Questão Prejudicial


Noção de Órgão Jurisdicional: TJ tem presunção favorável a que qualquer órgão designado por
Tribunal na estrutura judiciária interna de cada Estado-Membro, em conformidade com o
princípio da autonomia processual, possa ser um Órgão Jurisdicional.
➢ Questões de outros órgãos, com outras designações24, podem ser admitidas se o órgão,
naquele litigio concreto, tem competência jurisdicional e, nesse sentido, interlocutor
legítimo no diálogo “juiz a juiz”.

TJ, na dúvida, aceita a questão colocada, mesmo que o autor da questão não corresponda, prima
facie, à qualificação de órgão jurisdicional.
➢ Crítica AG Ruiz-Jarabo Colomer (De Coster, C-17/00): jurisprudência excessivamente
flexível e carente de necessária coerência comporta um défice de segurança jurídica;
jurisprudência é casuística, muito elástica e pouco científica

Critérios foram definidos no caso VAASSENS-GÖBBELS (1966):


A. Origem Legal – órgão criado por lei de forma direta (ato formalmente legislativo) ou
indireta (ato da função regulamentar)
B. Permanência e caráter obrigatório da sua jurisdição – jurisdição obrigatória em que há
vinculatividade das decisões proferidas pelo órgão

23
No caso Gauweiler, o Estado Português defendeu a inadmissibilidade de “ato preparatório ou
desprovido de efeitos jurídicos” – TJ contornou o problema e transformou questão de validade em
questão de interpretação.
24
À luz do princípio da autonomia institucional e processual como expressão direta da identidade política
e constitucional de cada Estado-Membro (art. 4º/2 TUE).

23
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

C. Processo com respeito pelo princípio do contraditório


D. Independência – estatuto do órgão tem de resistir a pressões externas e garantir a
imparcialidade dos seus membros
• Sobre a matriz Vaassens-Göbbels o TJUE tem feito uma interpretação mais
exigente das garantias de independência, relevando a natureza jurisdicional do
ato cuja adoção é solicitada ao órgão em causa.
• Tem havido casos mais controvertidos nesta jurisprudência “in progress”:
i. Questão da independência do órgão – instância tem de ter a qualidade
de terceiro em relação à autoridade que tomou a decisão objeto de
litígio no direito interno (RTL Belgium, C-157/09). Há casos em que
mesmo o facto do Governo designar os membros do órgão não põe em
causa a sua independência se estiver garantido que decide sem
obedecer a instruções (Abrahamson, C-407/98)25. Dupla exigência de
independência (do órgão) e imparcialidade (dos membros) postula a
existência de regras estritas (H.I.D., C-175/11).
ii. Decisão de Natureza jurisdicional
E. Julgar segundo o Direito – excluem-se as situações de julgamento pela equidade26

MLD: da letra do art. 267º TFUE extrai-se um 6 critério – ser um órgão jurisdicional de um
Estado-Membro
➢ Exclui os tribunais internacionais e tribunais de países terceiros
➢ Dior, C-337/95: TJ admitiu a questão colocada pelo Tribunal de Justiça do Benelux pois,
apesar de ser instância internacional, estava a decidir sobre direito da UE e as suas
decisões eram aplicáveis a 3 Estados-Membros, pelo que se justificaria uma
interpretação uniforme do DUE

Categorias Especiais de Órgãos Jurisdicionais


TRIBUNAIS ARBITRAIS
A legitimidade destes como autores de questões prejudiciais depende de fatores relacionados
com o seu estatuto legal específico.
➢ Tribunais arbitrais instituídos por acordo entre particulares não preenchem o requisito
da obrigatoriedade (Nordsee, 102/81).
➢ Tribunais arbitrais de foro profissionais, previstos na lei, quanto a litígios de convenções
coletivas já podem ser considerados (Danfoss, C-109/88).

TRIBUNAIS ARBITRAIS PORTUGUESES – TJ conclui pela admissibilidade das questões


submetidas por tribunais arbitrais necessários dado o art. 209º/2 CRP que inclui estes
tribunais naquelas entidades que podem exercer função jurisdicional (Mereck Canada, C-
555/13). Quanto a tribunais arbitrais voluntários, também se admite (Ascendi, C-377/1327).

25
Caso Syfait, C-53/03: TJ descartou a independência da Autoridade da Concorrência na Grécia, sujeita a
tutela por parte do Ministro do Desenvolvimento por serem insuficiente as garantias de independência
pessoal e funcional.
26
No entanto, dado o primado do DUE e o efeito direto, as instâncias jurisdicionais, mesmo que
habilitadas a decidir segundo critérios de equidade, estando obrigadas a respeitar o DUE podem acionar
o mecanismo das questões prejudiciais (Commune d’Almelo, C-393/92).
27
MLD: é um caso importante mas dele não se pode inferir o abandono definitivo da distinção entre
tribunais arbitrais necessários e voluntários.

24
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Mesmo os tribunais arbitrais que não possam colocar questões prejudiciais estão obrigados a
respeitar DUE e jurisprudência TJUE.
➢ MLD: a tendência, generalizada e excessiva, de “privatização” da justiça aponta para a
conveniência de um entendimento menos restritivo sobre a admissibilidade de
questões colocadas por tribunais arbitrais e reclama-se um mecanismo de escrutínio das
decisões arbitrais quando possa estar em causa a interpretação e aplicação uniforme de
normas eurocomunitárias.

JULGADOS DE PAZ
Fundamento no art. 209º/2 CRP e nada impede a sua classificação como órgão jurisdicional.

ÓRGÃOS DE ORDENS PROFISSIONAIS


Broekmeulen, 246/80: TJ é favorável à integração dos organismos profissionais como passíveis
de colocar questões prejudiciais, sendo determinante a existência ou não da garantia
fundamental da independência do órgão.

AUTORIDADES REGULADORAS
TJUE não tem sido favorável ao diálogo com as entidades administrativas independentes.
➢ O veredicto no caso Syfait, C-53/03, não legitima a certeza sobre ausência de
legitimidade das autoridades da concorrência – tudo depende da opção do legislador,
que pode configurar a entidade como tendo natureza puramente administrativa ou
também competente para funções jurisdicionais

TRIBUNAIS CONSTITUCIONAIS
O primeiro a colocar a questão foi o TC Belga, sendo seguidos por outros tribunais.

O TC Português ainda não suscitou uma questão prejudicial.


• Acórdão 141/2015 – TC descartou a obrigação de reenvio ao invocar a teoria do ato
claro
o MLD: mas não foi bem aplicado pois a natureza discriminatória da prestação de
um regime não contributivo que garante um mínimo de subsistência não está
definido e não se confirma perante a existência de jurisprudência casuística e
algo volátil sobre a matéria.
• Acórdão 363/2015 – TC concluiu sobre a compatibilidade do regime da Lei 67/2007 com
o direito à indemnização por erro judiciário
o TJ chegou à conclusão contrária (Silva e Brito, C-160/14)

Natureza Jurídica da Decisão de Reenviar


Há órgãos jurisdicionais que PODEM reenviar e outros que são OBRIGADOS – o critério
operativo desta distinção é a natureza não definitiva ou definitiva da decisão jurisdicional que o
tribunal nacional está habilitado a tomar no litígio concreto.

Aspetos fundamentais do funcionamento do processo de reenvio:


• Existência de uma verdadeira questão prejudicial – dúvida pertinente de interpretação
ou validade sobre norma jurídica que será aplicada, em articulação com o normativo
interno, ao caso concreto.

25
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

• Tribunais que decidem em última instância depende do caso concreto – teoria do litígio
concreto

MLD: obrigação de reenvio tem de ser interpretada à luz de um padrão equilibrado de


entendimento da função jurisdicional que envolve uma margem incomprimível de apreciação e
escolha da decisão mais razoável por parte do juiz – obrigação de reenvio por parte do órgão
jurisdicional nacional existe, mas no quadro de um dever prudencial de avaliação sobre a
necessidade e a pertinência da questão.

Apesar do art. 267º TFUE não distinguir entre questões de interpretação e questões de validade,
o caso Foto-Frost (1987) declarou a obrigatoriedade de colocar a questão no caso do juiz
nacional pretender declarar a invalidade da norma eurocomunitária, havendo monopólio do
TJ para declarar a invalidade.
→ Os órgãos jurisdicionais nacionais carecem do poder para declarar inválidos os atos das
instituições da UE, porque tal prerrogativa, gerando divergência de jurisprudência, seria
de molde a comprometer a própria unidade da ordem jurídica da UE e prejudicar a
exigência fundamental da segurança jurídica.
→ Admite-se, no entanto, que quanto a medidas provisórias, o Tribunal do Estado-Membro
possa declarar a invalidade dos atos comunitários.
o O caso Zuckerfabrik (143/88 e C-92/89) e Atlanta (C-465/93) clarificou que para
decretar medidas de proteção cautelar baseadas na invalidade da norma
comunitária em causa pois a pronúncia sobre a invalidade que é temporária –
juiz nacional, depois de deferido o pedido de proteção cautelar que suspenda a
instância e coloque ao TJ a respetiva e necessária questão prejudicial da
invalidade.

A jurisprudência CLIFIT consagrou a teoria do ato claro, com o objetivo de condicionar a


margem de apreciação do juiz nacional sobre a existência de uma questão necessária que
fundamente a obrigação de reenvio.
O juiz nacional está dispensado de fazer o reenvio se se verificarem certas condições:
• Características próprias do Direito Eurocomunitário – tendo em conta a análise da
norma, enquadramento sistemático e, em particular, aos objetivos do ordenamento.
• Interpretação de acordo com as várias versões linguísticas dos conceitos próprios do
DUE – juiz nacional está obrigado a comparar as versões linguísticas e a considerar a
autonomia concetual do direito comunitário face aos direitos nacionais.
• Grau de certeza – juiz nacional tem de estar convicto sobre o acerto de determinada
interpretação, atendendo à interpretação já dada por outros tribunais de toda a UE e
até pelo TJUE

No fundo, não pode haver dúvida razoável quanto à interpretação.


➢ Há, no entanto, preocupações legítimas com a tentação de aplicação abusiva da teoria
do ato claro por parte dos tribunais supremos – o art. 4º/3 TUE (princípio da cooperação
leal) manda que os tribunais supremos atuem com prudência de modo a evitar o abuso
da teoria do ato claro.

A teoria do ato claro está limitada às questões de interpretação

26
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Gaston Schull, C-461/03: clarificou a relação entre a doutrina Foto-Frost e a doutrina CLIFIT. Um
órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam suscetíveis de recurso não está obrigado a
colocar a questão se:
• Esta não for pertinente;
• Existe jurisprudência do TJUE que pretende seguir;
• A correta aplicação do direito não dá lugar a qualquer dúvida razoável.

Mesmo no caso de já existir um acórdão do TJ que declare a invalidade de norma análoga à


norma relevante no caso concreto, o tribunal nacional não se deve respaldar neste precedente
para dispensar o reenvio que é, portanto, obrigatório nos termos da jurisprudência Foto-Frost.

Uma vez reconhecida a obrigação de reenvio, eventualmente violada pelo Tribunal Nacional, são
várias as possibilidades de recurso para os tribunais.
• Ação por incumprimento contra o Estado-Membro – abrange as decisões do próprio
TJUE e vincula todos os níveis de autoridade dos Estados-Membros, incluindo os seus
tribunais.
o Não pode ser desencadeado por particulares. Particulares podem é fazer queixa
à Comissão para esta desencadear.
o Comissão c. Itália, C-129/00: acusação da Comissão envolvia uma censura à
jurisdição suprema italiana que, obrigado a colocar a questão ao TJ, não o fez e
não corrigiu a sua orientação jurisprudencial, em violação do princípio do
primado.
o Uma das dificuldades tem a ver com o princípio da separação de poderes – o
Governo do Estado-Membro condenado, responsável pela execução do acórdão
do TJ, não poderia dar ordens à respetiva jurisdição suprema.
▪ Poderia alterar a legislação processual interna no sentido de explicitar
e enquadrar a obrigação de reenvio, mas uma tal ação legislativa não
serve de garantia suficiente para o acatamento da jurisprudência do TJ
sobre o alcance do dever de colocar questões prejudiciais no caso de
não existir uma atitude cooperante por parte do tribunal supremo.
• Ação de indemnização por responsabilidade do Estado-Membro – função
compensatória dos direitos dos particulares (Köbler, C-224/01).
o Tutela indemnizatória quanto aos direitos materialmente prejudicados pela
incorreta aplicação da legislação eurocomunitária, pois poderia evitar-se essa
incorreta aplicação se se tivesse colocado uma questão prejudicial
▪ Não há um direito ao reenvio, por parte dos particulares, mas admite-
se em nome da tutela jurisdicional efetiva uma dimensão subjetiva do
processo de questões prejudiciais, sob a forma de um interesse ou
expetativa processual.
o Lei 67/2007 – art. 13º enquadra as decisões arbitrárias de recusa de reenvio,
resultantes de uma aplicação abusiva da teoria do ato claro ou apreciação
manifestamente errónea dos pressupostos de facto.
▪ Problema é art. 13º/2 que condiciona a admissibilidade do pedido de
indemnização à “prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição
competente” – isto é incompatível com DUE (Silva e Brito, C-160/14)

27
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

• Recurso extraordinário de revisão – art. 696º/f CPC também se aplica à revisão de


decisões judiciais proferidas por tribunais nacionais que sejam contrárias à
jurisprudência do TJUE, designadamente por violação da obrigação de reenvio.
• Queixa ao TEDH

Conteúdo e Forma da Decisão Judicial de Reenvio Prejudicial


Há respostas a pedidos prejudiciais que refletem, indiretamente, um juízo de desvalor ou de
desconformidade entre o Direito Nacional e o DUE.
➢ A resposta do TJUE a questões que envolvam apreciações sobre a compatibilidade do
Direito Nacional com o DUE depende da formulação do pedido, que deve incidir sobre
a norma ou princípio eurocomunitário em causa.

O despacho de reenvio do juiz nacional deve precisar o quadro factual e normativo do litígio
concreto com o adequado desenvolvimento para permitir ao TJ uma avaliação da
admissibilidade das questões e as suas implicações no litígio concreto e para o futuro, dado o
efeito de precedente atípico associado à autoridade do acórdão proferido a título prejudicial.

TJUE aprovou as “Recomendações à atenção dos órgãos jurisdicionai nacionais, relativas à


apresentação de processos prejudiciais” que desenvolve o RPTJUE (em especial o art. 94º).
➢ Redação simples, clara, precisa e sem elementos supérfluos – simplifica a tradução em
todas as línguas oficiais da UE.

Compete ao juiz nacional determinar o momento para proceder ao reenvio e decide de acordo
com o conhecimento que tem da fase em que se encontra o litígio (Mecanarte, C-348/89).

Deve refletir a posição do juiz nacional sobre a pertinência da questão e os argumentos que
apontam no sentido de uma determinada resposta, bem como qual a posição das partes quanto
a isto.

Reveste a forma prevista no direito interno para os incidentes processuais.


• Art. 23º ETJUE determina que a decisão de reenvio suspende a instância (de forma
obrigatória – art. 296º/c CPC) e é objeto de notificação às partes no processo nacional,
a todos os Estados-Membros, Comissão, instituição/órgão/organismo da UE que adotou
o ato de cuja validade ou interpretação é suscitada.
• Legislação da UE não estabelece exigências de forma.
o Direito Português: despacho28 (art. 152º/4 CPC – subsidiário a todos os tipos de
processo).

Acórdão sobre Questões Prejudiciais


Tramitação Processual: art. 267º TFUE; art. 23º e 23º-A ETJU; art. 93º a 114º RPTJUE
→ Página 142 livro MLD

28
Despacho de reenvio não admite recurso interno, com base no art. 630º/1 CPC, pois não traduz o
exercício de um poder discricionário do juiz.

28
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Efeitos do Acórdão
QUANTO À AUTORIDADE OU EFEITO DE PRECEDENTE ATÍPICO.
Acórdão sobre Interpretação
➢ Vinculativo para o caso concreto29
➢ Acórdão tem força obrigatória desde o dia da sua prolação (art. 91º RPTJUE)

Efeito de precedente atípico resulta da autoridade do acórdão – vinculatividade de raiz


funcional (que exclui qualquer relação hierárquica) pois identifica-se no acórdão interpretativo
a autoridade da coisa interpretada, também no sentido de decisão definitiva, insuscetível de
recurso30.
➢ Justifica-se pelo objetivo primordial da garantia da uniformidade da interpretação e
aplicação do DUE em todos os Estados-Membros.
o Essa garantia da unidade na interpretação e aplicação DUE está associada ao
princípio do primado31 e pode até justificar que um juiz nacional não siga a
jurisprudência superior se tal for contrário à jurisprudência do TJUE (Interedil,
C-396/09).

TJ pode ser instado a esclarecer sobre dúvidas relacionadas com o conteúdo do acórdão
interpretativo: seja por ser pouco clara (Steen, C-132/93), ou porque o tribunal nacional pensa
que pode haver uma alteração devido a ser jurisprudência ultrapassada ou por circunstâncias
supervenientes (Roquette Frères, C- 94/00).

Acórdão sobre Validade


➢ Reconhece-se a invalidade do ato, sendo que tribunal do reenvio não pode aplicar a
norma eurocomunitária considerada inválida.
➢ Em casos futuros, os tribunais nacionais e o próprio TJ (e por maioria de razão, o TG)
estarão impedidos de aplicar essa norma – dever de desaplicação.

Na ausência de invalidade, tal não equivale a uma certificação de validade para o futuro – a
questão pode voltar ao TJ com base noutros argumentos de invalidade.

Norma declarada inválida não está morta – está em coma jurídico.


• A eliminação definitiva da ordem jurídica da UE depende de um ato de revogação que
parte do autor do ato, cujo fundamento é o princípio da cooperação leal (art. 13º/2 TUE
e 266º TFUE por analogia32).
• A Comissão, não sendo autora do ato, tem o dever, dado o princípio do ato simétrico,
de propor a revogação do ato declarado inválido e, se necessário, a sua substituição por
um regime normativo compatível com o DUE.

Princípio da cooperação leal também vincula as autoridades nacionais a respeitar a declaração


de invalidade – estão obrigadas a adotar medidas convocadas pela inibição de efeitos do ato
inválido e no perímetro do litígio concreto.

29
Se o litígio for, eventualmente, sujeito a recurso, o juiz de recurso está obrigado a decidir em sentido
que seja compatível com o veredicto do TJUE.
30
A única forma de “obrigar” o TJUE a reexaminar a resposta do acórdão é colocar outra questão
prejudicial.
31
MLD: há limites ao primado (art. 4º/2 TUE; 53º CDFUE; 8º/4 CRP)
32
Van Landschoot, 300/86

29
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

QUANTO AOS EFEITOS NO TEMPO


Acórdão sobre Interpretação
➢ Decisão retroage ao momento da entrada em vigor da norma ou ato interpretado, neles
se incorporando.

O órgão jurisdicional de reenvio e todos os tribunais em casos futuros estão obrigados a aplicar
a norma segundo a interpretação definida pelo TJ a qualquer situação da vida, mesmo que a
relação jurídica seja anterior à data da prolação do acórdão (Denkavit, 61/79).
• Efeito retroativo do acórdão interpretativo pode limitar a natureza definitiva de uma
decisão administrativa – deve haver um reexame da decisão administrativa (Kempter,
C-2/06).
• Dúvidas mantêm-se quando ao saber se a jurisprudência Kühne e Kempter se aplicam
às decisões transitadas em julgado.

• Defrenne, 43/75: razões imperiosas de defesa do interesse geral podem justificar uma
limitação ao princípio geral da retroatividade.
• TJUE (Brzezinski, C-313/05; Bressol, C-73/08) clarificou 2 critérios cuja verificação
condiciona a decisão sobre a limitação da retroatividade: a boa fé dos interessados; o
risco de perturbações graves.

Acórdão sobre Validade


➢ Decisão de invalidade tem efeitos retroativos (salvo se o TJUE decidir de forma diferente
– analogia com art. 264º/§2 TFUE, de forma a salvaguardar os direitos e interesses
legítimos dos particulares afetados com a retroatividade da decisão de invalidade33).
➢ Efeitos ex tunc

33
Roquete Frères, C-228/92: mesmo que o TJ não diga expressamente, deve entender-se que a invalidade
não prejudica a situação daqueles que, à data do acórdão sobre a invalidade já instauraram recurso
judicial (devido à tutela jurisdicional efetiva).

30
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Quando o TJ decida que o ato declarado inválido continuará a produzir efeitos até à entrada em
vigor do ato que o deve substituir, tem de o dizer expressamente – modalidade de eficácia
prospetiva sob condição ou termo (Parlamento c. Conselho, C-21/94).

