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INFLUÊNCIA DA IRREGULARIDADE DAS VIAS NA PERDA DE QUALIDADE

DAS UVAS DE MESA DURANTE O TRANSPORTE

RESUMO
Durante o transporte, as cargas são submetidas a diferentes intensidades de vibrações e esforços, dependendo de
fatores distintos, cujo resultado, no caso das frutas, pode ser a redução de sua vida útil para consumo. Nesse
contexto, este trabalho teve como objetivo avaliar a influência da irregularidade longitudinal das vias na perda de
qualidade das uvas de mesa durante o transporte. Para tanto, duas amostras do tipo Niagara Rosada, previamente
selecionadas, foram transportadas ao longo de 15 km, sendo uma delas submetida ao transporte sobre via
pavimentada e outra condicionada à via não pavimentada. De maneira paralela, a irregularidade longitudinal
(IRI) das vias foi caracterizada a partir do emprego do aplicativo de celular SmartIRI®. Na sequência, ambas as
amostras de uva foram avaliadas, ao longo do tempo, em termos de massa relativa de degrana e perda de massa.
Como resultados, observou-se que o transporte sobre a via pavimentada, em comparação a não pavimentada,
representa redução de aproximadamente 19% na degrana e diminuição de cerca de 26% na perda de massa.
Além disso, destaca-se a possibilidade e facilidade da utilização de aplicativos de smartphone para o
levantamento de dados de irregularidade.

ABSTRACT
During transportation, loads are subjected to different vibrations and effort intensities, depending of distinct
factors, whose results, in the case of fruits, may be the reduction of their useful live for consumption. In this
context, this work aimed to assess the influence of roads longitudinal irregularity on the loss quality of table
grapes during transportation. For this purpose, two samples of the Niagara Rosada type grapes, previously
selected, were transported along 15 km; one of them was transported on a paved road and the other one was
conditioned to an unpaved road. Simultaneously, the longitudinal irregularity (IRI) of the roads was
characterized by the use of SmartIRI® mobile app. In sequence, both grape samples were evaluated, over time,
in terms of relative berry drop and loss mass. As a result, it was observed the transportation on a paved road, if
compared to unpaved, represents a reduction of approximately 19% in degreasing mass and a lowering of
approximately 26% in mass loss. Besides that, it can be highlighted the possibility and the ease of using
smartphone app to collect irregularity data.

1. INTRODUÇÃO
Dado o crescente aumento da população mundial, bem como da fome nas regiões menos
favorecidas e do apelo por uma alimentação de qualidade, é imprescindível que se
compreenda a dinâmica relacionada à produção dos alimentos, buscando-se soluções para
minimizar as perdas identificadas nos setores que os produzem e os comercializam.

Neste contexto, estudos têm demonstrado elevadas perdas no setor da fruticultura,


acreditando-se que grande parte ocorra devido ao transporte das frutas entre o produtor e o
consumidor final. De acordo com Soares (2000), pesquisador da EMBRAPA (Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária), as perdas de frutas no Brasil são da ordem de 30% da
produção, sendo o manuseio e o transporte responsáveis por 50% deste total.

Quanto ao transporte, sabe-se que as vias não pavimentadas correspondem a 78,6% do total
da malha viária nacional (Brasil, 2015), demonstrando-se que grande parte da produção do
País escoa sobre superfícies de elevada irregularidade se comparadas às vias pavimentadas.

A irregularidade gera vibrações e impacto mútuo entre os elementos carregados (as frutas, por
exemplo), cuja influência pode resultar em consideráveis contingentes de danos à produção
transportada, conforme já evidenciado por diferentes autores, em diferentes lugares do
mundo. Como consequência, constata-se, por exemplo, a redução de renda dos produtores e o
aumento dos desperdícios de alimentos.

