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HEBREUS
Autoria
Durante aproximadamente mil e duzentos anos (entre o ano 400 e 1600 d.C.), esse verdadeiro tra-
tado teológico aos hebreus (judeus) foi chamado de “Epístola de Paulo aos Hebreus”, muito embora
a igreja primitiva nunca houvesse lhe atribuído tal autoria. Orígenes, um dos pais da igreja do terceiro
século costumava dizer: “somente Deus sabe quem escreveu Hebreus”.
A primeira edição britânica da Bíblia King James, em 1611, assim como traduções posteriores
para outras línguas, incluindo a portuguesa, ainda abriam o livro de Hebreus com esse título. Com
a Reforma, entretanto, análises exegéticas mais aprofundadas começaram a ser implementadas; e
com as grandiosas descobertas bíblico-arqueológicas, ocorridas especialmente nos séculos XIX e
XX, convencionou-se entre os biblistas de todo o mundo que o mais correto seria manter o mistério,
que os próprios originais fazem, em relação à autoria dessa obra.
Desde a igreja primitiva, e na época dos pais da igreja, já havia uma inquietação em relação a esse
assunto. Tertuliano, por volta do ano 200 d.C., chega a se referir a esse livro como “uma epístola aos
hebreus com o nome de Barnabé”. Já na Reforma, foi Martinho Lutero quem primeiro, ao dedicar-
se à exegese dos manuscritos gregos que dispunha, sugeriu a autoria de Apolo. Esses autores
propostos são, de fato, grandes possibilidades, além de Silas, Áquila, Clemente de Roma e o casal
Áquila e Priscila.
Barnabé não fazia parte do grupo de apóstolos, no sentido restrito da expressão, mas tinha plena
autoridade espiritual a ele conferida pelo comitê apostólico e diretamente por Paulo e Pedro. Foi
um intelectual respeitado pela Igreja e cristão hebreu profundo conhecedor do Antigo Testamento.
Barnabé, portanto, cumpre bem as características necessárias como potencial autor dessa carta aos
Hebreus. Era judeu, da tribo sacerdotal de Levi (At 4.36), e tornou-se discipulador e amigo de Paulo,
com quem serviu por muito tempo como companheiro de ministério e missões. Foi o próprio Espírito
Santo quem indicou para a Igreja, em Antioquia, que Barnabé e Paulo deveriam ser enviados para a
grande obra de evangelização ocorrida durante a primeira viagem missionária (At 13.1-4).
Apolo é um candidato considerado ainda mais indicado por grande parte dos estudiosos modernos.
Lucas nos revela que “...chegou a Éfeso um judeu, natural de Alexandria, chamado Apolo, homem
eloqüente, e que acumulava grande experiência nas Escrituras”(At 18.24). Apolo também era judeu
convertido ao Senhor Jesus, pelo batismo de João, e dotado de admirável capacidade oratória e
intelectual. Paulo tinha grande respeito e amizade por Apolo, com quem realizou importante obra
evangelística em Corinto (1Co 1.12; 3.4-22).
Propósitos
Muito mais fácil de determinar do que a autoria de Hebreus, mas não menos difícil de compre-
ender em toda a sua amplitude, são os propósitos e o conteúdo temático desta carta endereçada
especialmente aos judeus (hebreus) convertidos a Cristo, que faziam parte da Igreja na Itália (13.24;
Rm 15.26), mas que estavam sendo tentados a voltar aos rudimentos da Lei e do judaísmo místico.
Alguns mestres judeus estavam pregando uma doutrina herética que não combatia diretamente a
mensagem cristã, mas procurava judaizar o evangelho (Gl 2.14; At 6.7).
O prefácio do livro já afirma categoricamente o caráter distintivo do Filho de Deus. Cristo é antes
da História, e a própria razão da História. Jesus é o agente que produz a única plena purificação dos
pecados derivados do coração humano, da Queda (Gn 3), e cometidos na História. Jesus Cristo é a
suprema revelação de Deus (1.1-3).
Portanto, o tema central de Hebreus é a supremacia e suficiência de Cristo, completando e ultra-
passando em muito a revelação preliminar e limitada concedida aos homens por meio do Antigo
Testamento. Por este motivo, todas as revelações, promessas e profecias do AT são perfeitamente
cumpridas somente na “Nova Aliança” ou “Novo Testamento”, nos quais a pessoa de Jesus, por cau-
sa da sua obra redentora, é o único e suficiente Mediador entre Deus e a humanidade. Muito superior
aos anjos, a Moisés (mediador da Antiga Aliança) e a todos os profetas do AT (1.4-14). Segundo
vários exegetas e estudiosos dos manuscritos gregos de Hebreus, esta carta poderia também ser
1 A “antigüidade” é um termo que indica a era anterior à primeira vinda de Jesus Cristo, em contraste com “nestes últimos dias” (v.2),
que se referem à era messiânica (ou período escatológico) inaugurada com a encarnação do Senhor (At 2.17; 1Tm 4.1; Jo 2.18). A ex-
pressão “Deus falou” é mais uma confirmação de que seu Espírito Santo é o supremo autor-inspirador dos escritores do AT e do NT.
2 Jesus Cristo, o Filho primogênito de Deus, é o herdeiro de todo o Universo e da eternidade (Ef 1.20-23; Rm 8.17). Cristo é
a Palavra, o agente da Criação (Jo 1.1-3; Cl 16.3). Ele é o resplendor da glória de Deus; assim como a luz do sol não pode se
separar do próprio sol, semelhantemente, o esplendor do Filho é inseparável da deidade, porquanto ele mesmo é Deus, como
segunda pessoa da Trindade (Jo 1.5-18). Jesus não é uma simples imagem ou anjo de Deus, mas a materialização exata da
pessoa de Deus (Jo 14.9; Cl 1.15). Cristo não pode ser comparado a qualquer outro deus, como imaginavam os gregos em
relação a Atlas, que, segundo a mitologia, tinha o poder de carregar o mundo nas costas. O Filho de Deus mantém sob seu
controle todo o macro e micro universo (Cl 1.17). Somente podia sentar-se ao lado direito do rei alguém por ele determinado e
investido da sua autoridade, pois esse ato normalmente indicava o seu sucessor ao trono, tradicionalmente seu filho escolhido. Ao
ser conduzido à direita do Pai, Jesus Cristo completou a obra da redenção, e hoje governa ativamente com Deus, como Senhor
absoluto do Universo (v.13; 8.1; 10.12; 12.2; Ef 1.20; Cl 3.1; 1Pe 3.22; Mc 16.19).
3 A maioria dos hebreus (povo semita do AT que deu origem aos judeus) acreditava que os anjos eram seres celestiais e
exaltados, que deviam ser reverenciados por terem participado da entrega da Lei de Deus ao povo no monte Sinai (2.2); sendo
essa Lei a suprema revelação de Deus para os judeus. Vários textos antigos, descobertos no monte Qunram e conhecidos
como os Rolos do Mar Morto, revelam a expectativa de muitos hebreus de que o arcanjo Miguel seria o grande líder do reino
messiânico e, nesse caso, alguns anjos ocupariam uma posição acima de Cristo. O escritor desse livro contesta veementemente
essa possibilidade, lembrando aos seus leitores, entre outras coisas, o fato de que o nome, para a cultura judaica, comunica o
caráter completo da pessoa. Portanto, o trecho que se segue nos revela que esse Nome era “Filho”, nome que deve ser adorado
por todo o Universo, o qual nenhum anjo pode ostentar (Gn 17.5; vv.5-14).
4 O Sl 2.7 é citado também em At 13.33, demonstrando o cumprimento perfeito da vontade de Deus na ressurreição do seu
Filho, Jesus (Lc 1.32,33; Rm 1.4; 2Sm 7.14).
5 Os próprios anjos declaram que Jesus Cristo é o Senhor e o adoram (Dt 32.43 – de acordo com a Septuaginta e os Rolos do
Mar Morto – Cl 1.15; Sl 97.7). Essas declarações, que no AT se referem a Yahweh (o nome impronunciável de Deus no AT), aqui
são aplicadas a Cristo, o que se constitui em mais uma indicação clara da sua absoluta divindade.
6 O autor de Hebreus cita a Septuaginta (tradução grega do AT), por ser a tradução das Escrituras que a geração dos judeus
de sua época mais conhecia, pois muitos palestinos já não sabiam ler o hebraico antigo (Sl 104.4).
como roupas serão trocados; mas, Tu és de sinais, Deus testemunhou feitos por-
imutável, e os teus dias não terão fim”.7 tentosos, diversos milagres e dons do
13 Ora, a qual dos anjos Deus alguma vez Espírito Santo, distribuídos conforme
declarou: “Senta-te à minha direita, até a sua vontade.4
que Eu faça dos teus inimigos um estra- 5 Porquanto, não foi aos anjos que Deus
do para os teus pés”? sujeitou o mundo vindouro, a respeito
14 Não são todos os anjos, espíritos do qual estamos falando.5
ministradores, enviados para servir em
benefício dos que herdarão a salvação?8 Cristo é feito à nossa semelhança
6 No entanto, alguém em certa passa-
Jamais negligenciar a salvação gem testemunhou, afi rmando: “Que é
7 O autor cita mais algumas passagens do AT que sugerem a divindade do Rei messiânico e davídico, reafirmando a superiori-
dade de Jesus, o Filho de Deus, sobre todos os anjos (Sl 45.6,7; 102.25-27).
8 O autor de Hebreus faz questão de aplicar os textos do AT dirigidos a Yahweh (Iavé) à pessoa de Jesus Cristo, o Filho. O
Salmo 110 é citado várias vezes, sempre aplicado a Jesus (3.13; 5.6,10; 6.20; 7.3-21; 8.1; 10.12,13; 12.2). O autor destaca: Cristo,
o Filho de Deus, reina; os anjos ministram como missionários celestes, enviados para servir aos escolhidos.
Capítulo 2
1 A expressão grega original, aqui traduzida pela palavra “desviemos”, tem o sentido literal de: “sermos levados por uma forte
correnteza”.
2 O autor de Hebreus refere-se à participação dos anjos na entrega da Lei a Moisés no Sinai (Dt 33.2 – “miríades de santos”
– Sl 68.17; At 7.38,53; Gl 3.19).
3 Os cristãos hebreus, principais destinatários deste livro, estavam negligenciando a comunhão da Igreja (koinonia) e dos
cultos (10.25), por acreditarem que Jesus estava demorando muito para retornar. O autor de Hebreus afirma que as testemunhas
oculares, sobretudo os apóstolos, foram os primeiros a confirmar a Mensagem proclamada por Cristo (2Pe 1.16; 1Jo 1.1). Ele,
entretanto, não reivindica alguma revelação direta do Senhor. Mas defende a nossa Salvação em Jesus Cristo, o Filho Unigênito
de Deus, com raro entusiasmo e conhecimento cristológico das Escrituras.
4 Deus fez questão de confirmar a chegada do Evangelho e seu Reino por meio de atos sobrenaturais e prodigiosos, como a
cura de milhares de enfermos (At 3.7-16) e a distribuição de diversos dons espirituais, em benefício ao seu Corpo (a Igreja), de
acordo com seus planos e propósitos (1Co 12.4-11).