Tribunais Portugueses e o Reenvio Prejudicial


2015: recorreram 132 vezes ao mecanismo das questões prejudiciais

Primeira vez ocorreu no caso Mecanarte, C-348/89, sobre a aplicação de Direito Aduaneiro –
primeiro reenvio em 1989 após 3 anos da adesão.

MLD: é excessiva a crítica feita aos juízes portugueses a propósito do seu alegado absentismo
prejudicial ou sobre a suposta existência de falhas graves na interpretação e aplicação DUE.
Não existe qualquer procedimento contra Portugal com fundamento na atuação dos seus
tribunais.

Número de reenvios prejudiciais têm aumentado e tem havido sempre pertinência judicial da
maior parte dos reenvios realizados.

31
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Tabela de Jurisprudência Reenvio Prejudicial

Nº DO
DATA NOME Resumo
PROCESSO
16. um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam suscetíveis de
recurso judicial previsto no direito interno é obrigado a submeter, quando lhe
é colocada uma questão de direito comunitário, a cumprir o seu dever de
reenvio sempre que uma questão de direito comunitário nele seja suscitada, a
menos que conclua que a questão não é pertinente, que a disposição comunitária
Gaston em causa foi já objeto de interpretação por parte do Tribunal de Justiça
C-461/03 6.12.2005
Schull ou que a correta aplicação do direito comunitário se impõe com tal
evidência que não dá lugar a qualquer dúvida razoável.

22. A possibilidade de o juiz nacional se pronunciar sobre a invalidade de


um ato comunitário também não é conciliável com a necessária coerência do
sistema de proteção jurisdicional instituído pelo Tratado (relembra Foto-Frost)
Vários Governos contestam a admissibilidade do reenvio prejudicial
38. o órgão jurisdicional de reenvio convida o Tribunal de Justiça a
pronunciar‑se não sobre a compatibilidade com o direito comunitário da
legislação portuguesa relativa aos jogos de fortuna ou azar mas apenas sobre
certos aspectos desta legislação, que estão descritos em termos genéricos
Liga de
Futebol 41. face à separação de funções entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o
C-42/07 8.09.2009
Profissional e Tribunal de Justiça, não se pode exigir que, antes de submeter a questão
Bwin c. SCML prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio proceda a todas as apreciações da
matéria de facto e de direito que lhe incumbem no âmbito da sua função judicial.

43. O órgão jurisdicional de reenvio definiu o quadro factual e regulamentar no


qual se insere a questão colocada ao Tribunal de Justiça.

Questão de validade de uma decisão do Conselho Europeu quanto a um


aditamento no TFUE.

36. Para o efeito, compete ao Tribunal de Justiça verificar, por um lado, que as
regras processuais previstas no referido artigo 48º/6 TUE, foram seguidas e, por
outro, que as alterações decididas só abrangem a terceira parte do TFUE, o que
implica que não dão origem a nenhuma alteração das disposições de outra parte
dos Tratados em que se funda a União e não aumentam as competências desta
última – tem competência para apreciar a decisão – TJUE é competente
porque está a analisar a validade de uma decisão do Conselho Europeu
(art. 267º/b); não olha para o conteúdo da decisão mas olha para o ato
jurídico em si

39. no contexto de um processo nacional, qualquer parte tem o direito de alegar,


C-370/12 27.11.2012 Pringle perante o órgão jurisdicional onde foi intentado esse processo, a invalidade de
um ato da União e de levar o referido órgão jurisdicional, que não é competente
para declarar ele próprio essa invalidade, a interrogar o Tribunal de Justiça a
esse respeito através de uma questão prejudicial

41. No entanto, importa precisar que o reconhecimento do direito de uma


parte de invocar a invalidade de um ato da União pressupõe que essa parte
não dispõe do direito de interpor, ao abrigo do artigo 263º TFUE, um
recurso direto contra o referido ato. Com efeito, admitir que um litigante,
que, sem nenhuma dúvida, tinha legitimidade na aceção do artigo 263º
quarto parágrafo, TFUE contra um ato da União no âmbito de um recurso
de anulação, possa, após o termo do prazo de recurso previsto no artigo 263º/§6,
TFUE, contestar, perante o órgão jurisdicional nacional, a validade do mesmo
ato traduzir-se-ia em reconhecer-lhe a faculdade de contornar o caráter

32
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

definitivo que em relação a ele esse ato reveste após expirarem os prazos de
recurso

42. No caso em apreço, não se afigura que o recorrente no processo principal


tivesse, sem margem para dúvidas, legitimidade para interpor um recurso de
anulação nos termos do artigo 263º TFUE contra a Decisão 2011/199.

8. Por força dos artigos 53.°, n.° 2, e 93.°, alínea a), do seu Regulamento de
Processo, se o Tribunal de Justiça for manifestamente incompetente para
conhecer de um pedido, pode, ouvido o advogado‑geral, proferir despacho
fundamentado, pondo assim termo à instância.

11. Todavia, importa recordar que, nos termos do artigo 51.°, n.° 1, da Carta,
as disposições desta têm por destinatários «os Estados‑Membros, apenas
quando apliquem o direito da União», e que, por força do artigo 6.°, n.° 1, TUE,
que atribui valor vinculativo à Carta, esta não cria nenhuma competência nova
para a União e não altera as competências desta.
Sindicato dos
12. Ora, não obstante as dúvidas expressas pelo órgão jurisdicional de reenvio
C-182/12 7.03.2013 Bancários do quanto à conformidade da Lei do Orçamento de Estado para 2011 com os
Norte princípios e os objetivos consagrados pelos Tratados, a decisão de reenvio não
contém nenhum elemento concreto que permita considerar que a referida lei se
destina a aplicar o direito da União.

13. Não ficou assim demonstrada a competência do Tribunal de Justiça para


responder ao presente pedido de decisão prejudicial.

14. Nestas circunstâncias, há que concluir que o Tribunal de Justiça é


manifestamente incompetente para conhecer do pedido de decisão prejudicial
apresentado pelo Tribunal do Trabalho do Porto.

24. compete exclusivamente ao juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e


que deve assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a tomar,
apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de
uma decisão prejudicial, para poder proferir a sua decisão, como a pertinência
das questões que submete ao Tribunal. Consequentemente, desde que as
questões colocadas sejam relativas à interpretação ou à validade de uma regra
de direito da União, o Tribunal é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se
C-62/14 16.06.2015 Gauweiler34 25. O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre uma questão
prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional se for manifesto que
a interpretação ou a apreciação da validade de uma regra da União solicitada
não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no
processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o
Tribunal não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar
uma resposta útil às questões que lhe são submetidas

Acórdão Silva e Brito – Tribunal superior deve colocar a questão ao TJUE


salvo se houver alguma das exceções à obrigação de reenvio:
C-160/14 9.09.2015 Silva e Brito 1. Falta de pertinência da questão – quando o tribunal nacional
considerar que o litígio subjudice não deve ser decidido de acordo com

34
C-102/14: Primeira vez que o TC Alemão colocou Questão
- ressalvou que a ultima palavra é do TC
- Itália argumentou que TJUE não deveria responder, pois a sua função não é pedagógica e as respostas
têm de ser vinculativas, portanto, isto não era verdadeira questão prejudicial (uma vez que não há
intenção de aplicar)
- TJUE reitera que deve sempre dar resposta e relembra que são respostas vinculativas.
- TC Alemão aplicou, sem problemas, a doutrina definida pelo TJUE

33
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

normas de DUE, mas tão-somente na conformidade das disposições


do direito interno;
• Existência de interpretação já anteriormente fornecida pelo TJUE
– apesar disto, o Tribunal nacional pode não se dar por satisfeito com
a interpretação anteriormente fornecida ou considerar que não é
suficientemente explícito pelo que o pode solicitar de novo;
• Não existem dúvidas – aplica-se a teoria do ato claro

STJ não colocou questão prejudicial obrigatória a TJUE


➢ Tribunal supremo está obrigado a suscitar uma questão
prejudicial de interpretação a propósito do sentido controvertido de
um determinado conceito jurídico constante de legislação
eurocomunitária, sobre o qual existe jurisprudência divergente por
parte das instâncias jurisdicionais inferiores bem como a dificuldade
de interpretação do conceito noutros Estados-membros.

Querendo uma indemnização por violação da obrigação de reenvio, Portugal


violou princípio da efetividade ao não facilitar indemnização.
➢ Por força do princípio do precedente atípico (aquilo que caracteriza a
autoridade da coisa interpretada pelos acórdãos proferidos a título
prejudicial) desde o caso Silva e Brito que os Tribunais portugueses
estão impedidos de aplicar a exigência processual do art. 13º/2
RRCEE (Lei 67/2007), sempre que esse fundamento é violação do
DUE.

Danos causados aos particulares em virtude de uma violação do DUE, cometida


por órgão jurisdicional nacional que decide em última instância, obsta à
aplicação de uma norma nacional que exige como fundamento do pedido de
indemnização contra o Estado a prévia revogação da decisão danosa? Acórdão
Silva e Brito equipara a sentença do TJ à revogação da decisão danosa quando
se constata a violação da obrigação de reenvio por parte do tribunal nacional,
cujas decisões não são passíveis de recurso interno.
A tutela através da reparação financeira funcionará como medida
compensatória para o lesado que já não pode, no quadro das vias internas de
recurso, obter uma revisão da decisão danosa.

37. A pedra angular do sistema jurisdicional assim concebido é constituída pelo


processo de reenvio prejudicial previsto no artigo 267.o TFUE, que, ao instituir
um diálogo de juiz para juiz, precisamente entre o Tribunal de Justiça e os
órgãos jurisdicionais dos Estados‑Membros, tem por objetivo assegurar a
unidade de interpretação do direito da União, permitindo assim assegurar a sua
coerência, o seu pleno efeito e a sua autonomia, bem como, em última instância,
o caráter adequado do direito instituído pelos Tratados.

43. A circunstância de um tribunal criado por Estados‑Membros fazer parte do


sistema jurisdicional da União tem como consequência que as suas decisões
estão sujeitas a mecanismos suscetíveis de assegurar a plena eficácia das
normas da União.
C-284/16 6.03.2018 Achmea
47. É certo que o Tribunal de Justiça declarou que não existe nenhum motivo
válido que justifique que um órgão jurisdicional comum a vários
Estados‑Membros, como o Tribunal de Justiça do Benelux, não possa submeter
questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça, à semelhança do que fazem os
órgãos jurisdicionais de cada um destes Estados‑Membros

48. No entanto, o tribunal arbitral em causa no processo principal não é um


órgão jurisdicional comum a vários Estados‑Membros, equiparável ao Tribunal
de Justiça do Benelux. Com efeito, ao passo que, por um lado, este último tem
por missão assegurar a uniformidade na aplicação das regras jurídicas comuns
aos três Estados do Benelux e que, por outro, o processo que corre perante essa

34
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

instância constitui um incidente nos processos pendentes nos órgãos


jurisdicionais nacionais, findo o qual a interpretação definitiva das normas
jurídicas comuns ao Benelux fica assente, o tribunal arbitral em causa no
processo principal não apresenta esses laços com os sistemas jurisdicionais dos
Estados‑Membros.

49. Daqui resulta que um tribunal como o visado no artigo 8.o do TBI não pode
ser considerado um «órgão jurisdicional de um dos Estados‑Membros», na
aceção do artigo 267.o TFUE e, não pode, assim, submeter um pedido de
decisão prejudicial ao Tribunal de Justiça.

Puligienica, C‑689/13 + Elchinov, C-173/09


Uma disposição de direito nacional não pode impedir que uma secção de um órgão jurisdicional
que se pronuncia em última instância, confrontada com uma questão de interpretação de DUE,
submeta uma questão a título prejudicial ao Tribunal de Justiça.
Artigo 267.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma disposição de direito
nacional quando esta seja interpretada no sentido de que, relativamente a uma questão que
tem por objeto a interpretação ou a validade do direito da União, uma secção de um órgão
jurisdicional que se pronuncia em última instância, nos casos em que não partilhe da orientação
definida pelo pleno desse órgão jurisdicional, deve remeter essa questão ao referido pleno e fica
assim impedida de submeter uma questão a título prejudicial ao Tribunal de Justiça.
+
Constitui jurisprudência assente que o artigo 267.° TFUE confere aos órgãos jurisdicionais
nacionais uma faculdade muito ampla de recorrer ao Tribunal de Justiça, se considerarem que
um processo neles pendente suscita questões relativas à interpretação ou à apreciação da
validade de disposições do direito da União necessárias para a resolução do litígio que lhes foi
submetido. Os órgãos jurisdicionais nacionais são, de resto, livres de exercer essa faculdade a
qualquer momento do processo que considerarem adequado.
Daqui o Tribunal de Justiça deduziu que uma regra de direito nacional, nos termos da qual os
órgãos jurisdicionais que não decidem em última instância estão vinculados por apreciações
feitas pelo órgão jurisdicional superior, não deve retirar a esses órgãos jurisdicionais a faculdade
de submeter ao Tribunal de Justiça questões de interpretação do direito da União a que essas
apreciações de direito se referem. Com efeito, o Tribunal de Justiça considerou que o tribunal
que não decide em última instância, se considerar que a apreciação de direito feita pelo tribunal
de grau superior o pode levar a proferir uma sentença contrária ao direito da União, deve ter a
faculdade de colocar ao Tribunal de Justiça as questões que o preocupam.
Todavia, há que salientar que a faculdade reconhecida ao juiz nacional pelo artigo 267.°,
segundo parágrafo, TFUE, de solicitar uma interpretação prejudicial ao Tribunal de Justiça antes
de, se for o caso, deixar de aplicar as indicações de um tribunal superior que se revelem
contrárias ao direito da União, não se pode transformar numa obrigação

A argumentação do Tribunal apela ao efeito útil do art. 267º - ele tem de ter efeito útil: “o efeito
útil do artigo 267.° TFUE seria diminuído se o juiz nacional estivesse impedido de dar,
imediatamente, ao direito da União uma aplicação conforme com a decisão ou com a
jurisprudência do Tribunal de Justiça” (Puligienica)
➢ Se se optou por uma aplicação desconcentrada do DUE através dos tribunais comuns
de cada Estado-membro, esses tribunais têm de ter mecanismos para aplicar o DUE.

35
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

IV. CONTENCIOSO DA LEGALIDADE


Através de várias vias processuais

Vias Diretas – recurso de anulação e recurso de omissão


Via Incidental – via de exceção – servem para ir a zonas de sindicabilidade onde as vias diretas
não conseguem ir (ex: casos de problemas com o prazo, legitimidade ativa dos particulares e
etc.): Exceção de Legalidade

Conceção sistémica importante porque esta visão vai influenciar opções de interpretação –
estas vias devem funcionar como um todo e têm de ser completas no seu todo e permitir a
sindicabilidade de todas as questões

Recurso de Anulação
Ao contrário do Reenvio Prejudicial, a versão originária do art. 173º do Tratado de Roma,
dedicado ao Recurso de Anulação, sofreu várias e importantes alterações com os Tratados.
➢ As modificações permitiram uma extensão subjetiva e objetiva do controlo jurisdicional
da legalidade por via da anulação.

Critérios Gerais de Admissibilidade do Recurso de Anulação


a) Tribunal Competente
Art. 256º TFUE: TG é competente para conhecer, em primeira instância, dos recursos de
anulação, exceto dos atribuídos a tribunal especializado ou os que estão reservados ao TJ por
força do art. 51º ETJUE.

b) Prazo de Impugnação
Art. 263º/§6 TFUE – DOIS MESES a contar de um dos seguintes factos:
i. Publicação do Ato, se ato for sujeito a publicação no JOUE (art. 279º/1/§3 e 279º/2/§2
TFUE) – dois meses a partir da publicação, ou seja, a partir do fim do 14º dia subsequente
à data de publicação do ato no JOUE (art. 50º RPTJUE)
➢ Data da publicação se sujeito a publicação – prazo de 2 meses começa a contar
no 14º dia subsequente à publicação (art. 49º/50º RTJUE), a que acresce 10 dias
como prazo de dilação em função da distância (art. 50º/51º RTJUE)35
ii. Notificação ao Recorrente, na qualidade de seu destinatário (art. 297º/§3 TFUE)
➢ Data da publicação se sujeito a publicação – prazo de 2 meses começa a contar
no 14º dia subsequente à publicação (art. 49º/50º RTJUE), a que acresce 10 dias
como prazo de dilação em função da distância (art. 50º/51º RTJUE)
iii. Dia em que o recorrente tomou conhecimento do ato (critério supletivo)
➢ Data da publicação se sujeito a publicação – prazo de 2 meses começa a contar
no 14º dia subsequente à publicação (art. 49º/50º RTJUE), a que acresce 10 dias
como prazo de dilação em função da distância (art. 50º/51º RTJUE)

Ao prazo substantivo de impugnação acresce a dilação em função da distância – prazo uniforme


de 10 dias (art. 51º RPTJUE)

35
Hoje em dia é único para todos

36
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Prazo perentório e insuscetível de prorrogação por decisão do TJUE (art. 52º RPTJUE).
➢ Admite-se é situações de erro desculpável na interpretação dos pressupostos da
contagem do prazo (Pitsiorlas, C-193/01).

c) Atos Suscetíveis de Impugnação


Redação que abrange o maior número de atos possíveis36 – são passíveis de recurso todos os
atos adotados pelo decisor da UE “destinados a produzir efeitos jurídicos em relação a terceiros”
➢ CRITÉRIOS CUMULATIVOS: AUTOR DO ATO + CONTEÚDO DO ATO
o O que está em questão é Direito Secundário – Direito Primário não está sujeito;
Tratados internacionais não estão sujeitos mas admitem recurso instaurado
contra o ato que aprova o tratado (no âmbito do art. 218º TFUE, que integra o
acordo na ordem jurídica da UE – ficção jurídica/estratagema processual que o
TJUE arranjou para sindicar)

Critério do Autor do Ato/Imputação

Há atos que não são recorríveis:


• Atos adotados pelos Estados-Membros constitutivos de Direito Primário da UE –
ressalva para aqueles com base no art. 48º/6 TUE (Pringle, C-370/12).
• Atos do decisor nacional – ressalva para o art. 14º/2 Estatuto Europeu dos Bancos
centrais
o MLD: supostamente visa garantir a independência dos bancos centrais
nacionais, mas, representa uma injustificada entorse ao modelo
descentralizado de aplicação da justiça na União Europeia
• Atos unilaterais imputáveis aos órgãos instituídos por acordos internacionais
• Atos imputáveis a entidades jurídicas que têm na relação com a UE um estatuto de
terceiro.

36
Destes atos excecionam-se os atos de PESC (art. 24º/4)
➢ A partir de Lisboa a exceção ficou limitada à PESC – o III Pilar ficou integrado.
Mas há exceção à exceção: art 40º TUE e art. 275º TFUE – positivação nos Tratados na sequência do caso
Kadi (pois há uma afetação dos direitos fundamentais de pessoas físicas).
➢ Antes do Tratado de Lisboa não havia possibilidade de impugnar a decisão aplicativa das sanções.
➢ MLD: Justifica-se exta exceção.

37
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Podem ser ou não passíveis de recurso, dependendo das circunstâncias concretas:


• Atos adotados pelos Estados-Membros reunidos no seio do Conselho – decisões,
resoluções, declarações dos representantes dos Estados-Membros reunidos no seio do
Conselho (quer o da União quer o Europeu).
o Por razões políticas é preferida a via intergovernamental à via eurocomunitária
de decisão.
• Acordos internacionais – é diferente o acordo internacional celebrado pela UE (art. 218º
TFUE) do ato unilateral do Conselho de aprovação do acordo em nome da UE (art.
218º/6 TFUE), este último é passível de constituir objeto de um recurso de anulação
com fundamento em alegações de ilegalidades relacionadas com a violação de regras
de procedimento (em especial, a escolha de base jurídica).

38
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Critério Material relativo à natureza dos Efeitos do Ato/Conteúdo do Ato


O ato deve ser vinculativo, no sentido de apto a produzir efeitos jurídicos que se projetam na
esfera de terceiros.
➢ AETR, 22/70: a forma, natureza e designação do ato não são, por si só, determinantes

Mesmo um ato, aparentemente destituído de suporte textual, indiciado pela mera operação
material de introdução de dados no sistema informático aplicável à gestão de limites
quantitativos de importação de produtos textêis pode ser objeto de impugnação (Portugal c.
Comissão, C-159/96)37.
➢ A recorribilidade do ato depende da sua aptidão para, por si, de modo auto-suficiente,
reconhecer e restringir direitos ou impor deveres – ato definitivo.

Os atos negativos também são recorríveis, salvo se o autor do ato beneficiar de uma
competência discricionária (Lütticke, 48/65).

