Caxias do Sul/RS.
2009
RESUMO
INTRODUÇÃO......................................................................................................................5
2 O PROBLEMA DA CAUSALIDADE..............................................................................14
CONCLUSÃO.......................................................................................................................32
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................35
INTRODUÇÃO
Erro! Indicador não definido.David Hume (1711-1776. Ediburgo, na Escócia). Filósofo empirista e
historiador, foi diplomata, ocupou o posto da Embaixada britânica em Paris, a partir de 1763. Tornou-se
amigo dos maiores pensadores franceses da época – Iluministas e enciclopedistas – Rousseau, Diderot e
D‟Alembert. A obra de Hume levou Bertrand Russell a declará-lo o maior filósofo da língua Inglesa, e é
bem conhecida a influência que exerceu sobre Adam Smith, e depois sobre Immanuel Kant, levando,
inclusive, o filósofo alemão a abandonar a metafísica racionalista e tornando possível a redação da Crítica
da Razão Pura. Influenciou os estudos sobre a teoria do conhecimento, sobretudo, dos positivistas, e
também o pensamento liberal clássico. Suas principais obras foram: A Treatise of Human Nature (1739-
1740; Tratado sobre a natureza humana); Investigações sobre o entendimento humano, 1748; Pesquisa
sobre os princípios da moral, 1751; A História da Inglaterra, 1754-1762” (HUME, 2001, p.5, em
prefácio).
como secretário do General Saint- Clair, de uma missão militar contra a França,
tendo o título de marechal- de - campo. Somente em 1748 voltou a publicar,
lançando a Investigação Acerca do Entendimento Humano, resumindo e corrigindo
os erros do Tratado, concentrando-se mais na Teoria do Conhecimento do livro I.
No inicio do século XVIII, as ideias do Iluminismo sobre Deus, a razão, a
natureza e o homem formavam uma nova visão que aos poucos tomava conta da
Europa. Este movimento, herdeiro do Renascimento e originado do racionalismo e
do empirismo do século XVII, fundava-se no uso da razão, vista como o atributo
pelo qual o homem apreende o universo e aperfeiçoa sua própria condição. A
ciência, especialmente a filosofia natural, firmava-se com o método experimental.
Os Iluministas produziram as primeiras teorias modernas sobre a natureza
humana, do ponto de vista científico.
O filósofo empirista inglês John Locke foi, certamente, o criador da Teoria do
Conhecimento. Em seu Ensaio acerca do entendimento humano -1689 - descreve as
circunstâncias desta nova disciplina, o autor diz que o Ensaio resultou das
dificuldades de resolver um problema filosófico, abordado ao acaso entre amigos;
diante da dificuldade, Locke sugeriu uma investigação sobre a extensão e o limite
do entendimento humano.
O papel do Ensaio foi fundamental para uma visão crítica do conhecimento,
pois rejeitou a apriorismo cartesiano, afirmando que as ideias não são inatas.
Assim, considerou que desde o nascimento a mente humana vai formando sua
experiência, formando o seu caráter individual. Locke chegou, então, à conclusão
de que, se o homem possui conhecimento, se sua alma é “um papel impresso”, os
conteúdos devem vir da experiência sensível e da reflexão. Em si mesmo, esses
elementos não constituem o conhecimento; seria, antes, processos que suprem a
mente com os materiais, que s~o “ideias”, express~o que adquire em Locke, o
sentido total de qualquer conteúdo do processo cognitivo. Incluem-se no
significado de “ideia” os “fantasmas” do conhecimento (dados imediatamente
provenientes dos sentidos), lembranças, imagens, noções e conceitos abstratos.
Foi a partir da Teoria do Conhecimento de John Locke (1621-1683) que
David Hume traçou um caminho próprio, desenvolvendo uma nova teoria do
conhecimento humano, ao estender o “princípio de cópia”, separando ideias
simples das complexas, muito usado por Locke, a todo o conhecimento. Percebeu a
necessidade de corrigir alguns erros conceituais deste filósofo, que apesar de ter
refutado as ideias inatas, afirmava que todas as “percepções” eram “ideias”,
pensamento do qual Hume n~o concordava. Dizia Hume que “Pensar” e “perceber”
são coisas distintas, e Locke teria confundido os termos. Ele buscou, então, em
Berkeley a inspiração necessária, pois considerava a teoria deste filósofo mais
completa: toda a ideia simples é uma cópia de uma impressão simples e não temos
ideia de substância externa distinta das ideias de qualidade particulares. Hume
criou um princípio semelhante: todas as ideias derivam de impressões
correspondentes. Este foi o argumento analítico que permitiu uma devassa nos
conceitos da metafísica clássica, iniciando pelo conceito de causalidade e suas
noções (conexão necessária, força, poder, substância, ação e criação).
