Você está na página 1de 9

See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.

net/publication/228460220

Pensamento estatístico: um componente primordial para o sucesso do


programa de qualidade seis sigma

Article · January 2004

CITATIONS READS

3 272

1 author:

Adriana Barbosa Santos


São Paulo State University
35 PUBLICATIONS   149 CITATIONS   

SEE PROFILE

All content following this page was uploaded by Adriana Barbosa Santos on 23 June 2014.

The user has requested enhancement of the downloaded file.


XXIV Encontro Nac. de Eng. de Produção - Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de nov de 2004

Pensamento estatístico: um componente primordial para o sucesso do


Programa de Qualidade Seis Sigma

Adriana Barbosa Santos (UNESP – PPG/UFSCar) adriana@dcce.ibilce.unesp.br


Manoel Fernando Martins (UFSCar) manoel@power.ufscar.br

Resumo
O uso dos princípios estatísticos para se estudar variação nos processos de manufatura teve
seu início nas primeiras décadas do século XX. Entretanto, mesmo com os avanços
conseguidos com a utilização de métodos e técnicas estatísticas como estratégia de melhoria
de processos e de solução de problemas em diversas áreas de conhecimento, ainda hoje, o
pensamento estatístico não é tão difundido no âmbito empresarial como um recurso eficiente
que leva a ganhos expressivos de melhoria do desempenho dos negócios. Com o surgimento
da abordagem Seis Sigma, o uso do pensamento estatístico e dos métodos estatísticos passou
a sinalizar oportunidades de ganhos financeiros advindos da melhoria de desempenho
organizacional. O Seis Sigma mudou o cenário competitivo ao resgatar os princípios
estatísticos e ressaltar sua relevância para conseguir incrementos significativos de melhoria
da qualidade, aumentar a produtividade e reduzir custos e, principalmente, diminuir as taxas
de defeitos definidos pelos clientes.
Este artigo traz uma fundamentação teórica e um conjunto de argumentos que mostram
porque o uso do pensamento estatístico é parte preponderante do sucesso do Programa de
Qualidade Seis Sigma.
Palavras chave: Pensamento estatístico, Seis Sigma, Melhoria de desempenho.

1. Introdução
A palavra “Estatística”, ainda hoje, provoca reações de temor em muitas pessoas que atuam
no âmbito empresarial. Essa temeridade criou barreiras que dificultaram a difusão dos
conhecimentos estatísticos nos ambientes de produção. Mais recentemente, com o surgimento
da abordagem Seis Sigma, as barreiras ao uso da filosofia estatística como estratégia para
melhoria de processos e para solução de problemas foram reduzidas.
O uso dos métodos estatísticos em ambientes de manufatura não é recente. Vários fatos
históricos demonstram o sucesso de sua utilização em pesquisa e desenvolvimento
(ISHIKAWA, 1985). Apesar disso, a Estatística vem sendo lembrada quase sempre ao nível
operacional, e sendo pouco utilizada como um recurso efetivo dos níveis gerencial ou
estratégico (BJERKE & HERSLETH, 2001).
Com o surgimento da abordagem Seis Sigma, o uso do pensamento estatístico e dos métodos
estatísticos passou a sinalizar oportunidades de ganhos financeiros advindos da melhoria de
desempenho organizacional. A literatura sobre o Seis Sigma enfatiza com freqüência o uso de
métodos científicos e, especialmente, dos métodos estatísticos (FINN, 1999; DALE et al.,
2000; HAHN et al., 2000; HAN & LEE, 2002; ROTONDARO, 2002). Entretanto, a
implementação do Programa de Qualidade Seis Sigma (PQSS) requer a aplicação, sobretudo,
do pensamento estatístico. Segundo Britz et al. (2000), o pensamento estatístico compreende
teoria e metodologia que auxiliam a identificar onde a melhoria é necessária, garantindo que
essa melhoria possa ocorrer em todos os processos. Assim, o pensamento estatístico é parte de
uma filosofia congruente aos objetivos de crescimento e melhoria do desempenho

