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1 JOÃO
Autoria
Entre a maioria dos eruditos atuais, não há dúvida de que o apóstolo João, conhecido como o
discípulo amado (Jo 13.23), e filho de Zebedeu (Mc 1.19,20), é o autor de 1 João, assim como das
demais cartas que trazem seu nome, do quarto evangelho e do livro do Apocalipse. Esses mesmos
historiadores e biblistas também afirmam que João, filho de Salomé (irmã de Maria), era primo de
Jesus (Mt 27.56; Mc 14.40; 16.1; Jo 19.25).
Algumas dificuldades quanto à autoria desta epístola foram levantadas durante a história da Igreja.
Em primeiro lugar, alguns críticos observaram o fato de a própria carta não apresentar seu autor
como a maioria das epístolas do Novo Testamento. Além disso, levantaram a questão das limitações
acadêmicas do apóstolo João, um modesto filho de pescador (assim como o apóstolo Pedro) que
não teve acesso aos estudos rabínicos formais e clássicos da época (At 4.13). E questionaram o fato
de um apóstolo se auto-intitular “presbítero”.
Contudo, as respostas a estas questões começam bem cedo, na própria igreja primitiva e por
meio dos pais da Igreja, que confirmaram a autoria da obra canônica do apóstolo João. O primeiro a
reconhecer e autorizar a autoria e a canonicidade desta carta e da obra de João foi Irineu, por volta
do ano 140 d.C., seguido por Clemente de Alexandria (150-215 d.C.), Tertuliano (155-222 d.C.) e
Orígenes (185-253 d.C.). O estilo do Evangelho segundo João é absolutamente semelhante ao de
1 João (veja algumas comparações: 1Jo 1.1 com João 1.1,14; 1Jo 2.7 com João 13.34,35; 1Jo 3.14
com João 5.24; 1Jo 5.9 com João 5.32,37, entre outras). As duas obras foram redigidas em grego
koiné (popular) de uma forma bem simples. Além disso, “iletrado” não significa “analfabeto”, e a
família de João era proprietária de uma empresa de pesca, e não apenas de um ou dois barquinhos
(Mt 4.21), o que certamente pode ter propiciado ao apóstolo bons professores durante seu longo
tempo de vida e ministério. Quanto ao fato de usar de modéstia ao referir-se a seu título eclesiástico,
devemos lembrar que o próprio apóstolo Pedro agiu da mesma maneira (1Pe 5.1), provavelmente
numa atitude deliberada de lançar o foco da sua atuação ministerial sobre a “supervisão espiritual de
seus filhos e netos na fé cristã” (uma tradução ampliada da expressão grega presbyteros – ancião).
Talvez um bom exemplo a ser seguido pelos líderes da Igreja em nossos dias (1Jo 2.1,28; 3.7).
Propósitos
O conteúdo desta carta demonstra o grande amor e carinho espiritual que o apóstolo João tinha
por seus “filhinhos na fé”, bem como sua preocupação com a correta evangelização do mundo. O
estilo joanino é inconfundível em sua obra, posto que ele emprega “ilustrações contrastantes” em
profusão: luz e trevas (1.6-7; 2.8-11); amor ao mundo e amor a Deus (2.15-17); filhos de Deus e filhos
do Diabo (3.4-10); o Espírito de Deus e o espírito do anticristo (4.1-3); amor e ódio (4.7-12, 16-21).
O gnosticismo, que na época de Pedro já provocava algumas baixas espirituais expressivas na
Igreja, ainda que em sua forma embrionária e primitiva, agora chama também a atenção de João
e o leva a escrever combativamente, buscando livrar a Igreja desse diabólico engodo. Os cristãos
estavam sendo envolvidos por uma forma ceríntia da filosofia gnóstica (expressão derivada do grego
gnosis, que significa “conhecimento”), que questionava o fato de Jesus ser perfeitamente humano.
Essa heresia helenista tinha apelos racionais bem ao gosto dos pagãos, como o dualismo e a liber-
tinagem, e repudiava qualquer forma de restrição moral.