5 O autor de Hebreus faz uma exposição cristológica do Salmo 8.4-6, demonstrando a superioridade absoluta de Cristo sobre
os mais altos anjos. Usa o termo grego oikoumenen, para comunicar a idéia “da sociedade organizada pelos seres humanos”,
ou seja, “o mundo”. Ao tomar sobre si a natureza humana e cumprir plenamente sua missão na terra, de acordo com o plano do
Pai, Cristo redimiu o ser humano caído e arrependido, não os anjos caídos (vv.11,14). O novo mundo será governado por Cristo,
juntamente com todos os cristãos (2Tm 2.12).
6 O texto sagrado de Sl 8.4-6 era bem conhecido pelos hebreus e contempla a pessoa de Adão, como o precursor da
humanidade. A ele, Deus confiou o poder sobre tudo o que havia na terra (Gn 1.26). O propósito de Deus era que o ser humano
fosse soberano no âmbito das criaturas, sujeito somente ao Senhor. Todavia, por causa da Queda (Gn 3), esse objetivo de
Deus ainda não foi completamente realizado. De fato, o próprio homem está “escravizado” pelo pecado, que é a morte (v.15), e
somente em Cristo pode ser salvo (liberto).
7 O Sl 8 refere-se aqui à pessoa do Messias, o Senhor Jesus, como o precursor do domínio humano restaurado sobre a terra.
Por causa da sua vida de amor e obediência ao Pai, seu sacrifício vicário na cruz e sua exaltação (1Co 15.45), tornou possível ao
homem perdoado e redimido o cumprimento das promessas do Sl 8 no Reino que se estabelecerá plenamente no futuro.
8 A expressão grega original archegőn, aqui traduzida por “Autor”, tem o sentido literal de: “Iniciador”. Cristo é o condutor dos
descendentes de Adão à glória que Deus planejou para a humanidade. Foi por intermédio da sua paixão pessoal – a Deus e à
humanidade – que Jesus pode se tornar nosso perfeito e único Salvador, o Messias (v.18; At 3.15; 5.31; Hb 12.2).
9 Na “Congregação”, um dos sinônimos da palavra Igreja (em grego ekklesia), só podem participar, como membros, os
“irmãos” de Cristo. Os filhos de Deus foram outorgados ao Filho do Pai como “irmãos” (v.11), participantes da natureza de Cristo
mediante o Espírito Santo (v.14). O autor de Hebreus cita o Sl 22, salmo de Davi (escrito há mais de mil anos antes da crucificação
de Jesus), e que se refere profeticamente aos sofrimentos e ao triunfo de Jesus Cristo, o Servo Justo de Deus, o Messias.
10 Satanás tem o “poder da morte” somente no sentido de “poder induzir” a humanidade ao pecado; desviar as pessoas do
Caminho que conduz a Deus: Jesus Cristo, e, conseqüentemente, relegar o ser humano incrédulo a uma condição de punição
inevitável, que é o eterno afastamento da presença de Deus: a morte (Ez 18.4; Rm 5.12; 6.23). Entretanto, a graça salvadora de
Deus está – neste momento – à disposição de todos os seres humanos que desejarem sinceramente recebê-la por meio da fé
em Cristo Jesus (Jo 1.12,13).
11 Aos anjos caídos (demônios) e ao próprio Satanás, não será concedida qualquer benevolência ou graça salvadora.
Todos esses espíritos do mal já estão condenados à punição máxima e eterna. Somente aos descendentes de Adão (os seres
humanos), que ao serem contemplados pela graça de Cristo, reconhecerem que andaram contra a perfeita vontade de Deus,
serão definitivamente redimidos e salvos da morte pela fé em Jesus (Gl 3.7).
12 Para que Jesus Cristo pudesse cumprir a Lei, e pagar plenamente a fiança da ira condenatória de Deus sobre a
humanidade, tinha que se tornar perfeitamente humano, todavia sem pecado (4.15), a fim de reunir todos os poderes legais
para se oferecer em resgate pelo pecado de Adão (e de toda a humanidade por extensão). O sacrifício do Justo na cruz foi a
derradeira e definitiva cerimônia de Propiciação (termo hebraico que significa “cobrir”, “apagar”) exigida por Deus para que a
Lei fosse perfeitamente cumprida, e a era da graça pudesse ser declarada em vigor até o iminente e glorioso retorno do Senhor
e o Juízo final (Lv 20-24; 17.11).
Capítulo 3
1 Jesus Cristo é o perfeito Sumo Sacerdote (representante) e Apóstolo (missionário) de Deus para o resgate (Salvação) da
humanidade (Mc 6.30; 1Co 1.1). Jesus muitas vezes se referiu a si mesmo como aquele que fora “enviado” ao mundo pelo Pai
(Mt 10.40; 15.24; Mc 9.37; Lc 9.48; Jo 4.34; 5.24-38; 6.38).
2 Ele foi fiel àquele que o constituiu, as- essa geração e declarei: O coração
sim como também foi Moisés em toda a destes está sempre se desviando, e não
casa de Deus.2 reconheceram os meus caminhos.
3 Jesus foi considerado digno de maior 11 Sendo assim, jurei na minha ira: Estes
glória do que Moisés, pelo mesmo prin- jamais entrarão no meu descanso”.
cípio que o construtor de uma casa pos- 12 Irmãos, tende muito cuidado, para
sui mais honra do que a própria casa. que nenhum de vós mantenha um co-
4 Porquanto, toda casa é construída por ração perverso e incrédulo, que se afaste
alguém; no entanto, Deus é o supremo do Deus vivo.
construtor de tudo.3 13 Pelo contrário, exortai-vos mutua-
5 Moisés foi leal como servo em toda a mente todos os dias, durante o tempo
casa de Deus, dando testemunho do que que se chama “hoje”, de maneira que
haveria de ser revelado no futuro;4 nenhum de vós seja embrutecido pelo
6 Cristo, no entanto, é fiel como Filho engano do pecado.6
sobre a casa de Deus; e essa casa, pre- 14 Porque passamos a ser participantes
cisamente, somos nós, isto é, se retiver- de Cristo, desde que em realidade, nos
mos com fé perseverante a coragem e a apeguemos até o fim à fé que nele depo-
esperança da qual nos gloriamos. sitamos desde o início.
15 Por essa razão é que se afi rma: “Hoje,
O grave perigo da incredulidade se ouvirdes a sua voz, não endureçais o
7 Assim como proclama o Espírito San- vosso coração, como ocorreu na rebe-
to: “Hoje, se ouvirdes a sua voz,5 lião”.
8 não endureçais o vosso coração, como 16 Ora, quem foram os que ouviram e
ocorreu na rebelião, durante o tempo da se rebelaram? Não foram todos os que
provação no deserto, saíram do Egito guiados por Moisés?
9 onde vossos pais me tentaram, pondo- 17 E contra quem Deus se manteve irado
me à prova, ainda que, durante quarenta por quarenta anos? Não foi contra aque-
anos, tenham contemplado as minhas les que pecaram, cujos corpos tomba-
obras. ram mortos no deserto?
10 Por esse motivo, me indignei contra 18 E a quem jurou que jamais haveriam
2 Moisés foi enviado por Deus para libertar o povo de Israel da escravidão egípcia, e para guiá-los à Terra Prometida. Jesus
foi enviado pelo Pai para libertar os dominados pelo pecado e pelo Diabo, de todas as nações, e conduzi-los ao Shabbãth do
Senhor (descanso sabático em hebraico) prometido aos que crêem (2.14,15; 4.3,9; Jo 1.12,13; 17.4). O termo original “casa”,
aqui, significa “família”.
3 Aqui, o termo “casa” pode ser traduzido como “lar”. Assim, Jesus, como Deus, é o próprio construtor do “lar”, sendo que
Moisés simplesmente fazia parte dessa “casa”. Jesus, o Filho de Deus, é o agente e herdeiro de toda a Criação, e, portanto, tem
o direito de mandar; Moisés tinha o direito de servir.
4 O próprio Moisés profetizou acerca da vinda e da obra de Cristo. A casa consiste no povo de Deus em todo o mundo, sua
família (Ef 2.19; 1Pe 2.5). Se alguém deixar de perseverar na fé, apenas demonstra que jamais foi, de fato, crente e filho de Deus.
Aquele que se arrepende de seus erros e pecados e não consegue ficar longe do Senhor e de sua família (a Igreja) é o filho
amado, e seu coração exibe a marca dos eleitos. A prova da realidade da regeneração está na fidelidade a Jesus Cristo e na
obediência à sua Palavra.
5 Aqui, temos mais uma evidência da inspiração do AT e, por conseguinte, de toda a Escritura. Essa citação de Sl 95.7-11 faz
uma análise sintética da frustrante história de Israel no deserto sob liderança de Moisés. Assim como o autor do salmo usou esse
fato histórico para advertir os israelitas do seu tempo contra a tentação da incredulidade e da desobediência à Palavra de Deus;
da mesma maneira, o autor de Hebreus aplicou o mesmo princípio aos seus leitores.
6 Embora estejamos vivendo na “época da graça” divina, em que todos têm à sua disposição o favor de Deus, mediante o
sacrifício de Cristo, a fim de se arrependerem de seus pecados e terem acesso à plenitude da Salvação, essa oportunidade única
é garantida somente “aqui e agora”; amanhã poderá ser tarde demais. Satanás é o mestre da mentira e tenta nos convencer de
que Deus não condenará ninguém ao inferno, nem julgará com rigor; e que nossos “erros” não são “grandes pecados”. Todos
esses argumentos só servem para embrutecer (endurecer) os corações daqueles que lhes dão ouvidos (2.8; Jr 17.9). Afastar-se
de Deus com rebeldia (literalmente no grego: “apostatar”) é desviar-se do Caminho da vida e preferir a morte, da mesma forma
como agiram muitos dos israelitas que saíram do Egito a caminho de Canaã, mas não depositaram “confiança plena” (em grego
hupostasis) no Senhor.
7 Após uma série de perguntas retóricas, o autor de Hebreus conclui que as pessoas que saíram livres do Egito, com destino a
Canaã, não puderam completar a viagem por não terem crido de todo coração nas promessas de Deus, o que lhes permitiu “abrir
a guarda” e cair em muitos pecados. O Senhor, em sua ira e juízo, fechou as portas de Canaã (a exemplo do que já havia feito
em Gn 3.23,24) para que toda aquela geração de israelitas incrédulos perecesse sem chegar ao lugar de repouso do Senhor (Nm
14.21-35). Os leitores de Hebreus são admoestados a ter muita cautela com os mesmos perigos no sentido espiritual.
Capítulo 4
1 O autor de Hebreus está sempre comparando a caminhada dos israelitas no deserto, abandonando a escravidão no Egito e
peregrinando até o “descanso de Deus” (em hebraico Shabbãth) na Terra Prometida, em relação à jornada do cristão rumo ao seu
pleno repouso espiritual no Reino de Deus. O descanso dos judeus, sob a liderança de Moisés, e depois de Josué, temporário e
terrestre, prenunciava o descanso eterno das nossas almas em Cristo (v.8; Js 1.13). A expressão grega “acompanhada” significa,
literalmente, “unida”; enquanto pode dizer também que “as boas novas” foram literalmente “evangelizadas”. A fé compromete o
ouvinte com a mensagem recebida; não se pode esquivar-se da sua obrigação (Rm 10.16; Is 53.1).
2 Do mesmo modo que a fé nas promessas de Deus era requerida para se entrar no descanso de Canaã, também só
ingressaremos no descanso pleno e eterno da salvação mediante a fé sincera na pessoa e na obra expiatória de Jesus Cristo.
Deus concluiu suas obras no sétimo dia da criação e descansou (v.4; Gn 2.2,3). Portanto, o Senhor nos convida para compartilhar
do seu descanso, e não para qualquer tipo de repouso que possamos conquistar (vv.10,11).
