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PREFEITURA MUNICIPAL DE SOROCABA

PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MULTIPROFISSIONAL EM SAÚDE DA


FAMÍLIA E COMUNIDADE

Bianca Priuli de Andrade

Um caso de sucesso

Sorocaba

2020
1º ETAPA: ESCOLHA E DESCRIÇÃO DO CASO
O caso de S. chegou em matriciamento da equipe NASF, na unidade de
Saúde da Família Ulisses Guimarães pela enfermeira Elisabete, e agente
comunitária de saúde Sara com a demanda de automutilação e ideação suicida
e foi acolhida na unidade pela assistente social Bianca e pelo psicólogo
Leonardo.
S., 14 anos, nascida em 06 de janeiro de 2006. Estuda na escola
municipal Sarah Salvestro no período vespertino, a adolescente relata gostar
de frequentar a escola, tem poucas amigas e são as mesmas que convive fora
do ambiente escolar. S. tem um bom relacionamento com a irmã mais nova e é
muito apegada aos seus animais de estimação. S. declara ser bissexual,
atualmente tem uma namorada e relata que seus pais não demonstram se
incomodar com sua orientação sexual. Durante os atendimentos relatou abuso
sexual por parte do padrasto e situações de violência doméstica que a mãe
está exposta. Segundo informações trazidas em matriciamento com CAPS IJ,
S. foi encaminhada ao serviço aos cinco anos de idade, pois presenciou o pai
quebrando o braço da mãe, porém só compareceu em dois atendimentos. S.
mora com a mãe E., o padrasto J. e a irmã E.
Segundo a adolescente a mãe trabalha em um brechó, do qual é dona e,
há tempos faz tratamento para depressão com medicamentos controlados. No
prontuário de E., foi possível observar que a mesma está em tratamento para
ansiedade e depressão desde 2006, tem relatos de ideação suicida e tentativa
de suicídio, traz histórico de esquizofrenia da mãe e transtorno afetivo bipolar
do irmão. E. fazia acompanhamento no CAPS Arte do Encontro e
posteriormente passou a frequentar o grupo Bem Viver na unidade de saúde.
Desde janeiro de 2019 não passa em atendimento na unidade.
De acordo com S., o padrasto é aposentado, faz uso de substâncias
psicoativas e ficou internado em uma clínica de reabilitação por alguns meses.
Relata que o padrasto “manipula” e “faz chantagem emocional” com sua mãe.
De acordo com o prontuário de J., o usuário é aposentado em decorrência da
situação de saúde mental, segundo declaração médica tem os diagnósticos de
CID 10 F 20.0 (esquizofrenia paranoide), CID 10 F 19.8 (transtornos mentais e
comportamentais devidos ao uso de múltiplas drogas e ao uso de outras
substâncias psicoativas - outros transtornos mentais ou comportamentais) e
CID 10 F 20.5 (esquizofrenia residual). J. fazia acompanhamento no CAPS Arte
do Encontro e posteriormente passou a ser acompanhado no grupo Bem viver
na unidade de saúde, porém não passa em atendimento na unidade desde
janeiro de 2019.
Em. é filha de E. e J., tem 6 anos e segundo a irmã, “é especial” e faz
acompanhamento na APAE. Não foi possível encontrar o prontuário da criança,
agente comunitária de saúde informa que Em. tem paralisia cerebral, é
acompanhada na APAE e na creche Maria Clara.
S. tem contato com o pai e os avós paternos e passa alguns finais de
semana na casa da família. Durante os atendimentos também trouxe relatos de
violência doméstica do pai com sua mãe, segundo a adolescente sua mãe
sofreu um aborto em decorrência de violência doméstica praticada por seu pai.
S. encontra-se em uma situação de alto risco psicossocial e violação de
direitos, pois está vivendo na mesma casa que seu agressor com o risco
eminente que os episódios ocorram novamente. Permanecer no mesmo
ambiente que o padrasto também pode lhe trazer prejuízos psicológicos
importantes, pois a adolescente traz relatos de ansiedade e medo constante. A
irmã também está exposta a riscos ao conviver em um ambiente de violência e
por estar na mesma residência que J. E. vive em situação de violência
doméstica e apresenta questões de saúde mental importantes, inclusive com
antecedentes na família. J. não está fazendo nenhum tipo de acompanhamento
para suas questões de saúde mental.
De acordo com Viana (2015), “(...) o ambiente é o local onde a pessoa
se encontra com as coisas ao seu redor e que exercem nela influências,
afetando-a de várias maneiras”, o ambiente o qual a pessoa está inserida
interfere diretamente em suas formas de ver e estar no mundo. A família de S.
está imersa em um contexto social complexo, de alta vulnerabilidade e de
relações interpessoais fragilizadas e violentas marcadas por violência sexual,
violência doméstica, uso abusivo de substâncias e questões de saúde mental
graves que influenciam e podem comprometer o desenvolvimento social e
pessoal de S., portanto a construção de um Projeto Terapêutico Singular deve-
se estender também aos membros de sua família para que a intervenção seja
mais efetiva e comprometida com a realidade a qual a adolescente está
inserida, uma vez que é no âmbito familiar que se originam as questões que a
adolescente está vivenciando.
2º ETAPA: ABORDAGEM FAMILIAR – APLICAÇÃO DE GENOGRAMA E
ECOMAPA
3º ETAPA: ELABORAÇÃO E APLICAÇÃO PROJETO TERAPÊUTICO
SINGULAR

