Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 13

DO CASAMENTO

APÓS O DIVÓRCIO
EM CASO DE
ADULTÉRIO

Por John Owen


Traduzido e editado por Renan Abreu
Original: “The Works of John Owen”, Volume 16; 254-257p;
Reimpressão de 2009; Ed. Banner Of Truth
Introdução
Durante o século 17, o parlamento inglês aprovou
três meios para o pedido de divórcio: (1) no caso em
que se provava a invalidade do casamento por
motivo de idade, pois só eram válidos casamentos
em que o homem possuía no mínimo 14 anos,
enquanto a mulher 12 anos. Ou ainda, nos casos de
impotência do homem ou frigidez da mulher. (2)
Havia também a possibilidade de separação “a
mensa at thoro” ou “mesa e cama”. Contudo, as
partes não poderiam se casar novamente e os
direitos de posse ou herança dos filhos
permaneceriam os mesmos. Esse divórcio era
defendido pelos romanistas uma vez que o laço
matrimonial não era rompido. (3) Ou ainda, através
do processo “divortuim a vinculo matrimonii”. Esse
processo era extremamente caro e a decisão final
tomada exclusivamente pelo parlamento inglês. É
diante deste cenário que John Owen escreve o
tratado “Casamento após o divórcio”, impresso
primeiramente no volume “Sermons and Tracts” de
1721.
Renan Abreu.
DO CASAMENTO APÓS O
DIVÓRCIO EM CASO DE
ADULTÉRIO
Todos sabem que o adultério é uma causa justa e
suficiente para o divórcio entre pessoas casadas.
O divórcio, dizem alguns, consiste na dissolução do
“vinculi matrimonialis”[vínculo matrimonial]; e,
assim, é removida a relação matrimonial de modo
que a pessoa inocente, divorciando ou requisitando
o divórcio, obtém liberdade para um novo
casamento.
Outros dizem ser apenas uma separação “a mensa at
thoro”, e que, neste caso, não há e nem deve existir
o rompimento da relação matrimonial.
I - Sou do julgamento que neste último caso:
Primeiro; o divórcio mero “a mensa et thoro” não é
um verdadeiro divórcio, mas imaginação de um
divórcio, sem utilidade, nem proveito legal, seja para
a lei da natureza ou a lei de Deus. Porque:
1— Trata-se, como foi dito, de mera invenção
tardia, que não existiu no mundo nem nos
tempos mais antigos: os da igreja de Roma que
creem nisso afirmam ique os divórcios, pela lei
da natureza, são “a vinculo” [sem vínculo] e
que, portanto, também existiam no Antigo
Testamento. Assim, esta invenção é imposta
sobre a graça e estado do evangelho que, de
fato, não influencia as relações e deveres morais
deles, mas apenas lhes dirige os fingimentos. .
2— Isso se deduz de uma ficção, a saber, que o
casamento entre cristãos é um sacramento, e,
por causa disso, é indissolúvel. Por conseguinte,
o casamento só teria lugar entre os crentes (o
resto da humanidade seria privado de seu direito
e privilégio natural). Entretanto, isto é uma
ficção, e, como tal, em muitos casos a igreja de
Roma faz uso dela.
Segundo; um divórcio perpétuo “a mensa at thoro”
não é de modo algum útil à humanidade, mas
apenas nocivo e doloroso. Porque:
1— Constitui uma nova condição ou estado de
vida em que não é possível ao homem ter uma
esposa, ou, ter uma esposa legalmente –
condição esta que é necessária a todo homem,
apto ao casamento, queira ele ou não. Porque
um homem pode ser, de modo ocasional,
compelido em consciência a não receber outra
vez a mulher que foi legitimamente repudiada
por adultério, nem poderá ele tomar outra
esposa por causa deste divórcio. Deus não
chamou nenhum homem para este estado.
2— Isso pode lançar o homem à necessidade de
pecar, e provavelmente assim será (pois
suponho que ele não possui o dom da
abstinência, e é a vontade expressa de Deus,
que ele se case). Ainda sobre essa suposição, ele
peca se mantiver abstinência, e peca se casar.