3 O ingresso de Israel em Canaã sob a liderança de Josué representou uma forma parcial e temporária de entrar no “Sábado
de Deus”. Mas, a posse do “Sábado” não foi completada naquela época, como demonstra o convite contínuo expresso no Salmo
95.7,8.
4 Podemos tomar a posse completa do “Sábado de Deus” por meio da fé sincera em Jesus Cristo. Assim como Deus des-
cansou da obra da Criação, o crente pode descansar de empreender esforços na tentativa de alcançar a sua salvação, e deve
repousar na obra consumada pelo Filho de Deus na cruz do Calvário, o qual nos conduzirá ao “Shabbãth eterno do Senhor”
(Ap 14.13).
5 O esforço do cristão não é “para alcançar o mérito da salvação”, mas sim porque “já é salvo”, busca perseverar na fé, pela
obediência diária ao Espírito Santo e à Palavra de Deus. Não devemos seguir o triste exemplo de Israel no deserto. As palavras
“repouso” e “descanso” vêm do termo original grego sabbatismos (Jo 5.19; 14.2,24).
6 A expressão total de Deus foi revelada aos seres humanos por meio da pessoa de Jesus Cristo, a Palavra encarnada (Jo
1.1,14) e, igualmente, nos foi confiada verbalmente. Essa palavra dinâmica e ativa de Deus, no cumprimento de todos os seus
planos, aparece claramente tanto no AT quanto no NT (Sl 107.20; 147.18; Is 40.8; 55.11; Gl 3.8; Ef 5.26; Tg 1.18; 1Pe 1.23). Tanto
a onipotente e onisciente presença do Senhor, quanto o poder de discernimento (em grego kriticos) da Palavra, revelam os senti-
mentos e intenções mais íntimas e os traz à tona da nossa consciência para que possam ser julgados (1Co 4.5).
7 O autor de Hebreus começa aqui uma longa exposição teológica (4.14 – 7.28) quanto à superioridade do sacerdócio de
Jesus Cristo sobre Arão e o ministério da tradição sacerdotal. Para os cristãos de hoje, esse pode ser um tema de entendimento
tranqüilo. No entanto, para os judeus de todos os tempos, especialmente no século I, essas conclusões são tão chocantes
quanto reveladoras e salvadoras (Sl 110.4). Assim como o sacerdote arônico, no Dia da Expiação, passava por entre os olhares
expectativos do povo em direção ao Santo dos Santos, assim também Jesus passou para além da vista dos discípulos que o
observavam atentamente, elevando-se e atravessando pelos céus até adentrar o Santuário Celestial, ocupando sua suprema
transcendência e autoridade, e cumprindo plenamente sua obra expiatória (7.26; At 1.9-11; Ef 4.10; Fp 2.9-11).
8 Jesus Cristo, nosso Sumo Sacerdote, não se mantém distante nem alienado do ser humano e de suas agruras, como ocorria
com os sacerdotes judaicos e, ainda hoje, acontece com muitos líderes espirituais. Deus se fez carne em Cristo e sentiu na pele as
fraquezas e sofrimentos que acometem a todos nós. Entretanto, ele jamais pecou, o que significa que obteve vitória sobre todos
os desafios da carne e do espírito. Portanto, só Jesus pode sentir o que sentimos e oferecer a sua ajuda compassiva sempre que,
pela fé, dela nos quisermos valer.
Capítulo 5
1 O sumo sacerdote precisa preencher dois pré-requisitos fundamentais: ser chamado por Deus e dedicar sua vida ao Senhor
e às necessidades do povo, sendo solidário com as fraquezas, lutas e ignorância dos seus irmãos, porém sem pecar. Só Jesus
Cristo conseguiu cumprir plenamente essas exigências (8.3; 9.9; Lv 1.2; 2.1; Nm 15.30,31; Hb 6.4-6; 10.26-31).
2 Cristo não tomou para si a glória de se tornar sumo sacerdote. Jesus, o Filho, foi designado por Deus de acordo com suas
próprias declarações proféticas (Sl 2.7; 110.4). O sacerdócio de Cristo, porém, não era conforme a ordem de Arão, mas segundo
Melquisedeque (v.6; 1.5; Sl 2.7-9; Rm 1.4).
3 A existência da preposição ek no manuscrito original grego deixa claro que Cristo pediu ao Pai para que o livrasse da morte
em seu sentido mais amplo. Jesus não recuou, em momento algum, diante dos sofrimentos e das aflições mais extremas, todavia
ficou horrorizado com o pecado da humanidade que haveria de arcar (Mt 26.36-46; 27.46). Sua oração foi ouvida pelo Pai que o
salvou da morte eterna por meio da ressurreição, a mesma que herdamos pelo seu sacrifício vicário. A expressão grega eulabeia
significa “reverente temor a Deus”, e pode ser traduzida como “piedade” (Jo 5.19; 1Jo 5.14).
4 Deus se fez humano em Cristo e decidiu passar pelo aprendizado a que todos nós estamos sujeitos. Suas lutas, tentações e vi-
tórias foram reais e não alegorias como querem explicar certos teólogos. A Bíblia não é uma obra de ficção, mas um depoimento fiel
das experiências vividas por homens de Deus, narradas pela inspiração do Espírito Santo. Ao contrário de Adão, que relativizando a
Palavra de Deus fracassou e caiu, Jesus permaneceu fiel (obediente) e prevaleceu; completando (aperfeiçoando) sua humanidade
filial e podendo, assim (perfeito), ser a fonte da “eterna redenção” (v.9; 2.10; 9.12; 12.2; Rm 4.25; 10.9; Tg 2.14-26).
5 Os hebreus não eram recém-convertidos, já haviam aprendido muito bem as doutrinas básicas do Evangelho, como as
apresentadas em 6.1,2. No entanto, haviam permitido que a preguiça mental, a indolência física e, especialmente, o esfriamento
espiritual, tomassem conta de suas vontades mais nobres (6.12). Deviam caminhar com perseverança na vida cristã autêntica e,
havendo passado pelos ensinos fundamentais da Palavra, ingressar com fé na plenitude do Espírito e do conhecimento avançado
do Senhor, como o autor de Hebreus nos exorta no capítulo 7.
Capítulo 6
1 Os ensinos básicos da doutrina de Cristo já deveriam ser sabidos e estar em plena prática entre os cristãos hebreus (1Co
15.3,4). A igreja, depois de algum tempo, estava dando ouvidos a falsos ensinos e realizando “obras mortas”, isto é, tendo uma
vida de pecado que condena o pecador à morte eterna (9.14).
2 Expressão que se tornou popular entre os cristãos e que comunica dependência em relação à soberania do Senhor. Somente
o Espírito de Deus pode iluminar as mentes e os corações, operando maturidade espiritual (1Co 16.7).
3 É Deus quem abre os olhos dos cegos espirituais (incrédulos) e lhes oferece a percepção da verdade divina. Aqueles que
“experimentaram”, isto é, “apreciaram pela experiência” a Palavra de Deus (2Co 4.4,6) e se apropriaram, mediante a fé em Cristo,
do “dom celestial”, oferecido a todo que crê no Senhor (2Pe 2.2), recebendo, portanto, o Espírito de Deus; estes se tornaram
metochoi (no original grego: participantes) da obra redentora e dos milagres da “era” de Cristo (em grego aiõn).
4 É preciso fazer uma grande diferença entre divergências teológicas e apostasia. O texto bíblico se refere aqui às pessoas que
va, que cai de tempo em tempo, e dá co- vista não haver outro maior por quem
lheita proveitosa àqueles que a cultivam, jurar;6
recebe a bênção de Deus. 14 e declarou: “Esteja certo de que o
8 Todavia, a terra que produz espinhos e abençoarei e farei numerosos os seus
ervas daninhas é inútil, e logo será amal- descendentes”.
diçoada. Seu fim é ser lançada ao fogo. 15 Sendo assim, havendo Abraão espe-
rado com paciência certeira, alcançou
Vivendo como herdeiros de Deus a promessa.7
9 Quanto a vós outros, no entanto, ó 16 Ora, os homens juram por quem é
amados, estamos convencidos de que a maior do que eles, e para eles o jura-
vossa situação seja muito melhor, sendo mento confirma a palavra empenhada,
beneficiados com as bênçãos decorren- pondo fim a toda discussão.
tes da salvação. 17 Do mesmo modo, Deus, querendo de-
10 Porquanto Deus não é injusto para se monstrar de forma mais clara aos herdei-
esquecer do vosso trabalho e do amor ros da promessa a imutabilidade de seu
que revelastes para com o seu Nome, pois propósito, interveio com juramento,
servistes os santos, e ainda os servis.5 18 para que nós, que nos refugiamos no
11 Desejamos, contudo, que cada um de acesso à esperança proposta, sejamos
vós demonstre o mesmo esforço dedica- grandemente encorajados por meio de
do até o fim, para que tenhais a plena duas afirmações imutáveis, nas quais é
certeza da esperança, impossível que Deus minta.8
12 de maneira que não vos torneis ne- 19 Essa esperança é para nós como ân-
gligentes, mas imitem aqueles que, por cora da alma, firme e segura, a qual tem
intermédio da fé e da longanimidade, pleno acesso ao santuário interior, por
recebem a herança prometida. trás do véu,
20 onde Jesus adentrou por nós, como
A promessa de Deus é imutável precursor, tornando-se sumo sacerdote
13Quando Deus fez a sua promessa a para sempre, segundo a ordem de Mel-
Abraão, jurou por si mesmo, tendo em quisedeque.
deliberadamente renunciam da sua fé na pessoa e obra de Jesus Cristo, conforme está prescrito na Palavra de Deus: a Bíblia (Rm
10.9; 2Tm 3.16). O Senhor pode transformar a vida de um apóstata por meio da sua infinita graça e misericórdia. Entretanto, a
igreja não deve realizar um segundo batismo, pois Cristo morreu por nós uma única vez (Gl 2.19; 9.26). A não ser que se conclua
que o suposto apóstata, na verdade, não era um convertido e que, agora sim, aceitou de coração o dom do arrependimento e
da salvação em Cristo (1Jo 5.16; 1Co 15.5; At 8.21-24). Portanto, esse lhe será o primeiro e definitivo batismo de testemunho do
novo nascimento (Jo 3).
5 O autor deste livro não está julgando que seus leitores sejam apóstatas. Ele apenas os adverte sobre os perigos da apostasia,
que pode ter seu início fatal com a indolência, inércia, preguiça (o peso dos pecados não confessados e abandonados) e o
cansaço espiritual ao longo da caminhada cristã (5.11; 12.1,12). Todo trabalho sincero e abnegado em prol do Reino de Deus
constrói um tesouro que é de valor eterno.
6 É próprio dos seres humanos fazer juramentos. Isso devido à situação decaída da humanidade na qual a palavra das pessoas
nem sempre é fiel e suficiente. Deus, ao fazer um juramento, demonstra que não há ninguém além dele mesmo, cujo nome possa
autenticar sua Palavra; humaniza-se mediante uma característica cultural, moral e ética de grande valor entre os humanos, e nos
oferece garantia em dobro (v.18; 11.39) quanto ao cumprimento cabal da sua Promessa (Gn 22.16-18). A expressão idiomática
hebraica literal, usada por Deus a Abraão, registrada nos manuscritos originais é: “abençoando te abençoarei”, que indica um
juramento ou promessa incondicional e permanente.