ENEGEP 2004 ABEPRO 1426


XXIV Encontro Nac. de Eng. de Produção - Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de nov de 2004

organizacional, uma vez que seu uso cria oportunidades reais de mudança e aprendizagem. E
mais, em relação ao Seis Sigma, essa filosofia é o diferencial da conduta dos profissionais
engajados na elaboração de projetos que produzem ganhos financeiros tangíveis para a
organização.
Este artigo traz uma fundamentação teórica e um conjunto de argumentos que mostram
porque o uso do pensamento estatístico é parte preponderante do sucesso da implementação
do PQSS. Para expor o assunto, o texto está organizado da seguinte maneira: A seção 2
apresenta os elementos chave para compreender o que é o pensamento estatístico e fornece
subsídios para compreender como a organização pode tirar vantagens por aplicá-lo, tanto em
processos de manufatura, como em operações de serviços. Na seção seguinte, serão
apresentados aspectos gerais sobre o Seis Sigma, incluindo uma proposição de definição para
o Seis Sigma. A influência do pensamento estatístico na implementação do PQSS consta do
conteúdo abordado na seção 4. Finalmente, na última seção são feitas algumas considerações
com o intuito de salientar pontos que evidenciam a contribuição desse trabalho.
2. Pensamento estatístico
Os primeiros trabalhos que aplicaram o pensamento estatístico datam do início do século
XIX. Foi em torno de 1900 que o entendimento do pensamento estatístico começou a
influenciar o desenvolvimento do pensamento moderno. Já nesta época, a variação era o
principal fator estimulante dos estudos da estatística matemática moderna (PORTER, 1986).
A aplicação do pensamento estatístico para melhor compreender as variações nos processos
de manufatura foi introduzida por W. A. Shewhart no início do século XX. Shewhart foi um
dos precursores no uso das teorias de probabilidade e estatística no âmbito das aplicações
industriais. Nos anos 1950, W. E. Deming motivou o uso da estatística como um meio para
tentar mudar o desempenho dos processos.
A literatura traz algumas definições de pensamento estatístico mais focadas para seu uso nos
ambientes empresarias. Snee (1990, p.118) define pensamento estatístico como “... processo
de raciocínio que reconhece que variação está em tudo ao nosso redor e presente em tudo que
fazemos, que todo trabalho é uma série de processos interligados; e que identificar,
caracterizar, quantificar, controlar e reduzir variação fornece oportunidades de melhoria”. A
Quality Press (1996) apresenta em seu glossário de termos que o pensamento estatístico é uma
filosofia de aprendizagem e ação, e traz como princípios: (a) todo trabalho ocorre num
sistema de processos interligados; (b) variação existe em todos os processos; e (c) entender e
reduzir variação é a chave para o sucesso. Moore (1990), citado por Chance (2002),
propuseram alguns elementos centrais do pensamento estatístico. São eles: a onipresença da
variação; a necessidade de dados sobre processos; o planejamento de coleta de dados com a
variação em mente; a quantificação da variação; e a explicação da variação.
Como se pode ver, as definições apresentadas acima trazem a variação como um conceito
primordial para compor o pensamento estatístico. Muitas vezes variação e variabilidade são
termos usados com certa equivalência. Entretanto, essa intercambiamento conceitual nem
sempre é aplicado de forma apropriada. Variabilidade tem um sentido mais amplo, pois
abrange não somente a variação, mas a instabilidade e a falta de exatidão (acurácia). Assim,
ao se adotar variabilidade em lugar de variação em cada uma das definições consegue-se criar
um sentido mais abrangente para o pensamento estatístico.
A respeito da variabilidade, há de se considerar que ela estará sempre presente, entre
produtos, pessoas, serviços, processos, natureza, etc. O importante é tentar descobrir: O que a
variabilidade indica sobre os processos? Quais são as fontes de variação? Qual o
entendimento que se tem dos conceitos de probabilidade e estatística para se entender, estudar

