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Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por ANA LUISA PORTO BORGES e Tribunal de Justica do Estado de Sao Paulo, protocolado em 12/02/2019 às 16:55 , sob o número WJMJ19401709440
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SOCIEDADE LIMITADA – REGÊNCIA SUPLETIVA PELAS


NORMAS DA SOCIEDADE ANÔNIMA (CC, ART. 1.053,
PAR. ÚN.) – CAPITAL SOCIAL DIVIDIDO ENTRE GRUPOS
IGUALITÁRIOS – CONTROLE CONJUNTO – VIOLAÇÃO

Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/pg/abrirConferenciaDocumento.do, informe o processo 1034953-37.2018.8.26.0100 e código 675030A.
DE DEVERES DE LEALDADE POR UM DOS GRUPOS –
CONCORRÊNCIA ILÍCITA E DESVIO DE OPORTUNIDA-
DES NEGOCIAIS – GRAVES DANOS À SOCIEDADE –
AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL – LEGITIMAÇÃO
EXTRAORDINÁRIA (POR SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL)
DO SÓCIO DO OUTRO GRUPO – INTELIGÊNCIA DOS
ARTS. 116, 117 E 246 DA LEI DAS S/A.

Por meio de seus mui ilustres advogados, Drs. Ana Luisa Porto
Borges, Rafael Villac Vicente de Carvalho e José Nantala Bádue Freire, inte-
grantes do renomado escritório “Peixoto & Cury Advogados”, a Consulente
CLD COMPANIA LOGÍSTICA DE DISTRIBUCIÓN SOCIEDADE ANÓNIMA (“CLD” ou “Con-
sulente”) submete à nossa análise cópias integrais dos autos da ação de
responsabilidade civil que – na condição de sócia da Bracenter Centro Bra-
sileiro de Armazenagem e Distribuição Ltda. (“Bracenter” ou “Sociedade”)
e agindo em juízo como substituto processual desta – propôs contra Com-
panhia Bandeirantes de Armazéns Gerais (“Bandeirantes”) e Patys Giallos
S/A (“Patys”), perante o V. Juízo de Direito da 2ª Vara Empresarial e Con-
flitos de Arbitragem do Foro Central da Comarca da Capital (proc. n°
1034953-37.2018.8.26.0100). Solicita assim a Consulente o nosso parecer
sobre a sua legitimação extraordinária para propor a ação de responsabi-
lidade civil em nome próprio e em benefício da Sociedade e, para tanto,
apresenta a consulta a seguir transcrita, acompanhada dos pertinentes
quesitos, a saber:

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CONSULTA

“I. – Os fatos: exposição sumária da controvérsia.

1. A Bracenter Centro Brasileiro de Armazenagem e Distribuição


Ltda. (‘Bracenter’ ou ‘Sociedade’) é sociedade empresária brasileira que se
dedica precipuamente à execução de serviços de armazenagem de carga
em geral e foi constituída sob a forma de sociedade limitada, com regência
supletiva pelas normas da sociedade anônima.

1.1. O capital social encontra-se dividido de maneira igualitária en-


tre dois grupos empresariais, nos termos das regras convencionadas em
seu pacto social. Assim, (i) a CLD Compania Logística de Distribución Soci-
edade Anónima (‘CLD’ ou ‘Consulente’), sociedade anônima estrangeira,
detém metade das quotas da Sociedade; e (ii) a Companhia Bandeirantes
de Armazéns Gerais (‘Bandeirantes’), companhia brasileira com 40% das
quotas, e a sua subsidiária Patys Giallos S/A (‘Patys’), sociedade anônima
estrangeira com 10% das quotas (em conjunto, ‘Grupo Bandeirantes’), ti-
tulam em comum a outra metade do capital social da Sociedade.

1.2. Ao longo de anos, as atividades sociais e a orientação dos ne-


gócios foram definidas de comum acordo entre os sócios da Sociedade; to-
dos os administradores foram eleitos por consenso.

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2. Ocorre que, conforme a Consulente constatou, o Grupo Ban-


deirantes vinha concorrendo sub-repticiamente com a Sociedade, ao pro-

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mover negócios expressamente vedados (pela lei e pela convenção exis-
tente entre as partes), e, por esse modo, estava a desviar oportunidades de
negócios para a sociedade concorrente, em claro prejuízo da Sociedade.

3. Diante deste quadro – em que o Grupo Bandeirantes, titular de


50% das quotas da Sociedade, incorreu em grave violação de seus deveres
de sócio e, com isso, causou (e ainda causa) expressivos danos patrimoni-
ais diretos à Sociedade –, a Consulente procurou inicialmente submeter o
tema à apreciação dos sócios, mas, como já era mais do que previsível em
situações dessa espécie (onde, surgindo o dissenso, um bloco impede a
tomada da decisão), simplesmente nada se conseguiu solucionar, mercê de
expedientes que o Grupo Bandeirantes pôs em prática no conclave.

4. Bem por isso, na sequência, e visando reconstituir o patrimô-


nio social desfalcado, a Consulente ingressou com a pertinente ação de
responsabilidade civil para, em nome próprio e no interesse da Sociedade,
pleitear a condenação do Grupo Bandeirantes a reparar os danos decor-
rentes de atos praticados com evidente abuso de poder – o que a Consu-
lente fez ao amparo dos arts. 117 e 246 da Lei de Sociedades por Ações
(Lei n° 6.404/1976, ‘Lei das S/A’ ou ‘LSA’).

5. Citado em juízo para responder a ação, o Grupo Bandeirantes


apresentou contestação conjunta – no bojo da qual, preliminarmente, sus-
citou a ilegitimidade ativa da Consulente, por não ter havido prévia delibe-
ração assemblear autorizadora da propositura da ação, a teor do disposto
no art. 159, § 1°, da Lei das S/A – e, à guisa de reconvenção, pediu também
fosse a CLD condenada a “restituir ao caixa da Bracenter os valores relaci-
onados aos clientes retirados da joint venture” (sic).

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6. Em primeira instância, surpreendentemente o processo foi ex-


tinto sem apreciação de mérito. Entendeu o ilustre MM. Juiz a quo que, em
realidade, a Sociedade não teria controlador definido e, portanto, a Consu-

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lente não poderia atuar como substituta processual, in verbis:

‘Como se observa, é fato incontroverso que a autora-reconvin-


da é sócia detentora de 50% das quotas de participação social
da BRACENTER Centro Brasileiro de Armazenagem Ltda., sen-
do as rés-reconvintes detentoras dos 50% remanescentes; o
que também é demonstrado pela Certidão Simplificada da soci-
edade emitida pela JUCESP (fls. 73/75) e pela documentação
societária apresentada (fls. 176/183, 184/230, 393/400 e
401/408).