7 A palavra grega original usada para descrever aqui a “paciência” de Abraão é makrothumia, que significa “longanimidade”, em
contraste com os sentimentos de indignação e revolta. Refere-se, portanto, ao fato de Abraão ter “esperado com fé”, por cerca de
25 anos, pelo nascimento de Isaque e, mais tarde, pela entrega e restauração do seu filho (Gn 12.3,4; 17.2; 18.10; 21.5; 22.16).
8 As duas afirmações imutáveis do Senhor são: a promessa de Deus, que por si só é absolutamente fidedigna, e o juramento de
Deus concedido aos homens, que confirma essa promessa. Hoje, os crentes podem contemplar a promessa que Abraão, no seu
tempo, podia apenas antever (11.13; Jo 8.56). Assim como uma forte âncora que mantém o navio na posição correta, e a salvo
da força das marés e das correntes marítimas, nossa fé (esperança convicta) em Cristo é nossa garantia de completa salvação
e segurança (Jo 10.34-38).
1 Embora o autor de Hebreus não afirme claramente que Melquisedeque foi uma cristofania, é revelador o fato de ele não ter
origem (genealogia) e ocupar simultaneamente duas posições de grande poder. Elementos que reforçam o pensamento do autor
quanto a prefigura (preexistência) do eterno Messias: Jesus Cristo. O nome “Salém”, vem do hebraico antigo, Yerüshalẽm, cujo
sentido primitivo teria sido “capital da guerra e da paz”. Mais tarde, essa expressão passou para o idioma aramaico como “cidade
da paz”. (Gn 14.18-20; Is 23.5,6; 33.15,16).
2 A Lei entregue a Moisés e ao povo, bem como o sacerdócio e os sacrifícios, faziam parte do mesmo sistema que contemplava
o fato de todas as pessoas nascerem em pecado (sob a maldição da Queda) e, portanto, sujeitas à condenação prescrita. Por
este motivo, necessitavam de um mediador legal e idôneo para representá-las diante de Deus. O autor de Hebreus esclarece, con-
tudo, que o sacerdócio levítico (ou da descendência de Arão) era imperfeito e havia se tornado insuficiente, mas que o sacerdócio
de Melquisedeque era o ideal e perfeito. A história registra que a proclamação daquele que viria a ser Sacerdote para sempre (o
Messias) foi escrita profeticamente, bem na metade do período em que os sacerdotes levitas exerciam seu serviço ministerial,
mostrando que o sacerdócio levítico existente deveria dar lugar a um sistema melhor (Sl 110.4).
3 De acordo com a Lei, a função sacerdotal fora outorgada exclusivamente à tribo de Levi (Dt 18.1), porém Jesus, em sua
humanidade, pertencia à árvore genealógica de Judá, uma tribo não-sacerdotal. Entretanto, o autor de Hebreus destaca que
Jesus é “sacerdote eterno”, segundo Melquisedeque e, portanto, indestrutível (v. 21).
4 Como defendeu o apóstolo Paulo, a Lei é santa e justa, todavia não é capaz de transformar em justos aqueles que violaram
seus mandamentos e, portanto, pecaram. Nem ao menos pode oferecer à humanidade o necessário poder para vencer o mal e
o pecado (Rm 7.12). A Lei foi apenas um sistema preparativo para a definitiva Lei da Salvação em Cristo (Gl 3.23-25; Mt 5.17). A
antiga aliança se cumpre plenamente na nova aliança da perfeita redenção e nos capacita a nos achegarmos à presença íntima
de Deus (Cl 1.5).
5 A cruz de Cristo marca definitivamente na história do Universo o ponto central do plano redentor de Deus para toda a
humanidade. O ato do sacrifício do Filho de Deus encerra o longo e árduo período histórico de “preparação”, e inaugura a “era
escatológica” (1.1,2; Gl 4.4; Rm 3.26). Toda a certeza de salvação e esperança (fé) no estabelecimento completo do Reino de
Deus, emana do sacrifício vicário de Jesus Cristo oferecido uma única vez para sempre (Is 53.6,10).
6 Os sumos sacerdotes humanos, por mais dedicados que fossem, não eram capazes de viver sem cometer algum pecado
(como prova a história até nossos dias); mortais e, portanto, impermanentes; segundo a Lei, somente podiam oferecer sacrifícios
de animais, que jamais serviriam de substitutos suficientes para o ser humano, criado à imagem de Deus. Cristo, entretanto, foi
“aperfeiçoado” ao enfrentar e vencer as tentações, jamais tendo sucumbido a pecado algum. Obedecendo em tudo ao Pai e,
assim, estabeleceu uma perfeição eterna (Gn 1.26-28; 2.10; 5.8).
Capítulo 8
1 A expressão “mais importante de tudo”, no original grego, tem o sentido de “resumo essencial”. O argumento que vem sendo
desenvolvido pelo autor de Hebreus tem como base escriturística o antigo texto hebraico de Jr 31.31-34, e serve para demonstrar
que Jesus Cristo, o Messias, é o verdadeiro e único mediador da Nova e Excelente Aliança (7.22).
2 O “verdadeiro santuário” (em grego tőn hagiőn alethines), expressa o contraste que há entre o tabernáculo construído por Moi-
sés (mais tarde colocado no templo de Jerusalém por Salomão - 1Rs 8.4), cópia imperfeita e transitória do “verdadeiro” (perfeito)
tabernáculo celestial, erigido pessoalmente por Deus e não por meio do homem. O santuário erguido por Deus corresponde ao
Santo dos Santos, um espaço absolutamente sagrado, localizado no interior do tabernáculo de Moisés, no qual o sumo sacerdote
entrava, somente uma vez por ano e por um breve momento, levando consigo o sangue da expiação (Lv 16.13-15,34). Jesus
Cristo, nosso Sumo Sacerdote, habita eternamente no tabernáculo celestial e intercede por nós diuturnamente (7.25).
este Sumo Sacerdote fizesse a sua oferta 10 “Esta é a aliança que farei com a
pessoal. casa de Israel, passados aqueles dias”,
4 Entretanto, se Ele estivesse na terra, garante o Senhor. “Gravarei as minhas
nem seria considerado sumo sacerdote, leis na sua mente e as escreverei em seu
tendo em vista que já foram constituí- coração. Eu lhes serei Deus, e eles serão
dos aqueles que apresentam as ofertas o meu povo,
prescritas pela Lei.3 11 ninguém jamais precisará ensinar o
5 Esses servem num santuário que é seu próximo, nem o seu irmão, dizendo:
representação e sombra daquele que ‘Conhece ao Senhor’, porque todos me
está nos céus, já que Moisés foi avisado conhecerão, desde o menor deles até o
quando estava para construir o taber- maior.
náculo: “Observai tudo com cautela, 12 Pois Eu lhes perdoarei a malignidade
para que faças todas as coisas de acordo e não me permitirei lembrar mais dos
com o modelo que vos foi revelado no seus pecados”.
monte”. 13 Ao proclamar “Nova” esta aliança, Ele
6 Contudo, agora, Jesus recebeu um mi- transformou em antiquada a primeira.
nistério ainda mais excelente ao dos sa- E o que se torna superado e envelhecido,
cerdotes, assim como também a aliança está próximo do aniquilamento.
da qual Ele é o mediador; aliança muito
superior à antiga, pois que é fundamen- Os ritos mosaicos eram imperfeitos
tada em promessas excelsas.4
7 Ora, se aquela primeira aliança não ti-
vesse imperfeições, não seria necessário
9 Ora, a primeira aliança possuía or-
denanças para adoração e também
um tabernáculo terreno.
buscar lugar para a segunda. 2 Pois foi levantada uma tenda, em cuja
8 Porquanto Ele declara, repreendendo parte da frente, conhecida como Lugar
o povo por suas faltas: “Dias virão, diz o Santo, estavam o candelabro, a mesa e
Senhor, em que estabelecerei com a casa os pães da proposição.1
de Israel e com a casa de Judá uma nova 3 Mas, atrás do segundo véu, havia a
aliança. parte chamada Santo dos Santos,
9 Não conforme a aliança que fi z com 4 onde se posicionavam o altar de ouro
seus antepassados, no dia em que os to- puro para o incenso e a arca da aliança,
mei pela mão, para os conduzir até fora também toda revestida de ouro. Nessa
da terra do Egito; pois eles não continu- arca, estavam o vaso de ouro contendo
aram na minha aliança, e Eu me afastei o maná, a vara de Arão que floresceu e
deles”, assevera o Senhor! as tábuas da aliança.2
3 Deus escolheu uma família de judeus muito simples e fez com que Jesus nascesse em uma tribo não sacerdotal (Judá). Os
sumos sacerdotes eram escolhidos entre os filhos da tribo sacerdotal de Levi (7.12-14; Ex 25.40). O verbo “apresentar” aparece
no texto no tempo presente, o que revela que o templo ainda estava em pleno funcionamento e ostentação. É uma indicação de
que o livro de Hebreus foi escrito antes da destruição do templo no ano 70 d.C.
4 O termo “mediador” (no original grego mesites) transmite a idéia de “alguém que fica no meio, unindo duas pessoas com
mãos fortes”. Portanto, a “Nova Aliança” (um nome ainda melhor para Novo Testamento), da qual Jesus Cristo é o nosso único e
suficiente mediador, é superior à “Velha Aliança” (ou Antigo Testamento), estabelecida por Deus mediante Moisés no deserto do
Sinai (9.15; 12.24; Êx 24.7,8; 25.40; 1Tm 2.5).
Capítulo 9
1 A “parte da frente” é uma referência ao Santo Lugar do tabernáculo (tenda erguida por Moisés no deserto do Sinai), que fora
separado do Santo dos Santos por um segundo véu (v.3). O primeiro véu apenas guardava a entrada. O candelabro era feito de
ouro batido e colocado no lado sul do Lugar Santo (Êx 40.24), tinha sete lâmpadas, as quais eram mantidas acesas todas as
noites (Êx 25.31-40). A mesa da Proposição (Presença), construída com madeira de acácia e revestida de ouro puro, ficava no
lado norte do Lugar Santo (Êx 40.22). Sobre ela se depositava doze pães, cuidadosamente dispostos em duas fileiras de seis
(Lv 24.5,6).
2 O altar do incenso se localizava no Lugar Santo, contudo, no Dia da Expiação, esse altar passava a fazer parte do Santo dos
Santos por conta da retirada momentânea do véu. Havia, claro, um estreito relacionamento sacramental com o santuário interior
e com a arca da aliança (Êx 40.5; 1Rs 6.22). No Dia da Expiação, o sumo sacerdote levava incenso desse altar, juntamente com
o sangue da oferta pelo pecado, para dentro do Santo dos Santos (Lv 16.12-14).
3 Esses querubins eram duas pequenas estátuas de seres alados, que formavam uma só peça com a tampa da arca e, de pé,
em cada extremidade do propiciatório; feitas em ouro puro, representando dois anjos da “Presença” divina que exaltam e zelam
pela reverência e santidade diante de Deus. Era entre essas figuras de anjos que aparecia a glória da “Presença” do Senhor (Êx
25.17-22; Lv 16.12-14). A tampa da arca da aliança era uma placa feita em ouro puro que se encaixava perfeitamente por cima da
arca. Uma vez por ano, exatamente no décimo dia do sétimo mês, quando a congregação de Israel celebrava o Dia da Expiação
(guardado pelos judeus até hoje como Yom Kippur), o sumo sacerdote aspergia sobre o povo, no tabernáculo e sobre a arca, o
sangue como oferta pelo pecado (Lv 16.14,15,29,34).