Por essa razão,, João escreve essa sua primeira
p epístola
p (considerada
( sua primeira
p carta circular
às igrejas
g j da pprovíncia da Ásia)) com dois objetivos
j fundamentais: desmontar todos os argumentos
g
filosóficos heréticos que estavam aliciando os cristãos em toda a província da Ásia naquele momento
(2.26); e, reafirmar aos crentes a convicção da salvação em Jesus Cristo, perfeitamente Deus e
perfeitamente Homem (5.13). Para tanto, João foi contundente e atacou a flagrante falta de moral
dos falsos mestres que viviam no meio da Igreja (3.8-10), e lembrou à Igreja de sua autoridade como
testemunha ocular da deidade e humanidade do Senhor Jesus, confirmando a fé dos seus leitores
no Cristo encarnado (1.3). Saber que seus filhos na fé estavam andando na sã doutrina era sua maior
alegria como bom pastor (1.4).
1 Todas as evidências demonstram que o autor desta epístola e das outras duas que se seguem é João, filho de Zebedeu (Mc
1.19,20; 15.40; 16.1; Mt 27.56; Jo 13.23; 19.25), primo de Jesus Cristo e um dos seus mais chegados amigos; apóstolo, autor do
evangelho que leva seu nome e do livro da Revelação (em grego: apocalipsis). A introdução dessa carta trata do mesmo assunto,
inclusive com a utilização de várias das mesmas expressões, no original grego, que estão registradas no início do Evangelho
Segundo João (Jo 1.1-4).
2 Jesus Cristo é reconhecido como “a Vida”. Afinal, ele é aquele que tem a vida em si mesmo, sempre existiu e vive para
sempre (Jo 1.14; 11.25; 14.6). É igualmente soberano sobre todos os seres viventes e a própria fonte da vida (5.11). João começa
e encerra sua epístola discursando sobre a vida eterna (5.20) e focalizando o tema: o Cristo é Jesus, corroborando a mensagem
básica do Evangelho: “Jesus é o Messias” (Jo 20.31).
3 A alegria do apóstolo só poderia ser completa se a Igreja compreendesse que o verdadeiro e expressivo amor fraternal,
produzido pelo Espírito Santo na vida de cada cristão, deve ser a mais evidente marca do “conhecimento de Cristo” e, portanto,
da Salvação na comunidade cristã (2Jo 12). A comunhão (em grego: koinõnia) é a expressão clara de união espiritual de Cristo
com o crente, comunicada por meio das metáforas da videira e dos sacramentos (Jo 15.1-5), dos membros do Corpo de Cristo
(Rm 12.1-8; 1Co 12.12; Cl 1.18).
4 A luz representa tudo o que é dito e realizado com clareza e verdade, sem obscuridades ou ambigüidades maliciosas. Os
pecados e os enganos fraudulentos são gerados sob uma penumbra de maus propósitos e torpezas. Ao contrário, Deus é como
a luz do meio dia, ilumina tudo e todos até o mais íntimo da alma. Ele é santidade e integridade absoluta. E essa luz se revela em
Cristo que habita no coração dos crentes sinceros e os ilumina cada dia mais (santificação). Jesus é a luz do mundo (Jo 8.12; Is
42.6; 49.6), pois ele é a perfeita revelação de Deus (Hb 1.3).
5 A expressão “caminharmos” é uma metáfora do nosso comportamento diário. Os cristãos eram conhecidos nessa época
como as pessoas que pertenciam ao “Caminho” (Jo 14.6; At 9.27; 18.26; 19.9; 19.23; 22.4). Uma das palavras-chave desta
epístola é “pecado”, pois ocorre 27 vezes no texto original grego.
6 No original grego, a expressão “fiel e justo” comunica um conceito único: “fiel-e-justo”. Esse aspecto lingüístico revela um
pouco mais sobre o caráter de Deus e sua forma de julgar todos que, mediante a fé pessoal no sacrifício redentor de Jesus Cristo,
se arrependem de seus pecados e recebem a graça perdoadora da Promessa que Deus firmou com os seus (Sl 143.1; Zc 8.8;
Jr 31.34; Mq 7.18-20; Hb 10.22,23). O perdão é o milagre de se restaurar completamente uma comunhão destruída pela quebra
de confiança (Mt 6.12).
7 Como diziam alguns dos pais da Igreja: “Santo não é a pessoa que não se suja, mas é aquele que sempre se lava nas águas
do perdão de Deus”. João combate os gnósticos de seu tempo que não conseguiam reconhecer que seus atos de imoralidade
e ganância eram, de fato, pecados.
O cristão não deve ser mundano 22 Quem é o mentiroso, senão aquele que
15 Não ameis o mundo nem o que nele nega que Jesus é o Messias? Este é o Ini-
existe. Se alguém ama o mundo, o amor migo de Cristo: aquele que rejeita tanto o
do Pai não está nele. Pai quanto o Filho.