No entanto, o processo de destruição da falsa metafísica, como dizia Hume,
tem um limite, representando um período cético do autor, e era necessário
reconstruir o conhecimento visando { construç~o da “Ciência do Homem”, o maior
objetivo do filósofo. A fase construtiva começa com o estabelecimento do segundo
princípio do conhecimento: as ideias são representações da memória e da
imaginação e resultam das impressões como cópias modificadas. A noção de
“cópia” continua, mas agora o sistema associa ideias e n~o somente copia, a partir
dos conceitos de semelhança, contiguidade espacial e temporal e por causalidade.
O conhecimento tem na imaginação, e não mais na razão, uma nova fonte, uma
faculdade natural da mente humana, com poderes de separar, selecionar e
conectar as ideias às impressões, uma forma sintética de constituição do
conhecimento.
A intenção de Hume era reduzir o poder absoluto da razão e ampliar o
espaço do conhecimento, privilegiando outras faculdades do entendimento
humano. Hume não se considera o inventor da teoria associativa, mas o inventor
de uma nova forma de usá-la. A forma de constituição do conhecimento, assim,
busca um equilíbrio de forças, entre princípios mais fortes e mais fracos,
combinados por forças atrativas na teoria da associação de ideias, inspiração que
veio da lei gravitacional dos corpos de Isaac Newton. As ideias simples se
introduzem naturalmente e as ideias complexas dependem de princípios lógicos,
dentre eles, o mais forte é o princípio da causalidade. Da mesma forma, as
impressões simples e complexas combinam-se ou associam-se. A mente humana
tem uma capacidade instintiva de criar, para Hume ela não é passiva, uma folha em
branco, com era para Locke, ela cria e transforma o conhecimento, e a imaginação
tem o poder de ultrapassar a realidade e a experiência.
As teorias de Locke (empirismo) e Berkeley (idealismo) e o método
experimental newtoniano foram a base do projeto de Hume, que acrescentou ao
título do seu primeiro livro o subtítulo: "uma tentativa de introduzir o método
experimental de raciocinar nos assuntos morais", indicando com isso a intenção de
construir uma “ciência do Homem” em torno das seguintes questões: descobrir o
porquê da rejeição da metafísica como ciência; a relação da ciência com a natureza
humana e descobrir um fundamento sólido para a experiência e a observação. Sem
dúvida que o projeto era ambicioso, Hume pretendia fazer ciência a partir dos
objetos do espírito, e ser considerado o Newton das ciências sociais. Se ele não
conclui o projeto, pelo menos mostrou que era possível estudar as ciências
humanas com controle científico, eliminando uma série de mitos e superstições do
conhecimento espiritual. Foi o primeiro a escrever uma antropologia religiosa,
mostrando que a religião também poderia ser uma ciência.
Quanto à metafísica, Hume pretendia, inicialmente, descobrir qual o motivo
do desprezo generalizado por essa ciência: “N~o é necessário uma conhecimento
profundo para descobrir quão imperfeita é nossa atual condição de ciência [...] os
doutos ignoram as questões que podem enfrentar o tribunal da raz~o humana”
(HUME, 2001, p.19, introdução).
A revalorização da metafísica dependia de uma reaproximação com a razão e
das outras ciências, mesmo a matemática, a filosofia da natureza e a religião
natural dependiam de uma ciência do homem. Para Hume, chegava o momento de
descobrir se a ciência do homem não admitia a mesma precisão da filosofia da
natureza. O recurso ao método experimental era uma alternativa para descobrir o
funcionamento da mente e sua relaç~o com os corpos externos: “Se, ao examinar
diversos fenômenos, descobrirmos que eles se reduzem a um princípio comum, e
formos capazes de remeter este princípio a outro, chegaremos finalmente àqueles
poucos princípios simples de que todo o resto depende. E, mesmo que jamais
possamos chegar aos princípios últimos, já é uma satisfação ir até onde nossas
faculdades nos permitem ir” (HUME, 1988, p, 2).