4 Apesar de o tabernáculo mosaico estar ultrapassado, continuava a simbolizar (inutilmente), uma volta à velha forma da Lei,
uma vez que ela não podia livrar em definitivo o ser humano da condenação do pecado. Os sumos sacerdotes levíticos tinham
que repetir todos os anos as cerimônias de purificação, mas Cristo ofereceu o sacrifício eficaz, pleno, único e eterno. Depois de
obter a eterna redenção, subiu e adentrou ao perfeito santuário celestial.
5 Esse é o versículo chave de Hebreus. Jesus Cristo foi ao mesmo tempo Sumo Sacerdote e Sacrifício imaculado; na inteireza
da sua pessoa e não apenas de forma exterior, superficial e incompleta. O Espírito de Cristo, que habita no coração (tabernáculo)
dos crentes, removerá totalmente a profunda e mortal marca do pecado gravada no âmago do nosso ser. É impossível servir ao
Senhor de forma aceitável com a consciência maculada.
6 Cristo é o único e suficiente mediador da Nova Aliança entre Deus e a humanidade, cuja “Promessa” é a herança eterna como
filhos do Altíssimo (7.22; 8.6,13; 12.24; 1Tm 2.5 conforme Jr 31.31-34). Por causa da morte expiatória de Cristo, essa herança
se tornou realidade para todas as pessoas que crêem sinceramente (os chamados) em Deus (Rm 8.28). Ao entregar-se como
so que se comprove a morte daquele que tuário erguido por mãos humanas, uma
o determinou;7 simples ilustração do que é verdadei-
17 porquanto, um testamento só tem ro; Ele entrou nos céus, para agora se
validade legal após a confirmação da apresentar diante de Deus em nosso
morte do testador, considerando que benefício;
não poderá entrar em pleno vigor en- 25 Ele também não se ofereceu muitas
quanto estiver vivo quem o fez. vezes, como procede o sumo sacerdote
18 Por essa razão, nem a primeira aliança que entra no Santo dos Santos de ano
foi sancionada sem sangue, em ano portando sangue alheio.
19 tendo em vista que, depois de pro- 26 Ora, se assim fosse, seria necessário
clamar todos os mandamentos da Lei que Cristo sofresse muitas vezes, desde
a todo o povo, Moisés levou sangue de o início do mundo. Mas agora Ele mani-
novilhos e de bodes, e também água, lã festou-se de uma vez por todas, no final
vermelha e ramos de hissopo, e aspergiu dos tempos, para aniquilar o pecado por
sobre o livro e toda a população, decla- intermédio do sacrifício de si mesmo.8
rando: 27 E, assim como aos homens está orde-
20 “Este é o sangue da aliança, a qual nado morrer uma só vez, vindo, depois
Deus ordenou para obedecerdes”. disto o Juízo,
21 E procedeu da mesma maneira, as- 28 assim também Cristo foi oferecido
pergindo com o sangue o próprio taber- em sacrifício uma única vez, para tirar
náculo e todos os utensílios usados nas os pecados de muitas pessoas; e apare-
cerimônias sagradas. cerá segunda vez, não mais para eximir
22 De fato, conforme a Lei, quase todas o pecado, mas para brindar salvação a
as coisas são purificadas com sangue, e todos que o aguardam!9
sem derramamento de sangue não pode
haver absolvição! O sacrifício de Cristo é definitivo
23 Portanto, se fez necessário que as re-
presentações das construções que estão
no céu fossem purificadas mediante tais
10 Assim, considerando que a Lei
oferece somente um vislumbre
dos plenos benefícios que hão de vir, e
sacrifícios, mas os próprios elementos não exatamente a sua realidade; jamais
celestiais, por meio de sacrifícios muito poderá, mediante os mesmos sacrifícios
superiores a estes. repetidos ano após ano, aperfeiçoar os
24 Pois Cristo não adentrou a um san- que se achegam para adorar.1
sacrifício e ao aspergir seu sangue sobre o madeiro da cruz e sobre o povo presente, perante a Lei, pagou totalmente o preço
necessário para libertar o ser humano pelos pecados cometidos, sob a primeira aliança, e quanto às violações dos mandamentos
mosaicos (Mc 10.45).
7 O termo grego “testamento” pode ser traduzido por “aliança” na maioria das vezes, entretanto, aqui e no v.17, o vocábulo é
usado especificamente no sentido de comunicar as últimas vontades de uma pessoa sobre a partilha da sua herança. O conceito
de “aliança” volta à tona do v.18 em diante. Os beneficiários do testamento não têm direito legal à herança determinada antes da
morte do testador. Nesse sentido, como a morte de Jesus Cristo foi devidamente comprovada na história, a promessa da herança
eterna (v.15) já pode ser usufruída pelos seus beneficiários de acordo com a vontade expressa do Senhor.
8 A primeira vinda de Jesus Cristo, o Messias, deu início a grande era messiânica, na qual toda a história da humanidade tem
transcorrido, aguardando o glorioso retorno de Cristo e o estabelecimento completo do Seu Reino, no qual viveremos eternamen-
te em sua presença (1.2; 1Pe 1.20; Mc 10.45; Rm 8.3; Ap 20.6).
9 Assim como os antigos israelitas aguardavam com expectação e ansiedade a volta do sumo sacerdote, enquanto estava no
Santo dos Santos intercedendo pelo povo, no Dia da Expiação; da mesma maneira, os cristãos devem viver e esperar com fé, na
expectativa da volta iminente do nosso Sumo Sacerdote (2Tm 4.8; Tt 2.13; Rm 8.29,30; Fl 3.20,21; 1Jo 3.2,3).
Capítulo 10
1 O sistema mosaico era composto da Lei e de todos os procedimentos sacerdotais levíticos (7.11). Contudo, os sacrifícios
perpetuados pela Lei, ano após ano, constituíam-se em uma grande ilustração e antevisão (literalmente em grego: uma sombra)
do poderoso e derradeiro sacrifício vicário de Cristo. O alvo da fé cristã é nos tornar discípulos (cópias fiéis) de Jesus Cristo (Rm
8.29; 2Co 4.4; Cl 2.17).
2 Se não fosse assim, não teriam cessa- 12 Jesus, no entanto, havendo oferecido
do de ser oferecidos? Porquanto, se os para sempre, um único sacrifício pelos
adoradores tivessem sido purificados pecados, assentou-se à direita de Deus,
de uma vez por todas, não mais se senti- 13 aguardando, daí em diante, até que
riam culpados de seus pecados.2 os seus inimigos sejam submetidos por
3 Contudo, essas cerimônias de sacri- estrado de seus pés.
fícios promovem, todos os anos, uma 14 Porquanto, com uma única oferta,
recordação dos pecados, aperfeiçoou por toda a eternidade todos
4 porque é impossível que o sangue de quantos estão sendo santificados.
touros e bodes remova pecados. 15 E disto, igualmente, nos dá testemu-
5 Por isso, quando Cristo veio ao mun- nho o Espírito Santo; porquanto, após
do, proclamou: “Sacrifício e oferta não ter declarado:
quiseste, mas um corpo me preparaste; 16 “Esta é a aliança que farei com eles,
6 de holocausto e ofertas pelo pecado depois daqueles dias, diz o Senhor. Co-
não te agradaste. locarei as minhas leis no âmago do seu
7 Então, Eu disse: Aqui estou, no Livro coração e as inscreverei profundamente
está escrito a meu respeito; vim para em sua mente”,
fazer a tua vontade, ó Deus”.3 17 e conclui: “Dos seus pecados e ini-
8 Havendo declarado em primeiro lugar: qüidades nunca mais me permitirei
“Sacrifícios, ofertas, holocaustos e ofer- recordar”.
tas pelo pecado não quiseste, tampouco 18 Afi nal, onde todas as transgressões
deles te agradaste”, os quais foram reali- foram perdoadas, não existe mais qual-
zados conforme a Lei. quer necessidade de oferta de sacrifício
9 Então, completou: “Aqui estou; vim pelo pecado.4
para fazer a tua vontade”. E assim,
Ele cancela o primeiro padrão, para Devemos perseverar na fé
estabelecer o segundo. 19 Sendo assim, irmãos, temos plena
10 E por essa determinação, fomos santi- confiança para entrar no Santo dos San-
ficados por meio da oferta do corpo de tos mediante o sangue de Jesus,
Jesus Cristo, feita de uma vez por todas. 20 por um novo e vivo Caminho que Ele
11 Ora, todo sacerdote se apresenta, dia nos descortinou por intermédio do véu,
após dia, para exercer os seus deveres isto é, do seu próprio corpo.5
religiosos, que nunca podem remover 21 Temos, portanto, um magnífico sa-
os pecados. cerdote sobre a Casa de Deus.
2 A consciência que condena e aflige diuturnamente o coração de uma pessoa em relação aos pecados cometidos, e que não
pode aceitar humilde e alegremente o perdão de Deus, ainda não conheceu a verdadeira Salvação que está à disposição de
todos mediante a simples e sincera fé em Cristo Jesus (Jo 1.12). Absolutamente, nada, e nenhum tipo de oferta ou sacrifício, têm
o poder de perdoar, limpar e renovar a consciência humana (v.4; Sl 51.10,16; 66.18).
3 O autor de Hebreus cita trechos dos Salmos da Septuaginta (a mais importante e antiga tradução grega do AT), para demons-
trar o tipo de obediência concorde e voluntária (submissão, sob missão) de Cristo em relação à vontade do seu Pai (Sl 40.6-8;
Lc 22.42; Jo 4.34). Nota-se que Deus nunca se interessou pelos sacrifícios em si, mas na verdadeira devoção e obediência à sua
Palavra (1Sm 15.22).
4 É prova de incredulidade e insulto contra Deus oferecer qualquer tipo de sacrifício por pecados já remidos em Cristo. Portanto,
o verdadeiro caminho para Deus não é mais pavimentado pelas ofertas ou cerimônias sacrificiais (como a tradicional missa católi-
ca ou os rituais espiritualistas), mas exclusivamente pela fé no Cristo ressurreto (9.12; Rm 4.25; 5.19). As citações nesta passagem
também foram extraídas da Septuaginta (o AT em grego) e atestam que na nova aliança todos os nossos pecados podem ser
perdoados de maneira eficaz, completa e perpétua, dispensando todo e qualquer tipo de sacrifício adicional ao já consumado
por Cristo (Jr 31.31-34 já mencionado em 8.8-12).
5 Na antiga aliança, o acesso ao Santo dos Santos era ultra-restrito, porquanto o sangue dos animais era insuficiente para
realizar a plena expiação dos pecados. Mas hoje, os crentes de todas as etnias e nações, podem se achegar com fé ao trono da
graça, pois o sacerdote perfeito ofereceu a si mesmo (o sacrifício perfeito) e expiou todo o pecado e condenação, de uma vez
para sempre. No momento exato da morte de Cristo na cruz do Calvário, o véu que, simbolicamente, fazia separação entre o San-
to Lugar e o Santo dos Santos, rasgou-se em duas partes, de cima a baixo (Mc 15.38). Aquele véu (cortina de tecido) representa
o corpo de Cristo em relação à questão do sofrimento. Assim como aquele véu, o corpo de Cristo foi rasgado, e abriu caminho
para a morada de Deus (literalmente: o tabernacular) na vida dos cristãos sinceros.