Na região oeste de Santa Catarina, assim como em outras regiões do País e do mundo, tem-se
o conhecimento de que considerável parcela da produção rural escoa por vias não
pavimentadas, inclusive de frutas, como a uva. Assim, o controle da irregularidade das vias
locais, baseado em alternativas mitigadoras de baixo custo ou até mesmo em sua
pavimentação, poderia refletir na redução das perdas do setor, aumentando-se o
aproveitamento dos alimentos e o lucro dos produtores, com custos-benefícios
compensadores.

Nesse sentido, este trabalho tem como objetivo relacionar as perdas no setor de viticultura,
devidas ao transporte, com as condições de irregularidade das vias. Para tanto, foram
comparados danos identificados em uvas transportadas por uma via pavimentada e por outra
não pavimentada, caracterizando-se sua irregularidade longitudinal. Como diferencial do
trabalho, evidencia-se a realização de medidas associadas de irregularidade (International
Roughness Index – IRI) a partir do emprego de um aplicativo de smartphone, destacando-se
sua facilidade de uso e interpretação dos resultados, bem como o fato de ser economicamente
acessível.

2. REVISÃO DE LITERATURA

2.1. Irregularidade longitudinal das vias


De acordo com o Manual de Gerência de Pavimentos do Departamento Nacional de
Infraestrutura de Transportes – DNIT (Brasil, 2011), a irregularidade longitudinal é definida
como “o somatório dos desvios da superfície de um pavimento em relação a um plano de
referência ideal de projeto geométrico”. O Manual de Restauração de Pavimentos Asfálticos,
também do DNIT (Brasil, 2006), destaca que esses desvios são responsáveis, entre outros
aspectos negativos, por afetar a qualidade de rolamento e a ação dinâmica das cargas atuantes
sobre a via.

Bernucci et al. (2006) comentam que a irregularidade pode ser expressa a partir de um índice
internacional, conhecido como IRI (Índice de Irregularidade Internacional, do inglês
International Roughness Index). Trata-se de um índice estatístico, expresso em unidade de
m/km, cuja medida é empregada, por exemplo, como ferramenta para controle e aceitação de
obras e serviços. Os autores mencionam que a irregularidade pode ser medida por
equipamentos topográficos ou por equipamentos medidores do perfil longitudinal (com ou
sem contato), também podendo ser avaliada de forma indireta, a partir de equipamentos do
tipo “resposta” (os quais possibilitam a obtenção de um somatório de desvios do eixo de um
veículo em relação à sua suspensão).

Nesse contexto, Almeida (2018) ressalta o desenvolvimento de diversos equipamentos para


medição da irregularidade, destacando a importância desse parâmetro, uma vez que valores
elevados de IRI prejudicam a qualidade de rolamento, aumentam os custos operacionais dos
veículos e reduzem a vida útil dos pavimentos. Em sua pesquisa, recentemente, o autor propôs
a criação de uma ferramenta alternativa aos levantamentos tradicionais de irregularidade –
resultando no SmartIRI®, um aplicativo capaz de estimar o Índice Internacional de
Irregularidade das vias por meio de um smartphone embarcado em um veículo. Almeida
(2018) menciona, inclusive, outras possibilidades de aplicativos para a área rodoviária, como
o RoadLab®, desenvolvido pelo Banco Mundial, também capaz de realizar levantamentos de
IRI.

2.2. Influência do transporte na perda de qualidade das frutas

Jarimopas, Singh e Saengnil (2005) estudaram a vibração durante o transporte de tangerinas,


na Tailândia. No trabalho, foram medidos os níveis de vibração em dois tipos diferentes de
caminhões, variando-se a velocidade dos mesmos e as condições das vias onde trafegavam.
Adicionalmente, os autores determinaram os danos causados às frutas em função da sua
posição no carregamento (topo ou fundo do caminhão). Como resultados, mostraram que
diferentes veículos apresentam níveis de vibração distintos e velocidades elevadas produzem
um maior contingente de danos às frutas transportadas. Além disto, comparando-se os níveis
de vibração entre vias não pavimentadas, vias com pavimento flexível e vias com pavimento
rígido, demonstraram uma situação bastante desfavorável do ponto de vista de vibrações
quando do tráfego em vias não pavimentadas. Por fim, de acordo com os resultados
observados, foi verificado, no trabalho dos autores, que as frutas posicionadas nos níveis mais
altos da carga sofrem um maior impacto vibratório devido ao transporte.