ENEGEP 2004 ABEPRO 1427


XXIV Encontro Nac. de Eng. de Produção - Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de nov de 2004

e controlar a variabilidade? Uma estratégia que vise a melhoria de processos passa,


indiscutivelmente, pela definição de ações corretivas nos processos, as quais terão sua
eficiência amarrada às respostas dessas questões.
As variações podem ser inseridas num processo através de suas entradas típicas (inputs) ou de
atividades que transformam estas entradas em saídas (outputs). Essas variações podem se
originar em seis fontes distintas, segundo Britz et al. (2000): (1) Pessoas: por meio de
diferentes maneiras de fazer as coisas, diferentes estilos de aprendizagem, diferentes talentos
e habilidades; (2) Máquinas: por meio de equipamentos inconsistentes ou de várias partes de
equipamentos, cujo desempenho não é uniforme (apesar de se esperar que fossem); (3)
Material: devido à diversidade de fornecedores que supostamente compreendem as mesmas
entradas, ou mesmo da variação entre diferentes remessas de um mesmo fornecedor; (4)
Método: através de procedimentos mal elaborados ou inapropriados às fontes de variação; (5)
Medições: inabilidade de medir exatamente e precisamente as diversas saídas dos processos;
(6) Ambiente: tanto do ambiente físico como do ambiente de trabalho, nas políticas, e ações
administrativas.
O principal fator para se analisar as fontes de variação são os dados. Os dados são parte
crucial no estudo da variabilidade, pois, assim como são geradores de resultados, são
geradores de incerteza. Aos dados também são imputadas fontes de erros que interferem
diretamente na aplicação dos métodos estatísticos.
Embora a existência de dados seja fundamental para se estudar variabilidade, é importante
distinguir a diferença entre entender variabilidade e usar dados. Variabilidade existirá
independentemente da disponibilidade ou não de dados para estudá-la. Enquanto que os dados
são coletados para melhor entender a variabilidade. Mas para compreender tal diferença é
preciso medir.
Estatisticamente falando, a medição é a única forma de se efetivar a observação de um
fenômeno que apresenta variações. A medição efetiva a ligação entre variação e dados, seja
nos processos técnicos, nos de manufatura, ou nos processos não técnicos, como os
administrativos, de serviços ou de transações. Do ponto de vista operacional, a medição é
empregada para: monitorar/acompanhar a produção; controlar ou investigar um processo;
garantir a qualidade de produtos e processos de fabricação; garantir o atendimento às
exigências de metrologia e de especificações; evitar o desperdício; e reduzir a taxa de erros,
defeitos e falhas. Naturalmente, que para tanto é preciso investir, ou seja, a medição é um
investimento que a organização faz para se beneficiar das vantagens de poder monitorar e
responder às mudanças ambientais, sejam elas no ambiente interno ou externo à organização.
A figura 1 apresenta conceitos que definem a estrutura que representa a sinergia entre
pensamento estatístico e métodos estatísticos como catalisadores da melhoria da qualidade.
Para melhor compreender o potencial de cada um dos conceitos destacados é necessário
perceber que:
Sem uma visão de processo: as pessoas têm dificuldade de entender o problema real e de
como devem se comportar face às propostas de soluções; é difícil definir o escopo do
problema e descobrir causas fundamentais para a existência do problema; o gerenciamento é
ineficaz; e a melhoria é lenta;
Sem entender variabilidade: pode ser difícil separar causas comuns de causas especiais; o
entendimento do processo é dificultado; o gerenciamento do processo é ineficaz; a melhoria é
lenta; não há como dimensionar e reduzir as perdas; e a aprendizagem é lenta;
Sem medição: não há observação e nem como avaliar o desempenho dos processos em relação
às exigências dos clientes; não se percebe onde estão os pontos fortes ou fracos
(oportunidades e ameaças); não há como coletar dados;

ENEGEP 2004 ABEPRO 1428


XXIV Encontro Nac. de Eng. de Produção - Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de nov de 2004

Sem dados: todos acham que sabem o que está acontecendo; não há histórico; há maior
dificuldade em se justificar as ocorrências de falhas e de sucesso; não há análise estatística; e
a melhoria não acontece;
Sem métodos estatísticos: não há evidência e sim impressões; a redução da variabilidade é
uma dificuldade real e desestimulante; os diagnósticos acerca da estabilidade dos processos
são prejudicados, pois, os resultados são pouco consistentes; a melhoria é lenta; e a
argumentação gerencial e operacional é fraca.

Pensamento estatístico

Processos Variabilidade Medição Dados Melhoria

Métodos Estatísticos

Filosofia Análise Aprendizagem Ação

Figura 1 – Pensamento estatístico como catalisador da melhoria da qualidade de produtos e


processos (adaptado de Britz et al. (2000)).