Terceiro; isto é ilegal porque se o vínculo de marido
permanece, logo, a relação continua. Esta relação é
o fundamento de todos os deveres mútuos, e,
enquanto tudo continua, ninguém pode dispensar ou
proibir a realização destes deveres matrimoniais. Se
uma mulher ainda possui relação de esposa para
com o homem, ela pode reivindicar os deveres de
marido para com ela. Separação pode ser por
comum acordo, por um tempo determinado, ou por
outras ocasiões que podem dificultar a realização
dos deveres conjugais, todavia, fazer de deveres
nulos uma obrigação contínua é um ato contra a lei
de Deus. Este divórcio, portanto, supondo qualquer
relação entre homem e mulher, sem deveres mútuos,
é ilegal.
Quarto; a luz da natureza nunca indica este tipo de
divórcio. O casamento é uma ordenança da lei da
natureza, mas, à luz e razão dessa lei, não existe
nenhuma sugestão para tal prática. Ela aponta a
possibilidade de novo casamento para aqueles que,
de modo justo, deixaram suas esposas.
Consequentemente, alguns, como os antigos gregos
e romanos, permitiram aos maridos matar a esposa
adúltera. Entre os romanos foi alterada a “lege
Julia”[documento jurídico acerca do divórcio],
embora, a ofensa continuasse pena capital. Neste
documento, posteriormente, o divórcio teve
propósito de dar a pessoa inocente liberdade para
novo casamento. Portanto, este tipo de divórcio é
apenas uma ficção.
II - A primeira opinião, portanto, está de acordo
com a verdade. Porque:
Primeiro; ao dissolver os laços do casamento, a o
casamento em si é dissolvido bem como e todos seus
deveres (retira-se a forma e o objetivo de qualquer
relação moral, e toda relação, em si mesma, cessa).
Mas isto é feito no caso de adultério e quando se
seguir um divórcio. O casamento consiste em que
dois se tornam “uma só carne”, Gn 2.24; Mt 19.6.
Mas tal união é dissolvida em caso de adultério
porque a adúltera se torna uma só carne com o
adúltero, 1Co 6.16, e nenhuma comunhão em carne
com seu marido resta, logo, está absolutamente
quebrado o vínculo ou o pacto de casamento. E
como podem os homens contestar que o vínculo
está completamente quebrado, ou fantasiar um
“vinculum” que não pode vincular? E nisto está
absolutamente destruído todas as formas de
casamento que serão concedidas. Portanto, está, em
si mesmo, dissolvido o vínculo de casamento.
Segundo; se a parte inocente do divórcio não recebe
a liberdade, então:
1— Ele está privado de seus direitos por causa
dos pecados de outro; e isto é contra a lei da
natureza. E assim, cada mulher ímpia possui o
poder para privar seu marido o direito natural.
2— Todos creem que o divórcio no caso de
adultério é apontado por nosso Salvador para
que a pessoa inocente faça uso do mesmo para
sua própria liberdade, vantagem e alívio; nisso
todos creem. Mas se a parte inocente não pode
se casar (outra vez) isso lhe seria uma armadilha
e julgo, pois, se não recebeu o dom da
abstinência, estará exposto ao pecado e
julgamento.
Terceiro; nosso bendito Senhor dá direções
expressas no caso, Mt 19.9, “Eu, porém, vos digo:
quem repudiar sua mulher, não sendo por causa de
relações sexuais ilícitas, e casar com outra comete
adultério”. Por isso, é evidente (e este é o sentido
claro do texto) que aquele que repudiou sua esposa
por fornicação e se casa com outra não comete
adultério. Portanto, o vínculo do casamento, neste
caso, é dissolvido e a pessoa que repudiou sua
esposa está em liberdade para se casar. Enquanto Ele
nega o repúdio e o recasamento por qualquer
motivo, a exceção do adultério permite ambos
repudiar e se casar de novo. Porque uma exceção
afirma sempre o contrário daquilo que é negado na
regra, ou nega o que é afirmado na regra da