16 Pois tudo o que há no mundo: as 23 Todo o que nega o Filho de igual for-
paixões da carne, a cobiça dos olhos e a ma não tem o Pai; quem confessa publi-
ostentação dos bens não provêm do Pai, camente o Filho tem também o Pai.
mas do mundo.7 24 Quanto a vós outros, zelai para que
17 Ora, o mundo passa, assim como sua aquilo que ouvistes desde o princípio per-
volúpia; entretanto, aquele que faz a von- maneça em vossos corações. Porquanto, se
tade de Deus permanece eternamente. o que ouvistes permanecer em vós, de igual
modo permanecereis no Filho e no Pai.
A ação dos anticristos 25 E esta é a Promessa que Ele nos fez: a
18 Filhinhos, esta é a hora derradeira e, vida eterna!
assim como ouvistes que o anticristo está 26 Eu vos escrevo estas advertências a res-
chegando, já agora muitos anticristos peito daqueles que vos querem seduzir.9
têm surgido. Por isso, sabemos que esta 27 Quanto a vós outros, a unção que dele
é a última hora.8 recebestes permanece em vós, e não ten-
19 Eles saíram do nosso meio, mas na des necessidade de que alguém mais vos
realidade não eram dos nossos, pois se ensine sobre isso. No entanto, a unção que
fossem dos nossos, teriam permanecido dele procede é verdadeira, não construída
conosco; o fato de terem nos abandona- sobre a mentira, e vos ensina sobretudo o
do revela que nenhum deles era realmen- que precisais saber. Permanecei, pois, nele
te dos nossos. assim como Ele vos ensinou.10
20 Entretanto, vós tendes uma unção que
procede da parte do Santo, e todos ten- Os verdadeiros filhos de Deus
des pleno conhecimento. 28 Sim, queridos filhinhos, permanecei
21 Portanto, não vos escrevo porque vos nele, para que tenhamos segurança quan-
falta o conhecimento da verdade, mas jus- do Ele se manifestar e não sejamos enver-
tamente porque a conheceis e, porquan-to, gonhados diante dele na sua vinda.
nenhuma mentira tem origem na verdade. 29 Se sabeis que Ele é justo, tomai conhe-
7 A sociedade incrédula se afasta do Senhor e, manipulada pelas artimanhas de Satanás, despreza a Palavra de Deus e os
crentes (Jo 15.18-24). Os cristãos são encorajados a amar a humanidade e lhes pregar o Evangelho, mas não devemos nos
apegar às paixões mundanas, pois somos cidadãos do céu (Jo 17.24; Tg 4.4).
8 Para os autores do NT, “a última hora” ou “o Dia do Senhor” são expressões de mesmo sentido, isto é, têm a ver com a
era iniciada com a primeira vinda de Jesus Cristo à terra e apontam para o seu retorno iminente e glorioso, a fim de resgatar
definitivamente a sua Igreja deste mundo que perece sob a liderança do Diabo, o arquiinimigo do Senhor e dos cristãos (At 2.17;
2Tm 3.1; Hb 1.2; 1Pe 1.20). João estava consciente de que seus leitores tinham pleno conhecimento das profecias que alertavam
para o surgimento de um grande e poderoso inimigo de Deus e do seu povo, antes do retorno de Cristo. Esse será o principal
“anticristo”, também chamado de “o homem do pecado” ou “a besta” (Mt 25.1-13; 2Ts 2.3; Ap 13.1-10). Entretanto, antes dele
aparecerão, ao longo da era cristã que vivemos, muitos tipos de anticristos. Estes têm as seguintes características básicas: negam
a encarnação; a perfeita divindade e humanidade do Jesus histórico; não têm amor a Deus como Pai, apenas usam de falsa
religiosidade para iludir as pessoas e atingir seus fins escusos; são mentirosos, avarentos, egoístas e ardilosos (2Jo 7). Na época
de João, esses anticristos eram representados pelos gnósticos primitivos que haviam abandonado a Igreja, pois nada tinham em
comum com os crentes (2Ts 2.4; Ap 13.6,7).
9 Paulo havia profetizado o que chamou de “lobos ferozes” cerca de 40 anos antes da revolta desses pseudocristãos e o início
do gnosticismo primitivo (At 20.29,30).