E é também incontroverso que o contrato social estipulou a


aplicação supletiva da Lei nº 6.404/76 à regência da sociedade,
pelo que, em tese, poderia ser aplicado ao caso o dispositivo
que autoriza a substituição processual da sociedade por seus
sócios, nos termos do art.246, §1º, da referida norma.
(...)
E, no caso em apreço, as partes têm participações paritárias, ou
seja, detêm os mesmos números de quotas e têm direitos equi-
valentes quanto a votos e a eleição de administradores, o que
implica dizer que a sociedade não possui sócio controlador de-
finido.

Tal situação obsta a pretensão das partes às suas respectivas


atuações como substitutas processuais da BRACENTER, nos
termos do art. 246, § 1º, da Lei nº 6.404/76, havendo assim ile-
gitimidade ativa de ambas para pleitear em nome próprio o di-
reito alheio (art. 18 do CPC), qual seja, o direito da sociedade
em comum à reparação de quaisquer atos ilícitos de concor-
rência desleal contra ela cometidos pelas suas sócias’.

7. A Consulente, à toda evidência, discorda desse entendimento –


que, se aceito, iria chancelar a completa impunidade dos sócios ímprobos –
e pretende recorrer ao Egrégio Tribunal ad quem.

8. Eis, em breve síntese, os fatos relevantes”.

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II. – Os quesitos da consulta.

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9. Expostos assim os fatos relevantes para a causa, a Consulente
formula os seguintes quesitos:

(1) – As regras da Lei das S/A que tratam da ação de respon-


sabilidade civil contra controlador são aplicáveis a so-
ciedade limitada regida supletivamente pelas normas
da sociedade anônima?

(2) – A ação social de responsabilidade civil contra controla-


dor exige prévia deliberação assemblear (LSA, art. 159,
§ 1°)?

(3) – A ação social de responsabilidade civil pode ser proposta


caso exista uma situação de controle conjunto? Os
membros do bloco de controle são partes legítimas ati-
vas ou passivas, conforme o caso, para essa demanda?

(4) – No caso concreto, a Consulente é parte legítima para


agir como substituta processual da Sociedade e pleitear
a condenação do Grupo Bandeirantes a reparar o dano
causado ao patrimônio social? A r. sentença merece re-
forma?

10. Passemos, pois, a expor o nosso entendimento sobre o caso.

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PARECER

I – Introdução: a questão central.

11. Pelo que se colhe da precisa consulta apresentada, a questão


central, em torno do qual gravitam todas as demais indagações formuladas
pela Consulente, pode ser assim equacionada: “em uma sociedade limitada,
regida supletivamente pelas normas da sociedade anônima e com o capital
social dividido entre dois grupos igualitários, pode um deles, na condição de
substituto processual da sociedade, agir em juízo em busca da condenação
do outro a reparar os danos causados ao patrimônio social? ”

12. Em primeira instância, deu-se resposta negativa a essa ques-


tão: nos autos da demanda proposta pela Consulente, entendeu o MM. Juiz
que “no caso em apreço, as partes têm participações paritárias, ou seja, de-
têm os mesmos números de quotas e têm direitos equivalentes quanto a
votos e a eleição de administradores, o que implica dizer que a sociedade
não possui sócio controlador definido”.

13. Respeitado o convencimento pessoal do ilustre Magistrado,


não nos parece que tenha sido essa a melhor solução, como adiante procu-
raremos demonstrar (nas partes III e IV deste parecer); mas, antes de
prosseguir na sua análise, afigura-se-nos de todo proveitoso ter presente
algumas outras considerações preliminares, úteis ao equacionamento da
questão (na parte II).

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II – A disciplina do poder de controle: os fins da disciplina legal e a ne-


cessária calibração teleológica do metro exegético.

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14. O poder de controle, como se sabe, é, antes de tudo, um fenô-
meno social, que se qualifica como fato jurídico, elemento fundamental da
economia societária, e não uma criação originária da ciência jurídica. Isto
porque, com ou sem o seu reconhecimento legislativo, continua a preexis-
tir(1).

15. Ao direito, em realidade, cumpre tão-somente reconhecê-lo e


valorá-lo para – tal como feito pioneiramente na Lei das Sociedades por
Ações – disciplinar o seu exercício e assinalar ao seu titular determinados
deveres e responsabilidades (LSA, arts. 116 e 117); torná-lo um centro de
imputação, a partir do qual se possa promover a sua funcionalização em
vista de outros interesses juridicamente tutelados(2).

16. Tendo presente esse dado, é, pois, sempre em harmonia com


tais fins e em linha com os interesses protegidos que a interpretação e a
aplicação das regras atinentes ao poder de controle precisam ser efetiva-
das; jamais, porém, de forma a negar ou contravir aqueles propósitos.

(1)
Conforme bem notaram os ilustres autores do Anteprojeto da Lei das S/A, “o poder de
controle é poder de fato, e não poder jurídico (...). O poder de controle da companhia não é
poder jurídico contido no complexo de direitos da ação” (ALFREDO LAMY FILHO e JOSÉ LUIZ
BULHÕES PEDREIRA, Direito das companhias, 2a ed. RJ: Forense, 2017, § 238, pp. 600-601).
(2)
Cf., por todos: FÁBIO KONDER COMPARATO, Função social dos bens de produção, ‘in’
Direito empresarial: estudos e pareceres, 1ª ed. – 2ª tir. SP: Saraiva, 1995, pp. 35-37. Ainda
segundo o mesmo autor, “uma das mais sentidas lacunas de nossa ordenação jurídica, até a
promulgação da nova lei acionária, consistia justamente na falta de previsão de limites rigo-
rosos para o exercício do controle societário, na medida em que esse fenômeno social havia
sido descurado, quase que totalmente, na visão do legislador, ou concebido como realidade
menos honesta, numa democracia acionária próxima da ilusão comunitária” (O poder de
controle na sociedade anônima, 3a ed. RJ: Forense, 1983, n° 114, p. 294). Ainda do mesmo
autor, cf.: A reforma da empresa, ‘in’ Direito empresarial: estudos e pareceres, cit., p. 18.
Cf. também: CALIXTO SALOMÃO FILHO, Deveres fiduciários do controlador, ‘in’ O novo di-
reito societário, 4a ed. SP: Malheiros, 2011, pp. 193 e segs.; e NELSON EIZIRIK, A Lei das
S/A comentada, vol. II, 2ª ed. SP: Quartier Latin, 2015, p. 226.

