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FICHAMENTO AVATAR

Ficha catalográfica

FELINTO, Erick; BENTES, Ivana. Avatar: o futuro do cinema e a ecologia das imagens digitais.
Porto Alegre : Sulina, 2010. 119p.

p. 7 – Era como se a ficção tivesse transbordando das telas de cinema para invadir o cotidiano
que, por sua vez, já não parece há muito tempo existir em outra forma que a midiatizada.

p. 8 – Se o mundo parece perder a substância face a seus processos de midiatização, talvez isso
se deva precisamente a uma situação cultural em que a mídia atingiu o ápice de seu poder. Ela
chegou ao ponto de poder prescindir inteiramente do suporte da realidade e, desse modo,
caracterizar-se como eminentemente tautológica. Hoje, o grande tema de discussão das
mídias são elas próprias. A internet fala da internet, a televisão fala da televisão, o cinema fala
do cinema.

p. 17 – O elemento narrativo que melhor demonstra essas interligações é o fato de o


protagonista depender da tecnologia humana – uma tecnologia que efetivamente parece
mágica – para integra-se ao mundo dos Na’vi.

p. 17 – Esse “upload” da consciência para novos corpos, grande sonho dos pós-humanistas
como Hans Moravec (cientista que estuda sistemas de inteligência artificial. Em seu livro Mind
Children (1990), propõe que num futuro não muito distante será possível “transplantar
(upload) um cérebro humano para uma máquina. PS.: O que de fato já existe! Como mostra
um episódio da série Deus – canal History – apresentado por Morgan Freeman, que uma
mulher milionária criou um robô dela própria com as informações de sua vida.

p. 18 – [...] a ignorância é uma qualidade desejável em Pandora. Pelo menos em relação a


qualquer saber que tenha a ver com o “homem branco”.

p. 18-19 – Historicamente, o intelectual foi quase sempre visto com desconfiança (e com
certeza, não apenas nos Estados Unidos). Sua educação é encarada como uma forma de poder
ou privilégio; suas posições são consideradas pouco práticas, pretenciosas e socialmente
subversivas.

p. 19 – [...] o conceito de cult expressa uma categoria polêmica e incrivelmente difícil de


definir. Ela pode abarcar tanto obras características do registro cultural ligado à “alta cultura”
(o cinema autoral, os filmes de “arte”) quanto produtos identificados frequentemente como
descartáveis e de mau gosto. O que tal categoria tem de interessante é precisamente esse
poder de reunir polos aparentemente opostos dos regimes de valor cultural. Mas também a
entonação religiosa que está implicada num dos primeiros sentidos do termo: os filmes “ cult”
produzem o efeito de um culto (e foi assim com Matrix, por exemplo). Eles se transformam
numa espécie de religião que exige seguidores fiéis e atentos a cada detalhe ou possível
mensagem secreta da obra.

p. 21 – Em Avatar, o clima neo-hippie, ecologicamente correto e tecnopagão sugere antes um


novo modelo de capitalismo, curiosamente colorido por uma espécie de espititualidade
“oriental”, como tem denunciado repetidamente Slavoj Zizek. Nesse singular casamento entre
capitalismo e Budismo, o sujeito é convocado a não se rebelar contra o status quo presente,
mas antes adotar uma atitude de desprendimento e ataraxia. Como se toda a turbulência e
confusão à sua volta não passassem de um pesadelo indesejável – algo que não deveria afetar
o centro mais profundo de seu ser – , o indivíduo é motivado a assumir postura contemplativa.

p.23 – [...] a forma de superar a depressão “pós-Avatar” consiste precisamente em continuar a


consumir o filme e seus subprodutos! Em outras palavras, trata-se de seguir alimentando o
capital e os fluxos se sentido do complexo midiotecnocrático.

p. 24 – Um dos aspectos mais interessantes da obra é o modo como consegue supostamente


veicular uma mensagem de tolerância com a diferença, reprovação da ganância capitalista e
cuidado ecológico com a natureza, ao mesmo tempo em que varre para baixo do tapete todos
os outros sentidos contraditórios e secundários que poderiam minar essa leitura de superfície.

p. 27 – No âmbito do ciberespaço, do tecnopaganismo e do universo das tecnologias digitais,


ressurge o antigo desejo do retorno à mãe primordial [...] – mas numa versão contaminada
precisamente de vetores tecnológicos. Essas peculiares conexões entre tecnologia, natureza e
espiritualidade são tema do interessantíssimo livro de R. L. Rutsky, High Techné (1999). A tese
central de Rutsky é que a modernidade sonhou com a possibilidade de reunir dois mundos em
princípio mutuamente excludentes (e que ela mesma ajudou a separar): a racionalidade
fragmentária e controladora da tecnologia e o poder mágico e totalizador da natureza.
Enquanto a ciência e a tecnologia se afirmaram como forças de análise, separação e controle –
sempre em busca da instrumentalização da natureza – , o poder mágico da arte seria trazer de
volta a unidade perdida, uma reconciliação com a natureza, uma retomada, pelo sujeito, de
sua morada originária.

p. 28 – nota de rodapé nº 17 – Ninguém parece ter percebido essa dimensão feminina em


Matrix, mas qual é a origem desse termo senão o latim “mãe” e “útero”: mater + ix? A Matrix
é uma mãe monstruosa que mantém seus filhos aprisionados em tanques amnióticos a partir
do quais lhes suga toda energia.

p. 29 – Não é à toa que nossas tecnologias digitais são essencialmente tecnologias simulacrais
(como vemos nas imagens de Avatar) – e desse modo colaborem para a construção de uma
pós-modernidade que é, mais que tudo, um mundo de telas, imagens e de um desejo de
memória total em meio à perda progressiva da memória.

p. 48 – Há muito o que dizer sobre um filme como fenômeno cultural ou comunicacional. [...]
Hoje é possível despir a expressão “cinema de entretenimento” da carga de conotações
negativas com que a crítica cultural a carregou ao longo de muitos anos.

LEMBREI AGORA DE MEIA NOITE EM PARIS, QUE O PROTAGONISTA VIVIA ESTE DILEMA POR
SER ROTEIRISTA DE COMÉDIAS TIPO B E QUERER ESCREVER ALGO MAISP ROFUNDO, COMO
UM ROMANCE, OU ALGO ASSIM...

p. 48 – Não apenas a diversão tornou-se um tema muito sério, mas as distinções tradicionais
entre universos de referência como “alta cultura” e “cultura de massa” encontram dificuldade
crescente para sustenta-se.

p. 49 – [...] o cinema é a mais tecnológica das artes. [...] E numa época em que já não parcem
existir mistérios no mundo, a sensação da maravilha não é algo desprezível. [...] O cinema tem,
portanto, uma relação congênita com o espanto. [...] A monstruosidade era uma das formas de
assinalar o espanto, o maravilhoso. Se a ciência parece ter desencantado o mundo, é preciso
criar novos mundos. Em Pandora, Jake reencontra a possibilidade de maravilhar-se. Como
acontece com as crianças, naquele mundo tudo é estranho, tudo é novo, e mesmo,
ocasionalmente, monstruoso.

p. 50 – Sim, agora é possível ser profundo e “pop” ao mesmo tempo.

p. 52 – Talvez o papel do pensamento acadêmico nestes tempos seja precisamente esse:


fomentar a diferença, ainda que em escala microscópica, alimentar pela mídia uma paixão
crítica, operar no interior dos sistemas sociais, mas em constante tensionamento com eles.

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