10 João não está menosprezando o ensino sistemático das Escrituras, mas sim alertando a Igreja para que não se deixe envolver
por falsas doutrinas e ensinos heréticos. Os gnósticos estavam arrogantemente pregando que haviam recebido uma revelação
especial de Deus, que os elevava a um padrão de conhecimento (no original grego gnosis) muito superior aos apóstolos. João
nos ensina que o ministério do Espírito Santo consiste em iluminar nossa alma para “percebermos pela experiência” em Cristo
(em grego ginõscõ – 2.13,14) a verdade já revelada na Palavra de Deus mediante seus autores sagrados (Mt 28.20; 1Co 2.9-16;
12.28; Ef 4.11; Cl 3.16; 1Tm 4.11; 2Tm 2.2,24).
cimento também que todo aquele que 7 Filhinhos, ninguém vos iluda: quem
pratica a justiça é nascido dele!11 pratica a justiça é justo, assim como Ele
é justo.
A vida santa dos filhos de Deus 8 Aquele que vive habitualmente no
11 Nem toda pessoa que se diz cristã é justa, mas toda justiça verdadeira só é possível ser vivenciada como resultado do novo
nascimento em Cristo (Ef 2.10).
Capítulo 3
1 João usa uma expressão grega especial para enfatizar que a fé no Senhor é uma “confiança inabalável” no seu amor e poder.
E que, mediante essa fé sincera, o crente vai abandonando (santificação) tudo o que o separa (pecado) da plena comunhão com
o Espírito de Deus (Jo 1.29; Rm 5.2).
2 O apóstolo não está exigindo uma perfeição impecável dos crentes, pois ele reconhece as limitações humanas a que ele
próprio está sujeito. O que ele está ensinando é que, diferentemente dos gnósticos de sua época, os cristãos devem buscar viver
de uma maneira santa (não caracterizada pelo pecado renitente e insensível), de acordo com a Palavra de Deus (tudo o que é
certo, justo e generoso – Fl 4.8,9), inclusive pela prática da confissão (reconhecimento) e correção dos erros cometidos diante
de Deus e dos homens (1.8-10; 2.1; Mt 18.15-20).
3 João faz importantes observações sobre o Diabo. É chamado de Maligno (seu principal atributo), pois em sua pessoa não há
bem algum (v.12; 2.13,14; 5.18,19). Ele vem pecando desde sua rebelião contra Deus, antes de provocar a queda da humanidade
(Gn 3; Jo 8.44). É instigador do pecado humano e todos quantos lhe dão ouvidos, e se entregam ao mundo de ilusões armado
por ele para cativar suas presas, passam a pertencer a ele (v.8,12). Ele está presente em toda a terra e tem sob seu domínio
macabro todo o sistema mundial dos incrédulos (5.19). Porém, não lhe foram concedidos permissão ou poder para lesar os
crentes sinceros (5.18). Pelo contrário, ao cristão foi dado o poder de vencê-lo mediante o Espírito do Cristo que já o venceu e o
destruirá definitivamente (2.13,14; 4.4).
4 João usa aqui um outro vocábulo muito especial spejrma (em grego transliterado: sperma), traduzido para o idioma inglês pela
KJ, desde 1611, como “seed” (semente), cujo sentido ampliado é uma metáfora do princípio vital da reprodução humana (esper-
ma) por meio do qual se transmitem às gerações as características do pai. O crente sincero tem o “gene” de Deus e, portanto, não
se compatibiliza com nada que proceda do Diabo ou deste mundo tenebroso (2Pe 1.4; 1Pe 1.23,25; Tg 1.18-23; Jo 3.6,8).
5 Aqui estão algumas das características do Diabo que se manifestam no mundo: o pecado (vv.8.10); ódio (v.12); mentira e
engano (Jo 8.44). Os falsos mestres e profetas, mais cedo ou mais tarde, revelam essas mesmas atitudes (1Jo 2.21,22; 4.2). Caim
foi um exemplo de incrédulo que se rende à ilusão demoníaca (Hb 11.4; Gn 4.8).
