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Immanuel Kant e Stuart Mill

Immanuel Kant (1724-1804)


Kant foi um filósofo alemão considerado até aos dias de hoje o maior pensador de todos os
tempos por muitos. Cresceu muito ligado à religião e formou-se em ciências, talvez por isso o
seu enorme interesse em salvar a metafísica tradicional, isto é, a disciplina da Filosofia que se
ocupa de entender a natureza do ser, assim como da própria realidade, estabelecendo-se uma
relação entre a mente e a matéria, baseando-se, assim, no trabalho de Aristóteles.

Ética deontológica/absolutista de Kant


● Uma teoria deontológica/absolutista consiste num conjunto de princípios ou leis
estabelecidas que permitem distinguir o certo do errado, sendo que não são
consideradas as consequências de uma ação na determinação do valor ético da mesma.
● Kant distingue as ações em...
○ «por dever» (a ação é unicamente motivada pelo puro respeito à lei moral)
○ «conforme ao dever» (cumpre o que é considerado correto, no entanto essa ação
persegue um interesse particular, um desejo ou uma inclinação)
○ «contrárias ao dever» (ações que contrariam absolutamente a moralidade, como
roubar, difamar e matar).
● Para Kant as ações de boa vontade (têm valor intrínseco) são aquelas que ocorrem
«por dever», sendo por isso moralmente corretas.
● O dever baseia-se na Razão, uma vez que toda a moralidade é racional fundamental,
dando origem a um imperativo categórico.
● Kant distingue os imperativos (princípios/formulações que expressam a noção do
Dever) em…
○ Imperativo hipotético: A ação é boa porque a partir dela podemos atingir um certo
fim desejado pelo sujeito, ou seja, uma ação que se rege por conformidade ao
dever, sendo por isso imoral. Estas ações são condicionais, particulares e
contingentes. Está por isso associado às éticas materiais de moral heterónoma
(imposta por algo exterior que foge à racionalidade).
○ Imperativo categórico ou da moralidade: A ação é boa quando é realizada de
acordo com a lei moral, ou seja, que se rege por dever. É considerado universal,
necessário e incondicional. Está associada à lei moral, dado o seu caráter formal e à
autonomia de vontade.
● À luz de Kant, o imperativo categórico é o único critério válido que devemos seguir
para decidir se um ato é ou não moralmente permissível. Para tal deverá apresentar uma
formulação universal aplicada em todas as situações.
● Desta forma e considerando uma única lei, a lei suprema da moralidade, Kant
formulou de três formas o imperativo categórico:
1. “Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela
se torne lei universal.” - qualquer pessoa deve apenas agir segundo máximas, leis
que sejam universais e necessárias a todos os agentes, pois só assim é que essas
mesmas ações são válidas e morais.
2. “Age como se a máxima da tua ação se devesse tornar, pela tua vontade, em lei
universal da natureza.” -
3. “Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa
de qualquer outro, sempre e simultaneamente como um fim e nunca como um
meio.” - Kant considera que o Homem como ser moral, tem um valor intrínseco de
dignidade, pelo que é errado utilizar as pessoas como meio para atingir os fins,
mas sim como fins, isto porque as pessoas são racionais e livres, isto é, possuem
racionalidade e liberdade, daí terem de ser respeitadas.
Exemplos: Kant não aceita o suícidio, porque estaríamos a permitir a toda a espécie
humana que o fizesse, o que é contrário ao sentido da vida, que devemos preservar o
Homem acima de tudo. Também estaríamos a utilizar o nosso corpo (algo exterior à
razão) como um meio para atingir outro fim, o alcance da paz interior.
● Retributivismo kantiano: O retributivismo é uma teoria sobre a punição de crimes
em que Kant pensa que qualquer crime deve ser retribuído da mesma forma, o que,
por exemplo, em casos de homicídio Kant era a favor da pena de morte dos
crimonosos, visto que o criminoso agiu com base naquilo que ele achava ser para si a
lei universal, que neste caso seria causar o sofrimento de alguém. Assim, o criminoso
deve ser julgado conforme a lei que ele considera ser universal, correta e válida.
● Posições sobre os animais: Kant considera que como os animais não-humanos não
têm a capacidade da racionalidade, então estes não precisam de ser respeitados nem
existe qualquer dever do Homem para com eles.

Objeções à teoria de Kant


● Conflito de deveres: Por vezes é inevitável termos de escolher entre dois deveres, isto
é, às vezes uma obrigação moral pode implicar não cumprir uma outra obrigação.
● Idiotas bem intencionados: Segundo Kant, os idiotas bem intencionados são
desculpados ou são punidos com retributivismo. O pensamento de Kant dá demasiada
importância à intenção, desconsiderando as consequências dessas mesmas ações. A
intenção do agente até pode ser boa, no entanto as suas consequências são ignoradas.
● Vazia de emoções: Emoções como o remorso, a simpatia e a compaixão têm uma papel
indiscutível no que diz respeito à moralidade, porque é possível que em certas situações
as pessoas ajam de acordo com a lei por razões que podem estar ligadas a outras
inclinações, no entanto as emoções são ignoradas na teoria de Kant.
● Consequências ignoradas: O cumprimento incondicional de obrigações morais pode
originar consequências que deviam ser tidas em consideração.
● Além das pessoas: Kant considera os recém-nascidos e os deficientes mentais
profundos incapazes de racionalidade, não merecendo respeito pelo que seria errado
utilizá-los como simples meios.
Stuart Mill (1806-1873)
Stuart Mill foi um filósofo, político e economista inglês, foi um dos pensadores liberais mais
influentes do século XIX (época da Revolução Industrial). Desde de cedo que foi educado
com as ideias de Jeremy Bentham (1748-1832), fundador do utilitarismo, de tal forma que
aos 15 anos passou a defender essa mesma teoria. O seu casamento com Harriet Taylor, assim
como o contraste entre a sua vida na corte e a dos pobres industriais influenciaram o seu
trabalho de vida, como a luta pelo direito das mulheres.