Insuscetíveis de Recurso são os atos puramente internos, cujos efeitos se esgotam na esfera
interna da instituição/órgão/organismo que os adotou (Espanha c. Comissão, C-443/97).

d) Recorrentes38

37
Conteúdo do Ato: C-159/96, Portugal c. Comissão
Portugal avançou Recurso de Anulação contra a Comissão sobre um ato que não tinha suporte
físico/textual, traduzia-se meramente num ato material de manipulação dum sistema
informático, que levou a que o resultado fosse diferente (aumento da flexibilidade de importação
de produtos da China).
Comissão extravasava as suas competências de decisão com um ato de execução (art. 290º TFUE)
– havia um ato de execução porque o legislador (Conselho) tinha feito um regulamento que
atribuía à Comissão esses poderes de adotar atos de execução; discute-se se esse Regulamento
atribuiu à Comissão poderes para fazer o que fez.
TJUE vem dizer que Comissão tinha possibilidade de adotar o ato desde que não fosse
contra o Regulamento
TJUE aceitou que era ato, mesmo sendo mera operação material, era suscetível de Recurso de
Anulação. Mas não enquanto “prática” (vários atos), somente o “ato” (que é o que é possível
sindicar pelo art. 263º).

38
Ex: C-104/16 P
Deliberação do Conselho (art. 218º TFUE) de celebração de acordo internacional de comércio entre a UE
e Marrocos.
➢ Recurso de Anulação para o Tribunal Geral.
➢ Recurso do TG para o TJ.

Quem interpôs Recurso de Anulação foi a Frente Polisário (movimento de libertação nacional de Marrocos
– reconhecidos internacionalmente).
➢ Sujeito internacional infraestadual, terceiro à UE, vai ao TJUE impugnar um ato da UE – foi
celebrado pela UE para ser aplicado em todo o território de Marrocos, que engloba o território
da Frente Polisário.

“Derrota que foi uma vitória”: TJUE rejeita que eles tenham legitimidade para interpor Recurso de
Anulação pois o acordo foi celebrado com Marrocos e não se podia aplicar ao território da Frente Polisário.
➢ Portanto, perderam o recurso mas ganharam politicamente o reconhecimento do TJUE de
sujeitos de DIPúblico com território próprio. TJUE julga o caso recorrendo ao DIP.

39
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

RECORRENTES DE LEGITIMIDADE PLENA – Estados-Membros, Parlamento Europeu, Conselho,


Comissão
• Estão dispensados de mostrar interesse em agir – assiste-lhes o direito de impugnar
qualquer ato jurídico com base num interesse objetivo de, por via da iniciativa
processual, garantir controlo da legalidade e a conformidade da atuação de decisor
jurídico da UE com os Tratados.
• Uma Instituição não pode atacar um ato próprio.
• O exercício do direito de recurso não está condicionado pelas posições tomadas pelos
representantes do Estado no Conselho durante o processo de adoção do ato (Itália c.
Conselho, C-166/78).

RECORRENTES DE LEGITIMIDADE CONDICIONADA – Banco Central Europeu e Comité das


Regiões
• Direito de recurso limitado pelo “objetivo de salvaguardar as respetivas
prerrogativas”39
• Finalidade de garantir a possibilidade de, pela via contenciosa, defender o seu lugar nas
relações interinstitucionais, pela invocação de eventuais violações ao princípio do
equilíbrio institucional, bem como de eventuais transgressões aos limites de
competência, resultantes nomeadamente de uma escolha errada da base jurídica que
fundamentou a adoção do ato em causa40.

MLD: com base no paralelismo entre legitimidade ativa e legitimidade passiva, determinante
para a jurisprudência do TJ relativamente ao estatuto processual do Parlamento Europeu,
parece-nos adequado e equilibrado, após o Tratado de Lisboa, aplicar o mesmo raciocínio
quando está em causa o direito de recurso do Provedor de Justiça Europeu41 e de outros órgãos
ou organismos da UE – interpretação extensiva art. 263º/§3 TFUE.
➢ Provedor não pode estar nos recorrentes ordinários pois está em causa a defesa de
prerrogativas institucionais e não a defesa de direitos e interesses subjetivos.

RECORRENTES ORDINÁRIOS – pessoas (físicas ou coletivas42)


Têm de fazer prova do interesse em agir:
• Simples – corresponde ao objetivo de alcançar a declaração de nulidade do ato que foi
formalmente dirigido e tem consequências efetivas e diretas para a parte demandante
(First Data, T-28/02).

39
Expressão surgiu em Parlamento c. Conselho, C-70/88, 1990
40
Critério político – de salvaguardar as suas prerrogativas; só pode instaurar recursos na defesa das suas
competências em sentido mais amplo.
Ex: podem impugnar ato sobre o qual deviam ter sido ouvidos e não foram
41
MLD: o Provedor de Justiça Europeu, em virtude das suas competências (na defesa dos direitos
fundamentais, no caso de má administração do decisor da UE) deveria ser um Recorrente de Legitimidade
Condicionada. Particulares podem não ter legitimidade para chegar ao TJUE, mas podem fazer queixa ao
Provedor e o Provedor deveria poder, em substituição deles, desencadear um Recurso de Anulação.
➢ Princípio do paralelismo – atos do Provedor são suscetíveis de impugnação (os internos,
subjacentes ao exercício da provedoria de justiça – atos internos que afetam a provedoria de
justiça), portanto, se pode ser controlado, deveria poder desencadeado o Recurso de Anulação.
42
Onde se enquadram entidades territoriais autónomas (entidades infraestaduais) e associações
representativa de interesses comerciais, categorias profissionais ou outras.

40
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

o O interesse processual é apreciado por referencia à data da introdução do


recurso e nessa data tem de ser considerado atual, o que exclui a relevância de
um interesse futuro e hipotético (BEUC, T-256/97).
• Qualificado – reclama do recorrente, que não é formalmente destinatário do ato
recorrido, a demonstração que o ato dirigido a outrem ou adotado como geral e
abstrato lhe diz “direta e individualmente respeito”.
o Prova do interesse em agir é sinónimo de benefício decorrente da eventual
anulação, ao que acresce a dupla exigência da afetação direta e individual.

Quanto a atos individuais dirigidos a outrem


TJ admite o recurso instaurado pelo particular quer no caso da decisão dirigida a outro particular
quer no caso de decisão dirigida a um Estado-Membro

O objetivo subjacente a este enunciado é o de excluir os particulares do contencioso da


legalidade dos (verdadeiros) atos normativos.

A dupla exigência da afetação individual e direta aplica-se tanto aos recursos de atos individuais
dirigidos a outrem como aos recursos de atos dirigidos a todos, é em relação a estes últimos que
a fórmula literal do art. 263º TFUE, aliada a uma jurisprudência self-restraint, representa um
verdadeiro obstáculo à impugnação de atos normativos.

Quanto a atos dirigidos a todos


Critério de distinção entre o ato individual e o ato potencialmente dirigido a todos deve ser
procurado no ato em causa, em função da sua natureza e efeitos jurídicos que produz.

TJ aponta como critério determinante da análise do caráter geral de um ato o “âmbito geral e
abstrato do seu domínio de aplicação”, o que remete mais para o exame do regime jurídico
previsto e a respetiva fundamentação.

O critério de dissociação entre, por um lado, o âmbito geral do ato e, por outro lado, a sua
possível incidência individual que nasceu no domínio dos direitos antidumping, adquiriu um
estatuto de critério sistemático de apreciação pelo TJUE. A natureza normativa não exclui a
incidência individual.

Dupla exigência de verificação cumulativa: dizer direta E individualmente respeito

AFETAÇÃO INDIVIDUAL
Plaumann: examina-se em primeiro lugar a segunda condição de admissibilidade pois sem esta
estar preenchida torna-se inútil procurar saber se atinge de forma direta – economia de esforço
processual

Fórmula Plaumann: diz individualmente respeito se afetar o particular devido a certas


qualidades que lhe são próprias ou a uma situação de facto que os caracteriza em relação a
qualquer outra pessoa e assim os individualiza de maneira análoga à do destinatário
➢ Exige-se que o recorrente, não sendo destinatário formal do ato, prove que é
destinatário material.

41
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

o MLD: TJUE faz distinção entre Destinatário Formal e Destinatário Material –


TJUE obriga recorrente a fazer prova que é Destinatário Material apesar de não
ser Destinatário Formal, mas obriga a fazer esta prova sendo ele Destinatário
Material nas mesmas condições que seria se fosse Destinatário Formal
➢ Tem-se em conta a sua situação de facto ou características que o distinguem no
conjunto dos demais destinatários formais.
o Exige-se que ato tenha sido adotado em função das características próprias do
recorrente que o individualiza face aos outros – isto é demonstrar que há um
falso regulamento.

O casuísmo extremo na aplicação da Fórmula Plaumann priva os recorrentes ordinários de uma


expetativa de recurso.

TJ e TG orientam a sua jurisprudência no sentido de, em relação aos principais domínios de


aplicação do direito económico da UE, admitir critérios de individualização dos respetivos
operadores económicos.
➢ MLD: é manifesto que o TJUE não pretende flexibilizar os critérios do teste Plaumann
fora do âmbito específico do Direito Económico.

AFETAÇÃO DIRETA
A medida eurocomunitária em causa tem de produzir efeitos direitos na situação jurídica do
particular e não deixar qualquer poder de apreciação ao destinatário dessa medida
encarregado da sua implementação (decorre apenas da regulamentação comunitária, sem
aplicação de regras intermediárias – Front National, C-486/01 P)
➢ Demonstração que o ato em causa produz efeitos sem necessidade de medidas
subsequentes de aplicação ou, mesmo precisando dessas medidas, elas são adotadas
através de atos cuja competência é vinculada.
➢ Há previsibilidade da aplicação dos atos da UE e como os particulares vão ser afetados.

Dois critérios cumulativos: ato impugnado tem de projetar os seus efeitos na esfera jurídica do
demandante; efeitos resultam diretamente do ato, no sentido em que não são pressupostos
atos de execução ou no sentido em que a execução é realizada no quadro estrito de uma
competência vinculada.

42
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

➢ Ato jurídico auto-suficiente, que produz efeitos sem necessidade de ato subsequente
de execução ou desenvolvimento – ato tem de ser auto-exequível, capaz de produzir
efeitos que se concretizam na esfera jurídica dos recorrentes sob a forma de direitos.
➢ Se o ato jurídico em causa depender de medidas nacionais ou eurocomunitárias de
execução, no quadro de uma competência com margem de apreciação, nesse caso são
estas medida que devem ser contenciosamente visadas.

Atos Regulamentares Auto-Exequíveis


Desde a jurisprudência Jégo-Quéré (T-117/01) que se percebeu que existia um problema com
a tutela jurisdicional efetiva dos direitos fundamentais dos particulares afetados por atos
jurídicos da UE de alcance geral.
➢ Em Unión de Pequeños Agricultores, o TJUE interpelou diretamente os Estados-
Membros, enquanto titulares do poder de revisão dos Tratados para fazerem
alterações.

A alteração proposta pelo caso Jégo-Quéré seria codificada na nova redação do art. 263º TFUE
(já patente com a Constituição Europeia e surgindo definitivamente com o Tratado de Lisboa) –
admitem-se recurso contra atos regulamentares que lhe digam diretamente respeito e não
necessitem de medias de execução.

Possibilidade de dispensar a demonstração da afetação individual fica dependente da


verificação cumulativa de 2 critérios:
1. Ser ato regulamentar – ato de alcance geral (excluindo os atos legislativos – INUIT, C-
583/11 P), havendo um conceito processual de ato regulamentar que depende mais da
forma/procedimento do ato que do seu conteúdo43.
2. Não necessitar de medidas de execução – se afeta diretamente o recorrente,
produzindo efeitos na sua esfera jurídica sem deixar margem de apreciação aos
destinatários da medida encarregados da sua aplicação, tendo esta caráter puramente
automático e decorrente apenas da regulamentação em causa, sem aplicação de outras
normas intermédias (Microban, T-262/10). Tem que ser o exercício de uma competência
puramente automática de execução que não envolva margem de apreciação.

FUNDAMENTOS do Recurso
Os critérios de oportunidade não estão sujeitos a escrutínio e apontam-se 4 vícios que podem ser
alegados em sede de fundamentação do pedido de anulação.

Do ponto de vista dos poderes do TJUE não é indiferente a exata qualificação dos fundamentos
de direito, embora, potencialmente, os quatro se reconduzam a uma violação dos Tratados.

43
Ausência de definição clara o que é um ato regulamentar – Caso Inuit + C-643/15 e C-647/15 (acórdão
a propósito de um recurso de anulação da Eslováquia e Hungria quanto a decisão de Conselho sobre
deslocamento de refugiados – Tribunal julgou recurso improcedente)
TJUE entende que é categoria residual que abrange todos os atos que não tenham forma de ato legislativo
(do art. 289º). Decisão do Conselho será ato regulamentar pois apesar de ser inovatória não seguiu o
procedimento legislativo.

43
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Tem de se respeitar o princípio do contraditório e o TJUE não pode proceder ao controlo oficioso
dos fundamentos de direito sem dar oportunidade às partes para a apresentação de
observações (Comissão c. Irlanda, C-89/08 P).

Uma eventual atuação do órgão que adotou o ato recorrido, no sentido da sua regularização em
momento ulterior à data de aprovação, é irrelevante e não afeta o fundamento da declaração
de nulidade (ICI c. Comissão, T-37/91).

i) Incompetência
Externa/Absoluta – UE carece de poderes jurídicos de atuação sobre a matéria.
• Comissão c. França, 11/69: incompetência externa envolvia a inexistência jurídica do ato
• Comissão c. ICI, T-37/91: incompetência gira em torno da questão da base jurídica e do
problema de saber se existe no Tratado norma habilitadora ou se esta é suficiente para
legitimar a aprovação do ato impugnado com tal conteúdo

Interna/Relativa – UE tem competência de decisão, mas esta foi exercida por


instituição/órgão/organismo que, nos termos dos Tratados, não estaria habilitada para o efeito.
• Parlamento e Dinamarca c. Comissão, C-14/06 e C-295/06: incompetência devido a
regras de repartição horizontal de poderes de decisão, nomeadamente violação de
regras de delegação de competência como a inobservância dos limites previstos no ato
de delegação.

ii) Violação Formalidades Essenciais


desconformidade com exigências de forma e de procedimento que enquadram, de modo
vinculativo, a adoção do ato.
• Garante a legalidade interna e permite o controlo jurisdicional.
• Depende do caso concreto e não se pode determinar a priori quais são as formalidades
essenciais e as formalidades não essenciais.

Omissão da referência a uma disposição expressa do Tratado não constitui um vício substancial
quando a base jurídica de um ato puder ser determinada com apoio noutros elementos do ato
(Comissão c. Conselho, C-370/07).

Uma fundamentação sumária pode ser considerada suficiente, num caso, e insuficiente noutro
caso.

iii) Violação de Lei


Violação dos Tratados ou de qualquer norma jurídica relativa à sua aplicação, equivalente à
inobservância de qualquer norma jurídica hierarquicamente superior.

Qualquer ilegalidade se reconduz à noção de violação.


O próprio TJUE adota, em certos casos, um raciocínio de aglutinação dos vícios sob o manto da
violação de lei – fundamento jurídico de ilegalidade ampla e que se define como residual.

Pode resultar de erro de direito, interpretação inapropriada da norma aplicável, uso de conceito
juridicamente incorreto e/ou erro sobre pressupostos de facto.

44
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

iv) Desvio de Poder


Controla-se o fim ou objetivo subjacente à adoção do ato.

Conceção objetivista: controlo a partir de indícios identificáveis no texto do ato, em especial a


relação entre a fundamentação e o regime jurídico previsto.
Conceção subjetivista: controlo a partir da intenção do autor do ato.

TJ seguiu conceção objetivista e haverá desvio de poder se o decisor exerceu os seus poderes
para prosseguir um fim diferente do previsto na norma de habilitação como fundamento dos
poderes que lhe são conferidos.
➢ Averiguam-se indícios objetivos, pertinentes e concordantes (Qualcomm, T-48/04)

Não basta demonstrar a existência de uma razão ilícita ou ilegítima de atuação – conceção do
TJUE importa provar que essa razão ilícita ou injustificada foi determinante na adoção daquele
ato.
➢ Existência de um fim ilícito e determinante, diferente do fim legal, não se presume.

O reconhecimento do desvio de poder implica uma censura grave à atuação do decisor da UE,
pelo que o TJUE se mostra particularmente meticuloso e exigente no seu escrutínio e eventual
reconhecimento.

Âmbito de Controlo
TJUE está limitado ao exercício de poderes de controlo sobre a legalidade do ato, ficando de
fora do seu controlo as questões tradicionalmente identificadas como oportunidade, mérito
e conveniência do ato.

Regra é a do controlo pleno.


Exceção é a do controlo restrito ou marginal – aplicada pelo TJUE em relação à qualificação
jurídica dos factos e à interpretação dos poderes consentidos pela norma de habilitação nos
caso em que, por força justamente da norma de habilitação, o órgão de decisão beneficia de
uma margem de livre apreciação ou competência discricionária.

Efeitos do Acórdão
Que recusa a declaração de nulidade
= improcedência do recurso
• Goza de autoridade de caso julgado, impedindo a renovação do pedido de anulação
(Cofradía de pescadores, T-415/03) – mas, este efeito erga omnes só opera em relação
aos vícios efetivamente apreciados pelo TJUE, pelo que não se pode confundir com uma
suposta declaração de validade ou convalidação do ato.

45
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Que declara a nulidade


= procedência do recurso
• Consequência da ilegalidade, se o recurso tiver fundamento, é a nulidade (não a
anulabilidade)44.
• A declaração de nulidade produz efeitos na esfera jurídica das partes no processo (efeito
inter partes) e em relação a qualquer situação jurídica futura, com um alcance geral.
o Enquanto o acórdão que recusa o pedido de declaração de nulidade tem uma
autoridade relativa de caso julgado, o acórdão declarativo de nulidade, ao
eliminar com efeitos ex tunc o ato em causa da ordem jurídica, beneficia da
autoridade máxima ou absoluta de caso julgado.
• Tem eficácia retroativa (ex tunc), no que diz respeito a todos os interessados (CELF, C-
199/06).
o Pode sofrer limitações para garantir a segurança e previsibilidade das relações
jurídicas, podendo ter objetivos de evitar o vazio normativo ou o sobressalto da
descontinuidade.

Não compete ao TJUE identificar ou impor as medidas necessárias para execução do acórdão,
pois tal extravasaria o quadro típico do contencioso da legalidade (SELEX, T-155/04)45.
➢ Cabe à instituição/órgão/organismo que emana o ato declarado nulo a obrigação de
tomar essas medidas necessárias (art. 266º TFUE).
o Se não o fizer, pode justificar-se um recurso por omissão, constituindo a
violação da obrigação de tomar medidas uma fonte do dever de reparação dos
eventuais prejuízos causados.
o Essas medidas necearias têm de proteger adequadamente os interesses do
recorrente (Deloitte, T-195/05).
o Têm de ser tomadas em prazo razoável, o que depende do caso em concreto.

A Comissão, mesmo não sendo autora do ato, tem o dever de propor a revogação/alteração
do mesmo, no exercício das suas competências de reserva de iniciativa normativa.

O desaparecimento do ato da ordem jurídica da UE resulta diretamente do acórdão


declarativo de nulidade.
➢ Mas, a reposição da legalidade não é automática e depende das medidas de execução
tomadas.
➢ Decisor da UE está é impedido de reaprovar o ato em causa, salvo se for possível o
expurgo das ilegalidades.

44
Em princípio a consequência é sempre a nulidade, salvo se for a inexistência jurídica (TJUE raramente
admite mas a figura é cabível para ilegalidades tão graves que nem sequer garantem a aparência de lei –
têm de ser muito graves. Ex: órgão da UE decidiu sobre matérias que não estão manifestamente na sua
competência.
Consequência disto é que a inexistência jurídica não tem prazo e pode ser invocado a qualquer altura.
45
Mas numa ótica de boa administração da justiça pode fornecer indicações úteis sobre conclusões a
extrair para o futuro do seu veredicto de nulidade.

46
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Comissão c. Assidomän, C-310/97 P46: Não pode levar à anulação de um ato não sujeito à
apreciação do juiz comunitário e que estaria ferido da mesma ilegalidade.
➢ A autoridade de um fundamento de um acórdão de anulação não pode ser aplicada à
sorte de pessoas que não eram partes no processo e relativamente às quais o acórdão
não pode, portanto, ter decidido o que quer que seja.

Recurso por Omissão


Art. 265º e 266º TFUE

TJUE já considerou que este recurso é uma “expressão de uma e mesma via de direito” que o
recurso de anulação.
➢ Via de direito é controlo da legalidade – seja por uma ação das instituições ou por uma
omissão.
o Esta afinidade é importante de ser estabelecida porque há repercussões no
plano prático na interpretação e aplicação desta base jurídica – é legítimo
aplicar os critérios do recurso de anulação ao interpretar uma situação lacunar
do recurso por omissão.
o Isto porque existe muita jurisprudência do recurso de anulação e pouca do
recurso por omissão.