Projeto Terapêutico Singular (PTS)

O Projeto Terapêutico Singular consiste na construção de propostas de ação


com o sujeito da intervenção através de discussões de equipe interdisciplinar e
apoio matricial, em geral utilizado em casos mais complexos. É realizado através
do diagnóstico, definição de metas com propostas de curto, médio e longo prazo,
divisão de responsabilidade entre os profissionais e a reavaliação das propostas
(BRASIL, 2008). Em decorrência da complexidade da dinâmica familiar de S. uma
parte do PTS se estenderá aos membros de sua família.

DEFINIÇÃO DE META: CURTO PRAZO

Objetivos: Aproximação e criação de vínculo com S.; diálogo sobre possibilidade


da adolescente ir morar com o pai; compartilhar caso e solicitar apoio da rede.

Data Ações Desenvolvidas Profissionais responsáveis


Acolhimento NASF (Assistente social Bianca e
21/08/2019
psicólogo Leonardo)
29/08/2019 Atendimento individual NASF (Assistente social Bianca e
psicólogo Leonardo)
30/08/2019 Compartilhamento de caso com a NASF (Psicólogo Leonardo),
equipe Equipe (Enfermeira Elisabete)
05/09/2019 Discussão de caso no MTC NASF (Assistente social Bianca,
CAPS IJ Farmacêuticas Dominique e
Jaqueline, Fisioterapeuta
Márcia), CAPS IJ (Assistente
social Maria Elisa) e Equipe
(Enfermeira Elisabete)
Caso compartilhado com NASF (Assistente social Bianca e
11/09/2019
Conselho Tutelar e CREAS Norte psicólogo Leonardo)
DEFINIÇÃO DE META: MÉDIO PRAZO

Objetivos: Sensibilizar S. para que compareça aos atendimentos no CAPS IJ,


inserir S. em espaços de cultura e lazer do território e tentar uma aproximação
com E.

Data Ações Desenvolvidas Profissionais responsáveis


25/09/2019 NASF (Assistente social Bianca e
Atendimento Individual
psicólogo Leonardo)
25/09/2019 Contato com CAPS IJ NASF (Assistente social Bianca)
26/09/2019 Contato com CREAS Norte NASF (Assistente social Bianca)
Contato com Conselho Tutelar
11/10/2019 NASF (Assistente social Bianca)
Norte
14/11/2019 Atendimento Individual NASF (Assistente social Bianca)
NASF (Assistente social Bianca e
22/11/2019 Atendimento S. e E.
psicólogo Leonardo)
NASF (Assistente social Bianca)
22/11/2019 Discussão de caso
Equipe (ACS Sara)
NASF (Assistente social Bianca,
psicólogo Leonardo, terapeuta
16/01/2019 Discussão de caso ocupacional Maribia) e Equipe
(Enfermeira Elisabete e ACS
Sara)
Contato com CREAS e CAPS
16/01/2020 NASF (Assistente Social)
Arte do Encontro
NASF (Terapeuta Ocupacional
22/01/2020 Atendimento E. e Em.
Maribia e enfermeiro Guilherme)
NASF (Assistente social Bianca e
18/02/2020 Atendimento S.
psicólogo Leonardo)
NASF (Terapeuta Ocupacional
19/02/2020 Atendimento E. e Em.
Maribia e enfermeiro Guilherme)
DEFINIÇÃO DE META: LONGO PRAZO