Havia, porém, uma dificuldade para a constituição da Ciência do Homem, ou
ciência moral como era conhecida na época. Esta não admitia fazer experimentação
(em laboratório) a exemplo da filosofia natural. Como fazer experiência
premeditada e controlada do comportamento humano? Os princípios que regulam
a natureza podem mudar sob observação, o comportamento humano, subjetivo,
pode ser alterado por vários fatores de investigação; assim, as observações não
seriam seguras. Como construir uma ciência nestas condições? Esse era o primeiro
problema a ser enfrentado. Segundo Hume, este problema podia ser remediado
pela observação cuidadosa da vida humana, recolhendo exemplos e experimentos
“tais como aparecem no curso do mundo, pelo comportamento dos homens em
companhia, nos negócios nos seus prazeres. Onde experimentos dessa espécie são
judiciosamente coletados e comparados, podemos esperar estabelecer sobre eles
uma ciência, que não será inferior em certeza, e será muito superior em utilidade a
qualquer outra compreensão humana [...], portanto, esse tratado da natureza
humana parece planejado como um sistema de ciências” (HUME, 2001, p. xix).
contradição. 5
4 “A análises dessa noção começou no séc. XVII, quando, com a distinção entre verdade de razão e
verdade de fatos [...] O primeiro a fazer essa distinção foi Hobbes: Há duas espécies de conhecimento, das
quais uma é o conhecimento de „fato‟ e outra é o conhecimento da consequência de uma afirmação
relativamente à outra. Tanto Leibniz quanto Hume concordam em julgar que o fundamento da verdade de
Fatos é o princípio da causalidade. Dessa análise resulta, portanto que o fato é: a) uma realidade
contingente, atingida ou testemunhada pela experiência; b) uma realidade fundada em certa conexão
causal. Uma noção de fato assim configurada é a que hoje se chamaria de noção de acontecimento, ou
seja, de realidade contingente que pertence à ordem da natureza. Essa última qualificação é a que se
expressa quando se julga que a verdade de Fato baseia-se no princípio causal” (ABBAGNANO, 1999,
p.430).
5 “Aristóteles define-a como oposição que, por si só, exclui o caminho do meio. Em analíticos, I, 2, 72,
Diz Hume que a história da humanidade, por exemplo, é uma questão de
fatos; ela expressa os fatos que aconteceram no mundo até hoje; mas o mundo
poderia ser diferente, e isso não seria nenhuma contradição, portanto, a
proposição histórica é assim, mas poderia ser diferente. O contrário de um fato
natural sempre é possível, pois, além de jamais implicar contradição, o espírito
humano pode o conceber com a mesma facilidade e distinção com que concebe o
seu atual acordo da realidade com a natureza.
A proposiç~o: “Que o sol n~o nascer| amanh~” é t~o inteligível e n~o implica
mais contradiç~o do que a afirmaç~o de que ele nascer|. “Podemos em v~o,
todavia, tentar demonstrar sua falsidade. Se ela fosse demonstrativamente falsa,
implicaria uma contradição e o espírito nunca poderia concebê-la distintamente”
(HUME, 2004, p. 48). Esta não é uma proposição necessária, mas sim contingente,
e neste caso, é possível sua negação, sem implicar com isso qualquer contradição.
Somente a realização da experiência poderá decidir a questão. Não podemos
recorrer ao método demonstrativo, pois apenas a experiência é que possui
define-a como relação entre proposição universal negativa e particular afirmativa, universal afirmativa e
particular negativa. Esses são os pares (AO, EI). Tendo nascido como princípio ontológico, passou para o
campo da lógica no século XVIII, graças a Leibniz que o considerou exclusivamente fundamentos das
verdades da razão, enquanto dizia que as “verdades de fato” baseavam-se no princípio de „razão
suficiente‟ “(ABBAGNANO, 1999, p.204).
6 “O núcleo do problema nas proposições „o sol nascerá‟ ou „não nascerá‟, não diz respeito às dúvidas de
Hume quanto ao aparecimento do sol, mas apenas consiste na indicação de um tipo de certeza diferente
da certeza absoluta. Trata-se, portanto, da caracterização da crença, que reina na esfera da opinião, e, de
acordo com Hume, que aqui diverge de Locke (veja-se N. K. Smith, ob. cit., pp. 63-70), é estendida a
todas as “questões de fato e de existência”. É assim que Hume estabelece uma categórica dicotomia entre
o conhecimento e a crença” (HUME 2004, p.48).