Esta é uma via processual que tem por objeto a inércia ou inação do decisor normativo.
• Caso Chevalley (Acórdão 15/70): o recurso de anulação e o recurso por omissão são
expressão de uma e mesma vai de direito – há uma ligação funcional ao mesmo corpo,
comandado pela lógica do contencioso da ilegalidade.
• Caso Mediocurso, T-451/04: não há a mesma afinidade com a ação por incumprimento
– a ação por omissão não se destina a condenar de forma pública o incumprimento pelas
instituições da UE do seu dever de agir, mas força-las a adotar o ato pedido, tendo em
conta, nomeadamente, a sua obrigação de tomar medidas necessárias à execução das
decisões dos tribunais da UE.
o MLD: para o Juiz da União, o móbil da ação por incumprimento contra os
Estados-Membros é a condenação ao pelourinho, ao passo que no recurso por
omissão, estando em causa Instituições da UE, se pode facilmente evitar o
castigo associado à condenação, mesmo no caso de cumprimento tardio ou
inútil para o lesado.

Recorre-se ao TJUE para que este declare que a abstenção é contrária aos Tratados, na medida
em que a Instituição demandada não a tenha corrigido.
➢ Se a abstenção for reconhecida e declarada contrária ao DUE, o acórdão obrigado o
demandado condenado a tomar as medidas necessárias à eliminação da omissão (art.
266º TFUE).

Exigência de uma fase pré-contenciosa: não é fácil provar que existe omissão ilegal

46
Negou a pretensão de um terceiro, por via da obrigação de execução, vir a beneficiar de uma restituição
das multas pagas com fundamento em decisões não impugnadas, mas equivalentes à decisão declarada
nula em recurso instaurado por uma das empresas destinatárias.

47
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

A condenação da Instituição será à prática de um ato.


• Um ato qualquer interrompe a omissão
o Ao particular interessa o ato que reconheça o direito que invoca
▪ No cenário de eliminação da omissão pela adoção de um ato de
conteúdo contrário à expetativa jurídica do particular, resta-lhe o
regresso ao TJUE, agora através do recurso de anulação ou,
eventualmente, ação de indemnização por responsabilidade
extracontratual da UE.

Omissão Relevante
O objeto deste recurso é a abstenção de pronúncia em violação dos Tratados
1. Abstenção ou omissão imputável às instituições/órgãos/organismos
2. Ilegalidade dessa abstenção

1. Abstenção ou omissão imputável às instituições/órgãos/organismos


Nem todas as situações de não decisão, de ausência de tomada de posição serão suscetíveis de
impugnação contenciosa ex vi art. 265º TFUE.

Escapa ao controlo do TJUE os casos em que não é possível provar a existência de um dever
de pronúncia.
➢ Caso paradigmático é o comportamento omissivo da Comissão, na sequência de uma
queixa por incumprimento apresentada pelo particular contra um Estado-Membro.
o Pode equacionar-se o direito de instaurar um recurso por omissão contra a
Comissão no caso de não responder nem fundamentar, mas, não assiste ao
queixoso o direito de impugnar a recusa da Comissão ou uma eventual resposta
de espera que corresponde a uma recusa implícita de instaurar a ação por
incumprimento.
o Não existe, neste caso, um dever de ação, porque a Comissão não está, por força
dos Tratados, obrigada a dar sequência contenciosa à queixa por
incumprimento47.

Regulamento UE 211/2011 sobre a iniciativa de cidadania


Comissão tem de respeitar um conjunto de exigências procedimentais mas não está obrigada a
dar sequência à iniciativa de cidadania sob a forma de uma proposta de ato jurídico da UE.

Existe sempre dever de pronúncia no caso de queixa apresentada por empresas com fundamento
em violação das regras da concorrência e sobre auxílios de Estado48.

A omissão objeto de recurso deve referir-se à não adoção de um ato que, se adotado, produziria
efeitos jurídicos ou teria, pelo menos, relevância jurídica.

47
Caso Star Fruit, 247/87
48
Nesta matéria, Rynair c. Comissão, T-442/07: Comissão, ao não tomar posição, incorreu em omissão na
aceção do art. 265º TFUE

48
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

2. Ilegalidade dessa abstenção


A falta de tomada de posição deve violar uma regra superior de direito, no sentido em que esta,
constante dos Tratados ou de um ato jurídico subordinante, impõe o dever de agir.
O recorrente deve identificar o ato ilegalmente omitido e precisar a sua natureza ou conteúdo,
de modo a tornar possível a execução do futuro acórdão declarativo da omissão (Parlamento
Europeu c. Conselho, 13/83).

O recurso por omissão pode ser instaurado contra as instituições da UE identificadas no art. 265º
TFUE e ainda, nas mesmas condições, contra órgãos e organismos da UE.
• Das 7 instituições da UE (art. 13º TUE), duas não estão entre as demandáveis – Tribunal
de Contas (carece de competência decisória), TJUE (é órgãos jurisdicional, incompatível
com este processo).
• Tratado de Lisboa deu nova redação e resolveu questão controvertida: prevê-se a
legitimidade passiva de órgãos e organismos da UE que se abstenham de pronunciar.

Recorrentes
PRIVILEGIADOS – Instituições e Estados-Membros: à luz do critério da correspondência
institucional entre legitimidade passiva e legitimidade ativa, que foi decisivo para desbravar uma
solução para o PE como autor do recurso de anulação, seria de considerar o reconhecimento,
pelo menos ao Provedor de Justiça Europeu, do direito de acusar de inércia ilegal as instituições,
órgãos e organismos da UE em casos de má administração (art. 228º/1 TFUE).

ORDINÁRIOS – pessoas singulares ou coletivas: estão sujeitos a uma condição estrita de


legitimidade.
• Só podem acusar uma instituição/órgão/organismo de inércia se esta se referir ao
comportamento de não lhe ter dirigido um ato que não seja recomendação ou parecer.
• O particular pode acusar o decisor da UE de não lhe ter dirigido um ato que, se tivesse
sido adotado, lhe diria direta e individualmente respeito.
o MLD: se o ato tivesse sido adotado diria direta e individualmente respeito – isto
é prova diabólica.
▪ Se já é difícil demonstrar ao particular que um ato adotado lhe diz
efetivamente respeito, muito mais difícil é demonstrar que, não
existindo o ato e nem sabendo especificamente o seu conteúdo, ele
diria individualmente respeito ao particular.

TJ passou a convidar os órgãos jurisdicionais nacionais a estender o reenvio a situações de


omissão (Tem Kate, C-511703) – se no quadro do direito processual nacional for possível
submeter ao órgão jurisdicional nacional a questão da omissão ilegal, o TJ parece indicar que
estará disponível para o seu controlo através do mecanismo do reenvio, num exercício de
interpretação ativista dos respetivos poderes de fiscalização.

49
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Procedimento pré-contencioso
A. Convite a Agir
Art. 265º/§2 TFUE: responsável pela omissão ilegal deve ser previamente convidado a agir.
Convite terá de ser formulado pela mesma pessoa que mais tarde pode recorrer ao TJUE
(princípio da coincidência formal e material entre procedimento e processo).
• Não tem padrão específico de forma, mas tem de ser formulado de modo a não deixar
dúvidas que se trata de um pedido para esse efeito.
• CTRS, T-12/12: é recomendável a citação expressa da disposição do Tratado que serve
de fundamento.

O convite a agir deve, nos termos da jurisprudência consolidada do TJUE, permitir à


instituição/órgão/organismo que fique a conhecer de maneira concreta o conteúdo da decisão
que lhe é solicitada e que tem por objetivo a tomada de posição.

Regularidade Procedimental tem de preencher os seguintes requisitos:


1) solicitar tomada de posição; diligência com base no art. 265º TFUE;
2) indicação dos atos pretendidos;
3) informação da identidade do requerente.

Não há prazo, mas a margem temporal não é ilimitada desde o momento em que o interessado
tomou conhecimento da situação de alegada omissão e o momento em que dirige o convite.
Depende das circunstâncias do caso concreto: 18 meses é razoável (Países Baixos c. Comissão,
59/70) e 4 meses é razoável (Schlüsselverlag, C-170/02 P)

B. Reação ao Convite
O prazo para tomar posição é de 2 meses.
➢ Esgotado esse prazo, se a reação não for suscetível de interromper ou suprimir a
omissão, o autor do convite a agir terá dois meses para instaurar recurso por omissão.

Tomar posição é:
• Adotar o ato solicitado
• Tomar medidas, ainda que não sejam as desejadas e indicadas
• Recusar expressamente adotar o ato
→ Perante qualquer uma destas reações, o Recurso por Omissão fica, em princípio,
prejudicado.

Se não houver resposta em 2 meses49, não existe tomada de posição e o recurso por omissão
pode seguir para a fase contenciosa.
➢ Dar uma resposta de procrastinação (“estamos a analisar”) significa que não tomou
posição e o prazo continua a correr e justifica a passagem à fase pré-contenciosa).
o Quando isto acontece torna-se inviável o recurso por omissão.
o Havendo ato expresso de rejeição o particular tem de avançar pelo recurso de
anulação – há ato expresso, do ponto de vista formal. Interrompe o recurso de
omissão e só legitima o particular a utilizar o recurso de anulação.

49
Ou houver uma resposta de espera, justificando-se com a análise ou estudo do pedido.

50
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Se mais tarde houver uma tomada de posição, tal é suficiente para ditar a inadmissibilidade
do recurso, por inutilidade superveniente da lide.
➢ A omissão deixa de existir na data em que o autor da interpelação é notificado com a
tomada de posição pela instituição (Branco c. Comissão, T-194/97 e T-83/98) e o objeto
de recurso é dado como desaparecido (Asia Motor, T-28/90).

Fundamentos do Recurso
Art. 265º TFUE não identifica os fundamentos da ilegalidade.
➢ O princípio jurisprudencial do paralelismo entre os dois recursos, como expressão de
uma mesma via de direito, conduz-nos a uma aplicação mutatis mutandis dos vícios
indicados a propósito da anulação.
o De fora ficam as alegações de incompetência e violação de formalidades
essenciais, dada a sua incompatibilidade lógica com o objeto de recurso.
o A questão da competência pode ser discutida no processo, mas como meio de
defesa da instituição recorrida.

Efeitos do Acórdão Declarativo de Omissão Ilegal


Acórdão é vinculativo e tem, esgotado prazo de recurso, autoridade de caso julgado.
Art. 266º/§1 TFUE: se a abstenção for declarada contrária aos Tratados, a
instituição/órgão/organismo está obrigada a tomar as medidas necessárias à execução do
acórdão em causa.

Efeitos limitados pois TJUE não pode indicar as medidas a adotar (Sumitomo, T-454/05) e o
acórdão não substitui, seja qual for a situação, o ato considerado em falta (Air One c. Comissão,
T-395/04).
➢ TJUE não pode dirigir injunções ao decisor da UE demandado ou, por qualquer outro
meio, substituir-se a este (Camar, T-79/96, T-260/97, T-117/98).

“Medidas necessárias” não significa que sejam as desejadas pelo particular – pode ser um
qualquer outro ato.
• Instituição dá execução ao acórdão simplesmente por adotar um ato. Que pode não ir
ao encontro dos interesses dos particulares.
• Nessa situação, o particular tem a oportunidade de passar para o recurso de anulação.

Limitação de poderes do TJUE não invalida o direito do recorrente acionar o art. 279º TFUE e,
nos termos do regime jurídico da proteção cautelar, solicitar ao juiz da UE que imponha à
instituição demandada a adoção de medidas pressupostas pela sua obrigação de agir na aceção
do Direito da União Europeia.

51
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Exceção de Ilegalidade
Art. 277º TFUE
➢ Alterado com o Tratado de Lisboa, que reflete a jurisprudência do TJUE sobre a noção
relevante de “regulamento” no âmbito do controlo incidental de ilegalidade, mas que,
por outro lado, obriga a uma reflexão sobre o sentido de certas exigências
jurisprudenciais, baseadas na redação anterior, como o caso das restrições impostas aos
Estados-Membros e às instituições quando invocam a exceção de ilegalidade.

Mecanismo processual que torna possível a invocação da ilegalidade, por via da exceção, a
título incidental, no quadro de uma via processual principal, junto do TJUE.
➢ Desde a década de 50 que a exceção de ilegalidade, nominada assim pela doutrina por
influência direta dos análogos nacionais (ex: art. 38º CPTA), representa expressão de um
princípio geral de DUE, invocável em todos os contenciosos relativos à aplicação da
norma comunitária (Simmenthal, 92/78; Alessandrini T-93/00)

Por natureza, falta autonomia processual ao controlo incidental de ilegalidade.


➢ A suposta ilegalidade do ato de alcance geral é invocada, necessariamente, no contexto
de um processo principal e com duplo alcance: por um lado garantir a inaplicabilidade
do ato de alcance geral em causa no caso concreto e, por outro lado, como decorrência,
apoiar o pedido na ação principal.

Art. 277º não é direito autónomo mas tem relevância prática significativa, funcionando como
meio complementar/subsidiário de tutela nas situações em que não seria possível, por
exemplo, instaurar o recurso de anulação.
➢ Exceção de ilegalidade não está limitada à invocação pelos particulares, mas é em
relação a estes que o controlo incidental da ilegalidade funciona de modo útil e
alternativo.

No acórdão Os Verdes, o TJUE mencionou expressamente a exceção de ilegalidade ao definir o


sistema como sendo completo de vias de recurso e de procedimentos destinados a confiar ao
TJUE a fiscalização da legalidade dos atos da UE.

Atos Passíveis de Controlo Incidental da Ilegalidade


Ato de alcance geral (art. 277º) é qualquer ato não seja individual/que não seja dirigido a uma
pessoa. Ex: regulamentos, diretivas e etc.
• O art. 277º ao remeter para o art. 263º/§2, em matéria de fundamentos de ilegalidade,
implica que o ato de alcance geral tem de produzir efeitos jurídicos.
• Exceção de Ilegalidade pode ser invocada em relação a qualquer uma das modalidades
de atos: art. 289º, 290º, 291º TFUE

O critério determinante é o da existência de um vínculo direto com o ato impugnado a título


principal, no sentido em que este tem por fundamento o ato sujeito a escrutínio por via da
exceção.
• Macchiolarti, 21/64: Tem de haver nexo jurídico direto entre o ato impugnado e os atos
de alcance geral e só nesses casos se pode invocar a exceção de ilegalidade. Ex: Estado-

52
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Membro numa ação de incumprimento de não transposição de diretiva contrapõe com


a ilegalidade desta.

Legitimidade Ativa
Preceito refere “qualquer parte” mas TJUE decidiu distinguir entre “qualquer parte” que tem
legitimidade ativa e “qualquer parte” que não a tem – o critério seria o da função da exceção de
ilegalidade.
• O TJUE considera inadmissível a invocação da exceção de ilegalidade em relação aos
atos de alcance geral que, afetando de forma direta e individual o particular, poderiam
ter sido objeto de recurso (Teva Pharma, T-140/12). Ex: regulamentos anti-dumping
• A alteração do art. 263º/§4 TFUE, no sentido de flexibilizar os pressupostos do recurso
contra “atos regulamentares” pode conduzir a uma solução mais restritiva em sede de
admissibilidade da exceção de ilegalidade.

Seria uma não questão, dada a letra do art. 267º - qualquer parte num qualquer recurso
instaurado junto do TJUE no quadro das vias processuais definidas no TFUE.
➢ TJUE não faz aplicação literal e usa a interpretação sistemática e finalística (de ser meio
compensatório) – por isso chega à conclusão que um particular (C-239/99 + T-140/12)
não pode invocar a exceção de ilegalidade relativamente a um ato que poderia, em
tempo útil, ter impugnado; não poderiam utilizar este artigo para alargar prazo do art.
263º TFUE
➢ Tratado de Lisboa flexibilizou o leque do art. 263º, o que complica a alegação da exceção
de ilegalidade

Estados-Membros e Instituições
TEORIA LITERAL: sim, podem – não há razão para excluir os que são recorrentes privilegiados no
recurso de anulação e é vantajoso manter aberta a possibilidade de contestar um ato normativo
cuja ilegalidade, só depois de esgotado o prazo de anulação, se tronou um problema para os
destinatários.

TEORIA FUNCIONALISTA: não, não podem – eles teriam sempre o direito de impugnar o ato em
causa via art. 263º e não o fizeram.
• Atende à função compensatória – o art. 277º é uma arma de recurso para os
particulares, não é acessível àqueles que têm todo o arsenal na mão. Corrente não
prevaleceu.
o MLD: concorda que não tenha prevalecido, pois deve sempre fazer-se uma
interpretação extensiva para permitir o acesso à justiça. Estados-membros e
Instituições podem invocar a exceção de ilegalidade.

TJUE decide geralmente pela admissibilidade da exceção de ilegalidade (Comissão c. BCE, C-


11/00; Espanha c. Conselho, C-442/04)

53
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Prazo de Invocação da Exceção de Ilegalidade


Art. 277º não estabelece prazo nem seria lógico que o fizesse.
MLD: os mecanismos de controlo incidental da ilegalidade ou da inconstitucionalidade visam,
justamente, permitir a suscitação da questão da invalidade quando esta se torna
extemporânea no quadro das vias diretas de impugnação.
➢ Tem de ser é num lapso temporal em que seja possível provar a existência de um vínculo
direto entre o ato jurídico de alcance geral e o ato jurídico de alcance individual que
constitui o objeto da ação principal.

Enquadramento Processual
Como não tem natureza processual autónoma, só pode ser deduzida pelas partes no âmbito de
um processo principal.
➢ TJUE admite a invocação oficiosa pelo próprio Juiz da União quando se trata de uma
ilegalidade de ordem pública (Societé des Fonderires Pont-à-Mousson, 14/59; Commom
Market Fertizielers, T-134/03 e T-135/05).

RECURSOS DIRETOS: invocável pelas partes em qualquer recurso direto


• Recurso de Anulação: mais frequente e bem sucedida (Kik c. IHMI, T-120/99)
• Recurso por Omissão: pode servir a defesa do demandado, que alega a ilegalidade do
ato com base no qual teria de adotar o ato em falta; ou argumentos do demandante,
que assume como ilegal o ato que dispensaria o demandante de agir (SNUPAT, 32/58)
• Ação por Incumprimento: meio de defesa para o Estado-Membro
• Ação de Indemnização por Responsabilidade Extracontratual da UE: serventia limitada
ao pressuposto da ilegalidade50.

REENVIO PREJUDICIAL: pode ser invocada junto do tribunal nacional.


No plano jurídico-processual distingue-se a exceção de ilegalidade deduzida junto do TJUE ao
abrigo do art. 277º TFUE da exceção de ilegalidade invocada junto dos tribunais nacionais, nos
termos previstos pelo direito processual interno.
• O objetivo é comum – controlo da legalidade dos atos jurídicos da UE
• Uma vez suscitada a questão da ilegalidade, por mor da jurisprudência Foto-Frost, o
tribunal nacional transforma a exceção de ilegalidade numa exceção de invalidade, a
decidir pelo TJ.

Efeitos do Acórdão que se pronuncia pela Ilegalidade


O ato de alcance geral é declarado inaplicável, nos termos do art. 277º TFUE.
• Inaplicabilidade do ato produz efeitos no processo em causa, limitados às partes.
• O ato declarado inaplicável mantém-se em vigor, embora ferido de morte

50
DLD Trading, T-146/01: A autonomia da ação de indemnização em relação às vias diretas de controlo
da legalidade, como característica específica da tutela indemnizatória depende, justamente, da invocação
da ilegalidade a título incidental.