Na mesma época, Berardinelli et al. (2005) avaliaram os danos causados em três cultivares de
peras, na Itália. No trabalho, a vibração experimentada em três posições diferentes de um
semirreboque foi simulada em um agitador eletromecânico. De acordo com os resultados
obtidos pelos autores, em média cerca de 30% das peras submetidas à vibração apresentaram
danos. No entanto, ao contrário de Jarimopas, Singh e Saengnil (2005), Berardinelli et al.
(2005) não encontraram diferenças significativas nos danos entre as frutas posicionadas em
alturas de carregamento distintas. Neste caso, as diferenças mostraram-se mais significativas
entre peras de diferentes cultivares.

Singh, Singh e Joneson (2006), por sua vez, estudaram a influência do tipo de suspensão dos
veículos em sua vibração. Para tanto, foi avaliada a vibração de veículos com suspensão a ar e
de feixe de molas, em mais de 16 mil quilômetros de rodovias nos Estados Unidos.
Adicionalmente, os autores propuseram métodos para simular estas condições em laboratório.
Os resultados obtidos por Singh, Singh e Joneson (2006) mostram que os níveis de vibração
dos caminhões com suspensão a ar são significativamente menores do que aqueles dos
caminhões com suspensão de molas.

Na Turquia, Acıcan, Alibaş e Özelkök (2007) conduziram um estudo de laboratório no qual


simularam o transporte de dois cultivares de maçãs e avaliaram sua influência na qualidade
das frutas, a partir de medidas de força de impacto e de vibração. De acordo com os resultados
observados pelos autores, pode-se definir uma correlação linear entre a força de impacto
sofrida pelas maçãs e os danos apresentados pelas mesmas. Avaliando-se o posicionamento
das frutas nas caixas, Acıcan, Alibaş e Özelkök (2007) também constataram diferenças
significativas entre os danos observados nas maçãs posicionadas no topo e na base dos
carregamentos simulados.

Zhou et al. (2007) avaliaram o efeito dos níveis de vibração provenientes do transporte de
peras, na China. Foram avaliadas modificações na coloração, na permeabilidade da membrana
celular da pele das frutas, firmeza da polpa, entre outras atividades celulares, em até 36 dias
após o transporte. Conforme observado na pesquisa dos autores, as peras posicionadas em
pontos mais altos do carregamento estão sujeitas a um maior dano devido à vibração. Esta
vibração, segundo os autores, é responsável por alterações na integridade da membrana
plasmática das células da pele das frutas, bem como de componentes nas paredes celulares das
peras, contribuindo para a mudança de cor e para o amolecimento das mesmas após o
transporte.

No Brasil, Rissi et al. (2008) mediram a vibração de dois diferentes tipos de caminhões (um
deles comumente utilizado para transportes de pequenas e outro de longas distâncias), que
trafegaram em 10 áreas metropolitanas localizadas em regiões distintas, em vias pavimentadas
e não pavimentadas. Como resultados, verificaram que as condições das rodovias, no Brasil,
variam significativamente de acordo com a região em que se localizam. Nesta direção, o
transporte realizado no interior das regiões metropolitanas apresentou menores níveis de
vibração quando comparado ao realizado nas rodovias interestaduais. Além disto, os autores
demonstraram incrementos na vibração dos veículos nas situações em que o carregamento é
mais leve, a velocidade é mais alta e as vias apresentam maior irregularidade.