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16.1. Por isso – e por mais intuitivo que seja dizê-lo – não é possível
que, na compreensão das regras legais, se possa prestigiar exegese que, em

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termos práticos, reduza a eficácia da disciplina sobre o poder de controle,
descure dos interesses tutelados, isente o seu titular dos deveres associa-
dos à sua posição jurídica ou impeça a efetivação das correlatas responsa-
bilidades. Fazê-lo seria negar a própria razão de ser da lei.

16.2. A interpretação da lei há de ser, antes de tudo, teleológica. É


dizer, “toda prescrição legal tem provavelmente um escopo”, conforme re-
gistrou Carlos Maximiliano, “e presume-se que a este pretenderam cor-
responder os autores da mesma, isto é, quiseram tornar eficiente, conver-
ter em realidade o objetivo ideado. A regra positiva deve ser entendida de
modo que satisfaça aquele propósito; quando assim se não procedia, cons-
truíam a obra do hermeneuta sobre a areia movediça do processo grama-
tical”(3).

17. De resto, tão ou mais importante do que prever regras jurídi-


cas adequadas em direito societário é a disposição do aplicador da lei em
torná-las efetivas, e não as transformar em meras promessas vazias(4).

(3)
CARLOS MAXIMILIANO, Hermenêutica e aplicação do direito, 21ª ed. RJ: Forense, 2017,
n° 161, p. 139. Acrescentou o grande jurista: “O hermeneuta sempre terá em vista o fim da
lei, o resultado que a mesma precisa atingir em sua atuação prática. A norma enfeixa um
conjunto de providências, protetoras, julgadas necessárias para satisfazer certas exigências
econômicas e sociais; será interpretada de modo que melhor corresponda àquela finalidade e
assegure plenamente a tutela dos interesses para a qual foi regida” (op. et loc. cits.). Cf. ain-
da sobre o ponto: GIUSEPPE LUMIA, Elementos de teoria e ideologia do direito – trad. Denise
Agostineti, SP: Martins Fontes, 2003, n° 24, pp. 79-80.
(4)
É essa a relevantíssima tarefa do jurista contemporâneo, conforme adverte lucidamente o
excepcional jurista alemão HERBERT WIEDEMANN: “Enquanto a jurisprudência e a doutrina
apenas se sentirem instadas a examinar unicamente a legalidade extrínseca, não porém a
justiça substancial dos mecanismos jurídicos, as possíveis conexões legais existentes per-
manecem subutilizadas” (Gesellschaftsrecht, Band 1 – Grundlagen, München: C. H. Beck,
1980, § 8 II, p. 425; no original: “Solange Rechtsprechung und Wissenschaft sich nur beru-
fen fühlen, die äußere Legalität, nicht jedoch die innere Sachgerechtigkeit privatrechtlicher
Gestaltungen nachzuprüfen, bleiben auch vorhandene gesetzliche Anknüpfungsmöglichkei-
ten ungenutzt”).

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18. Dito isso, volvemos ao caso concreto.

III. – A disciplina do poder de controle na Lei das S/A e a aplicação


supletiva de seus institutos à sociedade limitada.

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19. A Bracenter, como antes já foi destacado, é sociedade empre-
sária que adota a forma (ou tipo societário) de sociedade limitada (CC,
arts. 983 e 1.052) e que, por força da modelagem negocial imprimida pelas
partes no contrato social, se rege supletivamente pelas normas da socie-
dade anônima (CC, art. 1.053, par. ún.), in verbis:

“Cláusula 18ª – A sociedade será regida pelas disposições da


Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002 e, supletivamente, pela Lei
n° 6.404, de 15 de dezembro de 1976 e alterações posteriores”.

20. É por essa bitola, portanto, que ao caso se aplicam as regras da


Lei da S/A sobre o poder de controle, a sua caracterização, os deveres e as
responsabilidades inerentes à posição; e é por esse trilha, ainda, que se po-
de invocar – tal como reconhecido em primeira instância – a regra de subs-
tituição processual prevista no art. 246 da Lei das S/A(5), pertinente não só
à ação social de responsabilidade civil contra sociedade controladora, mas,
a fortiori, à ação contra sócio controlador in genere(6):

(5)
A regra é de legitimação extraordinária sob a forma de substituição processual (por todos,
cf.: CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, Sociedades anônimas e legitimidade dos minoritários:
questões processuais, ‘in’ Processo civil empresarial, SP: Malheiros, 2010, pp. 602 e segs.).
(6)
Cuida-se de regra geral de substituição processual aplicável a ação contra sociedade con-
troladora ou controlador isolado (cf.: FÁBIO KONDER COMPARATO e CALIXTO SALOMÃO FI-
LHO, Poder de controle na sociedade anônima, 6ª ed. RJ: Forense, 2014, nº 118, p. 332; AL-
FREDO SÉRGIO LAZZARESCHI NETO, Lei das Sociedades por Ações anotada, vol. II, 5ª ed.
SP: Societatis edições, 2017, nota 246-1, p. 1.086; DANIEL DE AVILA VIO, Grupos societá-
rios, SP: Quartier Latin, 2016, n° 6.3.1, p. 278; FRAN MARTINS, Comentários à Lei das Soci-
edades Anônimas, vol. 3, 2a ed. RJ: Forense, 1985, pp. 270-271; GABRIEL SAAD KIK BUS-
CHINELLI e RAFAEL HELOU BESCIANI, Aspectos processuais da ação de responsabilidade do
controlador movida por acionista titular de menos de 5% do capital social (art. 246, § 1°,
‘b’, da Lei 6.404/76), ‘in’ Processo societário II – coords. Flavio Luiz Yarshell e Guilherme
Setoguti J. Pereira,, SP: Quartier Latin, 2015, p. 270; JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA, Di-
reito societário, 8ª ed. RJ: Renovar, 2003, n° 198, p. 517; e SÉRGIO CAMPINHO, Curso de
sociedade anônima, RJ: Renovar, 2015, n° 19, p. 493; dentre tantos outros).