54
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

V. CONTENCIOSO DO INCUMPRIMENTO
Art. 258º, 259º, 260º TFUE

A revisão dos Tratados conduziu a um aperfeiçoamento desta via processual do


incumprimento através do estabelecimento de poderes de verificação do cumprimento
voluntário do acórdão do TJUE e, no caso de tal não acontecer, a possibilidade de, por decisão
judicial, o Estado-Membro relapso sofrer a aplicação de sanções pecuniárias.
➢ MLD: mecanismo original que melhor caracteriza o grau de imperatividade das
obrigações eurocomunitárias e o que melhor identifica a veia integracionista, pós-
soberanista, do modelo jurídico de construção europeia

MODALIDADES ESPECIAIS DE INCUMPRIMENTO E PROCEDIMENTOS JUDICIAIS


ESPECIAIS
• Procedimento simplificado no domínio do Direito aplicável aos auxílios de Estado (art.
108º/2 e 3 TFUE) – variante da ação por incumprimento, adaptada de forma específica
aos problemas específicos que apresentam as ajudas estatais para a concorrência no
seio do mercado comum (Comissão c. França, C-301/87).
• Procedimento simplificado no domínio da derrogação às medidas de harmonização do
mercado interno (art. 114º/9 TFUE)
• Procedimento simplificado no domínio das derrogações justificadas por razões de
segurança nacional
• Procedimentos específicos por violação das obrigações previstas no Estatuto do Banco
Europeu de Investimento (BEI) e no Estatuto do Sistema Europeu de Bancos Centrais
(SEBC)
• Procedimentos simplificados no quadro do Tratado Eurátomo (CEEA)

PROCEDIMENTOS NÃO JUDICIAIS


Duas situações em que os Tratados preveem duas situações de verificação e declaração de
incumprimento que não dependem do controlo jurisdicional do TJUE – mas TJUE não é
definitivamente arredado e pode intervir a posterior em virtude do princípio da tutela
jurisdicional efetiva.
• Procedimento por défice orçamental excessivo (art. 126º/11 TFUE)51

51
Estado-Membro destinatário das decisões adotadas pelo Conselho com base no art. 126º pode
impugnar essas mesmas decisões ao abrigo do art. 263º TFUE

Caso de Itália – Orçamento chumbado pela Comissão


Recusam-se a alterar o Orçamento
Comissão apresentou-se como “polícia bom” e “polícia mau”
Se Itália não alterar o seu “Orçamento do Povo” como pode TJUE intervir?
Comissão pode instaurar um Procedimento por Défice Excessivo (art. 126º TFUE) – atos da Comissão e do
Conselho que introduzem efeitos jurídicos
Por serem atos jurídicos, o destinatário dos atos pode impugná-los no TJUE – art. 263º.
Única forma de Estado reagir jurisdicionalmente.
Pode pedir proteção cautelar, ao suspender a eficácia do ato.
Não se pode instaurar ação por incumprimento (art. 126º/10) – considera-se que este procedimento por
défice excessivo substitui a ação por incumprimento.

55
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

o A competência de escrutínio jurisdicional que o art. 126º/10 TFUE exclui foi


reconhecida pelo chamado Tratado Orçamental – intergovernamental e sobre
matéria de disciplina orçamental na área do euro
• Procedimento de sanções políticas por violação dos valores fundamentais da UE (art.
7º TUE52)
o Mecanismo gizado como instrumento de sanção política, o que, em função
dessa natureza, dispensaria o crivo jurisdicional e a respetiva garantia do
respeito pelos direitos de defesa dos Estados-Membros.
o Única exceção é relativamente ao controlo da observância das disposições
processuais.
▪ MLD: Art. 7º TUE não deve ser interpretado como obstáculo à
instauração pela Comissão de uma ação por incumprimento contra o
Estado-Membro que, através da sua legislação ou prática política
administrativa, viola os valores fundamentais da UE.

Tratado Orçamental define metas mais exigentes


Art. 8º permite a um Estado (ou grupo de Estados) que peça ao TJUE a verificação do incumprimento de
um Estado do Tratado Orçamental.
Comissão não tem iniciativa – porque isto não está no âmbito dos tratados, dos quais a Comissão é
guardiã.
No âmbito do art. 8º também se pode pedir sanções pecuniárias contra o Estado-membro faltoso.

Se no final a Itália se recusar a pagar, há um conflito muito complexo de resolver.


Em última instância há uma suspensão da transferência de fundos.

Este é um conflito político que pode chegar ao TJUE.

52
Introduzido com o Tratado de Amsterdão e depois aperfeiçoado.
Com a constatação de violação do art. 2º - que é necessário para a aplicação do art. 7º - por um Estado-
membro, que viola Direitos Fundamentais dá-se aso a existirem Sanções Políticas
➢ Sendo a mais grave a suspensão do direito de voto no Conselho

Para que hajam sanções políticas é preciso uma declaração do Conselho Europeu, que exige a
unanimidade.
➢ O que não funciona, pois há aliados do Estado infrator que vetam.

Comissão Europeia, em 2014, anunciou um “Mecanismo de Enquadramento do Estado de Direito”


➢ Propunha um novo mecanismo que entra em ação antes do art. 7º e funciona em 3 fases:
Constatação, Recomendação, Acompanhamento dos Estados visados.
o Este mecanismo só funciona se houver uma cooperação leal dos Estados.

Grande fragilidade dos mecanismos de controlo político.

MLD: art. 7º TUE é uma entorse ao Estado de Direito pois não intervém o TJUE e o Estado-membro visado
não tem hipótese jurídica de se defender.
➢ O Estado-membro destinatário das sanções políticas não pode contestar a legalidade das
decisões do Conselho Europeu e do Conselho por razões de legalidade substantiva, mas pode
impugnar essas decisões por violação de requisitos procedimentais.

56
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Ação por Incumprimento


Tribunal Competente
Só o TJ é competente para julgar as ações por incumprimento contra os Estados-Membros.
• Solução apoia-se na convicção dos Estados-Membros, enquanto autores dos Tratados,
sobre a especial importância das condenações por incumprimento – justifica o
monopólio do tribunal supremo da instituição judicial da UE.
o O reverso da medalha é o caráter definitivo do acórdão, insuscetível de recurso
e, consequentemente, para os Estados-Membros a privação da tradicional
garantia do duplo grau de jurisdição.

Noção de Incumprimento
Conceito Operativo: sinónimo de não cumprimento, por um Estado-Membro, de qualquer uma
das obrigações que lhe incumbem por força dos tratados.
➢ Jurisprudência configura este incumprimento como tendo uma natureza abrangente e
objetiva.

Pluralidade das Regras Paramétricas


Para haver violação do DUE, o parâmetro são todas a fontes escritas, mas também as fontes não
escritas (princípios gerais de direito e a própria jurisprudência do TJUE).

Quanto às decisões dos representantes dos Estados-Membros reunidos no seio do Conselho e


outros atos de natureza intergovernamental como a celebração de convenções internacionais
entre Estados-Membros – natureza intergovernamental e convencional (situa-se no quadro do
DIPúblico embora regule matéria eurocomunitária).
• Decisões: pode haver escrutínio da compatibilidade com os Tratados, para evitar a
erosão e esvaziamento de competências da UE
• Não se pode imputar em sede de incumprimento aos Estados-Membros nem
convenções internacionais celebradas entre os Estados-Membros53 (Comissão c.
Bélgica, C-132/09)

Quanto a atos atípicos – pode haver sindicabilidade (França c. Reino Unido, 141/78; Comissão
c. Reino Unido, 32/79)

Quanto aos princípios gerais de direito – função paramétrica reconhecida na jurisprudência


Stauder (Prcesso 29/69) e no caso Internationale Handelsgesellschaft (Processo 11/70)
• MLD: O movimento de positivação dos direitos fundamentais e de princípios gerais de
direito torna a questão residual ou mesmo improvável, porque qualquer
comportamento ofensivo do “bloco de legalidade” da UE será sempre possível de
estabelecer uma conexão com disposição específica dos Tratados, incluindo CDFUE, ou
do direito derivado.

Quanto à jurisprudência do TJUE – art. 260º/2 TFUE

53
A não ser que os Estados-Membros atribuam competência ao TJUE nos termos do art. 273º TFUE

57
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Natureza da Obrigação Vinculante


Em sede do processo judicial de incumprimento não basta invocar um dever que vincula o
Estado-Membro e importa que se trate de uma obrigação cuja interpretação e tutela integra
o perímetro de jurisdição do TJUE

A invocabilidade contenciosa de norma dotada de efeito direto, por iniciativa dos particulares
junto dos tribunais nacionais, não paralisa ou limita a possível atuação contra o Estado-Membro
no quadro do incumprimento

Pluralidade de Comportamentos Tipificados de Incumprimento


TJUE aproveita a relativa ambiguidade da expressão “qualquer das obrigações que lhe
incumbem por força dos Tratados” para definir com a maior amplitude possível o rol de
práticas paramétricas.
➢ Densificação muito aberta do conceito vago, amparado pelo adquirido jurisprudencial.

VIOLAÇÃO POR AÇÃO: um Estado-Membro adota legislação contrária aos Tratados e normas
contantes de atos de direito derivado ou opta por adotar regime jurídico mais restritivo e menos
garantístico54.

VIOLAÇÃO POR OMISSÃO: censura do TJUE pode ter por objeto comportamentos omissivos
resultantes tanto da inércia legislativa como judicial, incluindo ainda as práticas administrativas
que consubstancial abstenção reiterada ou generalizada.

VIOLAÇÃO POR INOBSERVÂNCIA DOS PRAZOS DE EXECUÇÃO DAS OBRIGAÇÕES:


incumprimento pode ser declarado pelo TJ em relação a um Estado-Membro que já adotou as
medidas exigidas se o tiver feito fora do prazo. Execução extemporânea das medidas é
considerada contrária à exigência da uniformidade na aplicação do Direito da UE e ofensiva dos
deveres de solidariedade entre os Estados-Membros (Comissão c. Itália, 39/72).
➢ O rigor com que o TJ aprecia o dever da observância dos prazos estende-se à situação
de adoção de medidas já na pendência da instância, considerada pelo TJ como
irrelevante a título de inutilidade superveniente da lide55.

Natureza Objetiva do Incumprimento


O incumprimento existe ou não existe, não interessa a intensidade da violação nem se os
Estados-Membros agiram com intenção ou mera negligência.
➢ O incumprimento corresponde a uma situação objetiva de violação das regras, cabendo
à parte demandante a produção de prova suficiente nos autos

54
Wallonie, C-129/96: Estados-Membros devem abster-se de adotar disposições suscetíveis de
comprometer seriamente resultado prescrito por uma diretiva a ser transposta.
Um tal dever de abstenção é oponível em relação ao Estado-Membro mesmo que a legislação em causa
não vise, direta e expressamente, a transposição da diretiva em causa, mas com ela interfira (Mangold,
C-144/04).
55
O incumprimento pode ser declarado mesmo que as medidas tenham sido entretanto aprovadas –
veredicto de incumprimento mantém interesse processual e material para o efeito do apuramento de
eventual responsabilidade extracontratual do Estado-Membro em causa (Comissão c. Itália, C-442/06)
➢ MLD: concorda, mas aponta a falta de coerência do TJ, que não segue a mesma bitola para o
decisor da UE que regulariza a situação fora do prazo e na pendência da instância.

58
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Imputação do Incumprimento
O interlocutor da Comissão no procedimento administrativo pré-contencioso (o demandado
na fase contenciosa) é o Estado-Membro.
➢ O representante do Estado-Membro na fase pré-contenciosa e na fase contenciosa é,
por força do DIPúblico, aplicável no silêncio dos Tratados a este respeito, o Governo do
respetivo Estado-Membro.
o Isto apesar de muitas vezes a responsabilidade pela violação do DUE não
resultar diretamente de uma ação/omissão direta do Governo.

TJUE tem por base uma noção ampla de Estado, de inspiração jusinternacionalista, quanto a
quem imputa o incumprimento.
• MLD: única posição compatível com a exigência elementar da igualdade entre os
Estados-Membros perante os Tratados e o respeito pelo art. 4º/2 TUE.
o O princípio é sempre o mesmo, indiferente do grau concreto de autonomia que
beneficiam os órgãos de soberania e as entidades infraestaduais, ao Estado-
Membro cabe assegurar a plena eficácia das normas eurocomunitárias e, no
caso de falha, são as autoridades estaduais que respondem pelas consequências
(Haim, C-424/97).

Embora a Comissão já tenha suscitado o problema, na fase pré-contenciosa (Comissão c.


Dinamarca, C-52/90), das infrações resultantes de decisões judiciais (abrangidas pelo art.
258º), mantém-se inédita a iniciativa contenciosa com este fundamento.
➢ No caso de acontecer, caberá ao Estado-Membro tomar as medidas necessárias à
execução do acórdão do TJ, respeitando sempre o princípio da independência dos juízes.
o No limite, terá o Governo do Estado-Membro condenado de, no exercício do
poder legislativo, nos termos definidos pela respetiva Constituição, de alterar a
legislação material e/ou processual que alimenta a jurisprudência “dissidente”
dos tribunais nacionais.

TJ também já admitiu que pode haver imputação ao Estado-Membro mesmo nos casos em que
os particulares atuam com independência em relação ao Estado e aos demais poderes públicos.
• Caso Comissão c. França, C-265/95: “guerra dos morangos” em que estava em causa
entrave à livre circulação de mercadorias (vandalismo para protestar contra importação
de morangos espanhóis) – o Estado-Membro teria de agir e adotar as medidas
necessárias ao cumprimento das regras eurocomunitárias56
• MLD: pode um Estado-Membro ser condenado pelo caso da megafraude da Volkswagen
sobre a emissão de poluentes pelos veículos automóveis, pois houve violação das
normas comunitárias, por entidades privadas, mas em domínios nos quais as
autoridades nacionais estão investidas de poderes específicos de controlo e regulação.

56
Se, p.e., há um bloqueio de estradas, mas as forças policiais nada fazem para desbloquear e deixar
passar mercadorias de outro Estado-membro, o TJ pode atuar (livre circulação de mercadorias) – isto
aconteceu na chamada guerra dos morangos (C-265/90), em que a França foi condenada, por não ter
usado a força para desbloquear as estradas, fazendo com que os morangos espanhóis não conseguissem
passar e portanto não conseguissem chegar ao seu destino final

59
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Procedimento Pré-Contencioso
Caso de Comissão c. Estado-Membro
Fase administrativa que visa esclarecer dúvidas em torno do alegado incumprimento do Estado-
Membro ou para adotar medidas necessárias à reposição da legalidade.
➢ Fase preambular em que a admissibilidade e mesmo a procedência do recurso judicial
dependem da forma como forem observadas pela Comissão as exigências de
fundamentação e respeito pelo princípio da cooperação leal na fase procedimental.

A. CARTA DE NOTIFICAÇÃO DE INCUMPRIMENTO


Abertura da fase pela Comissão, no uso de poderes discricionários de apreciação.
Se a resposta das autoridades nacionais não for elucidativa e satisfatória, a Comissão pode optar
pelo procedimento formal que se inicia.

Carta deve ser inequívoca, com citação expressa da base jurídica (art. 258º TFUE), respeitando
certas exigências:
1) delimitação clara da alegada situação de incumprimento;
2) enunciação completa do âmbito e teor da alegada situação de incumprimento,
circunscrevendo o objeto do litígio;
3) definição de prazo suficiente de resposta

B. PARECER FUNDAMENTADO
Comissão tem de adotar um parecer fundamentado contendo uma descrição detalhada da
acusação e dos fundamentos, de facto e de direito, do porquê de achar que um Estado-
Membro violou as suas obrigações de fonte eurocomunitária.

Ao Estado-Membro é dado um prazo para por em prática as medidas pressupostas pelo dever
de conformação com DUE.

60
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

É um parecer fundamentado pois há um parecer jurídico dos serviços da Comissão, que


condiciona a iniciativa contenciosa, circunscreve o objeto do litígio, mas carece de força jurídica
para definir os direitos e as obrigações dos Estados-Membros – algo que só pode ser feito
através de decisões do TJUE.

Caso de Estado-Membro c. Estado-Membro


A legitimidade processual ativa de um Estado-Membro na ação por incumprimento está, nos
termos do art. 259º TFUE, dependente de uma tramitação pré-contenciosa, equivalente na sua
função e na intervenção da Comissão à tramitação prevista pelo art. 258º TFUE.

Um Estado-Membro que queira acionar outro tem de submeter a questão à apreciação da


Comissão.
➢ A Comissão dispõe de 3 meses para elaborar o parecer fundamentado.

61
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

➢ No final desse prazo, o Estado-Membro denunciante pode avançar para o recurso


judicial (decidindo tendo em conta o parecer da Comissão57)

A partir do impulso de um Estado-Membro, pode haver uma transformação e a Comissão pode


decidir, após emissão do parecer fundamentado, instaurar ela própria uma ação por
incumprimento, no exercício da sua legitimidade processual própria.
• Decisão que serviria para evitar o litígio direto entre Estados-Membros.
• Apenas 4 processos por incumprimento, de Estado-Membro contra Estado-Membro é
que chegaram à fase de julgamento e acórdão.

Processo de Ação por Incumprimento


I. Requisitos de Admissibilidade
A boa tramitação da fase pré-contenciosa pela Comissão revela-se fundamental na avaliação
das probabilidades de ganho da causa.

O parecer fundamentado deve delimitar de modo preciso o objeto do litígio – é apenas a partir
de uma fase pré-contenciosa regular que o processo contraditório no TJUE permitirá a este
decidir se o Estado-Membro não cumpriu efetivamente as obrigações precisas, cuja violação
é invocada pela Comissão.

Outros requisitos que decorrem do adquirido jurisprudencial (página 261 e ss. MLD):
• Identidade ou coerência entre o parecer fundamentado e a petição
• Alteração da legislação nacional ou eurocomunitária não afeta a admissibilidade da ação
• Incumprimentos posteriores à extinção do prazo fixado no parecer fundamentado são
irrelevantes (data que interessa para apreciar a existência de incumprimento é no
momento da extinção do prazo fixado no parecer fundamentado e não no momento da
notificação ao Estado-Membro)
• Cumprimento posterior à extinção do prazo fixado no parecer fundamentado é
irrelevante
• A Comissão não tem prazo para instaurar a ação por incumprimento a contar do termo
do prazo fixado pelo parecer fundamentado

II. Exigências de Prova


A parte demandante tem o ónus de prova sobre a existência de incumprimento (Comissão c.
França, C-419/03).

Por força do princípio da cooperação leal os Estados-Membros estão obrigados a prestar à


Comissão as informações solicitadas, de forma precisa, clara e completa.
➢ MLD: este comportamento tem de ser recíproco, apesar de nem sempre os serviços
competentes da Comissão atuarem da forma mais objetiva e adequada na relação com
as administrações dos Estados-Membros.

57
Formalidade essencial mas cujo teor não é determinante para o apuramento da existência de
incumprimento – mesmo que o parecer da Comissão conclua que não há incumprimento

62
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

III. Apresentação de Defesa pelos Estados-Membros


• MLD: são muito raros os Estados-Membros que admitem nos autos a existência de
incumprimento.
o São igualmente raros os exemplos de argumentos de defesa considerados
procedentes.

Os representantes dos Estados-Membros demandados optam por explorar a argumentação


baseada nas falhas eventualmente cometidas pela Comissão no que toca às exigências de
natureza procedimental.

A invocação da exceção de ilegalidade já foi admitida pelo TJUE como meio legítimo de defesa.
➢ Também já foi admitida a invocação por Estados-Membros de uma exceção por
inexistência jurídica do ato, em que faltava a base jurídica na ordem comunitária
(Comissão c. França, 6/69)58.

Há uma presunção de legalidade dos atos jurídicos da UE e eles são obrigatórios enquanto não
forem revogados ou declarados ilegais, pelo que o Estado-Membro está vinculado ao dever de
os aplicar na ordem jurídica interna, ainda que um tal comportamento envolva violação de
regras superiores do Tratado.

Podem haver causas de força maior que impedem o Estado-Membro de cumprir as suas
obrigações, tendo este conceito de ser entendido como um caso em que há circunstâncias
anormais e imprevisíveis, cujas consequências não poderiam ter sido evitadas, apesar de todas
as diligências desenvolvidas (Comissão c. Itália, C-334/08).
Do histórico jurisprudencial pode inferir que é praticamente impossível um Estado-Membro
fazer prova desta circunstância.

Pode haver casos de impossibilidade absoluta de execução


Ex: em matéria de auxílios de Estado já não é possível recuperar o auxílio concedido porque a
empresa beneficiária já não existe ou encontra-se insolvente.

Efeitos do Acórdão Declarativo do Incumprimento


O acórdão que declara verificado o incumprimento goza da autoridade de caso julgado: é
definitivo e obrigatório para o Estado-Membro condenado.
Tem unicamente como destinatário o Estado-Membro (a Comissão não tem de instaurar uma
segunda ação por incumprimento) – art. 260º TFUE

Se o Estado-Membro condenado não adotasse as medidas ou o fizesse de modo tardio e


incorreto, a solução seria a instauração de uma segunda ação por incumprimento pela Comissão,
sob a acusação de violação do Tratado por inexecução do acórdão.
➢ Essa segunda ação de condenação poderia não ser suficiente para sanar o problema
caso o Estado-Membro persistir na situação de incumprimento.

