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C APÍTULO VI

DAS ARRAS OU SINAL

Sumário: 1. Conceito. 2. Narurezajurfdica. 3. Espécies. 4. Funções


das arras.

1. Conceito

Sinal ou arras é quantia ou coisa entregue por um dos contraentes ao


outro, como confirmação do acordo de vontades e princípio de pagamento.
Para SILVJO RooRIGUES, as arras "constituem a importância em dinhei-
ro ou a coisa dada por um contratante ao outro, por ocasião da conclusão
do contrato, com o escopo de firmar a presunção de acordo final e tomar
obrigatório o ajuste; ou ainda, excepcionalmente, com o propósito de asse-
gurar, para cada um dos contratantes, o direito de arrependimento" 1•
É instituto muito antigo, conhecido dos romanos, que costumavam en-
tregar simbolicamente o anel, para demonstrar a conclusão do contrato. Exis-
tia nessa época uma espécie de noivado ou compromisso que duas pessoas de
sexo diferente assumiam, reciprocamente, conhecido pelo nome de sponsalia
(esponsais) que, além de solene, gerava efeitos. Consistia na entrega de um
sinal ou arras esponsalícias, que o noivo perdia, ou até as pagava em triplo ou
em quádruplo, se desmanchasse o noivado injustificadamente2.

2. Naturezajurúlica

O sinal ou arras tem cabimento apenas nos contratos bilaterais trans-


lativos do domínio, dos quais constitui pacto acessório. Não existe por si:
depende do contrato principal. As arras, além da natureza acessória, têm

1
Direito civil, v. 2, p. 279.
' Roberto de Ruggiero, /11stit11ições de direito civil, v. III, p. 62, § 48.

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também caráter real, pois aperfeiçoam-se com a entrega do dinheiro ou de
coisa fungível, por um dos contraentes ao outro.
Supõem elas a existência de um contrato principal, do qual dependem.
Não existem por si, sendo inconcebível imaginá-las isoladamente, sem es-
tarem atreladas a uma avença, considerada principal.
O caráter real decorre do fato de se aperfeiçoar pela entrega ou trans-
ferência da coisa (dinheiro ou bem fungível) de uma parte a outra. O simples
acordo de vontades não é suficiente para caracterizar o instituto, que depen-
de, para sua eficácia, da efetiva entrega do bem à outra parte.

3. Espécies
As arras são confirmatórias ou penitenciais. Sua principal função é
confirmar o contrato, que se toma obrigatório após a sua entrega. Prova o
acordo de vontades, não mais sendo lícito a qualquer dos contratantes res-
cindi-lo unilateralmente. Quem o fizer, responderá por perdas e danos, nos
termos dos arts. 418 e 419 do Código Civil.
Preceitua o primeiro dispositivo citado:
"Art. 418. Se a parte que deu as arras não executar o contrato, poderá
a outra tê-lo por desfeito, retendo-as; se a inexecução for de quem recebeu
as arras, poderá quem as deu haver o contrato por desfeito, e exigir sua
devolução mais o equivalente, com atualização rnonetária segundo índices
oficiais regularmente estabelecidos, juros e honorários de advogado".
A parte inocente pode conformar-se apenas com ficar com o sinal dado
pelo outro, ou com o equivalente, ou pode, ainda, "pedir indenização su-
plementar, se provar maior prejuízo, valendo as arras como taxa mínima".
Pode, também, "exigir a execução do contrato, com as perdas e danos,
valendo as arras como o mínim.o da indenização" (art. 419). Observa-se
que as arras representam o mínimo de indenização, e que pode ser pleitea-
da a reparação integral do prejuízo. Não havendo nenhuma estipulação em
contrário, as arras consideram-se confirmatórias.
Podem, contudo, as partes convencionar o direito de arrependimento.
Neste caso, as arras denominam-se penitenciais, porque atuam como pena
convencional, como sanção à parte que se valer dessa faculdade. Prescreve,
com efeito, o art. 420 do Código Civil:
"Se no contrato for estipulado o direito de arrependimento para qual-
quer das partes, as arras ou sinal terão função unicamente indenizatória.
Neste caso, quem as deu perdê-las-á em benefício da outra parte; e quern
as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente. Em ambos os casos não ha-
verá direito a indenização suplementar".

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Acordado o arrependimento, o contrato toma-se resolúvel, responden-
do, porém, o que se arrepender, pelas perdas e danos prefixados modica-
mente pela lei: perda do sinal dado ou sua restituição em dobro. A duplica-
ção é para que o inadimplente devolva o que recebeu e perca outro tanto.
Não se exige prova de prejuízo real. Por outro lado, não se admite
a cobrança de outra verba, a título de perdas e danos, ainda que a parte
inocente tenha sofrido prejuízo superior ao valor do sinal. Proclama a
Súmula 412 do Supremo Tribunal Federal: "No compromisso de compra
e venda com cláusula de arrependimento, a devolução do sinal, por quem
o deu, ou a sua restituição em dobro, por quem o recebeu, exclui indeni-
zação maior, a título de perdas e danos, salvo os juros moratórios e os
encargos do processo".
O sinal constitui, pois, predeterminação das perdas e danos em favor
do contratante inocente. A jurisprudência estabeleceu algumas hipóteses em
que a devolução do sinal deve ser pura e sirnples, e não em dobro: a) ha-
vendo acordo nesse sentido; b) havendo culpa de ambos os contratantes
(inadimplência de ambos ou arrependimento recíproco); e c) se o cumpri-
mento do contrato não se efetiva em razão do fortuito ou outro motivo es-
tranho à vontade dos contratantes.

4. Funções das arras

Tríplice a função das arras. Além de confirmar o contrato, tomando-o


obrigatório, e de servir de prefixação das perdas e danos quando convencio-
nado o direito de arrependimento, como visto, as arras atuam, também, como
começo de pagamento. É o que preceitua o art. 417 do Código Civil, verbis:
"Se, por ocasião da conclusão do contrato, urna parte der à outra, a
título de arras, dinheiro ou outro bem rnóvel, deverão as arras, em caso de
execução, ser restituídas ou computadas na prestação devida, se do mesmo
gênero da principal".
O sinal constitui princípio de pagarnento quando a coisa entregue é
parte ou parcela do objeto do contrato, ou seja, é do mesmo gênero do res-
tante a ser entregue. Assim, por exemplo, se o devedor de dez bicicletas
entrega duas ao credor, como sinal, este constitui princípio de pagamento.
Mas se a dívida é em dinheiro e o devedor entrega duas bicicletas a título
de sinal, estas constituem apenas uma garantia e devem ser restituídas,
quando o contrato for cumprido, isto é, quando o preço total for pago.

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