13 Meus irmãos, não vos admireis se o 23 Ora, e este é o seu mandamento: que
mundo vos odeia. creiamos no Nome de seu Filho Jesus
14 Nós sabemos que já passamos da mor- Cristo e amemos uns aos outros, assim
te para a vida, porque amamos os irmãos. como Ele nos ordenou.9
Quem não ama permanece na morte. 24 Todos aqueles que obedecem aos seus
15 Toda pessoa que odeia seu irmão é ho- mandamentos nele permanecem, e Ele
micida, e sabeis que nenhum assassino neles. E assim conhecemos que Deus
tem a vida eterna em si mesmo. permanece em nós: pelo Espírito que
16 Nisto conhecemos todo o significado do nos outorgou.
amor: Cristo deu a sua vida por nós e deve-
mos dar a nossa vida por nossos irmãos. Alerta contra os falsos profetas
17 Se alguém possuir recursos materiais e,
observando seu irmão passando necessida-
de, não se compadecer dele, como é possí-
4 Amados, não deis crédito a qualquer
espírito; antes, porém, avaliai com
cuidado se os espíritos procedem de
vel permanecer nele o amor de Deus? Deus, porquanto muitos falsos profetas
18 Filhinhos, não amemos de palavras têm saído pelo mundo.1
nem de boca, mas sim de atitudes e em 2 Deste modo, podeis reconhecer o Espí-
verdade.6 rito de Deus: todo espírito que confessa
19 Desta forma, saberemos que somos da que Jesus Cristo veio em carne é de
Verdade e acalmaremos o nosso coração Deus;2
na presença dele; 3 mas todo espírito que não confessa
20 pois, se o coração nos condena, Deus é Jesus não provém de Deus. Ao contrário,
maior que nosso coração; Ele é conhece- este é o espírito do anticristo, a respeito
dor de tudo. do qual tendes ouvido que havia de vir e,
21 Portanto, amados, se o nosso coração presentemente, já está no mundo.
não nos condena, temos coragem diante 4 Filhinhos, vós sois de Deus e tendes
de Deus;7 vencido os falsos profetas, porque maior
22 e recebemos dele tudo o que rogamos, é Aquele que está em vós do que aquele
porque obedecemos aos seus manda- que está no mundo.3
mentos e fazemos o que lhe agrada.8 5 Eles são mundanos; por isso falam como
6 Amor não é apenas uma bela palavra, mas um verbo que exige ações práticas e contínuas para que seu sentido seja bem
compreendido (Tg 2.14-17; Rm 5.5).
7 A expressão grega parresia “confiança” comunica um tipo de ousadia com que os crentes podem testemunhar às demais
pessoas sobre o amor de Cristo Jesus (At 2.29; 4.13,29,31) e uma “feliz segurança” ao nos aproximarmos de Deus em oração,
como um filho amado que confia plenamente no amor e na capacidade do seu pai (3.21; 5.14).
8 João nos ensina que obediência é uma condição indispensável de sermos verdadeiros cristãos (discípulos de Cristo), e não
causa meritória para obtermos resposta às nossas orações (5.14).
9 Esse mandamento tem duas partes indissociáveis: a fé sincera e absoluta em Jesus Cristo (Jo 6.29) e uma atitude de amor
fraternal para com os irmãos de fé e todas as pessoas que ainda carecem da Salvação (Jo 13.34,35; 15.12,17). João desenvolve
a primeira parte desse tema em 4.1-6, e, a segunda, em 4.7-12.
Capítulo 4
1 João usa a expressão grega pneuvmati “espírito”, para revelar que todo ser humano é dirigido não apenas por sua parte física
e material (ossos, carne e sangue), mas pela vida espiritual que reina em cada pessoa. Os nascidos do Espírito de Cristo (Jo 3),
são movidos por Deus e por sua Palavra (3.24), como seus filhos; os que permanecem mortos em seus pecados têm sua pessoa
(espírito) dominada pelo espírito do Maligno. Algumas vezes, inclusive sofrendo em seus próprios corpos com a invasão de
demônios (2.18-22). O homem e a mulher de Deus (profeta ou mestre) ensinam impelidos pelo Espírito Santo (2Pe 1.21). Falsos
teólogos e pregadores, como os gnósticos primitivos da época do apóstolo, falam sob a influência de espíritos afastados de Deus
(Mt 7.15; 24.11; 1Tm 4.1; 2Pe 2.1).
2 A expressão
p grega
g g original
g “confessar” tem o sentido de um compromisso
p de lealdade absoluta, qque implica
p em “testemunhar
com palavras e atitudes” o amor e a fé que o cristão sincero dedica ao Senhor (Jo 17.4-6). É muito mais do que um simples
depoimento formal ou conhecimento intelectual em relação à pessoa e à majestade do Cristo; pois isso, até mesmo o Diabo e os
demônios reconhecem e tremem de medo (Tg 2.19; Mc 1.24; 3.11).
