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DIREITO COMERCIAL II – SOCIEDADES COMERCIAIS

Profs. Doutores António Menezes Cordeiro e Ana Perestrelo de Oliveira


2021/2022

CASO PRÁTICO N.º 8:


DA ADMINISTRAÇÃO À FISCALIZAÇÃO DA VAI DAR TUDO CERTO, S.A.

Em 2017, António e Bernardo, jovens empreendedores, viviam num período de


inocência em que acreditavam que tudo era possível. Tinham um projeto empresarial
que, na sua perspetiva, tinha um futuro muito promissor. Para dar forma jurídica ao
projeto, constituíram uma sociedade anónima juntamente com quatro investidores, com
a firma “Vai dar tudo certo, S.A.”. Pediram a um contabilista, Eduardo, umas dicas
sobre os estatutos e escolheram o modelo de governo previsto no art. 278.º/1, a) CSC, o
único cujo funcionamento prático o contabilista conhecia. Um amigo do contabilista,
que era ROC (Filipe), ficou como fiscal único. António e Bernardo ficaram como
administradores executivos e dois dos investidores (Carlos e Diogo) ficaram como não
executivos. Bernardo assumiu a presidência do conselho.

António, Bernardo, Carlos e Diogo tiveram o cuidado de espelhar esta composição e


organização do conselho de administração num acordo parassocial. Neste especificaram
também que determinadas matérias, especialmente relevantes, só podiam ser aprovadas
por maioria de 2/3 dos membros do conselho.

Apesar de aparentemente os negócios da sociedade estarem a correr bem, a verdade é


que esta não apresentava resultados positivos. Em 2019, os quatro investidores
começaram a ficar desconfortáveis. Carlos e Diogo pediram então mais informações
sobre alguns contratos celebrados pela sociedade que apareciam de forma obscura nas
contas da sociedade. António e Bernardo responderam que eles deviam confiar na
informação que lhes tinha sido prestada e que a insistência no assunto consubstanciava
uma manifestação de deslealdade que, colocando em causa o trabalho de equipa, era
inadmissível. Carlos e Diogo escreveram então ao contabilista da sociedade, Eduardo,
a pedir pormenores sobre as contas, tendo este respondido que não o podia fazer sem o
consentimento de António e Bernardo.

Por portas travessas, os investidores acabaram por perceber que António e Bernardo
tinham celebrado um contrato com a sociedade, nos termos do qual esta lhes pagava
uma “comissão de gestão”, consumindo esta praticamente todos os resultados positivos
da atividade da sociedade. Perante isto, os investidores pretendem levar a questão aos
tribunais, retirando todas as consequências, incluindo a responsabilização de António e
Bernardo pelos prejuízos sofridos.

António e Bernardo, quando se apercebem da intenção daqueles, escrevem-lhes uma


carta onde explicam que atuaram no contexto da sua discricionariedade empresarial, por
entenderem que esta era a solução que melhor servia os interesses da sociedade. Não
podem, portanto, ser responsabilizados.

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Entretanto, os investidores não compreendem o silêncio de Filipe: nunca disse nada
sobre o que se passava, os seus relatórios anuais como fiscal único nunca referiram a
“comissão de gestão” e as certificações legais de contas eram omissas quanto à
“obscuridade” das contas...

1. Em que consiste um modelo de governo de uma sociedade comercial? Quais as


principais vantagens e inconvenientes de cada um dos modelos previstos no art. 278.º/1
CSC?

2. Qual o sentido da qualificação dos administradores como “executivos” e “não-


executivos” e qual o reflexo no seu status?

3. Podiam Carlos e Diogo exigir as informações referidas a António e Bernardo, por um


lado, e ao TOC, por outro?

4. Têm razão Carlos e Diogo ao considerar que a celebração do contrato, do qual resulta
a “comissão de gestão” para António e Bernardo, constitui uma violação dos deveres
destes?

5. Analise a pretensão dos investidores na ação que pretendem intentar, bem como a
resposta de António e Bernardo quanto à sua responsabilização.

6. Qual o papel do fiscal único e do ROC na sociedade? Poderia Filipe ser


responsabilizado pelos danos sofridos pela sociedade em virtude da “comissão de
gestão”?

7. O acordo parassocial celebrado é válido?

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