Objetivos: Construir um projeto de vida com S., fortalecer laços comunitários de


E. e aproximá-la dos grupos da unidade, reaproximar e ressignificar os vínculos
entre S. e sua mãe, e articular rede de serviços (CAPS Arte do Encontro e a USF)
para o caso de J.
Mês Ações a serem desenvolvidas Profissionais responsáveis
Janeiro a Atendimento S. NASF (Assistente social Bianca e
Março psicólogo Leonardo)
Fevereiro Atendimento de E. NASF (Terapeuta Ocupacional
a Abril Maribia e farmacêutica
Dominique)
Janeiro a Atendimento S. e E. NASF (Assistente social Bianca,
Abril psicólogo Leonardo e terapeuta
ocupacional Maribia)
Janeiro a Articular rede para caso de J. NASF (Assistente social Bianca,
Fevereiro psicólogo Leonardo, terapeuta
ocupacional Maribia) e Equipe
(Enfermeira Elisabete e ACS
Sara)

 Inicialmente, o objetivo durante os atendimentos e


desenvolvimento do PTS de S. foi de estabelecer vínculos e se
aproximar da adolescente para que compreenda a unidade de
saúde como um ponto de apoio para ela e sua família. Foram
identificadas as principais demandas e necessidades da usuária,
também foi realizada sensibilização sobre a necessidade de
compartilhar seu caso com outros serviços da rede.
 Caso foi discutido com a equipe de referência e reforçado a
importância de compartilhar com CAPS IJ.
 Caso foi compartilhado em matriciamento com o CAPS Aquarela
e posteriormente notificado ao CREAS e Conselho Tutelar.
 Foi realizado novo atendimento com a adolescente com as
devolutivas de intervenção dos outros equipamentos da rede e foi
realizado um diálogo sobre a possibilidade da mesma ir viver com
a família paterna.
 Realizado contato com a rede buscando as devolutivas e
intervenções já realizadas.
 Novo atendimento com a adolescente com a proposta de que
venha no próximo atendimento com sua mãe para construirmos
juntos o genograma da família.
 Usuárias faltam em atendimento.
 Após buscas no prontuário da família de S. foi realizada reunião
com a equipe de referência da USF e outros profissionais do
NASF com a proposta de expandir os atendimentos para os
outros membros da família, iniciando com a mãe E. e a irmã Em.
 Contato com os serviços da rede CREAS e CAPS solicitando
registros de atendimento da mãe e padrasto de S.
 Foi realizado acolhimento da mãe e da irmã de S. buscando
aproximação e compreensão da história de vida de E. visando a
construção de um cuidado familiar ampliado.

4º ETAPA: ANÁLISE DA GESTÃO DO CUIDADO

A gestão do cuidado se dá em cinco diferentes perspectivas - individual,


familiar, profissional, organizacional, sistêmica e societária - e consiste em
possibilitar tecnologias de saúde (duras, leves-duras e leves) em um
determinado tempo e espaço compatíveis com as necessidades do sujeito
(CECILIO, 2011).