Kitazawa et al. (2008), no Japão, estudaram a influência da forma de acomodação de pêssegos


no interior das caixas utilizadas durante o transporte dos mesmos. Na pesquisa, para reduzir a
vibração das frutas, os autores propuseram a redução de folgas no fundo das referidas caixas,
reduzindo-se o espaço para a movimentação dos pêssegos, bem como o revestimento das
frutas, uma a uma, com redes adesivas de espuma protetora. Conforme resultados obtidos, a
redução de folgas, em conjunto com o revestimento dos pêssegos com redes adesivas de
espuma protetora, mostrou-se efetiva na minimização dos danos causados às frutas em relação
à esfoliação da casca e à firmeza da polpa. No entanto, a solução proposta não isenta os
pêssegos de danos relacionados à descoloração da superfície.

Na mesma direção, na China, Zhou, Su e Li (2008) avaliaram a aplicação de materiais de


amortecimento para o revestimento de peras durante o transporte, com o objetivo de atenuar a
vibração das frutas e reduzir o contingente de danos. Para tanto, os autores mediram a
vibração durante o transporte e os danos causados em peras não revestidas (de referência), em
contraste com peras envoltas em redes de espuma protetora e em papel de embalagem.
Comparando-se os resultados obtidos na pesquisa, de acordo com Zhou, Su e Li (2008), a
utilização de materiais amortecedores diminui os danos causados às frutas, sendo as redes de
espuma protetora mais apropriadas para esta finalidade.

Posteriormente, na Turquia, Çamak et al. (2010) estudaram a utilização de caixas de


diferentes materiais para o transporte de figos frescos. Para o estudo, foram medidas,
inicialmente, as vibrações provocadas em um caminhão que trafegou nas rodovias do país
com carregamentos da fruta. Posteriormente, estas vibrações foram reproduzidas em
laboratório, avaliando-se os danos nas frutas conforme o tipo de caixa utilizado nas
simulações. Os resultados apresentados pelos autores demonstraram que caixas de papelão
são inapropriadas para o transporte de figos. De acordo com Çamak et al. (2010), o dano
causado às frutas transportadas nestas caixas é 2,5 vezes maior do que o dano causado às
frutas transportadas em caixas de poliestireno expandido.

Mais tarde, na Nigéria, Idah et al. (2012) avaliaram a aplicação de diferentes cestos para o
transporte de tomates. A pesquisa foi desenvolvida em laboratório, simulando-se as vibrações
verificadas em campo, e acomodando-se os tomates em cestos de palha (comumente
utilizados no país) e em cestos plásticos (comumente não utilizados). Como resultado
principal, os autores verificaram que os cestos plásticos apresentam um melhor desempenho
tratando-se da redução de danos resultantes da vibração dos frutos devido ao transporte.

No Irã, Soleimani e Ahmadi (2014), ainda tomando como principal referência o trabalho de
Jarimopas, Singh e Saengnil (2005), avaliaram a vibração durante o transporte de maçãs em
função da posição das frutas no carregamento (altura da caixa na carga, proximidade com o
eixo dianteiro ou traseiro), bem como da posição das mesmas no interior das caixas
individuais (topo / fundo). No estudo, foram utilizados veículos de diferentes suspensões (a ar
e de feixe de molas). De acordo com os resultados obtidos pelos autores, a vibração das frutas
é dependente tanto da sua posição no carregamento (topo / meio / fundo, eixo dianteiro /
transeiro), bem como da posição no interior das caixas individuais (topo / fundo).

Mais recentemente, na Itália, La Scalia et al. (2015) estudaram o efeito do transporte na


qualidade de morangos. Este estudo foi conduzido a partir da simulação do transporte em
laboratório, avaliando-se a qualidade e as propriedades microbiológicas das frutas com e sem
condicionamento vibratório. Os resultados obtidos mostraram que, do ponto de vista físico-
químico, ambos os cultivares de morangos apresentaram alterações na aparência e nas
características estruturais, o que é aumentado com o tempo em que as frutas permanecem
submetidas à vibração. Estes resultados corroboram com aqueles oriundos das análises
microbiológicas, de modo que uma maior exposição à vibração aumenta as alterações
microbiológicas identificadas nos morangos, reduzindo-se sua qualidade e vida útil residual.