58
Este entendimento foi reforçado recentemente com o caso Comissão c. República Checa, C-37/11

63
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

O Tratado de Lisboa contribuiu para aperfeiçoar o mecanismo jurisdicional de aplicação das


sanções pecuniárias no sentido de uma maior celeridade ao permitir, a montante, a simplificação
da fase procedimental e a dispensa da primeira ação por incumprimento:
• Art. 260º/2 deixa de exigir o parecer fundamentado se a Comissão considerar que um
Estado-Membro não tomou as medidas necessárias pode submeter o caso ao TJ, depois
de ter dado ao Estado em causa a possibilidade de apresentar as suas observações59
• Aditamento do art. 260º/3/§1

Em relação ao âmbito (temporal e material) da obrigação de executar o acórdão declarativo


do incumprimento
• A competência do TJ é meramente declarativa – TJ não pode determinar ou impor
medidas específicas, embora possa elaborar sobre o tipo e a extensão das possibilidades
de regularização existentes no caso concreto ou indicar medidas que avalia como
necessárias e adequadas à eliminação do incumprimento.
• TJ não pode fixar prazo para a adoção de medidas – tem de ser o mais rapidamente
possível, em prazo razoável

É diferente a natureza do acórdão proferido sobre o incumprimento, que se apresenta como


processo declarativo, quando comparada com a natureza ou função do acórdão relativo à
verificação da inexecução do primeiro acórdão – que é um processo executivo (Comissão c.
Portugal, C-292/11 P)

Saber qual o órgão interno ou qual a entidade estadual que deve adotar as medidas necessárias
é uma questão a resolver à luz da Constituição e das leis internas.

O destinatário do acórdão é o Estado-Membro, mas, os particulares podem beneficiar, de modo


reflexo, dos efeitos da decisão proferida pelo TJ.

Incumprimento Qualificado e Sanções Pecuniárias60


A iniciativa processual na ação de incumprimento por incumprimento, com vista à aplicação
de sanções pecuniárias, pertence unicamente à Comissão, que a pode exercer em relação a
qualquer acórdão declarativo do incumprimento, nos termos do art. 260º/1 TFUE.
➢ Pertence à Comissão apurar qual o prazo razoável para iniciar o procedimento pré-
contencioso contra o Estado-Membro, tendo em conta o prazo de que o Estado-
Membro dispõe para providenciar pela execução do acórdão de incumprimento.

59
A experiência de funcionamento da segunda ação por incumprimento, decalcada sobre o formato
procedimental da primeira ação por incumprimento, demonstrou que eram necessários vários anos, após
a declaração de incumprimento, para obter a condenação do Estado-Membro relapso ao pagamento da
sanção pecuniária
60
Aumentaram muito os acórdãos que ficaram por executar – a partir dos 70
Chegou-se a uma conclusão que se estava a atingir limite patológico em que Ação por Incumprimento não
estava a funcionar e obrigava-se a avançar para uma segunda ação por incumprimento.
➢ Mas mais uma vez esse acórdão era declarativo e podia não haver medidas de execução.
o Com Maatricht avança-se para um mecanismo sancionatório – veio conferir eficácia ao
modelo de execução do acórdão

64
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Art. 260º/3 foi adicionado com o Tratado de Lisboa e dispensa a fase pré-contenciosa,
permitindo à Comissão que na ação proposta ao abrigo do art. 258º solicite ao Tribunal, a par
da declaração do incumprimento, a condenação do Estado demandado ao pagamento de
quantia fixa ou sanção pecuniária compulsória.

Um dos aspetos mais controvertidos é saber se o Estado-Membro deu ou não execução ao


primeiro acórdão de incumprimento
➢ TJ tem de interpretar o alcance da sua primeira decisão mas não pode reabrir o debate
em torno das obrigações que foram declaradas violadas (protegidas pelo caso julgado).

Art. 260º/2 foi decalcado da fase pré-contenciosa do art. 258º TFUE – simetria funcional entre
a fase pré-contenciosa da primeira ação por incumprimento da fase pré-contenciosa da segunda
ação por incumprimento, abreviada e reduzida à carta para cumprir.
➢ Não pode alterar o objeto do litígio.
➢ A Comissão é obrigada a especificar com clareza os pontos em que o Estado-Membro
não deu execução ao acórdão, sob pena do pedido ser inadmissível.

As sanções pecuniárias a serem aplicadas em sede de incumprimento sobre incumprimento são:


• Quantia Fixa (lump sum) – função de sancionar o incumprimento consumado
• Sanção Pecuniária Compulsória (penalty payment) – função de persuadir o Estado-
Membro a por fim, de modo rápido e completo, ao incumprimento

Estas sanções variam devido aos pressupostos de aplicação e devido a critérios variáveis de
quantificação econométrica – isso é feito através das Comunicações da Comissão (as primeiras
de 1996) e da jurisprudência do TJUE.

Art. 260º/2 TFUE estabelece que a Comissão propõe o montante da sanção pecuniária e é o
TJUE que decide.
• TJ tem ampla margem de decisão.
• TJUE aliás, tem usado da sua liberdade decisória e sobre o caráter alternativo da sanção
fixa e sanção variável pronunciou-se que, por apelo a uma interpretação teleológica e
funcionalista, poder-se-ia aplicar uma dupla sanção.

65
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Caso que deu origem a uma jurisprudência iterativa de aplicação cumulativa dos dois tipos de
sanções.

Quanto à execução do acórdão condenatório ao pagamento de sanção pecuniária, os Tratados


não definem regras próprias sobre o procedimento de execução da sentença condenatória.
• O art. 280º TFUE determina que os acórdãos do TJ têm força executiva nos termos do
art. 299º TFUE, que, por sua vez, exclui o mecanismo da execução forçada contra
Estados-Membros.
o Ao recusar-se a pagar, o Estado-Membro viola uma obrigação que o vincula por
força dos Tratados – o que podia levar a Comissão a recorrer ao mecanismo da
ação por incumprimento.
o Este contencioso pode assumir uma feição circular.

Sem prejuízo dos direitos processuais de ativação de uma fase pós-contenciosa, TG e TJ fixaram
uma jurisprudência que clarifica a delimitação de competências entre, por um lado, o próprio TJ,
titular exclusivo do poder de declaração do incumprimento e de determinação do seu âmbito e,
por outro lado, a Comissão à qual incumbe garantir a execução do acórdão condenatório.
→ Páginas 284 e 285 livro MLD

Fase Pós Contenciosa


Circunstâncias associadas à aplicação de sanções pecuniárias sobre os Estados-Membros levam
a que surja esta fase.

Sanção pecuniária foi introduzida com o Tratado de Maastricht e teve tanto significado que a
Ação por Incumprimento deixou de ser a mesma.
• Antes de 1992 era meramente uma ação declarativa – mas até aos anos 1980 o
incumprimento não era muito reiterado. Mas começou a haver uma altura em que o
incumprimento passou a ser mais evidenciado.
• A partir de 1992, os Estados aceitaram uma revisão para conferir efetividade à Ação de
por Incumprimento, conferindo um caráter mais executivo
o Comissão c. Portugal, C-292/11 P: sanção tem uma característica de executivo.

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Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

No art. 260º/3, introduzido pelo Tratado de Lisboa, permite a Comissão ao recorrer para o
TJUE pedir logo a condenação do Estado e a sanção – violação do dever de comunicação de
transposição de uma diretiva legislativa (incumprimento é considerado mais grave, pelo que
justifica uma ação mais expedita).
• Comissão não tem de ir ao mecanismo do art. 258º e usa o art. 260º/3 como dois em
um.
• Violação da comunicação dos deveres de transposição – transposição parcial ou
incorreta não permite utilizar este mecanismo e terá de utilizar-se o art. 258º.
• Mecanismo expedito que só se aplica à violação de um dever procedimental (dever de
comunicação das medidas) – entende-se assim devido ao princípio da Cooperação Leal

Sanções pecuniárias aplicáveis – art. 260º diz claramente que é quantia fixa OU sanção
pecuniária compulsória
➢ Comissão c. França, C-304/02 (paradigmático do ativismo judiciária): TJUE vem dizer
descaradamente que esse OU deve ser lido como um E
o TJUE confrontava-se com uma possibilidade de alternativa e desvaloriza a letra
do artigo fazendo uma interpretação teleológica: autores do Tratado, ao prever
2 tipos de sanções, fizeram-no porque estas visam objetivos claramente
diferentes.
▪ Quantia fixa pretende punir o Estado pelo incumprimento verificado.
▪ Sanção pecuniária compulsória pretende persuadir o Estado que está
em incumprimento a repor a legalidade do ato – é instrumento de
persuasão.
o Raciocínio do tribunal é que há sanção para o passado e para o futuro,
justificando-se, em alguns casos, que ele seja duplamente penalizado.
o Pode aplicar duplamente as duas sanções.

Jurisprudência está legitimada pois os Estados-Membros, no Tratado de Lisboa, não


clarificaram esta situação e continuaram a permitir esta interpretação.
➢ MLD: A ação dos Estados na revisão legitima a jurisprudência do Tribunal.

Comissão indica valor da sanção mas é TJUE que decide (ele não está vinculado ao que a
Comissão pede).
➢ Só no caso do art. 260º/3 é que TJUE está limitado ao que a Comissão propõe – no art.
260º/2 não há esse limite.

Sanções Pecuniárias pode ter um valor muito avultado


Ex: C-557/14 – quantia fixa 3 Milhões; sanção pecuniária compulsória 8 mil € por dia

Modalidades Preventivas e Extrajudiciais de Controlo do Incumprimento


A montante da fase pré-contenciosa prevista pelo Tratado, a Comissão e os Estados-Membros
desenvolveram mecanismos expeditos de prevenção e resolução extrajudicial de conflitos
gerados por uma alegada violação dos Tratados e da legislação eurocomunitária pelas
autoridades nacionais competentes.

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Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

No seu formato e nos objetivos que os orientam, estes mecanismos replicam uma conhecida
estratégia do paradigma da justiça pós-estadual no sentido de favorecer a solução dos litígios
entre o Estado e os cidadãos fora dos tribunais:
• Centros SOLVIT – funciona desde 2002 e tem como objetivo conseguir, em 10 semanas,
uma resposta a um problema identificado pelos cidadãos e pelas empresas de violação
das regras do mercado interno pelas administrações nacionais.

• Sistema EU-Pilot – iniciativa da Comissão em 2008 funciona como uma plataforma


eletrónica que é acionada pela Comissão e pelos Estados-Membros para comunicar e
esclarecer questões, legais ou materiais, relacionadas com a (des)conformidade do
direito nacional com o Direito da UE, garantida a observância de prazos de tramitação.

Os dois sistemas são de natureza informal e facultativa no que respeita à participação e


colaboração das autoridades nacionais.

Notícia sobre multa ao Estado Português por incumprimento dos horários dos aeroportos
(https://www.dn.pt/pais/interior/bruxelas-pede-multa-pesada-para-portugal-devido-a-slots-nos-aeroportos-10147961.html)
• MLD: Não é que prazo de inexecução seja muito longo. Dois anos não é assim muito mas
Comissão considerou que sim devido ao impacte económico no setor
• Comissão instaurou uma segunda ação por incumprimento onde pede uma dupla
sanção (multa + sanção pecuniária compulsória)
• TJUE, vendo que Estado Português aprovou ontem a legislação, pode fazer uma de duas
(nunca há superveniência da lide):
o Decidir não aplicar a multa – porque já foi dado cumprimento ao primeiro
acórdão.
o Decidir aplicar a multa – porque o incumprimento já aconteceu e multa visa
sancionar o passado de incumprimento.

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Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

VI. CONTENCIOSO DA RESPONSABILIDADE


Responsabilidade Contratual
Art. 340º/§1 TFUE

A UE pode celebrar contratos de direito privado e de direito público com pessoas físicas e/ou
coletivas que tenham residência no território dos Estados-Membros ou não.

O direito aplicável ao contrato e o foro competente para arguir o litígio é escolhido pelas partes.
• O TJUE só pode ser a instância do litígio se a sua jurisdição for reconhecida, de modo
expresso, no contrato.
o Da articulação do art. 272º e 274º TFUE resulta que a o TJUE apenas dispõe de
competência de julgamento da ação de indemnização por responsabilidade
contratual da União se o contrato o prever, sob a forma de cláusula
compromissória. A UE deve ser uma das entidades que celebram o contrato61.
▪ A viabilidade jurídica da cláusula compromissória não depende da sua
conformidade com disposições de direito nacional (Feilhauer, C-
209/90) mas tem de observar certos requisitos de forma e exigências
de fundo.
• O direito aplicável é escolhido pelas partes pelo que poderá o TJUE apreciar a questão à
luz do direito nacional identificado. Em caso de dúvida, prevalece a aplicação do direito
nacional salvo se esta aplicação prejudicar o alcance e a eficácia do DUE (Flemmer, C-
80/99)

Os contratos celebrados pela UE com os seus funcionários são considerados contratos de


direito público, enquadrados pelas regras específicas do Estatuto dos Funcionários (Kergall,
1/55) e sujeitos à jurisdição do TJUE (art. 270º TFUE).

Responsabilidade Extracontratual da UNIÃO EUROPEIA


Art. 268º + 340/§2,3 TFUE

Pela via da ação de indemnização a UE (e automaticamente BCE) pode ser demandada por
qualquer pessoa que solicite a reparação devida por prejuízos resultantes de ato ou omissão
imputáveis à União.
➢ Qualquer sistema judicial tem de garantir, a par do controlo da legalidade, a tutela
indemnizatória de direitos e interesses lesados.

Art. 340º TFUE remete para os princípios gerais comuns aos direitos dos Estados-Membros –
são difíceis de identificar pelo que o TJUE aproveitou para definir uma conceção própria sobre a
responsabilidade da UE, centrada na consideração da especificidade funcional desta união de
Estados Soberanos.

61
O que exclui os contratos de concursos públicos celebrados no quadro do financiamento oriundo dos
fundos comunitários.

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Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Brasserie du Pêcheur, C-352/98: as condições de efetivação da responsabilidade da UE têm de


ser equiparáveis à responsabilidade do Estado-Membro. A proteção que os particulares podem
retirar do DUE não pode variar em função da natureza nacional ou comunitária da autoridade
que está na origem do prejuízo.

Esta via processual é:


1. SUBSIDIÁRIA – ação de indemnização contra a UE é sempre subsidiária em relação às
ações de indemnização contra os Estados-Membros
• A maioria das normas eurocomunitárias são aplicadas pelos Estados-Membros
(art. 291º/1 TFUE), o que coloca a questão de saber quem é o responsável pelos
prejuízos alegadamente causados e quem deve ser demandado.
i. Facto gerador do prejuízo resulta de ato adotado pelo Estado-
Membro: competência é do juiz nacional, ao qual cabe decidir sobre o
dever de indemnizar por parte do Estado-Membro, salvo se também
estava em causa competências de vigilância e fiscalização a exercer por
instituições da UE62.
ii. Atos nacionais de execução de normas ou atos da UE: decisor nacional
apenas se limitou a cumprir o dever de garantir a execução da norma
ou ato eurocomunitário que gozam de presunção de legalidade

iii. Responsabilidade partilhada entre UE e Estados-Membros: não


consagra o regime da responsabilidade solidária e sim o regime da
responsabilidade conjunta em que cada um dos potenciais autores do
prejuízo (UE e Estado-Membro) respondem no âmbito da respetiva
responsabilidade. Isto obriga o lesado a demandar primeiro o decisor
nacional, nos tribunais nacionais, e depois o decisor da UE, no TG63.
2. AUTÓNOMA
• Ação de indemnização é autónoma das restantes vias processuais previstas nos
Tratados relativas à interpretação e aplicação DUE.
• A partir dos casos Lütticke e Zuckerfabrik o TJUE corrigiu a trajetória que iniciou
com Plauman e estabeleceu o princípio da autonomia da ação de indemnização.

62
TJUE tem orientação restritiva sobre a eventual relevância destes deveres de fiscalização como fonte
geradora de responsabilidade (Cato, C-55/90; Vendedurías de Armadores Reunidos, T-61/01).
63
Tem de haver esgotamento das vias processuais adequadas junto dos tribunais nacionais – exigência
prévia de admissibilidade da ação de indemnização contra a UE, junto do TJUE.

70
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

• A ação de indemnização e o recurso de anulação prosseguem finalidades


distintas de garantia contenciosa, pelo que a admissibilidade do pedido de
tutela ressarcitória não depende da impugnação prévia do ato jurídico da UE
– enquanto a ação de indemnização via a reparação do prejuízo causado pela
instituição no exercício da sua missão, o recurso de anulação visa a supressão
de um determinado ato.
3. COMPENSATÓRIA – compensa a natureza restritiva da legitimidade ativa dos
particulares em sede de recurso de anulação, contribuindo assim para um nível
adequado de tutela jurisdicional efetiva

Requisitos de Admissibilidade
A. Tribunal Competente
Art. 256º TFUE: Tribunal Geral, mesmo que ação de indemnização seja instaurada por Estado-
Membro ou Instituição (art. 51º ETJUE).
➢ Pode haver recurso para o Tribunal de Justiça (art. 56º ETJUE) mas há limitações quanto
aos factos do processo, que ficam encerrados junto do TG (art. 256º/1/§2 TFUE e art.
58º ETJUE).

B. Legitimidade Ativa
Qualquer pessoa, física ou coletiva, de direito privado ou de direito público, interno ou
internacional, tem o direito de, com fundamento no art. 340º TFUE, instaurar uma ação de
indemnização contra a UE e o BCE.

C. Legitimidade Passiva
A questão de saber contra quem deve ser instaurada a ação de indemnização suscita vários
dúvidas que se reconduzem a: i) Imputação do Prejuízo; ii) Representação da UE

i) IMPUTAÇÃO DO PREJUÍZO
Atos das Instituições: expressão “instituição” abarca também órgãos e organismos
comunitários.

As entidades criadas por ato convencional celebrado entre os Estados-Membros (como o


Mecanismo Europeu de Estabilidade) têm natureza intergovernamental, pelo que se presume
que o TJUE rejeita a imputação, porque entende que os efeitos dos atos adotados pelo MEE
remetem para a ordem jurídica internacional e respetivos mecanismos de aplicação e
responsabilização

71
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Atos dos Agentes das instituições no exercício das suas funções: responsabilidade da UE só
pode ser acionada em situações em que as ações possam constituir o prolongamento necessário
das missões confiadas às instituições (Sayag, 9/69)
➢ MLD: ideia subjacente é bizarra porque exclui do âmbito da UE todos os atos e omissões
dos seus agentes que, por natureza, não possam ser executados pelas instituições, como
conduzir um automóvel.

Delegação de Poderes: UE pode ser responsabilizada pelos danos causados pela entidade que
atua, no quadro da delegação de poderes, em substituição da instituição titular da competência

72
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

ii) REPRESENTAÇÃO DA UE
Ação de indemnização visa a União, dotada de personalidade jurídica, e não a instituição, que,
no caso concreto, estará alegadamente, na origem do prejuízo.
• Representação da UE em juízo cabe à instituição que causou o prejuízo, podendo ser
uma representação partilhada.

O acionante deve instaurar a ação de indemnização contra a UE, com a especificação de qual ou
quais as instituições/órgãos/organismos da UE causadores do prejuízo e que assumem, no
processo, a função de representação da União.
➢ TJUE não é formalista e uma petição contra a Comissão e Conselho, quando deveria ter
a UE como demandada, não é, só por isso, inadmissível, desde que não afete os direitos
de defesa (Bühring, T-246/93).

Não é procedente a pretensão da Comissão de nela centrar a função de representação da UE


junto do TJUE (por analogia ao art. 335º TFUE).

D. Prazo de Prescrição
Ação de indemnização contra a União Europeia prescreve no prazo de 5 anos64 a contar da
ocorrência do facto que lhe tenha dado origem – art. 46º ETJUE.
➢ Esse prazo não começa a correr se for instaurado recurso de anulação ou omissão, que
tenha por objeto o facto gerador do prejuízo (Giordano, 11/72).

Se o prejuízo resulta de ato ilegal, o prazo de prescrição só começa a contar da data de cessação
de vigência, por revogação, declaração de ilegalidade ou qualquer outro tipo de ato interruptivo
(Steffens, T-222/97).

A apreciação subjetiva da realidade do dano pelo demandante não pode ser tomada em
consideração na determinação do ponto de partida do prazo de prescrição (Fratelli Rossi, C-
136/01; Comissão c. Cantina Sociale, C-51/05).
➢ O prazo começa a contar a partir do momento em que o prejuízo sofrido pela vítima se
concretizou efetivamente.

TJUE admite a instauração de ação de indemnização em situações de dano futuro, embora


iminente e previsível com um grau suficiente de certeza (Zuckerfrabrik, 281/84) – o prazo de
prescrição ainda nem sequer começou a contar

Ao contrário dos prazos processuais, cuja violação é examinada oficiosamente pelo TJUE, a
questão da inadmissibilidade da ação com fundamento no esgotamento do prazo de prescrição
tem de ser suscitada pelo interessado processual.

Fundamentos da Responsabilidade
Doutrina jurisprudencial inspirada pelos princípios gerais comuns aos direitos dos Estados-
Membros, designadamente pela teoria civilista relativa aos pressupostos da responsabilidade
aquiliana.
➢ Há desvios tendo em conta a especificidade da UE – não se exige a verificação da culpa.