Dimensão individual da gestão do cuidado

A dimensão individual da gestão do cuidado se relaciona ao ato de


cuidar de si mesmo, a capacidade de autonomia e da produção de formas de
ser e estar no mundo, da produção de escolhas e de formas de viver (CECILIO,
2011).
No decorrer dos atendimentos realizados com S. foi possível observar
que sua família materna reproduz o padrão de se aproximar de
relacionamentos com homens violentos. A adolescente trouxe relatos de
situações de violência doméstica com a avó, a mãe e as duas tias. S., durante
um dos atendimentos, declarou sentir repulsa de homens mais velhos e não se
sentir atraída pelos meninos de sua idade. Supõem-se que em decorrência de
todo histórico vivenciado com a figura masculina é possível relacionar o
sentimento de S. como um mecanismo de defesa e autoproteção, podendo ser
considerado uma forma de se autopreservar dentro de seus meios sociais,
escolha tomada em decorrência da complexidade e violência a qual foi
submetida e pela falta de orientação e acompanhamento de profissionais que
pudessem auxiliá-la na elaboração e ressignificação das experiências
vivenciadas. Não se pode desconsiderar a problemática da construção da
imagem masculina elabora pela adolescente, contudo ainda assim, essa ação
pode ser considera como forma de cuidar de si dentro das possibilidades
encontradas.

Dimensão familiar da gestão do cuidado 

A dimensão familiar da gestão do cuidado está relacionada à dimensão


da vida em si, a rede de afetos e está diretamente vinculada às relações entre
família, amigos, vizinhos podendo ter valores diferentes no decorrer da vida
(CECILIO, 2011).

A família é a principal responsável pelo cuidado, carinho, afeto e


proteção de seus membros, porém é no seio familiar que se estabelecem as
relações conflituosas da vida de S. Foi dentro da residência que presenciou e
vivenciou situações de violência e hostilidade. A adolescente tem vínculos
fragilizados com a família nuclear, se sente desprotegida pela mãe e relata
pouco contato com o pai, tendo maior proximidade e apoio da família extensa -
sua tia E.- também estabelece uma relação muito estreita com a namorada e
as amigas, as quais sempre trás relatos nos atendimentos. S. declarou sentir-
se responsável pelo cuidado da mãe e da irmã, demonstra preocupação
excessiva e medo do relacionamento entre E. e o padrasto, o que pode
significar uma inversão de papel entre mãe e filha. O PTS desenvolvido para a
adolescente tem como proposta trabalhar as relações familiares e como meta
de longo prazo reaproximar e reestabelecer o vínculo entre as usuárias
abordando e ressignificando os papéis sociais de mãe e filha.

Dimensão profissional do cuidado

A dimensão profissional do cuidado refere-se ao relacionamento


construído entre usuário e profissionais de saúde, orientado pela capacidade
técnica, ética e pela habilidade de desenvolver vínculo com o paciente pelos
profissionais (CECILIO, 2011).

Durante o desenvolvimento do PTS foi necessário a mobilização e a


articulação de diversos serviços da rede, como o Conselho Tutelar, o Centro de
Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), o Centro de Atenção
Psicossocial (CAPS) Aquarela, o CAPS Arte do Encontro e também a equipe
de referência da Unidade Básica de Saúde. Além de compartilhar o caso com
os serviços mencionados está sendo realizado seu processo de
acompanhamento através do contato, solicitação de devolutivas e
compartilhamento de novas informações observadas no território no que se
refere à família, uma vez que o PTS abrange a todos. Como o atendimento de
S. é compartilhado entre serviço social e psicologia está sendo possível realizar
um cuidado ampliado com uma abordagem significativa das situações
relatadas. O vínculo vem se fortalecendo a cada novo encontro, a qual se
demonstra cada vez mais confortável nos atendimentos realizados e
compreensível quanto à necessidade de aproximação da equipe com sua
família.

Dimensão organizacional do cuidado 

A dimensão organizacional do cuidado está relacionada a capacidade de


organização do processo de trabalho, a processos de atendimento comuns e
acordados entre os profissionais, também se relacionada ao planejamento, a
reuniões de equipe, a comunicação e está diretamente ligada a necessidade de
organização coletiva, corresponsabilidade e ao trabalho em equipe,
características difíceis de serem trabalhadas umas vez que os serviços de
saúde se apresentem como cenários de disputas de poder e divergências
profissionais (CECILIO, 2011).

Desde o início o caso de S. vem sendo discutido em equipe


multidisciplinar e apesar das dificuldades foi possível envolver a equipe de
referência da usuária e também os demais profissionais do NASF o que vem
proporcionando uma abordagem integral e o cuidado ampliado da família. No
que se refere ao envolvimento dos serviços da rede, houve uma maior
dificuldade de comprometimento de alguns com o caso, sendo necessária uma
maior cobrança e aproximação com os profissionais de referência.