Ética teleológica/consequencialista de Mill


● Uma teoria teleológica/consequencialista consiste num conjunto de princípios ou leis
estabelecidas que permitem distinguir o certo do errado através das consequências
resultantes das ações.
● Esta teoria segue-se pelo princípio da utilidade ou da maior felicidade (“Devemos
fazer aquilo que, previsivelmente, produza os maiores benefícios possíveis para todos
os que serão afetados pela nossa ação.”), ou seja, o correto é maximizar a felicidade
(prazer) e minimizar a infelicidade (dor).
● O utilitarismo assenta em quatro ideias principais…
○ Consequencialismo: as ações são baseadas nas suas consequências
○ Hedonismo: defende que se deve fazer aquilo que provoque maior prazer numa
maior quantidade pessoas
○ Imparcialidade: uma vez que a felicidade global é tida em conta, deverá ser tida
em conta com igual importância a felicidade de cada indivíduo independente das
suas características como género e etnia, porque todos são igualmente importantes
○ Naturalismo: baseia-se em sentimentos reais (dor e prazer) e não em teorias como
Kant no imperativo categórico
● Como forma de maximizar a felicidade estabeleceu-se uma hierarquização dos prazeres
tanto qualitativamente como quantitativamente…
○ Critério qualitativo
■ Superiores: Prazeres intelectuais e morais, apenas comuns no ser humano, por
exemplo o conhecimento, a beleza, a liberdade, …
■ Inferiores: Prazeres físicos, comuns a todos os animais, por exemplo a fome, o
sono, o sexo, …
○ Critério quantitativo: Quanto mais intensos e duradouros forem os prazeres, maior
é a felicidade gerada.
● Esta teoria é material por depender de fatores externos à ação em si, assim como é
particular por depender da ética de cada um (princípios morais de cada um).
● Luta pelos direitos das mulheres:
○ Stuart Mill defende que tal como aos homens foi dada a oportunidade de
escolherem as suas funções no seio da sociedade, então o mesmo deveria ser
aplicado às mulheres, uma vez que a estas lhes foi negada essa escolha.
○ Stuart Mill argumenta que a opressão a que as mulheres estão sujeitas são
puramente fundadas nas convicções da sociedade, confessando a satisfação de
perceber que as sociedades modernas evoluíram permitindo o desenvolvimento
intelectual, socioeconómico e político das mulheres.
○ Stuart Mill alega que no caso das mulheres terem liberdade e igualdade de escolha,
seriam capazes de se opor perante o casamento e se afirmarem socialmente perante
os seus maridos. Desta forma as mulheres teriam o direito de escolher os seus
esposos, de se divorciarem, permanecendo com os seus bens e de se voltarem a
casar, desde que seja reflexo da união sincera entre os cônjuges.
○ Stuart Mill expõe também que as mulheres têm direito à educação, com o objetivo
de aumentar as suas capacidades intelectuais. Desta forma as mulheres teriam as
mesmas capacidades que os homens para poderem trabalhar/ exercer quaisquer
funções.
○ Por fim, no último capítulo do seu livro, Stuart Mill expõe os benefícios da
igualdade de género, tais como : justiça igual para ambos os sexos, aumento de
pessoas a contribuir para o processo evolutivo da humanidade e maior influência
feminina sobre os homens.
(Todos estes argumentos conduziram para um aumento da felicidade das mulheres.)
● No utilitarismo tem se em conta que a felicidade não é própria apenas do agente, mas
de todos os envolvidos, incluindo os animais-não humanos. Estes devem ser
respeitados pelo que também têm o direito de serem felizes tal como os humanos. No
utilitarismo o especismo (domínio da raça humana sobre todas as outras) não é aceite.
● O objetivo desta moral resume-se à realização de cada ser humano no mundo.

Objeções à teoria de Mill


● Quantificação da felicidade e redução dos sentimentos: Nem todo o ser humano
apresenta o mesmo sentimento de prazer com as mesmas ações, pelo que os prazeres
não devem ser hierarquizados. Para além, de que a felicidade em si é mais abrangente
do que o prazer, porque existem emoções que vão muito mais além do conceito de
prazer, como é caso do amor. Sendo que alguns sentimentos negativos (dor) não podem
ser completamente ignorados quando permitem ao Homem evoluir interiormente.
● Falta de respeito para com os direitos humanos: Tendo por base a felicidade do
maior número de pessoas, esta teoria acaba por apoiar grandes injustiças, pois não tem
em conta a diferença e a individualidade dos seres humanos, como acontece na
«objeção do bode expiatório».
● Perda da integridade pessoal: Certas ações a favor da maximização da felicidade
podem ir contra a integridade pessoal, pondo em causa o tipo de pessoa que devemos
ser (por exemplo: matar um terrorista para salvar um país, torna-te num assassino).
● Imprevisão das consequências: Torna-se impossível antever todas as consequências
possíveis de uma ação.
● «Máquina de experiências»: Perda de autonomia e liberdade na decisão de algo que
promove a maximização da felicidade individual e/ou geral, sendo a liberdade um valor
superior à felicidade.

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