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“Art. 246. A sociedade controladora será obrigada a reparar os


danos que causar à companhia por atos praticados com infra-
ção ao disposto nos artigos 116 e 117.
§ 1°. A ação para haver reparação cabe:

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a) a acionistas que representem 5% (cinco por cento) ou mais
do capital social;
b) a qualquer acionista, desde que preste caução pelas custas e
honorários de advogado devidos no caso de vir a ação ser jul-
gada improcedente.
§ 2°. «omissis» ”

21. Essa ação social de responsabilidade civil contra controlador,


ou sociedade controladora, por sua vez, não está sujeita a prévia delibera-
ção assemblear e a ela não se aplica a disciplina própria da ação de respon-
sabilidade civil contra administrador de companhia (LSA, art. 159)(7), ao
contrário do que o Grupo Bandeirantes pretendeu sustentar em defesa(8).

(7)
Cf.: MARCELO VIEIRA VON ADAMEK, Responsabilidade civil dos administradores de S/A e
as ações correlatas, 1a ed. – 2a tir SP: Saraiva, 2010, n° 7.6, p. 408; EGBERTO LACERDA
TEIXEIRA e JOSÉ ALEXANDRE TAVARES GUERREIRO, Das sociedades anônimas no direito
brasileiro, vol. 2, SP: Bushatsky, n° 245, p. 711; NELSON EIZIRIK, A Lei das S/A comentada,
vol. IV, cit., p. 261; CARVALHOSA/KUYVEN, Tratado de direito empresarial, vol. 3: Socie-
dades anônimas, 2a ed. SP: RT, 2018, n° 8.11, p. 588; ALFREDO SÉRGIO LAZZARESCHI NE-
TO, Lei das Sociedades por Ações anotada, vol. II, cit., nota 246-2c, p. 1.089; DANIEL DE
AVILA VIO, Grupos societários, cit., n° 6.3.2, p. 281; GABRIEL SAAD KIK BUSCHINELLI e
RAFAEL HELOU BESCIANI, Aspectos processuais da ação de responsabilidade do controla-
dor..., cit., pp. 261-264; JOSÉ WALDECY LUCENA, Das sociedades anônimas: comentários à
lei, vol. 3, RJ: Renovar, 2012, p. 742; e SÉRGIO CAMPINHO, Curso de sociedade anônima,
cit., n° 19.5, p. 493. Na jurisprudência, cf.: STJ, REsp 16.410-SP, 4a Turma, Rel. Min.
SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, v.u., j. 14.12.1992, DJ 16.05.1994, RSTJ 59/221.
(8)
É verdade que, certa feita, se afirmou que se “aplica por analogia a norma do art. 159 da
Lei n° 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas) à ação de responsabilidade civil contra os
acionistas controladores de companhia por danos decorrentes de abuso de poder” (STJ, REsp
1.214.497-RJ, 4a T., Rel. Min. RAUL ARAÚJO, m.v., j. 23.09.2014, DJ 06.11.2014), mas, len-
do-se a íntegra do aresto e não apenas a ementa, verifica-se que, em realidade, em tal julga-
do não se decidiu em momento algum que, para propor ação contra o controlador seria ne-
cessária a prévia deliberação; o que se aplicou, analogicamente (se tanto...) naquele caso, foi
a diferenciação, que o art. 159 da Lei das S/A enuncia, entre as ações individual e social, e
os distintos legitimados para cada qual. De mais a mais, no caso, a Bracenter é sociedade
limitada com capital dividido entre dois blocos iguais, em que, portanto, até para a ação con-
tra administrador a deliberação seria dispensável (cf.: STJ, REsp 736.189-RS, 4a Turma, Rel.
Min. NANCY ANDRIGHI, v.u., j. 06.12.2007, DJ 18.12.2007).

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22. Cuida-se, outrossim, de ação exercitável por “qualquer acionis-


ta”, desde que para tanto preste caução, ou, independentemente dela, por
“acionistas que representem 5% (cinco por cento) ou mais do capital soci-

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al”. Consequentemente, pode a ação ser proposta não só pela minoria, mas,
tal como sucede na espécie, até por quem integra o bloco de controle, des-
de que ao réu se impute a prática de ilícitos individualmente praticados
(no caso, apropriação de oportunidade negocial e concorrência ilícita).

23. Mas, se assim é, resta ainda verificar: poderia a Consulente ter


proposto a ação contra o Grupo Bandeirantes? Teria ele a qualidade para
poder responder à ação como controlador? Vejamos o ponto, com maior
vagar.

IV. – O controle conjunto e o cabimento da ação social: titularidade


conjunta do poder de controle e responsabilidade individual pelos
abusos isoladamente praticados.

24. Na condição de sócia titular de metade do capital social da


Bracenter, a Consulente – tal como enunciado na consulta – propôs ação
de responsabilidade civil contra o Grupo Bandeirantes e, por meio dela,
imputa a este a prática de atos individuais de evidente deslealdade socie-
tária; por isso, pede a sua condenação a reparar os danos diretos e imedia-
tos experimentados pela Bracenter.

25. O MM. Juiz de primeira instância, porém, não reconheceu ao


Grupo Bandeirantes o status de controlador e, portanto, não o considerou
parte legítima para figurar no polo passivo da demanda, pois “no caso em
apreço, as partes têm participações paritárias, ou seja, detêm os mesmos
números de quotas e têm direitos equivalentes quanto a votos e a eleição
de administradores, o que implica dizer que a sociedade não possui sócio
controlador definido”.

26. A nosso ver, com todas as vênias, houve aí certa confusão en-
tre os conceitos de maioria, de um lado, e poder de controle, de outro.

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27. Ainda quando de per si o Grupo Bandeirantes não detenha


a maioria do capital social, nem por isso deixa de merecer o status de
controlador e, como tal, está sujeito às correlatas responsabilidades.

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27.1. O art. 116 da Lei das S/A, como se sabe, define o controlador
como “a pessoa natural ou jurídica, ou o grupo de pessoas vinculadas por
acordo de voto, ou sob controle comum, que: a) é titular de direitos de só-
cio que lhe assegurem, de modo permanente, a maioria dos votos nas deli-
berações da Assembleia Geral e o poder de eleger a maioria dos adminis-
tradores da companhia; e b) usa efetivamente seu poder para dirigir as
atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia”.