6 A expressão grega aqui traduzida por “abandonemos” transmite o sentido original de “deserção” (Mt 27.46; 2Co 4.9; 2Tm
4.10,16). Deus planejou a Igreja para que os cristãos pudessem ser companheiros de caminhada, exortando e sendo exortados
pelo Espírito e uns aos outros, em amor fraternal. Por isso, não é concebível a teoria do culto exclusivo e distante da comunhão
dos irmãos (1Jo 1.3). A demora do glorioso retorno do Senhor causou certa apatia e frustração naqueles cuja fé era frágil
e oscilante, e foram tentados a desistir da luta espiritual diária para voltar aos rudimentos do judaísmo e da antiga aliança.
Entretanto, o autor de Hebreus, e muitos cristãos, presenciaram o terrível dia da destruição de Jerusalém no ano 70 d.C. Um dos
sinais da iminente volta de Cristo (Lc 21.20-22; 1Ts 5.2,4; 2Ts 1.10; 2.2; 2Pe 3.10).
7 Todo e qualquer pecado tem seu perdão e remissão em Cristo Jesus, menos o pecado da rejeição consciente e sistemática
(apostasia) ao amor de Deus mediante seu Evangelho. O cenário histórico dessa passagem do AT está registrado em Nm 15.27-
31 e refere-se especialmente àquelas pessoas que, havendo confessado sua fé no Senhor, decidem afastar-se do Corpo de
Cristo (a Igreja), negando a fé que um dia abraçaram (6.4-8). Rejeitar o sacrifício de Cristo é rejeitar a única possibilidade efetiva
de Salvação eterna, porquanto não existe nenhum outro sacrifício aceito por Deus. A expressão “feriu os pés do Filho de Deus”
comunica o sentido de “absoluto e renitente desprezo ao Senhor e sua Palavra” (Zc 12.1-9).
8 Com o passar do tempo, tendemos a ganhar mais conhecimento bíblico e experiência na convivência com o Corpo de Cristo.
Todavia, precisamos sempre nos lembrar do tempo em que fomos alcançados pelo divino amor do Senhor, quando a luz da
salvação brilhou alegremente em nossas mentes e corações, como as Boas Novas de Deus (6.4; Jo 1.9; At 2.40-44).
37 pois dentro de pouco tempo “Aquele aprovou as suas ofertas. Apesar de estar
que vem virá, e não tardará. morto, seu testemunho de fé ainda é
38 Mas o justo viverá pela fé! Contudo, eloqüente.4
se retroceder, minha alma não se agra- 5 Por meio da fé, Enoque foi arrebatado,
dará dele”.9 de forma que não experimentou a mor-
39 Nós, entretanto, não somos dos que te; e “já não foi encontrado, porquanto
regridem para a perdição; mas sim, dos Deus o havia arrebatado”, visto que
que crêem e, salvos, seguem avante. antes de ser arrebatado, havia recebido
o testemunho de que tinha agradado a
A essência e o sentido da fé Deus.5
9 O autor de Hebreus toma como base a Septuaginta (o AT em grego) para salientar o fundamento da fé cristã: a salvação
pela graça de Deus, mediante a fé em Cristo; e a vida (cristã), como resultado direto da fé que depositamos em nosso Salvador
(Hb 2.3,4). O autor escreve para os salvos e perseverantes, porém está consciente de que há alguns insinceros entre os crentes,
mas que somente o Senhor poderá cuidar deles. Muitos cristãos hebreus serviram de “espetáculo” ao mundo (literalmente em
grego theatrizomenoi), devido às muitas e terríveis perseguições por causa do Evangelho que viviam e pregavam, contudo ainda
não haviam passado pelo martírio que viria (12.4; 1Co 4.9). Mesmo assim, alguns já estavam apostatando da fé. Em Jerusalém,
porém, vários santos líderes do Senhor morreram torturados por proclamarem a mensagem salvadora de Jesus Cristo: Estevão,
Tiago, filho de Zebedeu, Tiago, irmão do Senhor Jesus, esses por volta do ano 62 d.C.
Capítulo 11
1 A expressão grega original hupostasis significa um tipo de “certeza concreta”, uma “confiança sem espaço para dúvida”. A fé
é como uma “declaração escrita e oficial” em relação às promessas de Deus, das quais a vida e obra de Jesus Cristo, o Messias,
é a maior e melhor.
2 O autor de Hebreus se refere aos “antigos” homens e mulheres de fé como exemplos de “crentes” da era pré-cristã. No AT,
Deus valorizava a fé (sincera e absoluta) depositada em sua pessoa e Palavra, tanto quanto a fé que devemos a Cristo no NT.
3 A fé substancia a realidade de Deus. Por mais que a humanidade avance nas ciências, a melhor resposta para a criação do
Universo e o cotidiano de cada um de nós provém da fé em Deus.
4 O motivo principal da aceitação do sacrifício de Abel foi ter sido oferecido por fé. O texto do AT, nos deixa entender que a oferta
de Caim foi entregue apenas como um formalismo ritual, sem sincera fé e adoração (Gn 4.3,4; 1Jo 3.12).
5 A melhor maneira de se agradar a Deus é crendo nele. Esse foi o grave erro do primeiro homem (Gn 3), maldição que
acompanhará grande parte da humanidade até o final dos tempos. Por isso, iluminados, e grandemente afortunados, são aqueles
que aceitam o toque divino e celebram com fé a Salvação em Cristo Jesus (Is 64.4; 1Tm 1.17; Jo 1.18). Enoque foi justificado
porque “agradou a Deus”, por meio da fé (Gn 5.18-24; Sl 49.15; 73.24).
6 A fé que agrada a Deus é a fé em sua pessoa, santa e excelsa (Jr 29.13). A fé na fé, ou a fé em outro qualquer ser ou objeto,
é apenas uma expressão de força de vontade humana ou inócua crendice.
7 O dilúvio foi uma prova mundial da vindicação da fé de Noé em Deus, e do castigo da incredulidade. A fé de Noé na Palavra
de Deus o levou a convencer sua família a construir um enorme barco no meio de uma região árida e muito distante do mar.
Noé tinha 480 anos quando Deus o chamou para construir a arca. Passou cerca de 120 anos pregando sobre o juízo de Deus,
e suportando todo tipo de zombarias e incredulidades. Durante todo esse período de graça, não viu nenhuma pessoa se
arrepender (Gn 5.28 – 9.29; 6.3; 1Pe 3.20). Noé morreu com a idade de 950 anos (2Pe 2.5; At 28.26; Ap 2.7).
8 Abraão é apresentado no NT como o exemplo maior de todos os que crêem em Deus (Rm 4.11-16; Gl 3.7-29). Sua fé
manifestou-se na profunda adoração e amorosa obediência dedicada ao Senhor (Gn 12.4). A expressão grega kaloumenos, que
significa “convocação ou chamada”, revela que Abraão, assim como outros servos, ouviram e atenderam prontamente, pela fé, o
convite pessoal de Deus para realizar suas missões (Gn 15.6; Ne 9.7; At 7.2-5; Mt 11.28). Deus prometeu Canaã a Abraão somente
depois de sua volta do Egito (Gn 13.14).
9 Assim como os patriarcas e o povo de Israel, os cristãos – pela fé - também peregrinam neste mundo que se tornou estranho
ao amor de Deus por causa do pecado (Gn 3; 23.4; 1Pe 1.1,17). Somente quando o discípulo aprende a priorizar sua fé no
Senhor, considerando todas as demais coisas como secundárias, é que efetivamente estará seguindo a Cristo (Lc 14.33). Somos
cidadãos do céu, nossa pátria não está nesta Terra (Fp 3.20).
10 Sara foi considerada estéril por haver passado, em muito, da idade média de ter filhos (Gn 18.11,12). Abraão, com cerca de
100 anos de idade, não tinha a mesma vitalidade da juventude (Gn 21.5; Rm 4.19). Entretanto, para Deus não há impossíveis e
seus propósitos serão sempre cumpridos. A descendência de Abraão é, hoje em dia, numerosa em todo o planeta, como a areia
das praias (Gn 11.30; 13.16; 15.5; 22.17; 26.4; 1Rs 4.20).
11 Os patriarcas, assim como todos os crentes, não morrem para Deus, mas são renovados e vivem eternamente (Mc
12.26,27).
12 A expressão original grega peirazomenos pode significar, ao mesmo tempo, “tentar” e “provar”. Deus não incentiva ninguém
para o mal, mas usa todas as provações (tentações), às quais as pessoas são diariamente submetidas, a fim de que o homem
observe e analise suas próprias motivações e reações. O Senhor sempre espera que o homem escolha aceitar o amor e as
orientações do Pai celeste. Para Deus, a intenção é tão ou mais importante que a ação; assim como o ser, mais valioso que o
fazer (Tg 1.13). O vocábulo “unigênito”, além de significar a exclusividade de um “filho único”, tem o sentido de “muito amado”,
o que ilustra a própria pessoa do Filho de Deus (Mc 12.6).
13 A fé de Abraão era tão pura, sincera e tranqüila que, mesmo no ápice da sua pior crise, creu no amor e no poder de Deus para
ressuscitar Isaque, caso fosse necessário. Fato que realmente ocorreu, de modo figurado, quando o próprio Senhor – contemplando
a prova de fé de Abrão – providenciou o Cordeiro da expiação, prefigurando a pessoa e a obra vicária do Cristo (Gn 22.13).
14 As orações e bênçãos dos pais sobre os filhos têm grande significado e poder (Gn 27.27-40).
do sobre a extremidade do seu cajado, e fez aspersão do sangue, para que o anjo
adorou a Deus.15 destruidor não tocasse nos primogênitos
22 Pela fé, José, também ao fi nal da vida, dos israelitas.
relembrou o êxodo dos fi lhos de Israel 29 Pela fé, o povo atravessou o mar Ver-
do Egito e deu instruções quanto ao en- melho como em terra seca; mas quando
terro dos seus próprios ossos.16 os egípcios procuraram também atra-
vessar, morreram afogados.
A fé heróica de Moisés 30 Foi pela fé que os muros de Jericó des-
23 Mediante a fé, Moisés, ainda recém- moronaram, depois de serem rodeados
nascido, foi escondido durante três durante sete dias.20
meses por seus pais, porque perceberam 31 Também foi mediante a fé que a
que sua formosura não era comum, e prostituta Raabe, por haver acolhido os
não temeram o decreto do rei.17 espiões, não foi morta juntamente com
24 Pela fé, Moisés, já adulto, recusou ser os incrédulos.21
aclamado como fi lho da fi lha do Faraó, 32 Quantos exemplos mais darei? In-
25 preferindo ser maltratado com o felizmente não disponho de tempo
povo de Deus a desfrutar os prazeres para falar sobre a devoção de Gideão,
que o pecado é capaz de proporcionar Baraque, Sansão, Jefté, Davi, Samuel e
por curto período de tempo. os profetas,
26 Por amor ao Messias, julgou sua 33 os quais, por intermédio da fé, con-
desonra uma riqueza mais excelente quistaram reinos, praticaram a justiça,
do que os tesouros do Egito, porquanto receberam o cumprimento de promes-
contemplava a sua gloriosa recompen- sas, fecharam a boca de leões,
sa.18 34 extinguiram a violência do fogo,
27 Por meio da fé, abandonou o Egito, foram libertos do fio da espada; da
não temendo a ira do rei, e perseverou, fraqueza tiraram força, tornaram-se
pois fitava Aquele que é invisível.19 poderosos nas batalhas e puseram em
28 Por intermédio da fé, celebrou a Páscoa retirada exércitos estrangeiros.22
15 A maior herança que os pais deixam para seus filhos e netos é a bênção da expressão sincera de que eles também conhe-
çam e andem com Deus (Gn 47.29-31; 48.8-20; Sl 23).