3. MATERIAIS E MÉTODO DA PESQUISA


O procedimento experimental foi desenvolvido durante o mês de Janeiro de 2020,
obedecendo-se às etapas apresentadas na Figura 1.

Amostra 1:
Transporte por via
pavimentada

Levantamento de Avaliação das


Coleta das
Triagem prévia irregularidade das amostras pós-
amostras
vias (IRI) transporte (danos)

Amostra 2:
Transporte por via
não pavimentada
Figura 1: Método da pesquisa

Para dar início à pesquisa, foi cuidadosamente colhida uma amostra de cerca de 4000 g de uva
de mesa do tipo Niagara Rosada. A colheita ocorreu em uma propriedade rural familiar,
localizada no município de Caibi, na região oeste do estado de Santa Catarina.

Com cautela, transportou-se a amostra de uva recém-colhida até o local definido para a
triagem prévia e caracterização das frutas, nas proximidades do local de colheita. Nesta etapa,
os cachos de uva foram visualmente inspecionados, removendo-se quaisquer grãos com
características distintas dos demais (por exemplo, iminência de degrana, envelhecimento
precoce ou coloração discrepante). Em seguida, foram separadas duas amostras, identificadas
como Amostra 1 e Amostra 2, com massas de aproximadamente 1800 g cada, mantendo-se o
padrão de similaridade visual entre elas.

No mesmo dia, as duas amostras foram transportadas ao longo de uma distância igual a 15
km, sendo o transporte da Amostra 1 realizado sobre via pavimentada e o transporte da
Amostra 2 sobre via não pavimentada. Em ambas as situações, as frutas foram transportadas
na caçamba de um veículo do tipo pick up leve, tendo sido previamente acomodadas no
interior de uma caixa de papelão de dimensões iguais a 25 x 33 x 12 cm. Esse procedimento
foi idealizado buscando-se caracterizar o transporte feito por consumidores familiares e
pequenos produtores locais.

Paralelamente, foi conduzida a caracterização das condições superficiais das vias, a partir de
medidas de irregularidade longitudinal, em termos de IRI (International Roughness Index).
Para tanto, empregou-se o aplicativo de smartphones SmartIRI®, que é brasileiro e foi
desenvolvido no trabalho de Almeida (2018). Nesta etapa, os dados foram coletados com o
aplicativo instalado em um celular modelo Samsung Galaxy A5 2017, embarcado em um
veículo de passeio e fixado no para-brisa com um suporte do tipo Samsung Vehicle Dock, este
último também empregado por Almeida (2018). Na pesquisa do autor, os melhores resultados
foram obtidos para velocidades de percurso entre 60 e 80 km/h, motivo pelo qual este
intervalo foi admitido como referência para o presente estudo. A partir desta consideração, o
levantamento de irregularidades sobre a via pavimentada foi realizado a velocidade média de
aproximadamente 60 km/h, ao passo que a velocidade média para as medições pela via não
pavimentada foi de 50 km/h. Devido a restrições físicas e questões de segurança,
principalmente no caso da via não pavimentada, não foi possível elevar as velocidades de
percurso a um patamar superior.