3 Os falsos cristãos e mestres são inspirados pelo mesmo espírito que habita nos anticristos (v.3). O Diabo é chamado também de
“aquele que está no mundo” (Jo 12.31; 16.11). No v.3, o vocábulo “mundo” significa a Terra habitada por todos nós; nos vv. 4 e 5,
quem pertence ao mundo, e o mundo os enviou o seu Filho para ser o Salvador
compreende. do mundo.
6 Nós somos de Deus; quem conhece a 15 Se alguém confessa publicamente que
Deus nos ouve; qquem não é de Deus não Jesus é o Filho de Deus, Deus permanece
nos entende. É assim que reconhecemos o nele, e ele em Deus.
Espírito da Verdade e o espírito do erro. 16 Portanto, dessa forma conhecemos o
amor que Deus tem por nós e confiamos
O amor de Deus nos move plenamente nesse amor. Deus é amor, e
7 Amados, amemos uns aos outros, pois aquele que permanece no amor perma-
o amor procede de Deus; e todo aquele nece em Deus, e Deus, nele.
que ama é nascido e conhece a Deus. 17 Dessa forma, o amor é aperfeiçoado
8 Aquele que não ama não conhece a em nós, a fim de que tenhamos total
Deus, porquanto Deus é amor. segurança no Dia do Juízo, pois, assim
9 Foi deste modo que se manifestou o como Ele é, nós semelhantemente somos
amor de Deus para conosco: em haver nesse mundo.6
Deus enviado o seu Filho unigênito ao 18 No amor não existe receio; antes, o
mundo, para vivermos por intermédio perfeito amor lança fora todo medo. Ora,
dele. o medo pressupõe punição, e aquele que
10 Assim, nisto consiste o amor: não em teme não está aperfeiçoado no amor.
que nós tenhamos amado a Deus, mas em 19 Nós amamos porque Ele nos amou
que Ele nos amou e enviou o seu Filho primeiro.
como propiciação pelos nossos pecados.4 20 Se alguém declarar: “Eu amo a Deus!”,
11 Amados, considerando que Deus porém odiar a seu irmão, é mentiroso,
amou desta forma, nós também deve- porquanto quem não ama seu irmão, a
mos amar uns aos outros. quem vê, não pode amar a Deus, a quem
12 Ninguém jamais viu a Deus; se amar- não enxerga.
mos uns aos outros, Deus permanece 21 Ora, Ele nos entregou este manda-
em nós, e o seu amor é aperfeiçoado em mento: Quem ama a Deus, ame de igual
nós.5 forma a seu irmão!7
13 Temos certeza de que permanecemos
nele, e Ele em nós, porque Ele nos outor- A fé em Cristo vence o mundo
gou do seu Espírito.
14 E vimos e testemunhamos que o Pai 5 Todo aquele que crê que Jesus é o
Cristo, é nascido de Deus; e todo
no entanto, indica precisamente o sistema político, econômico, social e religioso ao qual pertencem todos aqueles que ainda não
nasceram de Deus (iluminados pelo Espírito), inclusive os anticristos e todos quantos vivem enganados e enganando (Jo 1.9).
4 O amor supremo de Deus vai além da encarnação para focalizar o sacrifício redentor de Jesus Cristo, o Filho de Deus. É a fé
(o amor puro e verdadeiro) na pessoa e na obra de Cristo que nos proporciona plena confiança (segurança e paz) quanto à nossa
salvação eterna (Jo 3.16). João usa a expressão “amor” em suas diversas formas, mais de 40 vezes nesta carta; somente entre
4.7 e 5.3, a palavra “amor” aparece 32 vezes no original grego. O amor de Deus é infinito e a própria essência do Pai, por isso,
humanamente incompreensível e absolutamente incomparável. Contudo, é nossa inspiração, motivação e ideal (v.11).
5 O próprio Deus aperfeiçoa o seu supremo amor através do exercício cotidiano do amor fraternal dos cristãos, uns pelos
outros, e todos pelos que ainda não conhecem ao Senhor como Salvador. As pessoas terão uma visão da pessoa de Deus no
momento em que nós as amarmos como Cristo amou sua Igreja (Jo 1.18; Tg 2.22).