27.2. Portanto, de acordo com esse conceito legal – que foi pratica-
mente repetido no art. 243, § 2°, da Lei das S/A, para a sociedade contro-
ladora, e no art. 1.098, I, do Código Civil(9) – “a pessoa ou grupo de pessoas
somente é acionista controlador quando coexistem quatro requisitos: (a) é
titular de direitos de sócio que lhe assegurem, (b) de modo permanente,
(c) a maioria dos votos nas deliberações da Assembleia Geral e o poder de
eleger a maioria dos administradores da companhia e (d) usa efetivamente
seu poder para dirigir as atividades sociais e orientar o funcionamento dos
órgãos da companhia”(10).

28. Ora, na espécie o Grupo Bandeirantes e a Consulente detêm


o controle totalitário conjunto da Sociedade: possuindo cada qual idên-
ticas participações societárias, em conjunto têm ambos o poder de definir
as deliberações assembleares e, pois, eleger os administradores da Socie-
dade.

28.1. Diz-se que o controle é totalitário porque “nenhum dos sócios


é afastado do poder de dominação, no qual a unanimidade é de rigor, seja

(9)
Com pequenas diferenças: no art. 243, § 2°, da LSA e no art. 1.098, I, do CC não se men-
ciona a exigência de uso efetivo do poder.
(10)
ALFREDO LAMY FILHO e JOSÉ LUIZ BULHÕES PEDREIRA, Direito das companhias, cit., §
237, p. 591.

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por se tratar de sociedade unipessoal, seja por se tratar de sociedade com


poucos sócios (...) (controle totalitário conjunto)”(11).

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28.2. Diz-se, outrossim, que o controle é conjunto porque é exercido
por duas ou mais pessoas vinculadas por acordo de voto(12), e esse acordo
de voto não precisar sequer ser escrito ou decorrer de um pacto parasso-
cial. Pode ser tácito ou até, como no caso concreto (que versa sobre socie-
dade contratual), resultar – não de um pacto parassocial e sim – do pacto
social, isto é, as regras do contrato de sociedade.

28.3. Sobre esse ponto, são oportunas, como sempre, as boas lições
de Fábio Konder Comparato:

“A lei, ao definir o controle conjunto, refere-se a uma situação


em que as pessoas que exercem o poder estão vinculadas por
acordo de voto, ou estão sob controle comum. Esse acordo de
votos não é necessariamente regido pelo art. 118, mesmo que
seja um acordo tácito, ou um acordo por escrito não levado a
arquivamento na sede social. Para efeito de determinação dos
controladores e da sua responsabilidade, é um acordo de votos.
(...) Nenhuma dessas sociedades acionistas, isoladamente, tem
o poder de comando e só conjuntamente elas podem construir
essa dominação societária”(13).

(11)
EDUARDO SECCHI MUNHOZ, Empresa contemporânea e direito societário: poder de con-
trole e grupos societários, SP: Juarez de Oliveira, 2002, p. 226. Com idêntica lição, FÁBIO
KONDER COMPARATO explica que o controle totalitário se faz presente “quando nenhum aci-
onista é excluído do poder de dominação da sociedade, quer se trate de sociedade unipesso-
al, quer se esteja diante de uma companhia do tipo familiar (controle totalitário conjunto).
Em tais hipóteses, a unanimidade é de rigor” (O poder de controle na sociedade anônima,
cit., n° 12, p. 43). É hipótese corrente em joint ventures.
(12)
Cf.: NELSON EIZIRIK, A Lei das S/A comentada, vol. II, cit., p. 228 (pois “embora nenhum
dos signatários do acordo detenha, individualmente, a maioria das ações votantes, a união
das suas ações assegura o controle acionário, mediante o chamado ‘bloco de controle’”).
(13)
FÁBIO KONDER COMPARATO, Acionista controlador, ‘in’ Sociedade anônima: I Ciclo de
conferências para magistrados / Emerj, SP: IBCB, 1993, pp. 45-46. Cf. ainda: LUIZ GASTÃO
PAES DE BARROS LEÃES, Poder de controle, ‘in’ Estudos e pareceres sobre sociedades anô-
nimas, SP: RT, 1989, pp. 277-278.

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28.4. De resto, nada impede que o controle conjunto seja exercido


por duas ou mais sociedades. E a razão para isso é até intuitiva. “Se uma só
sociedade pode exercer o controle de outra – bem anotou Fábio Konder

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Comparato – “por que razão várias sociedades não poderiam ser titulares
em conjunto desse mesmo controle, com ou sem acordo de voto explicita-
mente concluído entre elas? Há, pergunta-se, alguma razão jurídica para se
admitir que várias pessoas físicas exerçam conjuntamente o controle de
uma companhia isolada, e para se negar que várias sociedades possam
exercer, em conjunto, o controle de outra sociedade?”(14)

28.5. Por fim, a permanência e o uso efetivo desse poder são mais
do que estridentes: não apenas nas últimas três assembleias (se adotado o
tradicional parâmetro da Res. n° 401/1976 do CMN(15)), mas, em realida-