2. O PROBLEMA DA CAUSALIDADE.
Não pode ver-se, sem sentir certa pena, como os seus adversários [...]
passaram inteiramente por alto o ponto do problema. Desde os ensaios
de Locke e de Leibniz, ou antes, desde a origem da metafísica, tanto
quanto alcança a sua história, nenhuma ocorrência teve lugar que
pudesse ser mais decisiva, a respeito do destino desta ciência
(metafísica), do que o ataque que David Hume lhe fez (KANT, 1988, p.10).
7No Prolegômenos , Kant afirma que Hume não era contrário à metafísica, pois dava também este nome a
sua filosofia e atribuía-lhe um grande valor: A metafísica e a moral, diz ele , são os ramos mais
importantes da ciência (Kant, 1988 p.14).
sua essência, a natureza de uma necessidade absoluta, de um mundo perfeito e
pré-determinado:
Hume partiu essencialmente de um único, mas importante conceito de
metafísica, a saber, a conexão de causa e efeito (portanto, também os seus
conceitos consecutivos de força e ação, etc.), e intimou a razão, que
pretende tê-lo gerado no seu seio, a explicar-lhe com que direito ela
pensa que uma coisa pode ser de tal modo constituída que, uma vez
posta, se segue necessariamente que uma outra também deva ser posta,
é o que diz o conceito de causa (KANT, 1988, p14).
8 “Entre as raízes desses erros pode ser apontado o próprio discurso de Hume. As dificuldades que se
deve a linguagem empregada pelo filósofo. Por exemplo, Selby-Bigge diz “isso torna fácil encontrar
todas as filosofias em Hume, ou, ao opôr um enunciado contra o outro, nenhuma” (SMITH, 1995, p. 14).
para a noç~o de “subst}ncia”, interpretou a causalidade física como um esforço
mental, deixando a prova do mundo externo sem solução. Berkeley, em seguida,
teria negado a “subst}ncia material” e consequentemente também a causalidade
material. Hume teria completado o processo ao negar a causalidade espiritual e,
por conseguinte toda noção possível deste conceito, sobrando, apenas, uma
sequencia de experiências psicológicas, transitórias que, embora ricas, nada
significam.
O segundo princípio que Hume estabeleceu, geralmente omitido por alguns
intérpretes, diz o seguinte: A imaginação tem a liberdade de transpor e mudar
ideias. A interpretaç~o dos “compêndios” seria satisfatória e completa se este
princípio fosse mais bem explicado. O segundo momento metodológico de Hume é
o mais importante de todos. O estabelecimento do “segundo princípio” é o que
permitiu a Hume iniciar a ciência da “Natureza Humana”, o projeto que previa uma
grande reforma da ciência moral, baseado nas mais recentes conquistas da
9 “Na linha tradicional que interpreta Hume como um cético, está, entre outros: Red, Kant, Popkin,
Fogelin, Michaud e Olaso. Esta corrente pensa que Hume negou a objetividade da causalidade, do mundo
e do sujeito. A outra corrente, a mais recente, interpreta Hume como um filósofo naturalista cuja
contribuição é ressaltar o papel dos instintos e crenças naturais. Nesta corrente, entre outros, citamos:
Kemp-Smith, Barry Stroud, N. Capaldi e J. P. Monteiro” (SMITH, 1995, p. 13).
10 “O termo percepções é utilizado por Hume (2004, p.35) para designar a totalidade fenômenos mentais
e das operações da vontade. Elas constituem todos os materiais do pensamento, diferenciando-se de
Locke”.
simples não suportam qualquer divisão ou separação, diferentes das complexas
que podem ser divididas em várias partes. A rigorosa correspondência entre
impressões e ideias foi assim estabelecida Hume: “Portanto, quando suspeitamos
que um termo filosófico esteja sendo empregado sem nenhum significado ou ideia
– o que é muito frequente – devemos apenas perguntar: de que impressão é
derivada aquela suposta ideia? (HUME, 2004, p. 23).