6 Somente a pessoa que é nascida de novo, que alcançou um viver maduro em Cristo, manifestando o fruto do Espírito Santo
(v.13), sabe canalizar o amor de Deus para todos ao seu redor (2Co 2.15; 5.14; Gl 5.22; Rm 5.8). O amor de Deus em nós é o sinal
de paz de que somos salvos, que produzirá plena confiança e alegria, quando o Dia do Juízo chegar como um relâmpago. Como
filhos amados do Senhor, não há porque ter qualquer receio de sermos, por algum motivo, condenados por Deus, pois é o amor
genuíno quem confirma a salvação (v.18; Jo 21.15-17).
7 Jesus Cristo, numa de suas muitas provas de que é Deus, unificou os dois mandamentos da Lei (Dt 6.4 e Lv 19.18), anun-
ciando a Nova Ordem: a Lei do Amor, que está sobre toda lei e se resume num único mandamento: amar a Deus e ao próximo
(Mt 22.37-40).
aquele que ama o Pai, de igual modo, ama 9 Nós aceitamos o testemunho dos ho-
também o que dele foi gerado.1 mens, contudo o testemunho de Deus
2 Desta maneira, sabemos que amamos os tem maior valor, porquanto é a Palavra
filhos de Deus: quando amamos a Deus e de Deus, que Ele próprio afiança acerca
obedecemos os seus mandamentos. do seu Filho.
3 Porquanto, nisto consiste o amor a 10 Ora, quem crê no Filho de Deus tem
Deus: em que pratiquemos os seus man- em si mesmo esse testemunho. Todavia,
damentos. E os seus mandamentos não todo aquele que não deposita fé em Deus
são penosos. o faz mentiroso, porquanto não crê no
4 Todo aquele que é nascido de Deus ven- testemunho que Deus proclama acerca
ce o mundo; e este é o triunfo que vence do seu Filho.
o mundo: a nossa fé!2 11 E o testemunho é este: que Deus nos
5 Quem é que pode vencer o mundo? concedeu a vida eterna, e esta vida está
Somente a pessoa que crê que Jesus é o em seu Filho!5
Filho de Deus. 12 Quem tem o Filho, tem a vida; quem
6 Este é aquele que veio por intermé- não tem o Filho de Deus, não tem a vida.
dio de água e sangue, Jesus Cristo;
não apenas mediante a água, mas por Conselhos finais do amado pastor
água e sangue. E o Espírito é quem dá 13 Estas orientações vos escrevi, a fim de
testemunho, porquanto o Espírito é a saberdes que tendes a vida eterna, a vós
Verdade.3 outros que credes em o Nome do Filho
7 Assim, há três que proclamam teste- de Deus.6
munho: 14 E esta é a segurança que temos para
8 o Espírito, a água e o sangue, e há plena com Ele: que, se lhe fizermos qualquer
concordância entre os três.4 pedido, de acordo com a vontade de
1 João viveu numa sociedade patriarcal e, neste sentido, a família é a ilustração mais adequada para demonstrar que quem
amar a Deus, o Pai, amará naturalmente o Filho primogênito e todos os seus irmãos mais novos (2.22). A fé em Cristo, assim como
a expressão sincera, prática e contínua de amor fraternal é sinal de que nascemos de novo (4.7).
2 O apóstolo não está afirmando que a vida cristã é simples de entender e fácil de viver, mas que todo aquele que é nascido
de novo recebe, com o Espírito Santo, a capacidade de olhar para os desafios e as provas com a mente de Cristo (4.7; 2.15). Em
contraste com as obrigações do legalismo judaico (Mt 23.4), os mandamentos de Jesus Cristo são leves e suaves, pois visam
proporcionar refrigério, descanso e segurança para nossas almas (Mt 11.30; Jo 14.5; Rm 12.2).
3 Os gnósticos primitivos, muitos saídos da própria Igreja, estavam pregando que Jesus teria nascido como qualquer ser
humano e vivido assim (inclusive cometendo alguns pecados), até seu batismo, quando o Espírito de Deus, chamado “Cristo”
desceu sobre a pessoa de Jesus, mas o abandonado antes do martírio na cruz, para que somente o homem Jesus morresse.
João, evidentemente, não concorda com esse sofisma (mistura de um pouco de verdade com algumas mentiras, resultando
num grande engano), e se esforça, durante toda essa carta, para deixar claro aos seus leitores que Jesus Cristo é perfeitamente
homem e perfeitamente Deus (1.1-4; 4.2; 5.5). A água simboliza o batismo de Jesus, e o sangue, a sua morte. Assim, o ministério
de Jesus teve início com seu batismo nas águas e terminou com sua morte vicária na cruz. Jesus Cristo é o Filho de Deus
não somente no batismo, mas também, na sua morte e ressurreição. O Espírito Santo é a pessoa da Trindade que confirma o
testemunho apostólico em nossos corações, que Jesus é o Filho Unigênito de Deus (Jo 1.32-34; 2.27; 1Co 12.3).