(14)
FÁBIO KONDER COMPARATO, Titularidade do poder de controle e responsabilidade pela
concessão abusiva de crédito, ‘in’ Direito empresarial: estudos e pareceres, cit., p. 69. Em
outro estudo, reforçou: “Na hermenêutica dos textos normativos indicados, verifica-se fa-
cilmente que a omissão do art. 243, § 2°, a respeito do controle conjunto não significa, obvi-
amente, proibição do fenômeno, pela boa razão de que uma situação fática não se proíbe;
valora-se. Na ausência de previsão normativa, não há, pois, vedação do controle conjunto
em matéria de grupos societários. Estamos diante de simples lacuna, desde logo preenchida
pelo recurso à definição geral do art. 116” (Controle conjunto, abuso no exercício do voto
acionário e alienação indireta de controle empresarial, ‘in’ Direito empresarial..., cit., p.
83). Cf. ainda no mesmo sentido: GUILHERME DÖRING CUNHA PEREIRA, Alienação do poder
de controle, SP: Saraiva, 1995, n° 12, p. 20; e RODRIGO R. MONTEIRO DE CASTRO, Controle
gerencial, SP: Quartier Latin, 2010, n° 3.3.1, p. 79 – frisando que “o controle totalitário
conjunto se revela, igualmente, em joint ventures, cuja estrutura de capital aponte para
uma igualdade ou quase igualdade de contribuições (...). Neste modelo, contribuem para a
joint venture o mesmo capital, 50% cada um (...) Qualquer que seja o quórum previsto para
as deliberações, está-se, de fato, diante de situação de controle totalitário conjunto”.
(15)
Na medida em que a Lei das S/A refere-se ao critério, mas não fixa “os contornos do que
se deva entender como ‘permanente’, pode ser seguido o parâmetro estabelecido por ocasião
da edição da Resolução n° 401/1976, do Conselho Monetário Nacional, hoje revogada” e
que “considerava como controlador o acionista titular de ações que assegurassem a maioria
absoluta dos votos dos acionistas presentes nas 3 (três) ultimas assembleias gerais” (NELSON
EIZIRIK, A Lei das S/A comentada, vol. II, cit., p. 227). Cf. no mesmo sentido: MODESTO
CARVALHOSA, Comentários à Lei de Sociedades Anônimas, 2° vol., 3a ed. SP: Saraiva, 2003,
pp. 488-489; HAROLDO MALHEIROS DUCLERC VERÇOSA, Curso de direito comercial, vol. 3,
SP: Malheiros, 2008, n° 8.3.2.1.5.3, p. 271; JOSÉ WALDECY LUCENA, Das sociedades anô-
nimas: comentários à lei, vol. 1, RJ: Renovar, 2009, p. 1.081; ROBERTO PAPINI, Sociedade
anônima e mercado de valores mobiliário, 4a ed. RJ: Forense, 2004, n° 13.4.1, p. 179; e
SÉRGIO CAMPINHO, Curso de sociedade anônima, cit., n° 10.3, pp. 276-277.

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de, desde sempre, o controle foi efetivamente exercido em comum; todas


as deliberações da sociedade e, pois, até mesmo a eleição dos administra-
dores sempre foram decidida por mútuo consenso.

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28.6. A bem dizer, a única vez em que em assembleia surgiu algum
impasse a obstar o processo deliberativo, segundo revelam os documentos
societários apresentados, foi justamente quando se procurou debater as
medidas apropriadas para responsabilizar o Grupo Bandeirantes – o que,
no entanto, não modifica o passado e não desqualifica retroativamente o
controle comum exercido ao longo de anos(16), e muito menos o controle
conjunto que depois disso continuou a ser exercido, inclusive com a subse-
quente eleição de administradores da Sociedade de comum acordo.

28.7. É mesmo fora de dúvida, portanto, que a Sociedade está sujeita


a clara situação de controle totalitário conjunto exercido pelo Grupo Ban-
deirantes e pela Consulente.

29. E, diante de situação de controle conjunto, o controle em si


é titulado em comum pelos sócios, mas todos e cada um deles são con-
siderados de per si controladores para os fins de sujeição aos deveres e
responsabilidades próprias da função e, portanto, plenamente legitima-
dos cada qual a figurar no polo passivo de demanda em que se lhe imputa
a prática isolada de atos de abuso.

30. É o que, com grande felicidade, explica Laura Amaral Patella,


na sua festejada tese de doutoramento apresentada junto à Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo:

(16)
Além de as deliberações terem sido tomadas sempre de forma convergente, os adminis-
tradores foram sempre escolhidos por consenso, respeitando-se as indicações que cada gru-
po fez. Não houve sequer impasse, embora até este, se tivesse existido (e nunca existiu, se-
gundo informa a Consulente), não seria de molde a descaracterizar o controle, pois – a cons-
tatação é irrefragável – até mesmo não deliberar é, pois, manifestação de um poder... de ve-
to, e a omissão seria então fruto de ambos.

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“14. Imputando-se o controle ao grupo, a cada membro do gru-


po controlador decorre a assunção do status de acionista con-
trolador, de forma que toda a disciplina legal relativa ao contro-
le aplica-se ao grupo; ao passo que as regras direcionadas ao

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acionista controlador devem ser aplicadas a cada um e a todos
os seu membros, de forma individual e conjunta.

15. Sempre e desde que rigorosamente caracterizado o contro-


le do tipo conjunto, i) a disciplina legal do acionista controlador
deve ser aplicada, de forma integral, a cada uma e a todas as
pessoas que compõem o grupo, em virtude do status de acionis-
ta controlador atribuído a cada um e a todos os integrantes do
controle conjunto; ii) o controle, enquanto poder de dominação
sobre uma determinada organização empresarial, deve ser im-
putado ao grupo considerado em sua unidade; iii) os integran-
tes do controle conjunto são co-titulares do controle, uma vez
que compartilham esse titularidade; iv) a imputação final do
controle, considerando ser o grupo um ente sem autonomia e
personalidade própria, deve atingir os membros do grupo con-
trolador de forma indiferenciada e automática, e não seletiva;
v) para guiar a aplicação das regras sobre controle das compa-
nhias brasileiras ao grupo e a todos os seus membros, de forma
tão seletiva, há dois caminhos possíveis: ou imputa-se o contro-
le inteiramente a cada membro do grupo controlador, aplican-
do-se a cada um e a todos o enunciado referindo o controle de
forma integral; ou se aplica integralmente o enunciado ao gru-
po, atribuindo o comando legal de forma parcial a cada um de
seus membros, preservando sempre o escopo de tutela de cada
norma”(17).

(17)
LAURA AMARAL PATELLA, Controle conjunto nas companhias brasileiras: disciplina
normativa e pressupostos teóricos, SP: USP (Tese), 2015, p. 310. Acrescenta a estudiosa:
“Além da disciplina do art. 117, os deveres e responsabilidades imputados ao controlador
pela regra geral do art. 116, parágrafo único, também são exigíveis integralmente de todos e
de cada um dos acionistas controladores. Segundo esse enunciado, o acionista controlador –
novamente no singular e, portanto, todos e cada um dos membros do controle conjunto –
deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função
social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que
nela trabalham e para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve leal-
mente respeitar e atender. A rigor, se exigirá do grupo a atuação conjunta para cumprir o ob-
jeto social e a função social da companhia, e respeitar os interesses dos demais acionistas,

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31. Uma vez mais, é preciso aqui não perder de vista os interesses
tutelados e os fins a que se destinam as regras envolvidas neste segmento.

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31.1. É que, a vingar o entendimento adotado em primeira instância,
ter-se-á a inefetividade absoluta das regras societárias e, o que é pior, uma
situação de evidente prejuízo não só à sociedade e ao sócio, mas de todos
aqueles cujos interesses gravitam em torno da empresa (LSA, art. 11,6,
par. ún.).