Esse método também ficou conhecido como o “método do desafio”, que ser|
empregado para negar a realidade objetiva do conceito de causalidade, tão
defendido pela metafísica clássica. O objetivo de Hume fica claro, ele quer
esclarecer ou eliminar, em um primeiro momento, do conceito causal, todas as
ideias ambíguas obscuras (força, poder, conexão necessidade e substância). O
esclarecimento da ideia de causalidade, por meio do método do desafio, foi sem
dúvida uma atitude radical que tomou Hume. Afirma ele que todo efeito é um
evento distinto da causa, tornando-se impossível localizar em qualquer impressão
a ideia de causalidade.
Ousarei afirmar, como proposição geral, que não admite exceção, que o
conhecimento desta relação não se obtém, em nenhum caso, por
raciocínios a priori, porém nasce inteiramente da experiência quando
vemos que quaisquer objetos particulares estão constantemente
conjuntados entre si. A proposição que estabelece que as causas e os
efeitos não sejam descobertos pela razão, mas pela experiência, será
prontamente admitida em relação àqueles objetos de que nos
recordamos e que certa vez nos foram completamente desconhecidos,
porquanto devemos ter consciência de nossa absoluta incapacidade de
predizer o que surgiria (HUME, 2004, p.50).
Quando vejo, por exemplo, que uma bola de bilhar desliza em linha reta
na direção de outra, mesmo se suponho que o movimento na segunda me
seja acidentalmente sugerido como o resultado de seu contato ou
impulso, não posso conceber que cem diferentes eventos poderiam
igualmente resultar desta causa? Não podem ambas as bolas permanecer
em absoluto repouso? Não pode a primeira bola voltar em linha reta ou
ricochetear na segunda em qualquer linha ou direção? Todas estas
suposições são compatíveis e concebíveis. Por que, então, deveríamos
dar preferência a uma que não é mais compatível ou concebível que o
resto? (HUME, 2004, p. 51)
Portanto, é possível concluir que para Hume há uma certa pré-disposição da mente
para a conjunção constante na experiência, resultado de outras observações,
memorizadas no pensamento.
12 “Os dois níveis explicativos da causalidade são circunscritos e elucidados pelo princípio mais geral da
necessidade. Julgamo-la assim pelo fato de iluminar e fundamentar tanto a causalidade, como todas as
disciplinas compreendidas pela ciência da natureza humana. E deste modo que a causal é retomada e
situada na raiz dos fenômenos humanos, com o fim de descortinar a ideia de necessidade e de justificar a
inferência causal na ciência do homem. É com justeza, portanto, que Hume inseriu, após a explicitação da
ideia de conexão necessária, a seção intitulada “Da liberdade e da necessidade: deu continuidade lógica
aos argumentos baseados no raciocínio causal. Hume inicia pelo estudo da ideia de “necessidade‟, pois
dela irradia, além da causalidade e da ciência moral, o esclarecimento da ideia de liberdade” (HUME,
2004, p.214).
3 PRINCÍPIOS DA NATUREZA HUMANA
“Portanto, é o hábito
o grande guia do conhecimento”.
David Hume.
Este capítulo trata de vários tópicos necessários para o entendimento da
causalidade: sentimento de crença, hábito, razão e imaginação. Iniciamos
descrevendo as funções da memória e da imaginação. Parece que a mente ou o
espírito quando experimenta um novo “sentimento” (feeling) é movido por uma
crença, e assim, cria uma “nova impress~o”, que surge dos princípios da
imaginação. Nesta faculdade deve encontrar-se a explicação para a origem da
“impress~o” que origina a conex~o necess|ria e a respectiva inferência causal:
13 “Hume acrescenta, no “Appendix” do Tratado, um novo elemento para explicar a crença. Salienta que
um “segundo erro pode ser encontrado no primeiro livro, página 96, quando digo que duas ideias de um
mesmo objeto podem ser discriminadas apenas por seus diferentes graus de força e vivacidade. Acredito
que há outra diferença entre as ideias que não podem ser adequadamente compreendidas com aqueles
termos. Se tivesse dito que duas ideias de um mesmo objeto podem diferenciar-se apenas por seus
diferentes feeling [traduzimos por “maneira de sentir”], estaria bem mais próximo da verdade” (p. 636).
