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RESUMO: O presente artigo questiona os pressupostos com os quais a escola brasileira trabalha
o conceito de leitura, que impõe ao aluno a modalidade escrita como sendo a única, ou mais
relevante, forma de representação para composição de mensagens impressas. A leitura do mundo,
na concepção da escola atual, faz-se através da leitura do código escrito. Tal questionamento é feito
através da teoria da semiótica social (Kress e van Leeuwen, 1996). De acordo com essa teoria,
textos são construtos multi-modais; dos quais a escrita é apenas um dos modos de representação da
mensagem. Estes, por sua vez, são culturalmente determinados e constantemente redefinidos dentro
dos grupos sociais nos quais significam. Uma análise de impressos coletados em um ambiente de
trabalho é apresentada para demonstrar a multimodalidade das formas de representação, que deve
ser considerada quando do ensino da leitura da palavra, para uma leitura mais significativa do
mundo.
© ISSN: 1517-2539 – ETD – Educação Temática Digital, Campinas, v.3, n.2, p.19-26, jun. 2002. 19
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escola. LEITURA
Igualmente, o aluno (criança, jovem ou Kress e van Leeuwen (1996), dentre
adulto) traz para os bancos escolares outros, introduzem a noção de
habilidades maduras de se expressar multimodalidade das formas de
oralmente, nas quais a escola também representação que compõem uma
passa a interferir. Seus hábitos orais mensagem. Esses estudos, desenvolvidos
começam a ser “corrigidos”, e dentro da área da semiótica social,
substituídos pelo discurso valorizado na procuram englobar os diferentes modos
escola. Juntamente com o ensino de uma de representação impressa em um campo
“nova oralidade”, as expressões faciais e mais abrangente do que o até então
gestuais também são “re-educadas” no chamado de língua. Na teoria da
ambiente escolar. Assim, o repertório de semiótica social, a língua é entendida
representações que o aluno traz para a como parte de um contexto sociocultural,
escola é, na maioria das vezes, no qual cultura em si é entendida como
desprezado em face dos valores produto de um processo de construção
apregoados por esta. social. Sendo assim, nenhum código pode
ser completamente estudado em
Voltando à questão da leitura, e atendo-
isolamento. A língua – falada ou escrita –
me a ela neste artigo, proponho que
não pode ser entendida senão em conjunto
olhemos para esse conceito através do
com outros modos de representação que
prisma da semiótica social. Minha
participam da composição de uma
proposta é de que a escola passe a
mensagem. Com base nesta conceituação
trabalhar o conceito de leitura com uma
que proponho re-pensarmos o conceito de
visão mais ampla, considerando como
leitura neste texto.
fatores interferentes no processo de ler
outras formas de representação da Na semiótica social, sinais são
mensagem impressa. Preocupa-me o fato convenções sociais culturalmente
de que as crenças escolares sobre leitura, dependentes, e constantemente criados e
limitadas à leitura do código escrito, têm re-criados nas interações pessoais. A
subestimado o valor das outras formas de palavra escrita, enquanto originária de um
representação presentes na composição da sistema de sinais, é apenas parte da
mensagem escrita, sendo estas tão mensagem composta, quando atualizada
portadoras de significado quanto aquele. em um processo de comunicação.
Refiro-me, mais precisamente, a todos os Juntamente com ela, outros elementos,
recursos de composição e impressão do advindos de outros sistemas simbólicos,
texto, como: tipo de papel, ilustrações, compõem o corpo da mensagem como um
cores, diagramação da página, formato todo.
das letras, etc. A esse conjunto de Qualquer que seja o texto escrito, ele é
elementos, a semiótica social refere-se multi-modal, isto é, composto por mais de
como a multimodalidade das formas de um modo de representação. Em uma
representação. página, além do código escrito, outras
formas de representação como a
A MULTIMODALIDADE DAS diagramação da página (layout), a cor e a
FORMAS DE REPRESENTAÇÃO: qualidade do papel, o formato e a cor (ou
AMPLIANDO O CONCEITO DE cores) das letras, a formatação do
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itálico, tipos de letras e tamanhos) faz possível. Para tanto, faz-se necessário que
com que os olhos do leitor percorram sua composição, como um todo, facilite
rapidamente o folheto, como que para sua leitura, e atraia os mais diferentes
obterem rapidamente a informação leitores dentro da comunidade.
oferecida. Por outro lado, tais recursos
cumprem a tarefa, também, de deixar o
impresso mais atraente. CONCLUSÃO
As demandas para utilização bem
A característica de propiciar uma leitura sucedida dos impressos analisados neste
rápida do folheto reforça-se quando do artigo não se encerram nas habilidades de
uso dos recursos da escrita. A estrutura leitura do código escrito; muito pelo
sintática das sentenças nos textos contidos contrário. Como vimos, o reconhecimento
no folheto segue o modelo direto de visual de alguns deles (do tíquete, por
SUJEITO-VERBO-COMPLEMENTO. exemplo) leva à sua utilização, com
Tal aspecto leva a uma fácil compreensão sucesso, sem a necessidade primeira de se
da parte escrita, e a uma leitura mais conhecer o código escrito. Em outras
rápida. Observe os exemplos que se palavras, as demandas que o leitor
seguem, retirados do primeiro artigo da encontra para lidar com esses materiais
página de frente do folheto em análise: impressos incluem práticas mínimas de
Os artesãos de Cosmópolis terão mais uma oportinidade para
leitura e menores ainda de escrita. Desses
expor seus trabalhos. impressos, apenas o formulário
apresentado na Figura 1 requer o uso da
SUJ. V.
COMPLEMENTO
escrita, para preenchimento de algumas
lacunas. Nos demais, nenhuma demanda
de escrita é apresentada, ou seja, o leitor
A Divisão de Cultura está organizando uma feira de desses impressos não é levado a escrever
artesanato,
SUJ. VERBO COMPLEM. seja no material (preencher um cupom,
por exemplo), seja para o material
(contribuir com artigos, por exemplo).
que vai funcionar a partir do próximo semestre.
S. VERBO COMPLEM. Esses leitores são, assim, consumidores
de informação, uma vez que não estão
envolvidos na produção da informação
Ainda no que diz respeito ao modo de veiculada nesses impressos.
representação da escrita, nota-se que a
linguagem privilegiada na produção do Se compararmos empiricamente a
folheto aproxima-se do registro oral. O quantidade de pessoas envolvidas na
futuro feito através do composto “vai produção de impressos com aquela das
funcionar” é um exemplo a citar. pessoas que lêem os impressos, não
Acreditamos que, através desse recurso, precisaremos de muitas estatísticas para
os produtores desse impresso aproximam- perceber que a faixa daqueles que lêem é
se com maior sucesso dos leitores significativamente maior do que a dos que
almejados. Sendo um material de produzem o material para leitura. E não
circulação ampla no município, os poderia ser diferente. O que nos compete
recursos de linguagem devem ser tais que fazer, enquanto pessoas preocupadas com
atinjam a mais variada massa de leitores o conceito de leitura, é alertar para o fato
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