O pensamento estatístico não está amarrado à necessidade de se usar ferramentas estatísticas.


Na verdade, o entendimento da abrangência do pensamento estatístico em níveis gerencial e
estratégico dá maior impacto e racionalidade às ações do que propriamente o uso dos métodos
estatísticos (HARE et al., 1995). Para Britz et al. (2000), o pensamento estatístico deve
anteceder o uso dos métodos e ferramentas estatísticas, posto que é conceitual, universalmente
aplicável e tem como requisito principal o conhecimento. Já os métodos estatísticos
fortalecem o pensamento estatístico ao fornecerem oportunidades de melhoria dos processos
como conseqüência da medição, coleta de dados e análise estatística. Muitas organizações têm
devotado esforços no sentido de disponibilizarem recursos para capacitação e treinamento de
pessoas sobre o uso apropriado dos métodos estatísticos como estratégia de melhoria da
qualidade e da produtividade. Apesar disso, a aplicabilidade dos métodos estatísticos ainda é
questionável em algumas situações. Duas razões principais para este questionamento foram
apontadas por Leitnaker et al. (1996). A primeira diz respeito à crença errônea de que os
métodos estatísticos sejam meios para promover a melhoria organizacional. Sobre este ponto,
embora o uso dos métodos estatísticos seja muitas vezes um recurso necessário, é
responsabilidade daqueles que gerenciam os processos definir os meios e onde será aplicada a
abordagem estatística. A segunda razão se refere à preocupação em treinamento de
operadores, supervisores e técnicos; como se a deficiência dos processos fosse ocasionada
somente por falta de preparo dos profissionais de nível operacional, e não por outros aspectos
que refletem problemas nos níveis gerencial e estratégico, ou seja, uma visão estatística
estreita de gerentes e administradores. Falhas na implementação da estratégia decorrentes da
não compreensão da visão e da estratégia, falta de alinhamento, limitações do sistema de
informações de marketing, utilização de medidas de desempenho pouco abrangentes, e
resistência à mudança de cultura são exemplos desses problemas.
Frente ao exposto acima, pode-se perceber que o pensamento estatístico fornece uma
abordagem mais holística para a melhoria, a qual é complementada pelos métodos estatísticos
que são pautados no uso de dados, na análise das fontes de variação existentes em processos,
produtos e serviços.

ENEGEP 2004 ABEPRO 1429


XXIV Encontro Nac. de Eng. de Produção - Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de nov de 2004