64
Prazo mínimo – em caso algum pode ser inferior a 5 anos (Kampffmeyer, 1966).

73
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Verificação cumulativa das exigências quanto a 3 tipos de requisitos (Giordano, C-611/12 P):
1º. ILEGALIDADE do comportamento imputado à instituição da União
a. Ilegalidade do Ato Normativo – tem de haver uma violação suficientemente
caracterizada de uma norma superior de direito que proteja os particulares
(Zuckerfabrik, 5/71)
• Ato normativo: depende da natureza ou conteúdo do ato, tendo de
conter escolhas de política económica (não interpretada literalmente e
entendida como “escolhas de política” – implicam escolhas entre
soluções diferentes)
• Três elementos da ilegalidade qualificada/suficientemente
caracterizada:
1. Violação suficientemente caracterizada – violação grave e
manifesta (Amylum, 1977). Nos casos em que a instituição tem
margem de apreciação reduzida ou inexistente, a simples
infração ao direito comunitário pode bastar para provar a
existência de uma violação suficientemente caracterizada
(Bergaderm, C-352/98 p).
2. Norma violada é regra superior de direito – violação de uma
regra de direito (desenvolvimento com Bergaderm); uma regra
jurídica que confira direitos aos particulares (onde nessa função
garantidora reside a sua superioridade no quadro do DUE)
3. Violação de norma que visa proteger os particulares/conferir
direitos aos particulares – o particular que sofreu um prejuízo
só pode obter uma reparação se for bem sucedido na
demostração que pertence precisamente ao grupo que a norma
jurídica violada pretende proteger65.

b. Ilegalidade de ato de execução – basta a invocação da mera ilegalidade para


haver já uma violação. A simples infração do direito comunitário é suficiente
para implicar a responsabilidade extracontratual da UE (Fresh Marine, T-
178/98)
c. Responsabilidade por ato lícito – ainda está no limbo das hipóteses (havendo
somente debate doutrinário). Mas no caso Biovilac (59/83) o TJ já admitiu a
hipótese de um regime de responsabilidade por ato lícito. A jurisprudência
FIAMM (T-69/00) não deve ser interpretada como uma posição de rejeição do
princípio da responsabilidade por ato lícito, havendo jurisprudência posterior
que não descarta essa hipótese. O enriquecimento sem causa pode aqui ser
enquadrado.

2º. Existência do DANO


a. Cabe ao acionante, na qualidade de lesado que solicita a reparação,
providenciar provas sobre a validade ou existência do dano.
b. Prejuízo deve ser real, certo e quantificável no momento em que se intenta a
ação.

65
Inspiração da Lei Fundamental Alemã (art. 34º)

74
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

c. Pode ter natureza não patrimonial de dano moral (Carona, T-59/92)

3º. NEXO DE CAUSALIDADE entre o comportamento da UE e o dano invocado


a. Os atos ou omissões da UE devem ser a causa direta e imediatamente
determinante da lesão infligida no património e/ou nos direitos do
demandante.

Efeitos do Acórdão proferido sobre o Pedido de Indemnização


UE (ou BCE) é obrigada a pagar a indemnização pedida, sendo que o cálculo da mesma pode
ser feito pelo TJUE ou, via acórdão interlocutório, ser remetido para o acordo das partes66.

Força executiva (art. 280º e 299º TFUE) que é regulada pelas normas de processo civil do Estado
em cujo território a UE foi demandada.
➢ Art. 1º Protocolo relativo aos privilégios e imunidades da União Europeia – bens e
haveres da UE não podem ser objeto de qualquer medida coerciva sem autorização do
TJUE

Acórdão de improcedência tem autoridade relativa de caso julgado, mas, este não é oponível a
terceiros.

Em 2017 o TJUE predispôs-se a ultrapassar a acusação de que tem dois pesos e duas medidas
face à apreciação da responsabilidade extracontratual da UE e quanto à responsabilidade dos
Estamos-Membros.

4 de abril 2017, C-337/15 P, Provedor de Justiça c. Staalen


➢ Processo começou no TG
o Staalen ficou colocada numa lista de aprovados no Parlamento Europeu – mas
entende que esta lista foi tratada de forma incorreta e houve má administração.
o Queixou-se ao Provedor de Justiça que abriu inquérito mas encerraram-no logo.
Mesmo quando reabrem o processo concluem que não houve má
administração.

66
Se esse acordo falhar cabe sempre ao juiz da UE a determinação do montante de indemnização.

75
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

o Staalen considerou que Provedor de Justiça agiu mal e obteve da provedoria um


pedido de desculpas.
o Instaura em tribunal uma ação contra o provedor com um pedido de
indemnização – art. 340º

Tribunal entende que Provedor de Justiça pode ser admitido para efeitos do art. 340º, mesmo
não sendo uma instituição (C-234/02 P) – Tribunal alarga legitimidade passiva face àquilo que
decorre expressamente da letra do artigo.

Aqui entendeu o mesmo e reconhece que Staalen pode demandar a Provedoria.

Verifica que houve violação do dever de diligência e concedeu à cidadã uma indemnização por
danos morais – a quebra de confiança no Provedor de Justiça é indemnizável.

Provedor de Justiça considerou que TG cometeu erros de apreciação e recorreu para o TJ.

O acórdão do TJ, em sede de recurso, primeiro começa por considerar que TG cometeu um
erro de direito – considerar como suficiente uma violação simples do dever de diligência, pois
exige-se uma violação “suficientemente caracterizada”
➢ Quis manter como atual uma fórmula que vem desde o Acórdão Zuckerfabrik, dos anos
70 – só há lugar a indemnização se houver uma “violação suficientemente caracterizada
de uma regra superior de direito que protege os particulares”.
➢ TJ vem dizer que Provedor tem poder de apreciação (se abre ou não inquérito e quando
deve dá-lo por terminado) com margem de discricionariedade – o que se deve sindicar é
se não houve uma violação desse poder de apreciação por violação suficientemente
caracterizada.

TJ anula acórdão do TG, por ele não ter verificado se houve essa violação grave e manifesta.
➢ TJ considerou que tinha todos os elementos de prova para julgar o caso: e chegou à
mesma conclusão que TG e reconheceu indemnização
o No entanto não foi pela mesma fundamentação apresentada pelo TG – houve a
verificação da violação suficientemente caracterizada e tal estava presente
nesse caso.

30 de maio de 2017, C-45/15 P, Sepahan


Empresa Iraniana sofreu medida de congelamento de fundos na sequência da PESC.
➢ Pediu provas e fundamentação para esse congelamento por parte do Conselho –
Conselho manteve o congelamento e negou o acesso aos documentos.

Sociedade recorre para o TG para impugnar a Decisão do Conselho de congelamento dos bens
– TG dá razão por falta de provas.
➢ TG dá indemnização de 50 mil €, pedida pela sociedade.
o Todos ficam insatisfeitos – Sociedade diz que é pouco, Conselho diz que TG
andou mal
o Ambos recorrem para o TJ

76
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

TJ considerou que a declaração de nulidade não é suficiente como forma de reparação do que
a sociedade sofreu – ela agora poder aceder aos capitais não é suficiente para compensar não
ter podido aceder durante 3 anos.
➢ Mas TJ não acede à sociedade quando ela pede reparação pelos danos materiais – tem
de ser efetivo e sociedade não fez prova da ocorrência desses prejuízos reais e efetivos
que tinham uma relação direta com a decisão de congelamento dos bens.
➢ Mantém a decisão do TG

Recusa por parte do Conselho o acesso aos documentos que dariam à sociedade a
fundamentação dessa medida – aí houve uma violação suficientemente caracterizada que
permite essa responsabilidade extracontratual.

MLD: Os pressupostos continuam a ser restritivos – nem todos os danos são indemnizáveis.
➢ Mas dentro desse contexto o TJUE demonstra maior abertura para o exercício ao direito
a uma indemnização.

Responsabilidade Extracontratual dos ESTADOS-MEMBROS


Em violação do Direito da União Europeia

Em matéria de ação de indemnização, os Tratados limitam-se a remeter para os direitos


nacionais a concreta definição dos elementos da responsabilidade extracontratual, abrindo a
porta à decisão jurisprudencial sobre a densificação a dar aos requisitos fundamentais da
ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidade.
➢ Esta remissão deveria ser acompanhada de uma previsão expressa nos Tratados do
dever de indemnizar por parte dos Estados-Membros quando há violação de DUE.
o Nunca aconteceu, apesar de ter havido varias propostas ao longo da história da
UE.

A recusa dos Estados-Membros positivarem esta matéria não evitou a construção


jurisprudencial – manifestação típica de ativismo judicial que busca a respetiva legitimação na
ausência de resposta por parte do decisor normativo.
→ ACÓRDÃO FRANCOVICH, 19 DE NOVEMBRO DE 1991: TJUE identifica como princípio
geral de DUE, como inerente ao sistema do Tratado, a responsabilidade de um Estado-
Membro por violação do DUE.
o É pressuposto pelo direito eurocomunitário, como inerente ao sistema jurídico
da tutela jurisdicional efetiva que suporta a União de Direito.

Cabe às Ordens Jurídicas internas regulamentar as modalidades processuais das ações judiciais
destinadas a assegurar a plena proteção do direito à reparação – princípio da autonomia
institucional (limitada pelo critério da equivalência e da efetividade67)

67
Traghetti, C-173/03: legislação italiana foi considerada excessivamente restritiva, logo contrária ao
dever de indemnizar. A obrigação de reparar os prejuízos causados aos particulares não pode ficar
subordinada a condições extraídas do conceito de culpa que ultrapassem o pressuposto pela violação
suficientemente caracterizada do DUE.

77
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Em Portugal: art. 22º CRP + Lei 67/200768

Para haver lugar a responsabilidade extracontratual do Estado-Membro o TJUE identifica, no


caso concreto de prejuízos por não transposição de diretiva:
1. Resultado prescrito pela diretiva atribui direitos a favor dos particulares
2. Conteúdo desses direitos é identificado com base nas disposições relevantes da diretiva
3. Existência de nexo de causalidade

O caso Brasserie du Pêcheur/Factortame (C-46/93 e C-48/93) vem responder a dúvidas


deixadas pelo Francovich, confirmando a leitura do princípio geral da responsabilidade mas
aperfeiçoando as condições que sujeitam o Estado-Membro ao dever de reparação69:
1. A regra de DUE violada tenha por objeto conferir direitos aos particulares
2. A violação é suficientemente caracterizada (desrespeito grave e manifesto)70
3. Existência de nexo de causalidade entre violação e prejuízo sofrido

O princípio fundamental da autoridade do caso julgado e o caráter definitivo das decisões


proferidas pelos tribunais supremos não são obstáculo ao reconhecimento da
responsabilidade do Estado-Membro por facto de sentença – o demandante numa ação de
indemnização bem-sucedida ganha o direito à reparação, mas não, necessariamente, o direito
a uma alteração da matéria julgada na decisão geradora do prejuízo.

68
Que foi impulsionada pela condenação do Estado português no TJUE, pela definição de um regime
jurídico-processual de ativação da responsabilidade do Estado por violação do DUE
69
O caso Bergaderm (C-352/98 P) vem concluir, de modo coerente, que o dever de reparação por parte
da UE também se impõe quando satisfeitas as 3 condições de verificação de que depende a
responsabilidade dos Estados-Membros.
➢ Convergência entre o regime jurídico aplicável à responsabilidade da UE e dos Estados-Membros
o que leva a que a interpretação e aplicação dos regimes nacionais sobre a responsabilidade, por
um tribunal nacional, é necessariamente orientada por um dever de interpretação conforme a
jurisprudência do TJUE (tanto a proferida ao abrigo de questões prejudiciais como as decisões de
pedidos de indemnização).
70
Köbler (C-224/01): essa violação da regra comunitária pode ser por decisão imputável a juiz nacional
➢ Tomásová (C-168/15): responsabilidade do Estado por exercício da função jurisdicional depende
da violação perpetrada por um tribunal nacional que decide em última instância

78
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Lei 67/2007, à luz do dever de interpretação conforme com DUE


Em 2004 (Acórdão C-275/03), o Estado português foi declarado em situação de incumprimento
por não revogar um DL de 1967 na parte em que subordinava a indemnização das pessoas
lesadas pelo Estado à prova da existência de culpa ou dolo71.

Em 2008 (Acórdão C-70/06), o Estado português volta a ser condenado pois a Lei 67/2007 não
garantia a execução do primeiro acórdão condenatório.
➢ Altera-se esta lei, acrescentando o art. 7º
o MLD: positivação sob a forma de remissão genérica para o regime jurídico
eurocomunitário da responsabilidade do Estado por violação do DUE é
redundante.
▪ Haveria remissão cruzada (regime nacional remete para o DUE e DUE
remete para os nacionais, na medida que o seu regime assenta nos
princípios gerais comuns aos direitos dos Estados-Membros).

MLD: quase todas as omissões e incongruências que a doutrina tem apontado à Lei 67/2007
podem ser supridas pela via, mais ou menos criativa, da interpretação conforme ao DUE, tal
como resulta da jurisprudências contante do TJUE.
Apenas pode haver dúvidas quanto:
• Art. 15º (Responsabilidade no exercício da função legislativa) – falta referência à
omissão, mas, na jurisprudência do TJUE sobre a noção relevante de incumprimento não
há uma distinção entre o incumprimento que se traduz em ação e o que se traduz em
omissão (Comissão c. Itália, 31/69).
→ Páginas 339-342 livro MLD

71
Estando em causa a transposição de uma diretiva (Diretiva 89/665 – Diretiva Recursos) sobre aplicação
de processos de recurso em matéria de adjudicação de contratos de direito público e obras de
fornecimento, que definia uma responsabilidade objetica.

79
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

• Art. 13º/2 – interpretação influenciada pelo Acórdão Silva e Brito, C-160-14


o A exigência da revogação prévia da decisão judicial danosa, quando essa
revogação está, na prática, excluída, como acontece com as hipóteses de
reapreciação das decisões do STJ, contraria o DUE, em especial os princípios
definidos pelo TJ em matéria de responsabilidade do Estado por danos causados
aos particulares em resultado de violação de DUE cometida por tribunal de
última instância.
▪ A tutela, através da reparação financeira, funciona como medida
compensatória para o lesado que já não pode, no quadro das vias
internas de recurso, obter uma revisão da decisão danosa (dado o caso
julgado).
▪ Este artigo constitui um obstáculo à aplicação efetiva do DUE, quando
está em causa uma interpretação manifestamente errada do DUE por
um tribunal superior que viola o dever de submeter um reenvio
prejudicial ao TJUE.
▪ O TC (Acórdão 363/2015) apontou uma solução dual (pode ser
incompatível com DUE mas é compatível com art. 22º CRP) e, 2 meses
depois, o caso Silva e Brito vem afastar quaisquer dúvidas e define como
sendo incompatível com o DUE.
▪ O acórdão foi vinculativo para o tribunal que suscitou a questão
prejudicial, devendo este desaplicar o art. 13º/2. Por força do
princípio do precedente atípico, desde a data deste acórdão, os
tribunais portugueses estão impedidos de aplicar a exigência
processual do art. 13º/2 Lei 67/2007 sempre que o fundamento do
pedido de indemnização seja violação do DUE.
• MLD: segurança jurídica está em perigo devido a uma aplicação
casuística e desigual pelo que se insta o legislador a revogar esta
norma ou a adaptá-la de modo a garantir uma solução
equivalente e efetiva às exigências do DUE.
→ Páginas 343-348 livro MLD

80
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

- VIAS PROCESSUAIS ESPECIAIS -

VII. MEDIDAS PROCESSUAIS DE TUTELA PROVISÓRIA


Todo o sistema de vias processuais de direito, se coerente com a exigência primordial da tutela
judicial efetiva, deve garantir ao sujeito jurídico o acesso a proteção cautelar/provisória.
Proteção esta que é:
• Limitada – juiz não pode, com a sua decisão nesta fase, prejudicar/inviabilizar a decisão
final sobre a substância do litígio concreto
• Antecipatória – a natureza dos interesses em jogo torna suscetível de lesão grave e
irreparável, em função do tempo de espera, pela dirimição definitiva do caso.

MLD: tutela cautelar representa um instrumento adequado e necessário de salvaguarda do bem


jurídico ameaçado pelo desencontro entre tempo real e tempo processual.

Art. 278º e 279º TFUE


Resulta dos princípios gerais comuns aos direitos dos Estados-Membros e da jurisprudência
relevante do TEDH (a propósito dos art. 6º e 13º CEDH na sua dimensão positivada de direito ao
recurso judicial).

Esta proteção é acessória e provisória


• Não cumprem fim autónomo e desligado do processo principal, estando em causa a
conservação de direitos e interesses cuja exata composição terá de aguardar pela
decisão no processo principal.
• O pedido de suspensão de execução do ato ou decretamento de qualquer outra medida
provisória só é admissível se o requerente tiver impugnado o ato em causa ou se o
requerente for parte em processos perante TJUE – art. 160º/1, 2 RPTJUE
• É provisória em termos cronológicos e funcionais – surge antes da decisão final e não a
pode prejudicar/comprometer

Art. 278º TFUE: reconhece-se o poder para determinar a suspensão da execução (ou eficácia)
do ato impugnado.
➢ A interpretação deste artigo é no sentido de limitar a competência de proteção cautelar
por parte do TJUE à suspensão de medidas tomadas pelo decisor eurocomunitário.

Art. 279º TFUE: alarga a competência judicial de proteção cautelar a um conjunto de medidas
não tipificadas, definidas pela sua dupla natureza de “provisórias” e “necessárias”.
➢ Ampla margem de apreciação do juiz da União no que respeita às circunstâncias do caso
concreto e à escolha da medida que melhor se adeque à salvaguarda do interesse
jurídico invocado pelo requerente, com respeito pelos limites e pressupostos da tutela
cautelar72.

72
Não podem é ter efeito automático de substituição do titular da competência normativa ou
administrativa, devido à separação de poderes

81
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Contexto Processual do Pedido de Medidas Provisórias


As medidas provisórias são pedidas no quadro de um processo instaurado junto do TJUE no
âmbito de uma das vias contenciosas de direito expressamente previstas nos Tratados.
➢ Não é admissível um pedido de proteção cautelar formulado no quadro do mecanismo
das questões prejudiciais, pois este carece da natureza de um processo contencioso e
nele, os eventuais interessados neste tipo de proteção não têm sequer o estatuto de
partes73.

O pedido de medidas não tipificadas afigura-se compatível com um contexto processual de


base mais alargado: ação de indemnização, ação por incumprimento, contencioso da função
pública da UE, recurso das decisões do TG para o TJ, recurso de anulação e recurso por omissão.

Tribunal de proteção cautelar e Juiz competente


Decisão 2012/671/UE (com base no art. 10º/3 RPTJUE): a competência para a apreciação dos
pedidos de proteção cautelar passou do Presidente do TJ para o Vice-Presidente (art. 161º/1
RPTJUE).
➢ Nos termos do art. 11º/3 RPTG, o TG poderá decidir no mesmo sentido análogo de
delegar no Vice-Presidente esta competência – mas apesar de haver Vice-Presidente, o
poder continua no presidente (art. 157º e 158º RPTG).

Requisitos Processuais
A. O Pedido
O pedido é apresentado em requerimento separado (art. 160º/4 RPTJUE) na mesma altura em
que dá entrada a petição ou em momento posterior ao início do processo principal.

O requerimento pode ser submetido em qualquer momento durante o tempo de duração da


instância, embora uma suscitação tardia é suscetível de comprometer o juízo favorável sobre a
urgência da solicitação (IMS, T-346/06).
➢ É considerado extemporâneo o pedido apresentado depois do encerramento da fase
escrita e da fase oral, escassas seis semanas antes da data anunciada para a prolação do
acórdão (Barbara, 1958).

Este pedido, apesar de ser formulado em separado e tramitado em processo autónomo, pode
ser prejudicado pela manifesta falta de admissibilidade do pedido principal.
Ex: impugnação de uma decisão da comissão que notifica o interessado da recusa de instaurar
ação por incumprimento dada a natureza insindicável do ato (Schulz c. Comissão, C-97/94).

O problema da legitimidade processual dos particulares em sede de impugnação de atos que


não lhe sejam dirigidos, na sua reconhecida complexidade, não é de molde a suscitar prima facie
uma posição inequívoca sobre o caráter (in)admissível do recurso.

73
Factortame e Atlanta: TJUE não é competente para decidir sobre medidas cautelares no quadro do art.
267º TFUE mas não está impedido de definir o âmbito dos deveres do juiz nacional como garante
subsidiário da tutela provisóra.