Dimensão sistêmica da gestão do cuidado

A dimensão sistêmica da gestão do cuidado discorre sobre a delineação


das redes de cuidado integrais em saúde nos diferentes níveis de
complexidade, porém trata do caminho individual e singular que os usuários
percorrem nos serviços, que muitas vezes não se encaixa nas linhas de
cuidado construídas pelos gestores (CECILIO, 2011).

A agente comunitária de saúde teve papel fundamental na organização


do fluxo de atendimento do caso de S., uma vez que foi ela quem deu a
atenção necessária e trouxe a situação para discussão no matriciamento da
equipe NASF. A partir dos atendimentos foi possível compartilhar e articular a
rede de serviços da saúde e da assistência social, contudo a maior dificuldade
encontrada tem sido que a usuária comece a frequentar os atendimentos no
CAPS IJ e que o serviço faça a busca ativa e tente se aproximar da
adolescente.

Dimensão societária da gestão do cuidado em saúde

A dimensão societária da gestão do cuidado se relaciona ao papel do


Estado na organização das políticas públicas, na construção da cidadania e
acesso a condições dignas de vida (CECILIO, 2011).

É notável a fragilidade, a deficiência e a precarização da rede de saúde


mental no município de Sorocaba. Apesar dos CAPS se caracterizarem como
serviços de portas abertas os usuários encontram séries dificuldades para
serem acolhidos, mesmo compartilhando e discutindo os casos nos
matricimentos de saúde mental os profissionais e o próprio serviço burocratiza
o acesso de pacientes. No caso da adolescente S. há grande dificuldade do
comprometimento e corresponsabilização dos técnicos, pois a adolescente não
compareceu nos atendimentos agendados e mesmo sabendo da complexidade
da situação os profissionais não se disponibilizaram a realizar uma abordagem
diferente ou a busca ativa do caso.

5º ETAPA: REFLEXÃO DA ATIVIDADE

Realizar essa atividade foi um desafio e uma experiência muito


enriquecedora. No decorrer do desenvolvimento do PTS de S. foi sendo
observado que o caso era muito mais complexo do que imaginava envolvendo
questões de saúde mental, violência doméstica, abuso sexual, drogadição e
para atender às necessidades apresentadas pela usuária foi imprescindível o
envolvimento dos serviços da rede e dos profissionais da unidade de saúde.

O PTS é uma ferramenta muito importante para as equipes de saúde e é


quase que imprescindível para nós que fazemos parte do Núcleo Ampliado de
Saúde da Família e Atenção Básica (NASF – AB), uma vez que estamos
inseridos dentro das unidades para dar suporte aos casos mais complexos do
território, portanto, teoricamente, deveríamos desenvolver um PTS para todos
os casos, ou minimamente, para a grande maioria. Infelizmente, o que se
observa é que esse instrumento é muito raro de ser utilizado dentro das USFs
e que se fosse realmente aplicado possibilitaria um maior comprometimento e
corresponsabilização com os casos apresentados.

Atualmente, o cenário nacional das políticas de saúde pública é de


intenso retrocesso e precarização, estamos vivenciando momentos do avanço
do conservadorismo e da política neoliberal e é possível ver os rebatimentos
dessa situação dentro dos estados e municípios brasileiros com a intensa
privatização e terceirização de muitos equipamentos públicos. São diversas as
lacunas encontradas na atenção à saúde no munícipio de Sorocaba, a rede de
atenção em saúde mental, por exemplo, encontra-se muito instável e
fragilizada, essa situação interfere diretamente no trabalho desenvolvido nas
USFs e muitas vezes encontramos dificuldade em compartilhar alguns casos
com os serviços de saúde mental da região onde atuamos - essa foi a maior
dificuldade no desenvolvimento do PTS de S.

Foi muito satisfatório ver o envolvimento da equipe de referência da


unidade e dos outros serviços que foram acionados no decorrer dessa
atividade, demonstrando como há a possibilidade de desenvolver grandes
ações quando se trabalha em equipe e em rede. Foi muito gratificante ver o
envolvimento da usuária com as propostas apresentadas e observar as
mudanças proporcionadas em seu meio social e familiar.