16 Jacó e José são outros valorosos exemplos de pessoas cuja fé é clara e robusta; seja durante a difícil caminhada da vida,
como na hora da morte (v.13; Gn 50.24,25).
17 Moisés, desde seu nascimento, apresentava sinais incomuns de beleza e carisma (Êx 6.20; Nm 26.58,59). Contudo, seus
pais tinham plena consciência de que ele pertencia ao Senhor; creram que ele haveria de sobreviver ao decreto do faraó egípcio
que determinara a morte de todos os meninos hebreus recém-nascidos (Êx 1.16,22; 2.2).
18 Em Êx 4.22, Israel é literalmente, nos originais, chamado de “filho de Deus” (Os 11.1). A pessoa de Jesus Cristo, o Messias
de Israel, sempre esteve unida ao povo de Deus (1Co 10.4). Assim como Abraão que viu a Cristo (Jo 8.56), Moisés exerceu o
ministério de arauto do Senhor, na preparação do caminho para a chegada do Messias (Sl 69.9).
19 O medo dos crentes não se compara ao desespero dos incrédulos. Moisés fugiu para Midiã, na península do Sinai, aos 40
anos de idade (Êx 2.11-15; At 7.23-29). Moisés é considerado um dos maiores líderes de todos os tempos por sua perseverança
em guiar seu povo através do deserto, por 40 anos, sem tirar os olhos da fé de Cristo (o Messias). Ele pôde ver o invisível, e
permaneceu fiel ao Senhor (At 7.30).
20 Deus mandou que Moisés transferisse a liderança do povo de Israel para o jovem Josué, homem de fé, cujo primeiro grande
desafio, a conquista da terra prometida, foi vencido exclusivamente pelo poder da fé no Senhor, sem uma única batalha (Js 6).
21 Raabe, mesmo após haver abraçado a fé em Deus, continuou a carregar o estigma de ter sido prostituta (Js 2.8-11; 6.22-25).
Entretanto, sua vida deve ser vista como um exemplo da grandiosidade da graça do Senhor, capaz de redimir absolutamente
qualquer pecador, e elevá-lo à dignidade eterna (Tg 2.25). Raabe, crente no Senhor, casou-se com Salmom e foi mãe de Boaz,
ancestral de Davi, que é incluído na genealogia de Jesus Cristo (Mt 1.5).
22 O autor de Hebreus tem em mente todos os grandes heróis da fé, e muitos outros homens e mulheres de Deus, porém
se vê limitado ao tempo e espaço para comentar sobre todos neste livro. Mesmo assim, cita resumidamente: Daniel (Dn 6.22),
Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, Elias (1Rs 19); Eliseu (2Rs 6.31), Jeremias (Jr 36.19,26); Gideão (Jz 6.15); Jônatas, e tantos
outros (1Sm 14.6).
23 Referência à mulher de Serepta (1Rs 17.17-24), ao ocorrido com a mulher sunamita (2Rs 4.8-36) e aos muitos servos de
Deus que não se sujeitaram às pressões de reis, governantes despóticos, exércitos e do próprio sistema mundial; mas preferiram
entregar suas vidas aos torturadores e à morte, a fim de herdarem dignamente a vida eterna e as recompensas celestiais. A
expressão grega original, aqui traduzida por “martirizados”, significa literalmente “esticados e açoitados até a morte”.
24 Homens de Deus como Zacarias, filho do sacerdote Joiada, e Isaías (serrado ao meio por ordem de Manassés, segundo
a tradição histórica), que foram mortos por declararem a verdade (2Cr 24.20-22; Lc 11.51). No século II a.C., a maioria dos
macabeus deram suas vidas por causa de Deus.
25 Nem todos os heróis da fé experimentaram completo triunfo de suas ações em vida. Contudo, absolutamente todos
receberam a bênção e o galardão divino, e ouvirão da boca do Senhor, juntamente com muitos cristãos: “Muito bem, servo bom
e fiel!” (Mt 25.21). O grande e pleno cumprimento das promessas de Deus, tanto para os antigos heróis da fé, quanto para nós,
encontra-se na pessoa e obra de Jesus Cristo, que é a “ressurreição e a vida” (Jo 11.25,26).
Capítulo 12
1 O autor de Hebreus compara a vida cristã a uma corrida olímpica de longa distância (antigo esporte grego no qual os atletas
deviam vencer os cerca de 42 km que ligava a cidade de Maratona a Atenas). O público que torce pelos competidores é formado
por celebridades da fé, por isso não podem ser considerados meros espectadores, mas fontes de inspiração e nossos grandes
exemplos de vida com Deus. A expressão grega original marturos, que originou nossa palavra “mártir”, significa “testemunhas”,
o que demonstra a amplitude do sentido de vivermos uma vida exemplar: disciplinada pelo Espírito Santo (At 20.24; 1Co 9.24-26;
Gl 2.2; 5.7; Fp 2.16; 2Tm 4.7).
2 O caminho para a vitória na maratona da vida é concentrar toda a nossa atenção na pessoa de Cristo (Fp 3.13,14), pois ele
é o ponto de partida e, ao mesmo tempo, linha de chegada e o objetivo maior da nossa fé. Jesus é nosso melhor orientador, trei-
nador e exemplo, pois ele já venceu a morte e conquistou o grande prêmio do Universo (1.3; Is 53.10-12). Portanto, as restrições,
sofrimentos e humilhações que passamos diariamente, por amor e obediência ao Senhor, são recompensadas pela certeza da
vitória e da glória eterna (11.26; Mt 5.10-12; Rm 8.18; 2Co 4.17; 1Pe 4.13; 5.1,10).
3 Jesus Cristo sofreu infinitamente mais do que qualquer ser humano em todos os tempos. Por isso, Ele – por meio do seu
Espírito – pode compreender perfeitamente e ser sensível às nossas aflições. E não apenas ser solidário, mas efetivamente nos
livrar de todo mal. Essa certeza deve nos fortalecer e animar, especialmente quando passamos por momentos de grande tristeza,
incerteza e sofrimento (Is 40.28-31).
a fi lhos: “Meu fi lho, não desprezeis a tração; mais tarde, no entanto, produz
disciplina do Senhor, nem desanimeis fruto de justiça e paz para todos aqueles
quando por Ele és repreendido, que por ela foram disciplinados.
6 pois o Senhor disciplina a quem ama, e 12 Sendo assim, fortalecei as mãos enfra-
educa todo aquele a quem recebe como quecidas e os joelhos vacilantes.6
fi lho”. 13 “Preparai caminhos retos para os vos-
7 Suportai as dificuldades, aceitando-as sos pés”, para que aquele que manca não
como disciplina; Deus vos trata como se desvie, pelo contrário, seja curado!
fi lhos. Ora, qual o fi lho que não passa
pela correção do seu pai? 4 Exortação à paz e à sinceridade
8 Mas, se estais sem orientação, da qual 14 Esforçai-vos para viver em paz com
todos se têm tornado participantes, então todas as pessoas e em santificação, sem
não sois filhos legítimos, mas bastardos. a qual ninguém verá o Senhor.7
9 Além do mais, tínhamos nossos pais 15 Vigiai para que ninguém se exclua
humanos que nos educavam, e nós os da graça de Deus; que nenhuma raiz de
respeitávamos. Quanto mais devemos mágoa venenosa brote e vos cause con-
toda a obediência ao Pai dos espíritos, fusão, contaminando muitos;8
para então vivermos!5 16 que não se abrigue entre vós nenhum
10 Porquanto, nossos pais nos discipli- imoral ou profano, como Esaú, o qual
navam por um espaço curto de tempo, por uma refeição desejada, vendeu todos
da forma que melhor lhes parecia. Deus, os seus direitos de herança como fi lho
entretanto, nos corrige para o nosso bem mais velho.9
maior, a fim de que possamos participar 17 E, assim, como bem sabeis, quando
plenamente da sua santidade. mais tarde quis herdar a bênção, foi
11 Toda correção, de fato, no momento rejeitado; e não teve como cancelar sua
em que ocorre não nos parece ser mo- decisão, apesar de ter buscado a bênção
tivo de contentamento, mas de frus- desesperadamente.10
4 A expressão grega original paidéia significa “educar para a vida” e tem um sentido mais amplo do que a palavra “castigo”,
muitas vezes associada somente a repreensões físicas. Contudo, quando necessário, como um bom pai, o Senhor nos disciplina
ou corrige (em grego: “açoita”). Os sofrimentos, humilhações e perseguições devem ser aceitos pelos cristãos como parte do
processo educacional usado por Deus para nosso desenvolvimento espiritual (5.13; At 14.22).
5 Respeito e obediência são os componentes básicos da “submissão” e nos ajudam a entender o que significa a expressão
bíblica “o temor do Senhor” (2Co 7.1; Pv 9.10). Deus é o criador do espírito humano e, portanto, nosso Pai espiritual. Nossos pais
humanos são pais genéticos e biológicos, numa linguagem bíblica: “segundo a carne” (Nm 16.22; Ec 12.7; Zc 12.1). Desde os
primórdios, a obediência (submissão humilde) a Deus é a grande chave para a vida eterna (Tg 1.21; Gn 3).
6 Sempre que a admoestação ou correção divina (disciplina) é aceita com submissão, produz no cristão grandes benefícios.
Portanto, deve ser recebida com gratidão e esperança, como uma provação sadia da nossa fé em Cristo (1Pe 1.6,7; Tg 1.2; Pv
4.26).
7 A tradição familiar, a posição sócioeconômica ou a formação acadêmica não podem proporcionar o verdadeiro conhecimento
de Deus. Somente a santidade nos permite “ver a Deus”. E quem vê a Deus, vê ainda melhor o seu próximo (Lc 10.29-37; 1Pe
1.15,16; 1Jo 3.2,3).
8 A expressão “se exclua da graça” quer dizer, “colocar-se aquém da graça”, ou, ainda, “decidir não tomar posse da graça”,
dom oferecido pelo Senhor, mas que deve ser aceito fervorosamente pelo crente para que possa ter seu efeito pleno (2.1-4; 6.4-8).
O termo original grego episkopountes significa aqui “zelar com amor” pela saúde espiritual dos irmãos. É a mesma palavra para
“bispo” ou “epíscopo”. Tanto aqui como em Dt 29.18, a expressão “mágoa venenosa” ou “amargura” tem a ver com sentimentos
como inveja, vingança, maledicência, que são capazes de envenenar o indivíduo e toda a comunidade.
9 Deus criou a humanidade para que ela, espontaneamente, vivesse em harmonia com o seu Criador e a terra, obviamente,
dando muito mais valor às coisas espirituais. Entretanto, com a Queda (Gn 3), Satanás teve condição de inverter os valores reais,
e o homem passou a dar mais valor às coisas profanas (poder, prestígio, bens materiais). A história de vida de Esaú ilustra bem
essa triste realidade humana (Gn 25.29-34; Fp 3.18,19).
10 Esaú agiu como a maioria das pessoas incrédulas, apenas lamentando sua perda material, mas não se arrependendo
claramente pelo pecado de haver trocado o bem espiritual e eterno pela satisfação de um desejo momentâneo e carnal (Gn
27.41; 2Co 7.10).