31.2. Isto porque, em semelhante hipótese, atos de grave deslealda-


de societária, como os praticados pelo Grupo Bandeirantes, restariam sim-
plesmente imunes a qualquer sanção: a Consulente não poderia agir indi-
vidualmente, porque o dano direto é da sociedade e não cabe a ação indi-
vidual para a reparação de dano social; a Sociedade, por sua vez, com o
bloqueio do Grupo Bandeirantes, restaria paralisada; e, portanto, não ha-
veria remédio adequado, útil, apropriado e efetivo, para superar a situa-
ção. O absurdo dessa constatação fala de per si.

31.3. De mais a mais, não se pode perder de vista que, no caso con-
creto, está-se a tratar de uma sociedade limitada, em que a própria dinâ-
mica societária se processa ao largo dos formalismos extremados próprios
das sociedades anônimas(18) e diante da qual o próprio comportamento

dos trabalhadores e da comunidade. Qualquer abuso ou desvio, no entanto, pode ser imputa-
do a qualquer dos controladores, eis que titulares desses deveres em sua integralidade, e não
de forma fracionada” (op. cit., p. 268). Cf. ainda: JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA, Direito
societário, cit., n° 198, p. 517 (anotando: “quando várias pessoas exercem, em conjunto, o
controle, todas serão consideradas controladoras e terão idênticas responsabilidades”).
(18)
Cf. sobre o ponto: STJ, REsp 736.189-RS, 4a Turma, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, v.u., j.
06.12.2007, DJ 18.12.2007; e STJ, REsp 1.138.101-RS, 3a Turma, Rel. Min. LUIS FELIPE
SALOMÃO, v.u., j. 06.10.2009, DJe 19.10.2009 – em que, embora versando tema correlato,
foi feito um mui pertinente registro: “em relação à responsabilização do sócio-administrador
por atos praticados em detrimento da sociedade limitada, formada apenas por dois sócios,
cada qual 50% da participação societária, faz-se necessária a realização de uma interpretação
sistemática do Decreto 3.708/19 com a Lei 6.404/76, a fim de permitir o acesso à justiça da
pessoa jurídica, maior prejudicada pelos atos alegadamente imputados pelo autor aos re-
corridos”.

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concludente dos sócios acaba por fornecer a melhor pauta de interpretação


das regras de regência de seu relacionamento(19). Por essa senda, então, é
de se observar que o Grupo Bandeirantes não apenas não colocou em dú-

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vida a sua condição de co-controlador e, por esse metro, a legitimação para
figurar no polo passivo, como, ademais, ele próprio apresentou em nome
próprio pedido reconvencional... em favor da Sociedade; vale dizer, o outro
co-controlador também manejou a ação prevista no art. 246 da Lei das
S/A! Qual, então, a celeuma?

32. Em suma, nada mais precisa, ou merece aqui ser dito.

V. – Súmula: síntese conclusiva.

33. Por tudo o que ficou longamente exposto neste parecer...

considerando que a Bracenter é sociedade limitada re-


gida supletivamente pelas normas da sociedade anôni-
ma e, portanto, a ela se aplicam as regras da Lei das S/A
que tratam de deveres e responsabilidades do controla-
dor (LSA, art. 116) e, muito especialmente, as que disci-
plinam a ação de responsabilidade civil contra controla-
dor ou sociedade controladora (LSA, arts. 117 e 246).

(19)
É que explica KARSTEN SCHMIDT, festejado societarista alemão e eminente Professor da
Universidade de Bonn: “O contrato social é interpretável. A interpretação inicia-se, como
em qualquer contrato, pelo teor literal de sua convenção. Antes do teor literal, no entanto,
têm precedência: a efetiva compreensão por parte dos participantes (BGHZ, 20, 109, 110 =
NJW 1956, 665; BGH NJW 1996, 1678, 1679) e o costume efetivo e concordante do parti-
cipante. Decide o contrato vivido” (Münchener Kommentar zum Handelgesetzbuch, Band 2:
Handelsgesellschaften und stille Gesellschaft, 2ª ed. München: C.H. Beck/Vahlen, 2006,
§105, 149, p. 59); no original: “Das Gesellschaftsvertrag ist auslegungsfähig (...). Die Aus-
legung beginnt, wie bei jedem Vertrag, mit dem Worlaut des Vereinbarung. Vorrang vor
dem Wortlaut haben aber: das tatsächliche Verständnis aller Beteiligten (BGHZ, 20, 109,
110 = NJW 1956, 665; BGH NJW 1996, 1678, 1679) und die tatsächliche einverständliche
Übung des Beteiligten. Es entscheidet der gelebte Vertrag”. Cf. do mesmo autor: Gesell-
schaftsrecht, 4ª ed. Köln Carl Heymanns, 2002, § 5 I 4, p. 91. Cf. ainda a respeito: REIN-
HARD SCHAMBERGER, Die Auslegung von Gesellschafsverträgen, Wien: Verlag Österreich,
2018, pp. 80-81; e, no direito pátrio, ERASMO VALLADÃO A. E N. FRANÇA, A conduta dos
associados como regra de interpretação dos estatutos de uma associação, ‘in’ Temas de di-
reito societário, falimentar e teoria da empresa, SP: Malheiros, 2009, p. 181.

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considerando que ação de responsabilidade civil contra


controlador não está sujeita a prévia deliberação assem-
blear e a ela não se aplica a disciplina própria da ação de
responsabilidade civil contra administrador (LSA, art.