Após os atendimentos individuais realizados com a adolescente a ACS


de referência nos comunicou que S. tinha se mudado para a casa da família
paterna e, com isso, foi compartilhado o caso com a equipe de referência do
novo território que a adolescente está vivendo.

Também após alguns atendimentos com a mãe E. a ACS informou que a


mesma separou-se do marido J. novamente e o usuário foi embora da
residência.
Não foi possível realizar a aproximação com J., porém as orientações e
reflexões propostas à S. e E., possivelmente, contribuíram para as
transformações ocorridas na vida de ambas.

A dimensão educativa do assistente social é uma das suas


principais possibilidades de atuação, em especial, dentro da APS. Ela se
realiza através da atividade reflexiva desenvolvida em sua relação direta com
os usuários visando a construção de novas formas de olhar, compreender e
atuar na realidade.
A função pedagógica desempenhada pelo assistente social inscreve a
prática profissional no campo das atividades educativas formadoras
da cultura, ou seja, atividades formadoras de um modo de pensar,
sentir e agir, também entendido como sociabilidade (ABREU;
CARDOSO, 2009, p.1).

As ações do assistente social possuem um caráter político pedagógico,


pois incidem tanto nas condições objetivas de vida da classe trabalhadora,
como em suas condições subjetivas, através da influência em suas formas de
pensar e agir sobre o mundo (LIGABUE, 2016).
Buscando estabelecer vínculos e estreitar laços com a adolescente o
diálogo, portanto o acolhimento e a escuta qualificada, se caracterizam como
uma abordagem de extrema importância para o Serviço Social.

(...) para o Serviço Social, o acolhimento é parte integrante do


processo interventivo dos assistentes sociais e congrega três
elementos que agem em concomitância: a escuta, a troca de
informações e o conhecimento da situação em que se encontra o
usuário. Também se pode dizer que o acolhimento objetiva o acesso
a direitos das mais diversas naturezas, bem como a criação de
vínculo e a compreensão de elementos para fundamentar uma futura
intervenção (CHUPEL; MIOTO, 2010, p. 55 – 56).

O acolhimento, a escuta qualificada, a reflexão sobre a própria


identidade, a inserção de S. em espaços de convivência, sua inserção em
práticas artísticas e culturais são ações que auxiliam em seu bem estar e em
uma melhor qualidade de vida, contribuindo para que elabore novas
percepções e maneiras de ser e estar no mundo.

O assistente social busca atuar na perspectiva de compreender, intervir,


antecipar e planejar iniciativas sociais e terapêuticas que extrapolam a visão
biomédica, realizando seu exercício profissional através da integralidade, aliada
a ações multiprofissionais e intersetoriais (CHUPEL; MIOTO, 2010, p.100).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABREU, M. M.; CARDOSO, F. G. Mobilização social e práticas


educativas. In: ABEPSS; CFESS (Orgs.). Serviço Social: direitos sociais e
competências profissionais. Brasília: Cfess/Abepss, UnB, 2009, p. 593-608. 
Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção á Saúde. Núcleo Técnico da
Política Nacional de Humanização. Clínica ampliada, equipe de referência e
projeto terapêutico singular – 2 ed. – Brasília, 2008.
CECILIO, Luiz Carlos Oliveira. Apontamentos teórico-conceituais sobre
processos avaliativos considerando as múltiplas dimensões da gestão do
cuidado em saúde. Interface (Botucatu). 2011, vol.15, n.37, pp.589-599.
CHUPEL, C. P.; MIOTO, R. C. T. Acolhimento e serviço social: contribuição
para a discussão das ações profissionais no campo da saúde. Serviço Social
e Saúde, Campinas, SP, v. 9, n. 2, p. 37–59, 2015.
LIGABUE, H. P. A Expressão da Dimensão Educativa no Trabalho do
Assistente Social na Política de Assistência Social. 2016. 183 f.
Dissertação (Mestrado em Serviço Social) - Faculdade de Ciências Humanas e
Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Franca,
2016.

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