11 Os versículos 18 a 21 fazem menção à maravilha, poder, temor e alta reverência que envolveu todo o povo de Israel e a
região do monte Sinai, quando Deus outorgou a Lei a Moisés (Êx 19.10-25; Dt 4.11,12; 5.22-26; 9.9-19; 18.16; At 7.32). O autor
de Hebreus estabelece um contraste entre o monte Sinai, “intocável” (Êx 19.12), e o monte Sião (Jerusalém). Entretanto, não se
refere exatamente à parte montanhosa a sudeste de Jerusalém, mas sim à Cidade Celestial de Deus e aos que habitam com o
Senhor, a fim de marcar nitidamente a diferença entre as duas grandes alianças de Deus com a humanidade, sendo a nova aliança
em Cristo maior e definitiva (11.10-16; 13.14; Fp 3.20; Ap 5.11,12; Gl 4.26; Ap 21.2).
12 A expressão grega no plural “primogênitos” retrata a excelência do amor de Deus para com cada uma das pessoas salvas
(seus filhos) desde os primórdios (2.10,11; Lc 10.20; Ap 21.27). O termo “espíritos” refere-se aos “santos” do AT, agora aperfeiço-
ados mediante a morte e ressurreição do Primogênito de Deus (11.40). É por intermédio do Espírito de Deus, que sela (autentica)
e habita a vida do crente, que temos pleno e eterno acesso à Nova Jerusalém, a Cidade Celestial de Deus.
13 O sangue de Abel clamou durante toda a história da humanidade por justiça e condenação para o pecador (assassino). O
sangue de Cristo, entretanto, derramado na cruz, proclama – ainda mais forte – o perdão e a reconciliação eterna do pecador
arrependido com Deus (Gn 4.10; Hb 9.12; 10.19; Cl 1.20; 1Jo 1.7).
14 Aquele que tem a voz criativa e poderosa é Deus (Êx 19.18; Dt 4.24; Sl 68.7), Aquele que nos redime, aconselha e orienta é
Cristo, que veio dos céus e está nos céus (1.1-3; 4.14; 6.20; 7.26; 9.24). E, porque recebemos essa revelação maior e completa,
temos ainda mais responsabilidade em preservar a fé e viver testemunhando as Boas Novas (o Evangelho): Cristo em nós! (2.2-
4). A nova ordem esperada por Ageu, e tantos homens e mulheres de Deus do passado (Ag 2.6-21), teve pleno cumprimento no
sacrifício e ascensão de Jesus Cristo, que estabeleceu seu Reino. O ensino claro das Sagradas Escrituras é que tudo passa nesse
mundo. Somente o Reino de Deus é eterno (v.28).
Capítulo 13
1 O autor de Hebreus tem duas preocupações básicas: a apostasia dos judeus-cristãos e o esfriamento do amor fraternal
cristão entres os crentes, especialmente pela demora do retorno de Cristo (evento que eles esperavam para aqueles dias), e
pelo desenvolvimento de diversas doutrinas e seitas heréticas. A hospitalidade e a simpatia dos crentes do primeiro século
foi a principal marca da Igreja. A própria palavra “cristão” foi criada originalmente pelo povo que, por testemunhar o amor dos
membros da Igreja, passou a chamar os crentes de “pequenos Cristos” (cristãos). Sem saber, alguns crentes haviam hospedado
anjos, assim como Abraão (Gn 18), Gideão (Jz 6) e Manoá (Jz 13).
aqueles que sofrem maus tratos, como não podem produzir qualquer benefício
se vós pessoalmente estivésseis sendo real para aqueles que neles confiam.5
maltratados.2 10 Nós possuímos um altar do qual não
4 Digno de honra seja o casamento en- têm direito de comer os que ministram
tre todas as testemunhas, bem como no tabernáculo.6
a pureza do leito conjugal; porquanto, 11 O sumo sacerdote leva sangue de ani-
Deus julgará os imorais e adúlteros. mais até o Santo dos Santos, como oferta
5 Seja a vossa vida desprovida de avare- pelo pecado, mas os corpos dos animais
za. Alegrai-vos com tudo o que possuis; são queimados fora do acampamento.
porque Ele mesmo declarou: “Por moti- 12 Por isso, para santificar o povo por
vo algum te abandonarei, nunca jamais intermédio do seu sangue, Jesus igual-
te desampararei”.3 mente sofreu fora da porta da cidade.
6 Por esta razão, podemos afi rmar com 13 Saiamos, portanto, ao encontro dele,
toda a segurança: “O Senhor é o meu fora do acampamento, levando conosco
Ajudador, nada temerei. O que poderá a mesma humilhação que Ele suportou.7
fazer contra mim o ser humano?” 14 Pois não temos na terra nenhuma ci-
dade permanente, mas buscamos a que
A vida dos discípulos de Cristo há de vir.
7 Lembrai-vos dos vossos líderes, que 15 Sendo assim, por intermédio dele,
vos ensinaram a Palavra de Deus; ob- ofereçamos continuamente a Deus um
servando-lhes atentamente o resultado sacrifício de louvor, que é o fruto de
da vida que tiveram e imitai-lhes a fé. lábios que confessam o seu Nome.
8 Jesus Cristo é o mesmo, ontem, hoje e 16 De igual modo, não negligencieis a
eternamente!4 contínua prática do bem e a mútua coo-
9 Não vos deixes influenciar pelas várias peração; pois, são desses sacrifícios que
doutrinas heréticas. Porque o mais im- Deus muito se alegra.8
portante é fortalecer o coração pela graça, 17 Sejais obedientes aos vossos líderes
e não por alimentos cerimoniais, os quais espirituais e submissos à autoridade que
2 A expressão grega original sõmati “em corpo” (pessoalmente) transmite a idéia cristã de Corpo de Cristo, ou seja, quando um
membro sofre todos sofrem, principalmente o próprio Cristo (1Co 12.26).
3 A impureza moral e a adoração ao dinheiro, bem como tudo o que ele pode comprar (poder e prazeres), são demonstrações
claras de que a pessoa que se deixa dominar por essas ilusões ainda não aprendeu a depositar sua plena confiança (fé) em Deus,
e, portanto, está longe da companhia amável e segura do Senhor e muito próxima da condenação eterna (Dt 31.6,8; Js 1.5; Lc
12.15,21; Ef 5.5; Fp 4.10-13; Cl 3.5; 1Tm 6.6-19). O cristão sincero, por causa da sua fé no Senhor, pode contar com o cuidado
paternal de Deus enquanto prossegue corajosamente, trabalhando e construindo seu futuro (Fp 4.11,12; 1Tm 6.8).
4 O autor de Hebreus exorta seus leitores a seguirem o discipulado ministrado e legado pelos homens de Deus que lhes
pregaram o Evangelho, mesmo considerando que tais pessoas já haviam passado (morrido). Contudo, Jesus Cristo – Deus e ser
humano – não está sujeito às mudanças causadas pela passagem do tempo e sempre será a Verdade. Questionar a supremacia
absoluta de Cristo, por que retarda sua volta ou qualquer outro motivo, voltando aos antigos rituais levíticos ou similares é sub-
verter o Evangelho (capítulos 5 a 10).
5 O autor de Hebreus se preocupa com as filosofias e doutrinas pré-gnósticas que estavam se conectando ao judaísmo e
pervertendo a fé de alguns cristãos, especialmente entre os judeus (9.10; 1Co 8.8; Cl 2.16).
6 O altar dos crentes é a cruz de Cristo, que marcou o fim de todo o sacerdócio arônico e sua substituição pela ordem de
Melquisedeque, da qual Cristo é o único e incomparável sacerdote. Os sacerdotes não podiam comer do sacrifício do Dia da
Expiação, porém todos nós somos convidados a participar da mesa do sacrifício (Santa Ceia) do Senhor, mediante simples e
sincera fé no Filho de Deus (Jo 6.48-58; Lv 4.12; 16.27).
7 O fato de Cristo ter sido levado e crucificado fora dos muros de Jerusalém, constituiu-se em mais uma viva ilustração do seu
sacrifício expiatório. Da mesma forma como a retirada dos corpos dos animais sacrificados para fora do antigo acampamento de
Israel simbolizara a eliminação do pecado, assim também, devemos todos avançar em direção à nova aliança, deixando para trás
o pecado e as tradições insuficientes do judaísmo ou de qualquer outra religião, ainda que essa atitude nos traga qualquer tipo
de desonra familiar, social ou cultural (Êx 33.7; Lv 24.14,23; Nm 12.14).
8 A expressão “sacrifício de louvor” é usada metaforicamente para evidenciar a nova ordem em Cristo: a doce obrigação de
vivermos gratos a Deus por nossa salvação eterna (1Pe 2.9; Rm 12.1; Fp 4.18) e o cuidado fraternal que devemos aos nossos
irmãos na fé. E, assim, estaremos cumprindo a verdadeira e pura religião que alegra o coração de Deus (Tg 1.27).
exercem. Pois eles zelam por vós como 21 Ele mesmo, vos aperfeiçoe em todo o
quem deve prestar contas de seus atos; bem a fim de que possais realizar a von-
para que ministrem com alegria e não tade dele, e opere em vós tudo quanto
murmurando, porquanto desta maneira lhe é agradável, por intermédio de Jesus
tal ministério não seria proveitoso para Cristo, a quem seja a glória para todo o
vós outros.9 sempre. Amém!10
22 Amados irmãos, rogo-vos, igual-
Recomendações finais e bênção mente, que aceiteis bem essa minha
18 Orai por nós, pois temos certeza de mensagem de encorajamento; porquan-
caminhar com a consciência limpa, e to, vos escrevi de forma resumida.
desejamos viver de modo honrado em 23 Desejo que saibais que o nosso irmão
relação a todas as áreas da vida. Timóteo foi posto em liberdade. Se ele
19 Pessoalmente, rogo-vos com insistên- chegar em breve, irei visitá-los em sua
cia que orem para que eu vos seja resti- companhia.
tuído o mais depressa possível. 24 Saudai a todos os vossos líderes espi-
20 Ora, o Deus da paz, que mediante o rituais, bem como todos os demais san-
sangue da aliança eterna trouxe de volta tos. Os da Itália vos enviam fraternais
dentre os mortos o nosso Senhor Jesus, saudações.
o grande Pastor das ovelhas; 25 A graça seja com todos vós!
9 A liderança espiritual nada tem a ver com a direção despótica de muitos governantes e empresários, mas o respeito sincero
e fraterno pelas autoridades eclesiais, bem como pela ordem, reverência e disciplina no âmbito da Igreja, são qualidades
estimuladas em todo o NT. Os guias ou líderes espirituais são pastores que zelam com todo amor e dedicação pelas ovelhas de
Deus. O ministério do bispo (palavra grega que no NT tem o mesmo sentido de “pastor” ou “ancião”) é supervisionar, isto é, “vigiar
com amor” (em grego neotestamentário episkopos) seus irmãos, como quem deve prestar contas ao Senhor. O pleno exercício
do pastorado tem implicações eternas e não se limita a esse mundo. O galardão (premiação) ou julgamento será definido no
futuro tribunal de Deus (Rm 14.10; Lc 12.42).
10 O autor de Hebreus escolhe a melhor expressão para encerrar seu sermão sobre a perseverança na fé em Cristo, e abençoar
seus leitores: “o Deus da paz” é o título do Senhor, muitas vezes usado nas bênçãos formuladas pelos valorosos homens de Deus
que, como nós, podiam descansar na paz do Pai (shabbãth), apesar de todas as provações (Rm 15.33; 16.20; Fp 4.9; 1Ts 5.23).