82
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

MLD: o juízo prévio de admissibilidade do pedido no litígio principal não deixa de interferir
com a decisão sobre o pedido de medidas provisórias.
➢ Embora limitadamente, de modo a evitar um julgamento antecipado do mérito da
causa, o juiz das medidas cautelares é obrigado a analisar o pedido e a fundamentação
do recurso principal, através de uma análise perfunctória e que consiga apurar o
fumus boni juris.

B. Requerentes
A suspensão da execução do ato só pode ser requerida pelo demandante que impugnou o ato
perante o TJUE.

Quando está em causa o decretamento de qualquer outra medida provisória necessária, o


requerente pode ser qualquer parte no processo principal, demandante ou demandado.

À parte requerente cabe provar que prossegue um objetivo específico com o pedido de
medidas provisórias: o interesse processual em agir.
Ex: esse interesse pode traduzir-se na relação entre a medida solicitada e o objetivo de evitar
que os seus direitos e interesses sejam lesados de forma grave e irreparável (Denfil, 310/85 R).

Mesmo os Estados-Membros, que não precisam de demonstrar interesse em agir no quadro do


contencioso de anulação, estão sujeitos a um escrutínio que incide sobre a verificação da
utilidade prática da medida solicitada (Itália c. Comissão, T-431/04 R).
➢ O mesmo se aplica a todos os recorrentes privilegiados.

Na ausência de efeito útil, o pedido deve ser liminarmente indeferido, porquanto a medida de
suspensão de execução do ato e qualquer outra providência se revelariam inúteis na
modificação da situação jurídica do requerente.

83
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

C. Destinatários
Art. 160º/5 RPTJUE: o pedido de medidas provisórias tem de ser notificado à “outra parte”
Em virtude do caráter acessório, a medida solicitada deve visar a parte oponente no processos
principal.

Requisitos Substantivos
O TJUE exerce a sua competência de juiz de medidas cautelares no quadro de uma teoria clássica
sobre a confluência necessária e cumulativa de 3 requisitos de decisão74:

1. Aparência de Bom Direito (fumus boni iuris)


Verificação de uma probabilidade séria da existência do direito invocado na causa principal ou
da procedência da pretensão formulada no processo principal.

O requerimento de medidas provisórias deve demonstrar, com elevada probabilidade, que o


pedido no processo principal não é destituído de fundamento jurídico.
• Mas não se trata de obter do juiz uma promessa de decisão favorável.
• Cabe ao requerente apresentar os fundamentos de facto e de direito que constam da
petição e que demonstram a viabilidade jurídica do pedido principal.

Avaliação é perfunctória e instrumentalmente orientada pelo objetivo de decidir sobre a


necessidade de tutela jurisdicional provisória.
➢ Dependendo do caso concreto, o TJUE já considerou este critério preenchido atendendo
a diversos requisitos relacionados com as circunstâncias específicas do litígio.

2. Urgência (periculum in mora)


Risco fundado de ocorrência de prejuízo grave de difícil reparação para os interesses que o
requerente visa assegurar no processo principal, pelo que se torna urgente, no sentido de
inadiável, adotar a medida solicitada.

O decretamento da medida provisória depende de um juízo de verosimilhança75 sobre o facto


de a medida provisória, se não for adotada, resultar em prejuízo grave e irreparável (ou de
difícil reparação) na esfera jurídica do requerente.
➢ Cabe ao requerente fazer prova que não pode esperar pelo desfecho do litígio principal
(ESEDRA, T-169/00 R).

74
MLD: juiz das medidas provisória pode atuar com margem amplíssima de apreciação, podendo valorizar
de forma diferente cada uma das condições.
➢ Comissão c. Atlantic, C-149/95 P(R): o juiz das medidas provisórias dispõe de um vasto poder de
apreciação e é livre de determinar, relativamente às especificidades do caso concreto, o modo
como essas diferentes condições devem considerar-se verificadas, bem como a ordem dessa
análise, uma vez que nenhuma norma de direito comunitário lhe impõe um esquema de análise
preestabelecido para apreciar a necessidade de decidir provisoriamente.
➢ O requisito que tem prevalecido é o do Periculum in Mora
75
Não tem de ser comprovado com grau de certeza absoluta – basta que seja previsível em grau
suficiente (Prayon-Ruppel, T-73/98 R).

84
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Salvo circunstâncias excecionais, o prejuízo financeiro não será suscetível de qualificação


como irreparável, uma vez que pode ser objeto de uma compensação financeira posterior, na
sequência da decisão sobre o mérito da causa.
➢ Isto é assim, a não ser que haja uma situação suscetível de colocar em risco a existência
do requerente antes de ser proferido o acórdão que porá termo ao processo principal
(Masetto, T-346/06 R).

Prejuízo que resulta da divulgação de informação confidencial ou que envolve, por outra forma,
a violação de direitos fundamentais: páginas 372-374 livro MLD

3. Ponderação de interesses
Decretamento da medida provisória solicitada fica dependente do caráter prevalecente do
interesse invocado pelo requerente e também do dano superior e agravado que, com elevada
probabilidade, resultará da ausência de diligência cautelar.

A ponderação sobre a relevância relativa dos interesses das partes em litígio só faz sentido se
forem dados como verificados os requisitos relativos ao fumus boni iuris e à urgência.
➢ Mas não é análise totalmente autónoma, porque o juiz das medidas provisórias já foi
obrigado a propósito da natureza grave e irreparável do prejuízo, a sopear a importância
dos direitos e interesses suscetíveis de lesão.

85
Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Efeitos da Decisão sobre Medidas Provisórias


Art. 162º RPTJUE: toma a forma de despacho fundamentado, imediatamente notificado às
partes.
• Se proferido pelo TJ, irrecorrível.
• Se proferido pelo TG, suscetível de recurso (art. 57º/2 ETJUE).

A decisão sobre medidas cautelares não vigora para além da data do acórdão sobre o mérito
da causa, o que tem inegável relevo prático na situação de processos pendentes no Tribunal
Geral.

Uma rejeição de um pedido de medidas provisórias não inibe a parte que o tenha deduzido de
submeter novo pedido, baseado em factos novos (art. 164º RPTJUE).

Tribunais nacionais e medidas provisórias com fundamento no DUE


A tutela provisória assegurada pelo direito comunitário perante os órgãos jurisdicionais
nacionais (art. 274º TFUE: juiz comum do processo de medidas provisórias é o juiz dos tribunais
nacionais, identificado pelos critérios previstos nas legislações processuais de cada Estado-
Membro) não pode variar consoante se discutam:

Medidas Nacionais supostamente contrárias ao DUE – sem prejuízo do princípio da autonomia


processual do Legislador nacional, será ineficaz, por dever de desaplicação, uma qualquer regra
processual interna que proíba, ou apenas restrinja, a competência do juiz nacional como juiz de
medidas provisórias baseadas na exigência do efeito útil das normas e princípios do DUE.
• Casa paradigmático de funcionalização do juiz nacional, cujas competências passam a
ser exercidas no quadro pressuposto pelo DUE, deste retirando a sua legitimidade de
tutela provisória.
• Unibet, C-432/05: incumbe a cada Estado-Membro regular os requisitos de concessão
de medidas provisórias destinadas a garantir a proteção dos direitos conferidos aos
litigantes pelo DUE, desde que tais requisitos respeitem o princípio da efetividade e
equivalência.

Medidas Eurocomunitárias supostamente contrárias ao DUE – o juiz nacional do processo de


medidas provisórias, pressupondo como necessário o conhecimento da jurisprudência relevante
sobre a matéria, estará obrigado a verificar se estão reunidos os requisitos considerados
vinculativos pelo TJUE em detrimento da legislação ou jurisprudência internas de sentido
contrário ou divergente.

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Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Pode justificar um desvio à doutrina Foto-Frost, permitindo ao tribunal nacional, por razões de
urgência, o decretamento da medida provisória baseada na suposta invalidade do ato
comunitário, desde que suspenda a instância nacional e coloque a questão prejudicial de
validade ao TJ (Zuckerfabrik).

Despacho 19 de outubro sobre Medidas Cautelares – C-619/18 R, Comissão c. Polónia


➢ MLD: tomada de posição corajosa do TJUE

Despacho proferido em 17 dias (sublinha bem a urgência das medida cautelares) no âmbito de
uma Ação por Incumprimento, pela Comissão no âmbito do art. 258º TFUE.
• O que está em causa não é o processo do art. 7º TUE (mecanismo político).
• A Comissão assume que são realidades diferentes e vem é aumentar a pressão sobre a
Polónia.

Enquanto no art. 7º é a violação do Estado de Direito no geral, o art. 258º está a ser utilizado
para concretizações de violações do Estado de Direito.
➢ Este art. 258º não era considerado como suscetível de ser utilizado para situações tão
graves – Comissão entendia que devia ser utilizado para situações específicas.

Em outubro há alteração da perspetiva da Comissão, por antever o bloqueio à luz do art. 7º,
decidindo utilizar o mecanismo do art. 258º TFUE.
➢ Mas neste caso a acusação tem de ser muito específica: o que está em causa é a lei
sobre o tribunal supremo da Polónia (reforma do Supremo de forma a aumentar a
possibilidade de o Executivo exercer influência sobre o Tribunal)

Comissão entra com uma Ação por Incumprimento e ao mesmo tempo pede Proteção Cautelar,
que se concretiza na suspensão da lei.
Art. 279º

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Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Avaliação de medidas provisórias pelo TJUE tem em conta: fumus boni iuris + periculum in mora
Aparência de bom direito
Urgência, devido a causar prejuízos irreparáveis

Dúvida agora está em saber se Polónia vai acatar


• Poder-se-ia recorrer ao mecanismo do Incumprimento Qualificado nos termos do art.
260º? Comissão teria de instaurar outro procedimento.
• Mas o art. 260º/2 exige um acórdão e neste caso não está em causa um acórdão. E
agora?
• E mesmo que se se aplicasse, se a Polónia mesmo assim não pagasse? Circularidade –
pois os acórdãos do TJUE não têm força executiva (art. 280º, 299º)

MLD: Grande Confronto


• Momento da integração europeia de cisma.
• Cisão ideológica entre diversos Estados-membros da UE
• União Económica e Monetária funciona como um puzzle: regras Tratado +
Regulamentos + Tratado Orçamental 2012
o Comissão segue as regras mais estritas do Tratado Orçamental

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VIII. RECURSO DAS DECISÕES DO TG PARA O TJ


O princípio fundamental do duplo grau de jurisdição, garantia suplementar de realização da
justiça no exercício do direito de acesso aos tribunais, ficou consagrado nos Tratados, depois
da criação do Tribunal de primeira Instância e, a seguir, reafirmado com a previsão de tribunais
especializados.

Art. 256º TFUE


Critério hierárquico que caracteriza a relação entre os dois únicos tribunais da União Europeia,
depois da importante reforma de 2016, não se esgota no mecanismo do recurso.
➢ Ainda se prevê a figura da reapreciação, cujo objetivo é o de salvaguardar a
uniformidade de jurisprudência nos casos em que exista risco grave de lesão da unidade
ou da coerência do direito da União.

O modelo de recurso das decisões do TG para o TJ foi inspirado pelo regime do chamado
recurso de cassação.
➢ TJ não pode conhecer da matéria ou mérito das pretensões processuais, limitando-se a
sua apreciação aos erros de direito cometidos pelo tribunal recorrido.
o Mas, o TJ pode, se o litígio estiver em condições de ser julgado, decidir
definitivamente sobre o litígio concreto (art. 61º ETJUE).

Objeto do Recurso
Art. 256º TFUE + 58º ETJUE: limitado às questões de direito, tendo como pedido a anulação (total
ou parcial) da decisão recorrida do TG (art. 169º/1 RPTJUE)

Podem ter por objeto acórdãos ou despachos do TG que:


1. Ponham termo à instância
2. Decisões que conheçam parcialmente do mérito da causa
3. Decisões que ponham termo a um incidente processual relativo a uma exceção de
incompetência ou a uma questão prévia de admissibilidade.

Recurso deve ser interposto no prazo de 2 meses a contar da notificação da decisão


impugnada.

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Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

O recurso pode ser interposto por qualquer das partes que tenha sito total ou parcialmente
vencida na decisão tomada pelo TG (art. 56º/§2 ETJUE).

O Estatuto exige a demonstração de um especial interesse em recorrer, pois só podem interpor


recurso se a decisão do TG as afetar diretamente (art. 57º/§2 ETJUE).

Fundamentos do Recurso
Art. 169º/2 RPTJUE
• A legislação processual codificou em 2012 a orientação paulatinamente definida pelo TJ
em relação à obrigação precisa de fundamentação, sob a forma de uma clara
identificação dos pontos controvertidos da decisão do TG posta em causa.
o Segundo jurisprudência constante do TJ, um recurso de decisão do TG não pode
limitar-se a reproduzir os fundamentos e os argumentos já apresentados no
tribunal de primeira instância, sem adiantar argumentos destinados a provar
que este teria cometido um erro de direito (Abello c. Comissão, C-30/96 P).
o Não têm necessariamente de ser argumentos novos, mas tem de haver uma
avaliação crítica da decisão tomada pelo TG, o que corresponde a um estádio
superior de desenvolvimento da argumentação jurídica em causa.

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Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

Efeitos da Decisão do TJ que se pronuncia sobre o Recurso

Se o recurso for julgado procedente, o TJ anula a decisão do TG (art. 61º ETJUE) em parte ou
no seu todo (art. 169º/1 RPTJUE).

Ao TJ cabe, no caso de se decidir pela anulação da decisão recorrida, definir o futuro do processo
entre duas opções possíveis:
1. Julgar definitivamente o litígio, se estiver em condições para isso
2. Remeter o processo ao TG para julgamento (art. 61º/1 ETJUE).

MLD: atendendo ao art. 170º/2 RPTJUE não é descabido assumir que a regra é a do julgamento
do litigio pelo próprio TJ, com inegáveis vantagens em função do objetivo de celeridade, mas
com eventual prejuízo para o recorrente, impedido de exercer plenamente os seus direitos de
defesa como seria o caso se os autos fossem remetidos para o TG.
➢ Entre 1997 e 2012 a taxa de avocação foi de 73% - preferência do TJ pela opção da auto-
decisão.

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Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

CEDH e TEDH
No âmbito da CEDH não há sistema de precedente – até que ponto estão os Estados vinculados
a seguir a jurisprudência do TEDH fora dos processos a que lhes dá origem?

Execução de sentenças também pode ser difícil.


Compensações tendem a ser inferiores ao valor que os tribunais nacionais arbitram.

TEDH não é tribunal de recurso – não há uma revisão das sentenças proferidas a nível nacional.
Não há uma anulação desses atos.
Ao nível do TEDH vai só haver uma compensação.
➢ Rui Guerra da Fonseca: cada vez mais se recorre ao TEDH como instância e de recurso e
não como confirmação.

TEDH não pode estar a assumir uma feição de Tribunal Constitucional?


Começou a ir mais longe nas suas decisões e a apontar medidas que o Estado deveria tomar.
Há um certo deslocamento da função do TEDH – menos justiça individual feita à queixa
apresentada e mais julgamentos com alcance de decidir a questão em geral.
Julgamentos-piloto que resolvem a situação no geral e depois, com base nisso, fazem
recomendações aos Estados.

Protocolo 16 não foi assinado nem ratificado por Portugal – permite aos tribunais superiores
das Altas Partes Contratantes solicitar ao TEDH pareceres consultivos sobre questões de
princípio relativas à interpretação ou aplicação dos direitos e liberdades consagrados na CEDH
ou seus Protocolos.

CEDH e UE
CEDH foi o primeiro catálogo de Direitos Fundamentais/do Homem/Humanos no espaço da
Europa.

Caso Stauder termina o Agnosticismo Valorativo do TJUE e passa a considerar que os Direitos
Fundamentais da CEDH fazem parte dos valores dos Estados-membros como princípios gerais
de Direito.
A partir de 1975 há uma receção expressa da CEDH na jurisprudência do TJUE

CEDH passou a ser parâmetro e fonte de standards e limites à verificação e escrutínio da


legalidade dos atos da UE.

Adesão à CEDH
Antes não havia norma – TJUE não permitia a adesão por não haver norma

Com o Tratado de Lisboa consagra-se norma habilitante: UE “adere”


TJUE é consultado e dá o Parecer 2/13
➢ Todos os Estados-membros dizem que não há incompatibilidade e as problemáticas
jurídicas podiam ser ultrapassadas
➢ TJUE nega a adesão da UE à CEDH

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Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

o TJUE é muito cioso da sua jurisprudência e não se quer ver numa estrutura em
que não esteja ele no topo.

MLD: acha que não vai haver adesão

A adesão é necessária?
É algo que é mais simbólico do que para proteção jurídica.
• Já há proteção jurídica pois a CEDH faz parte integrante da ordem jurídica da UE (art.
6º/3 TUE).
• Disposições da CEDH podem prevalecer se derem proteção mais alta: art. 53º CDFUE
• Triângulo Judicial Europeu: Tribunais Nacionais + TJUE + TEDH
o Não é relação clássica e é atípica – mas o projeto europeu não é de todo típico.
o Tribunais relacionam-se de tal forma que é residual a possibilidade de haver
conflitos entre o TJUE e TEDH. Há uma espécie de reverência mútua em que se
respeitam.

Mesmo sem adesão formal há uma articulação entre textos e tribunais.


➢ UE não pode ser demandada, mas todos os Estados-membros podem.

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Sebenta CUE – 2018/2019 DNB

BREXIT
VICISSITUDES DO BREXIT EM TERMOS JUDICIÁRIOS
Nos tribunais internos do Reino Unido e da Irlanda tem-se debatido o Brexit e as suas
consequências.
➢ Têm vindo a juízo sob forma de ação popular.

Tribunais britânicos têm acionado o mecanismo das questões prejudiciais.

Também há grupos de cidadão que chegam ao Tribunal Geral impugnando este processo de
saída do Reino Unido.

T-458/17 – acórdão TG
Cidadãos ingleses fora do Reino Unido pediam a declaração de nulidade da Decisão do Conselho
de maio de 2017 nos termos do art. 50º TUE.
• Considerou que os particulares não tinham legitimidade ativa.
• Considerou que foi uma decisão política (com base no art. 50º) e intermédia, pelo que
não pode ser sindicado.
o É um ato intermédio que não produz efeitos jurídicos e só provoca
consequências procedimentais.

A 13 de fevereiro de 2018, o supremo tribunal da Irlanda do Norte enviou ao TJUE uma questão
prejudicial acerca da aplicação da legislação comunitária aos cidadãos europeus que se
encontrem no território.

C-621/18, Tribunal Supremo da Escócia, entrou no TJUE a 3 de outubro


Um Estado pode revogar unilateralmente o pedido de saída da UE?
• Representantes Reino Unido dizem que Tribunal estava a atuar em termos políticos e
que não tinha relevância jurídica – recorreram para o Supremo Tribunal do Reino Unido
que não lhes deu razão.
• Despacho de 19 de outubro de 2018 – definiu-se a tramitação urgente para este
processo

Alegações foram muito extremadas


• Perguntas dos juízes indicam que o TJUE se inclina a considerar a questão como
admissível – primeiro momento de saber se é possível haver um reenvio prejudicial
nesta matéria.
• Segundo momento é saber como funciona o art. 50º

Governo do Reino Unido fixou-se somente numa posição – não discutiram a interpretação do
art. 50º pois esta questão não cabe no âmbito do art. 267º. É uma falsa questão prejudicial pois
não se prende com um litígio concreto entre particulares.
➢ Conselho e Comissão acompanham esta posição mas apresentam também argumentos
face à interpretação do art. 50º.
o Tese do Reino Unido, acompanhada pela Comissão é a seguinte: estamos a usar
o art. 267º para pedir ao TJUE um parecer consultivo. Ele pode ser consultado,
mas pelo art. 218º e não pelo art. 267º.

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o Normalmente TJUE rejeita os desvios de procedimento: não se pode utilizar


uma via contenciosa para se chegar a outro.
▪ Acusa TJUE de anátema constitucional: se TJUE responder vai entrar em
conflito com a identidade constitucional do Reino Unido (violando art.
4º).
➢ Comissão e Conselho têm a posição de que o art. 50º não pode ser revogado
unilateralmente.
o MLD: tem defendido a possibilidade de revogação à luz do DIPúblico, pois as
declarações unilaterais podem ser revogadas por declarações contrárias,
conforme resulta da CVDT e do costume.

Mas agora vêm dizer que não se pode interpretar art. 50º à luz do DIP, devido às especificidades
dos tratados e de ser lex specialis.
➢ Também há questões políticas envolvidas.

Falam no abuso de direito – se fosse possível a um Estado retirar unilateralmente um pedido de


saída esse meio ia ser utilizado para chantagear a UE e como vantagem de negociação. Problema
de integração à la carte começando com um pedido de saída.

Ideia é de que é um processo irreversível, quer jurídica quer politicamente.

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