3. Seis Sigma
No início dos anos 1990, quando foram publicados os primeiros artigos sobre o Seis Sigma,
os autores demonstraram entender que o Seis Sigma era uma abordagem técnica, onde a
medição, uso da estatística e a meta de quase perfeição constituíam os pontos fortes da
abordagem (MITCHELL, 1992; TADIKAMALLA, 1994; BEHARA et al., 1995). Mas, com
o passar do tempo, novas visões foram sendo introduzidas e o Seis Sigma passou a constituir
um modo eficiente e eficaz das organizações conseguirem elevar seu desempenho. Para
compreender a abrangência do Seis Sigma recomenda-se a leitura dos textos de Harry &
Schroeder (2000), Eckes (2001), Perez-Wilson (1999), Pande et al. (2001) e Rotondaro
(2002).
Apesar da grande repercussão que o Seis Sigma gerou desde o seu surgimento ainda no final
dos anos 1980, pouco se tem feito no sentido de se identificar e incorporar novas teorias para
se estudar o tema. Na última década, grandes companhias no mundo inteiro adotaram o
PQSS. Entre elas aparecem Motorola, General Eletric (GE), Allied Signal, 3M, IBM, Dow
Chemical, American Express, DuPont, Toshiba, Eaton, Johnson & Johnson (SCHROEDER et
al., 2002).
As publicações acadêmicas recentes sugerem indicadores interessantes para identificar
elementos chave e diretrizes que definem o Seis Sigma. Uma tendência notória é a inserção
do Seis Sigma em assuntos ligados à gestão estratégica dos negócios. Coronado & Antony
(2002) definem o Seis Sigma como “uma estratégia para melhoria de negócios usada para
aumentar a lucratividade do negócio, eliminar refugo, reduzir custoda não qualidadee
melhorar a eficiência e eficácia de todas as operações ...”. Schroeder, et al. (2002) chegaram a
uma definição após reunir descrições de técnicos e administradores envolvidos com o PQSS,
a saber: “ Seis sigma é uma coleção de ferramentas estatísticas, um processo para melhoria,
uma linguagem comum e uma filosofia de negócio que se difunde na companhia inteira”. Para
Linderman et al. (2003), o Seis Sigma “...é um método sistemático e organizado para
melhoria estratégica de negócio, desenvolvimento de novos produtos e desenvolvimento de
serviços...”.
A literatura não tem demonstrado uma congruência tão evidente no sentido de formalizar
melhor a definição do Seis Sigma, talvez em sinal do aumento do escopo do Seis Sigma que
cresceu juntamente com o número de organizações que passaram a adotar o PQSS. Assim,
após analisar vários trabalhos publicados desde o início dos anos 1990, foi possível identificar
alguns elementos chave que levaram a proposição da seguinte definição:
Seis Sigma é uma abordagem que impulsiona a melhoria do desempenho do
negócio, baseando-se na aplicação do pensamento estatístico em todos os níveis
de atividades; no enfoque estratégico de gerenciamento; na valorização da
satisfação dos clientes; na utilização de uma metodologia sistematizada que
integre técnicas variadas para se avaliar e otimizar processos; na capacitação e
na mudança de cultura proveniente da aprendizagem.
Esta definição aponta temas essenciais que definem o arcabouço do Seis Sigma e que
contribuem para enxergar que o PQSS possui propriedades dos programas estratégicos e
também dos programas operacionais.

ENEGEP 2004 ABEPRO 1430


XXIV Encontro Nac. de Eng. de Produção - Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de nov de 2004

4. O Pensamento estatístico e o Seis Sigma


No contexto gerencial, os elementos centrais do pensamento estatístico estão intimamente
associados à obtenção e forma de utilização das informações, pois, quando Snee (1990)
destaca a redução de variação, a eliminação de causas comuns e especiais de variação, a
consistência de propósito e a robustez como elementos essenciais do pensamento estatístico,
deve-se considerar que o gerenciamento das informações sobre cada um desses elementos é,
sem dúvida, o fator de diferenciação entre administradores conscientes ou não dos princípios
fundamentais do pensamento estatístico.
Desde os anos 1980 o uso de métodos estatísticos vem sendo recomendado como um recurso
para o aprimoramento gerencial. Na interpretação de Deming, gerentes e administradores
deveriam se concentrar no ”como” a organização fornece produtos e serviços aos seus
clientes, em vez de ficarem obsessivamente preocupados com os ganhos financeiros e com o
controle gerencial. Em seu discurso, dirigido aos gerentes seniores, Deming era enfático em
afirmar que eles detinham a responsabilidade de gerenciar os meios, e não somente as
medidas de desempenho relativas ao controle contábil. Em suas considerações, por vezes,
Deming salientou que o objetivo do administrador de um sistema é o de otimizar o sistema
como um todo, a fim de proporcionar a satisfação dos stakeholders. Para isso, seria necessário
compreender os elementos da teoria da variabilidade, incluindo o entendimento do que é um
sistema estável e também da diferenciação entre causas comuns e causas especiais de
variação.
Coletar dados que gerem informações confiáveis e relevantes e que dêem suporte à tomada de
decisão é uma condição necessária na visão moderna do gerenciamento da qualidade em
qualquer ambiente organizacional. Nas organizações que adotam o Seis Sigma, a redução da
variação, a medição e a coleta de dados são premissas indiscutíveis para o sucesso do PQSS.
E ainda, se o pensamento estatístico é entendido e reconhecido como um aspecto primário
para a organização, aplicado em todos os níveis hierárquicos de atividades, ele contribuirá
para a criação e disseminação de uma gramática comum de comunicação, a qual favorece o
alinhamento estratégico, a integração e a mudança de cultura organizacional; dimensões
estratégicas que facilitam e aprimoram a implementação do PQSS.
Apesar da grande ênfase na redução da variação, a literatura que trata sobre o PQSS não
reforça a necessidade do pensamento estatístico como tema essencial, ou seja, como ponto de
partida para se pensar na implementação do PQSS. Com mais freqüência encontra-se estudos
que salientam o significado estatístico do Seis Sigma, juntamente com um enfoque dirigido
para a aplicação dos métodos estatísticos, ou mesmo, descrições das práticas empregadas
pelas organizações. Bajaria (1999) menciona este aspecto como uma falha nas discussões
sobre o tema.
Hare et al. (1995) apontam o foco em processos, o entendimento de variação e o uso de dados
para subsidiar ações como componentes chaves que deveriam ser desenvolvidas e usadas nas
atividades diárias de gerenciamento. Os autores ressaltam, ainda, que a tomada de decisão,
como reflexo das ações gerenciais baseadas em dados, é um princípio básico para enriquecer
o gerenciamento de processo e para melhorar processos. No Seis Sigma essa postura gerencial
é fortemente enfatizada. Para exemplificar, a lista de itens que segue traz algumas ações que
podem ser mais bem definidas com a aplicação do pensamento estatístico.
• Definir estratégias para melhoria do • Quebra de barreiras interfuncionais
desempenho organizacional • Monitoramento das flutuações de mercado
• Manter constância de propósito • Estímulo ao trabalho em equipe
• Aprimorar o planejamento • Tomada de decisões baseada em fatos e dados
• Reduzir o número de fornecedores • Aumento da robustez no gerenciamento