4 A Lei exigia duas ou três testemunhas para assuntos de grande importância, geralmente julgamentos de vida ou morte ou
que envolvessem a reputação de alguém (Dt 17.6; 19.15; 1Tm 5.19). Na Vulgata e na antiga King James, esses versículos vêm
com alguns acréscimos: “...testemunho no céu: o Pai, a Palavra e o Espírito Santo, e estes três são um. E há três que testificam
na terra: o Espírito, a água e o sangue...”. Como os acréscimos não são encontrados em nenhum manuscrito original ou mesmo
tradução antes do séc.XVI, o comitê de tradução da KJA decidiu manter o texto em português de acordo com a compilação dos
mais antigos e fiéis manuscritos (Majoritário e Grego Crítico). O batismo do Espírito e na água são ordenanças para todos os
crentes (1Co 12.13; At 2.38).
5 O testemunho refere-se à segurança e paz internas providas pelo Espírito Santo no coração de todo cristão sincero (Rm 8.16;
Jo 3.36; Fp 4.7).
6 O apóstolo João deixa claro que escreveu seu Evangelho para anunciar a Jesus Cristo como Salvador e Senhor de nossas
vidas, bem como despertar a fé no coração de todas as pessoas (Jo 20.31). Nesta carta, entretanto, João considera que seus
leitores já são crentes e que agora precisam solidificar sua fé e teologia bíblicas.
Deus, temos a certeza de que Ele nos dá nascido de Deus não é escravo do peca-
atenção.7 do; antes, Aquele que nasceu de Deus o
15 E, se estamos certos de que ele dá aten- protege, e não permite que o Maligno o
ção a tudo quanto lhe rogamos, estamos possa tocar.
convictos de que receberemos os pedidos 19 Estamos cientes de que somos de Deus
que lhe temos feito. e que o mundo inteiro jaz no Maligno.
16 Se alguém vir seu irmão cometer peca- 20 Da mesma forma, temos pleno conhe-
do que não leva à morte, ore, e Deus dará cimento de que o Filho de Deus é vindo
vida ao que pecou. Refiro-me àqueles e nos tem concedido entendimento para
cujo pecado não leva à morte. Existe reconhecermos o Verdadeiro. E nós esta-
pecado que conduz à morte, não estou mos vivendo naquele que é o Verdadeiro,
ensinando que se deva orar por este. em seu Filho Jesus Cristo. Este é o verda-
17 Toda injustiça é pecado, contudo há deiro Deus e a vida eterna.
pecado que não induz à morte.8 21 Filhinhos, acautelai-vos com os falsos
18 Ora, sabemos que todo aquele que é deuses!
7 É preciso compreender que Deus não é nosso servo, nós é que servimos ao Senhor. Portanto, devemos ter cuidado com
nossos pedidos. A oração eficaz e que sempre terá a resposta de Deus deve, antes de tudo, ser feita por alguém que teve seus
pecados lavados pelo Senhor (Sl 68.18); deve rogar em o nome de Jesus Cristo (Jo 16.23,24); sua oração e petição devem glori-
ficar a Deus (Tg 4.2,3); deve crer nas promessas (Tg 1.5-7) e guardar os mandamentos de Cristo (3.22; Jo 15.7).
8 Qualquer pecado na comunidade cristã deve, em primeiro lugar, provocar um sentimento de solidariedade, intercessão e res-
tauração (Mt 18.15-22; Gl 6.1). A Igreja, na época de João, estava vivendo sob os ataques dos hereges gnósticos que pregavam
uma espécie de “amor livre”, sem qualquer pudor ou princípio moral. Além disso, negavam veementemente a encarnação de
Jesus Cristo. A pessoa que afirma ser cristã, mas nega que Jesus Cristo é o Messias (o Cristo), o Filho de Deus, perfeitamente
humano e perfeitamente Deus, revela-se como anticristo e incorre no mesmo pecado eterno e sem perdão contra o Espírito Santo,
qual seja: o pecado da incredulidade renitente e despudorada (2.18-23; 4.4,5; 2Jo 9; Mc 3.29; Mt 12.22-32).