exceção. Toda exceção é uma proposição particular
contraditória à regra geral, logo, quando uma é
afirmativa a outra é negativa, e vice versa. A regra
aqui é afirmativa (aquele que repudia sua mulher e
se casa novamente comete adultério). A exceção é
negativa (aquele que repudia sua mulher por
fornicação e se casa novamente não comete
adultério). Ou pode ser concebido de outra forma, a
saber, que a regra geral deve ser negativa e a
exceção positiva: não é lícito repudiar sua esposa e
se casar com outra; isso é adultério. Então a exceção
é: é lícito ao homem repudiar sua mulher por causa
de fornicação, e, assim, se casar com outra. Esta é a
natureza de todas as exceções que eu poderia
demonstrar em todos os casos.
Não há propósito para o fato de que outros
evangelistas (Mc 10.11,12, Lc 16.18) não
expressem isso, porque:
1— Mateus utiliza por duas vezes, no capítulo
5.32 e no capítulo 19.9, e, portanto, foi
seguramente utilizada por nosso Senhor.
2- É uma regra assegurada por todos, que a
mesma coisa relatada por vários evangelistas de
modo breve, menor, com expressões mais
curtas é avaliada e interpretada por outras
completas e maiores. E, toda regra geral, em
qualquer lugar, é limitada por uma exceção
anexada a ela em qualquer lugar que esteja,
pois, existe insuficiência em qualquer regra
geral a menos que admitido uma exceção.
É muito vão responder que nosso Salvador falava
apenas aos judeus o que lhes era ou não permitido ;
pois:
1— Em sua resposta ele reduz as coisas à lei da
criação e de sua promulgação no princípio. Ele
declara que, foi a lei do casamento e a natureza
dessa relação, antecedente à lei e a promulgação
de Moisés. Então, reduziu as coisas à lei da
natureza, dando uma regra para toda
humanidade neste assunto.
2— Os fariseus questionaram nosso Senhor
sobre o divórcio de modo absoluto, dando
liberdade de casamento após o fato, isso porque
nunca ouviram falar de outra coisa diferente. A
pretensa separação “a mensa et thoro” nunca foi
sequer ouvida no antigo testamento. Se nosso
salvador não deu uma resposta com relação ao
mesmo divórcio do questionamento, mas de
outro que eles não conheciam, Cristo não os
respondeu, mas lhes iludiu (eles perguntaram
uma coisa e ele respondeu outra sem propósito
algum). Essa ilusão não pode ser admitida, seria
uma grande blasfêmia imaginar isso. Portanto,
ao negar as causas que eles defendiam para o
divórcio e afirmar que apenas a fornicação era
causa justa, ele permitiu, neste caso, o divórcio
de que tratavam os fariseus – este que era
absoluto e de vínculo matrimonial.
Outra vez; o apóstolo Paulo define de maneira
expressa a liberdade para o casamento de quem está
maliciosa e obstinadamente abandonado, afirmando
que a religião Cristã não prejudica o direito natural e
o privilégio dos homens neste caso. 1Co 7.15 ”Mas,
se o descrente quiser apartar-se, que se aparte; em
tais casos, não fica sujeito à servidão nem o irmão,
nem a irmã”. Se uma pessoa obstinadamente
abandona o casamento, sob a pretensão de religião,
ou qualquer outra coisa, e não mais coabita com seu
marido ou esposa, é sabido que, pela lei da natureza
e uso de todas as nações, a parte abandonada, sem
seu ou sua companheira e tendo os objetivos do
casamento frustrados, está em liberdade para se
casar novamente. Isso não é assim apenas entre os
cristãos. O que deve fazer um irmão ou irmã no
caso em que está abandonado? Diz o apóstolo:
“Vocês não são mais escravos, são livres” – para o
novo casamento.
Esta é a doutrina constante de todas as igrejas
protestantes no mundo, e ela tem lugar no governo
das nações, para a rainha Elizabeth nascida durante
a vida da rainha Katharine, de quem seu pai foi
divorciado.

Você também pode gostar