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159);

considerando que a Consulente titula mais de 5% (cinco


por cento) do capital social da Bracenter e, portanto, es-
tá legitimada a agir como substituta processual da soci-
edade (LSA, art. 246, § 1°, a), sem ter que prestar caução
às custas;

considerando que a Consulente e o Grupo Bandeirantes


detêm o controle totalitário conjunto da Bracenter, na
medida em que nenhum deles está afastado do poder de
dominação e, em linha com as regras do pacto social,
têm escolhido os administradores e dirigido as ativida-
des sociais e orientado o funcionamento dos órgãos da
sociedade, sempre por mútuo consenso;

considerando que, embora o controle da Bracenter seja


detido e exercido em comum pela Consulente e pelo
Grupo Bandeirantes, todos e cada um deles deve ser
considerado acionista controlador, sujeito por isso às
específicas regras de deveres e responsabilidades ine-
rentes a este status;

considerando que, por isso mesmo, o Grupo Bandeiran-


tes, como controlador, tem legitimidade para figurar no
polo passivo da ação de responsabilidade civil em que se
lhe imputa a prática de atos individuais de abuso de po-
der de controle e deslealdade societária;

considerando que a interpretação das regras legais pre-


cisa ser feita em harmonia com os seus fins e de modo a
tutelar os interesses por elas protegidos, e não de forma
a levar à irresponsabilidade de qualquer dos sócios ou à
completa inefetividade do direito societário, obstando o
exercício de remédios voltados a recompor o patrimônio
social; e

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considerando que o próprio Grupo Bandeirantes, reco-


nhecendo a realidade da divisão interna de poderes,
propôs em sede reconvencional ação social contra a
Consulente e, por esse modo, revelou com a sua conduta

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a exata compreensão que os sócios têm do regramento
societário da Bracenter, que afinal é uma sociedade do
tipo contratual, bem diversa de uma típica companhia;

– diante de tudo isso, não temos dúvida em concluir que a


ação de responsabilidade civil proposta pela Consulente
contra o Grupo Bandeirantes reúne todas as condições da
ação e, portanto, merece ter regular prosseguimento, com
a integral reforma da r. sentença de primeira instância.

VI. – Respostas aos quesitos.

34. Isto posto, passamos a responder aos quesitos formulados:

(1) – As regras da Lei das S/A que tratam da ação de respon-


sabilidade civil contra controlador são aplicáveis a so-
ciedade limitada regida supletivamente pelas normas
da sociedade anônima?

R: Sim, sem dúvida alguma. Não havendo regras sobre a


matéria no capítulo do Código Civil destinado a regrar a
sociedade limitada (CC, arts. 1.052 e segs.) e prevendo-
se no contrato social desta a aplicação supletiva das
normas da sociedade anônima (CC, art. 1.053, par. ún.),
é fora de dúvida, na doutrina e na jurisprudência, a ple-
na aplicabilidade das regras da Lei das S/A que tratam
dos deveres e responsabilidades do controlador (LSA,
arts. 116 e 117) e, de maneira mais específica, a que re-
gula a ação de responsabilidade civil contra sociedade
controladora (LSA, art. 246) e, a fortiori, contra contro-
lador. A sentença, neste particular, reconhece às ex-
pressas a aplicabilidade da disciplina da lei acionária.

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(2) – A ação social de responsabilidade civil contra controla-


dor exige prévia deliberação assemblear (LSA, art. 159,
§ 1°)?

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R: Não, de forma alguma. Em realidade, desconhece-se
qualquer pronunciamento da doutrina ou da jurispru-
dência (com exceção de uma imprecisa ementa, que se-
quer reflete o real conteúdo da decisão) no sentido de
que, para a propositura de ação de responsabilidade ci-
vil contra controlador seria necessária prévia delibera-
ção assemblear. A diferenciação que se faz, porém, en-
tre a ação social e a ação individual de responsabilidade
civil contra administrador, a partir da titularidade do
patrimônio diretamente atingido, essa sim é a mesma
que se pode fazer no âmbito das ações contra controla-
dor, até porque, em realidade, ela se funda em parâme-
tros gerais de responsabilidade civil e na distinção que
se faz entre danos diretos e indiretos. No caso, todavia,
toda essa discussão é absolutamente anódina, pois não
há dúvida que a Consulente reclama, em benefício da
Sociedade, a reparação de danos diretamente experi-
mentados no patrimônio social.

(3) – A ação social de responsabilidade civil pode ser proposta


caso exista uma situação de controle conjunto? Os
membros do bloco de controle são partes legítimas ati-
vas ou passivas, conforme o caso, para essa demanda?

R: Sim. Legitimado ativo para a ação de responsabilida-


de civil contra sociedade controladora é qualquer acio-
nista que detenha 5% (cinco por cento) do capital soci-
al ou, desde que preste caução às custas, qualquer acio-
nista. De outro lado, a ação social de responsabilidade
civil pode ser proposta contra controlador, ou socieda-
de controladora, ainda quando haja controle conjunto.
Isto porque, em caso de controle conjunto, conquanto
este pertença ao grupo em comum, cada um e todos os
seus membro qualificam-se como controladores e, por-

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tanto, respondem pelos atos de abuso individualmente


praticados. Interpretação diversa ofende os arts. 116 e
246 da Lei das S/A e a própria ratio das regras legais
que, afinal de contas, foram estruturadas para atribuir e

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tornar efeitos direitos e responsabilidades próprias de
quem exerce poder que se funda na propriedade de
bens alheios e que, afinal, deve respeitar e zelar pelos
interesses juridicamente protegidos de terceiros. Dian-
te de um claro quadro de controle totalitário conjunto,
o pior cenário seria o de promover, em termos práticos,
a completa irresponsabilidade de tais agentes, por falta
de remédio processual apropriado e eficaz.

(4) – No caso concreto, a Consulente é parte legítima para


agir como substituta processual da Sociedade e pleitear
a condenação do Grupo Bandeirantes a reparar o dano
causado ao patrimônio social? A r. sentença merece re-
forma?

R: Sim, não temos dúvida alguma em dizê-lo. Feita a ne-


cessária distinção entre maioria e poder de controle e,
por esse modo, reconhecida a presença de um quadro
de controle totalitário conjunto (que se projetou no
tempo ao longo de anos), deve-se reconhecer que, de
um lado, a Consulente é parte legítima ativa, pois reúne
mais de 5% do capital social (CC, art. 1.053, par. ún., e
LSA, art. 246, § 1°, a), e, de outro, o Grupo Bandeirantes
é parte legítima passiva, pois integra o bloco de contro-
le e, conquanto este seja titulado em comum, é de per si
controlador para os fins de sujeitar-se às regras legais
que disciplinam os seus deveres e as suas responsabili-
dades. Essa realidade, de resto, não foi contestada se-
quer pelo Grupo Bandeirantes que, admitindo-a, formu-
lou ele próprio, em reconvenção, ação social contra a
Consulente. A r. sentença, por isso, a nosso ver merece
reforma, para que, com a baixa dos autos, o processo
tenha regular seguimento.

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É o nosso parecer, s.m.j.

Marcelo Vieira von Adamek

da Faculdade de Direito da USP )


São Paulo, 07 de fevereiro de 2019.

( Doutor e Mestre em Direito Comercial


pela Faculdade de Direito da USP. Professor Doutor

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