Após o transporte das frutas, visando mensurar a influência da irregularidade das vias na
qualidade das uvas, de forma quantitativa, ambas as amostras foram avaliadas segundo os dois
critérios seguintes: (a) massa relativa de degrana (Equação 1); e (b) perda de massa (Equação
2). A avaliação da massa relativa de degrana foi realizada em três fases, em função do tempo
decorrido após o transporte: imediatamente depois, após 48 h e após 96 h. Em 48 h e 96 h
depois do transporte, também foram feitas avaliações de perda de massa. Nos períodos
compreendidos entre as avaliações, as duas amostras permaneceram em repouso, à
temperatura ambiente média de 29°C, sobre superfície horizontal plana.

massa degrana (1)


massa relativa degrana (%) = ×100
massa total da amostra

massa da amostra na fase de avaliação (pós-transporte) (2)


perda de massa (%) = ×100
massa inicial da amostra
4. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.1. Caracterização da irregularidade longitudinal das vias


As Figuras 2 e 3 apresentam, respectivamente, a evolução da irregularidade longitudinal ao
longo dos trechos avaliados e os valores médios de IRI correspondentes. Cabe comentar que o
transporte sobre a via não pavimentada, devido à largura reduzida da pista, foi realizado a
partir do posicionamento do veículo no centro da via (segundo o seu eixo), motivo pelo qual
consta nos resultados um único levantamento (mas que, considerando-se ida e volta, também
resultou em 15 km de distância total percorrida).
20

15
IRI (m/km)

10

0
0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 7000
Distância a partir do ponto de partida (m)

Pavimentada (Faixa direita) Pavimentada (Faixa esquerda)


Não pavimentada

Figura 2: Levantamento da irregularidade longitudinal (IRI)

14,00

12,00

10,00
IRI (m/km)

8,00

6,00
11,31

4,00

2,00
2,44 2,40
0,00
Pavimentada (Faixa direita)
Pavimentada (Faixa esquerda)
Não pavimentada

Figura 3: Valores médios de irregularidade longitudinal (IRI)


Conforme é possível observar e, de acordo com o esperado, os resultados levantados pelo
aplicativo SmartIRI® indicam a maior irregularidade superficial da via não pavimentada. Em
termos médios, a título de balizamento, verifica-se que o IRI de 11,31 m/km encontra-se em
concordância com a escala de irregularidade longitudinal apresentada por Sayers e Karamihas
(1998), uma vez que os autores referem-se a resultados iguais ou superiores a 8 m/km para
rodovias não pavimentadas sem manutenção. No caso de estradas não pavimentadas com
manutenção, é indicado o intervalo de IRI entre 3,5 m/km e 10 m/km.

De maneira análoga, considerando-se os intervalos apresentados por Sayers e Karamihas


(1998) para rodovias pavimentadas, também se constatou conformidade entre a escala de
referência e os resultados obtidos nesta pesquisa. Nessa direção, os autores apresentam
intervalos de 1,5 m/km a 3,5 m/km para pavimentos novos, de 2,5 m/km a 6,0 m/km para
pavimentos antigos e entre 4,0 m/km e 11,0 m/km para pavimentos deteriorados.

Sobre a evolução da irregularidade longitudinal da via não pavimentada (Figura 3), de modo
geral, pode-se notar o melhor comportamento da superfície na primeira metade do trajeto
(menores valores de IRI). Em campo, para os primeiros 2,5 km do trecho, foi possível
identificar, de forma comparativa, condições de trafegabilidade melhores em alguns
segmentos, com manutenções aparentemente recentes, o que indica a coerência dos resultados
obtidos.

4.2. Resultados de massa relativa de degrana e perda de massa das amostras


Nas Figuras 4 e 5 são apresentados os resultados das avaliações de massa relativa de degrana
e de perda de massa das amostras, considerando-se o tempo decorrido a partir das diferentes
condições de transporte. Inicialmente, conforme é possível observar nas Figuras 4 e 5,
destaca-se que, para ambos os critérios de avaliação adotados nesta pesquisa, as perdas foram
maiores no caso da amostra de uva transportada pela via não pavimentada.