Esta nova discussão da natureza da crença ocupa nove das dezessete páginas do “Appendix”, e seu
principal aspecto consiste em mostrar que a crença é um feeling. Convém lembrar que, no corpo do
Tratado, em nenhum momento a crença é designada como feeling” (HUME, 2004, p.65).
cavalo, mas não está em nosso poder acreditar que semelhante animal tenha
alguma vez existido” (HUME, 2004, p.64).
Em geral, a crença tem como objeto um fato que possivelmente não é dado
diretamente na experiência, caso não derive de uma observação direta será
atingida por meio de um raciocínio a partir de outro fato. Hume cita dois tipos de
crença: caso seja perguntado ao crente por que ele acredita no seu Deus, esse deve
ser capaz de fornecer as razões de sua crença. Esta crença somente estará
plenamente justificada se um fato em questão for uma consequência lógica dos
fatos que lhe servem de evidência. Em outro exemplo: “Acredita-se que
dinossauros caminharam sobre a terra”, essa é uma crença acerca de algo a que
não temos acesso direto pela observação ou experiência, entretanto, se justifica
com base na experiência indireta que podemos ter com o passado (em livros de
história ou pela educação). Essa crença, como diz respeito a casos do passado, não
pode ser fundada em raciocínios de causa e efeito, mas apenas por inferências.
Nossa razão deve ser considerada uma espécie de causa, cujo efeito
natural é a verdade; mas esse efeito pode ser frequentemente impedido
pela irrupção de outras causas, e pela inconstância de nossos poderes
mentais. Em toda a probabilidade, após termos descoberto, além da
certeza original dos abjetos, uma nova incerteza, derivada da fraqueza
da faculdade de julgar, nossa razão nos obriga a somar a elas uma nova
dúvida, e assim por diante, ao infinito [...]. Mas a natureza, por uma
necessidade absoluta e incontrolável, determinou-nos a julgar, assim
como a sentir e respirar (HUME, 2001, p. 213).
14 “O costume é, portanto, o fator que faculta o pensamento antecipar que o futuro será semelhante ao
passado e leva a mente a inferir de uma causa presente um efeito ausente. O costume compreende
também mais alguma coisa. As ideias introduzidas por Hume são inferências e não meras sugestões. A
experiência que temos da conjunção constante‟ entre, por exemplo, chama e calor, ou neve e frio,
determina-nos, quando revemos a chama ou a neve, pelo “costume a esperar calor ou frio, e a acreditar
que esta realidade existe realmente e que se manifestaria se estivesse mais próxima de nós”. Revela-se,
assim, como o costume envolve e condiciona a crença” (HUME, 2004, p. 64).
Qual é, portanto, a conclusão sobre a hipótese do hábito? Para Hume deve-se
confessar que seu estudo encontra-se muito distante das teorias filosóficas
correntes. Neste sentido, ele admite que seja uma hipótese. Toda crença, em
matéria de fato e de existência real, procede unicamente de um objeto presente à
memória ou aos sentidos e de uma conjunção costumeira entre esse e algum outro
objeto. Hume sugere para pesquisas mais avançadas sobre o tema, examinar com
maior exatid~o a natureza da “crença” e da “conjunç~o costumeira” durante o
processo do conhecimento. O estudo neste caminho será abstrato e metafísico, mas
“A esta altura, poderíamos perfeitamente terminar nossas pesquisas filosóficas. Na
maioria dos problemas jamais poderíamos adiantar um único passo; e em todas as
questões deveríamos terminar aqui, depois das mais incessantes e curiosas
investigações” (HUME, 2004, p.64).
CONCLUSÃO
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 4. Ed. São Paulo, Martins Fontes, 2000.
DECARTES, Renê. Discurso do Método. São Paulo: Abril Cultural, 1973 (coleção: Os
Pensadores).
HUME, David. Investigação Sobre o Entendimento Humano. São Paulo: Abril
Cultural, 1973 (coleção. Os Pensadores).
________________, Resumo de Um Tratado da Natureza Humana. Tradução: Rachel
Gutiérrez e José Sotero Caio. Porto Alegre: Editora Paraula, 1995.
________, Um Tratado da Natureza Humana. - São Paulo: UNESP, Imprensa Oficial,
2001, tradução de Déborah Danowski.
_________, Um Tratado da Natureza Humana. Fundação Calouste Gulbenkian: Lisboa,
2001. (tradução de Serafim da silva Fontes, p.5, prefácio de João Paulo Monteiro).