25,00 8,00
Massa relativa degrana (%)

7,00
Perda de massa (%)

20,00
6,00

15,00 5,00
4,00
10,00 3,00
2,00
5,00
1,00
0,00 0,00
0 48 96 0 48 96
Tempo decorrido após o transporte (h) Tempo decorrido após o transporte (h)

Pavimentada Não pavimentada Pavimentada Não pavimentada

Figura 4: Avaliação da massa relativa de Figura 5: Avaliação da perda de massa


degrana

A partir da observação da Figura 4, nota-se que, imediatamente após a realização das


operações de transporte, a massa relativa de degrana medida já era maior para o caso da
amostra transportada sobre a via não pavimentada. Essa constatação indica, conforme
esperado, o desprendimento imediato de grãos mais acentuado decorrente da submissão da
amostra a condições de maiores irregularidades (maior vibração das uvas). Passadas 48 h e 96
h do transporte, a tendência de maior índice de degrana para a amostra transportada pela via
não pavimentada foi mantida, inclusive com valores crescentes, demonstrando-se os efeitos
nocivos da maior vibração também ao longo do tempo. Na prática, quando expostas nas
gôndolas dos supermercados, por exemplo, depois de 4 dias do transporte, as uvas
transportadas pelas vias não pavimentadas apresentariam degrana relativa de 23,3%, ao passo
que, para as uvas transportadas pelas vias pavimentadas, o índice seria de 18,9% (redução de
aproximadamente 19% no desprendimento de grãos). Essa característica está diretamente
relacionada à aceitação das uvas pelo mercado consumidor e, além disso, o desprendimento
dos grãos, com ruptura superficial, acaba acelerando o apodrecimento das frutas.

Em relação à evolução da perda de massa das amostras ao longo do tempo, cujos resultados
são apresentados na Figura 5, também pode-se destacar o melhor comportamento da amostra
de uva transportada pela via pavimentada. Depois de 96 h das operações de transporte, a
amostra submetida às condições da via pavimentada apresentou perda de massa de 5,6%,
enquanto a amostra submetida ao transporte pela via não pavimentada apresentou perda de
7,6%. Deste modo, de acordo com os resultados obtidos, mesmo considerando-se o consumo
dos grãos desprendidos dos cachos, em ambas as situações, o transporte pela via pavimentada
poderia ser capaz de reduzir cerca de 26% da perda de massa das amostras depois de 4 dias.

5. CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS


Conforme proposto, este trabalho possibilitou relacionar a perda de qualidade de amostras de
uva submetidas ao transporte com as condições de irregularidade longitudinal das vias (IRI).
Para tanto, comparou-se a massa relativa de degrana e a perda de massa, ao longo do tempo,
das uvas transportadas por via pavimentada e não pavimentada.

Como principal resultado, observou-se a influência negativa da elevada irregularidade da via


não pavimentada na perda de qualidade das uvas transportadas sobre ela. Nesse sentido, a
amostra submetida ao transporte pela via pavimentada apresentou menor índice de degrana e
menor perda de massa. Em termos práticos, de acordo com os resultados obtidos, estima-se
que o transporte sobre via de reduzida irregularidade, em comparação ao transporte sobre via
de elevado IRI, poderia reduzir cerca de 1/5 e 1/4 das perdas, respectivamente, em termos de
massa relativa de degrana e perda de massa, considerando-se a passagem de 4 dias após o
transporte.

Assim, com base nos resultados da pesquisa, pode-se destacar a importância da adoção de
políticas de gestão para o controle da irregularidade superficial das vias empregadas para o
transporte de alimentos, uma vez que elevações nos valores de IRI podem impactar
negativamente na vida útil ao consumo da carga transportada. Essa constatação possui apelos
de ordem econômica e de responsabilidade social, pensando-se na sustentabilidade do
processo de produção e transporte de alimentos.

De maneira adicional, o trabalho também possibilitou evidenciar, na prática, a facilidade do


emprego de aplicativos de smartphone para o levantamento de dados de irregularidade
longitudinal, demonstrando-se a agilidade e simplicidade na aquisição de dados, podendo ser,
inclusive, uma opção economicamente viável para controle de irregularidade por órgãos
públicos.

Agradecimentos

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