ENEGEP 2004 ABEPRO 1431


XXIV Encontro Nac. de Eng. de Produção - Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de nov de 2004

• Avaliar tendências competitivas • Melhorar os processos de distribuição


• Incentivar as pessoas a pensarem na • Reduzir variação nos processos
eficiência e eficácia das atividades administrativos e de fabricação.

Note que, os itens acima apontam, conjuntamente, ações em processos estratégicos, gerenciais
e operacionais.
Em cada um dos níveis de atividades (estratégico, gerencial e operacional) o pensamento
estatístico pode ser aplicado com características um tanto quanto distintas. O nível estratégico
tende a fazer um uso mais conceitual das idéias subjacentes do pensamento estatístico; o nível
gerencial cuidará da utilização do pensamento estatístico na implementação e gerenciamento
dos meios que possibilitam alcançar os objetivos estratégicos, principalmente para que as
atividades do nível operacional estejam em harmonia com a orientação estratégica.
Uma vez que o pensamento estatístico se torna um conceito disseminado em todos os níveis
de atividades, o aumento da qualidade vem como conseqüência de ações com consistência de
propósito e associadas a uma mudança de cultura organizacional. Essa mudança de cultura
pode proporcionar uma diminuição da resistência à utilização dos métodos estatísticos
imprescindíveis para compor uma metodologia sistematizada que leve a melhorar todos os
processos, eliminando defeitos, erros e falhas e otimizando os processos e suas saídas. No
PQSS as metodologias descritas pelas siglas DMAIC e DFSS têm tais características e são
utilizadas de forma sistemática para implementar os Projetos Seis Sigma, os quais são
implementados com o intuito de que sejam catalisadores da elevação do desempenho.
5. Considerações Finais
Este artigo contribuiu para mostrar que, na verdade, implementar métodos estatísticos em
diferentes produtos, processos, setores ou objetos pode não ser a preocupação mais relevante
para promover a mudança e aprendizagem que se espera alcançar com a implementação do
PQSS. As pessoas e seus níveis de aceitação e de compreensão dos princípios que norteiam o
pensamento estatístico podem ser uma das maiores barreiras para o insucesso do PQSS.
O sucesso do PQSS depende, sobretudo, da implementação dos Projetos Seis Sigma, mas,
para a efetividade deste propósito, é preciso que as pessoas estejam conscientes das metas de
longo prazo; de como as ações individuais contribuem para a realização dos objetivos
estratégicos; de haver uma direção comum; e, sobretudo, de se dispor de uma gramática de
comunicação que facilite o alinhamento estratégico. O uso do pensamento estatístico pode
garantir a existência dessa gramática comum que deve ser compartilhada por todos para que o
PQSS aja diretamente na base do sucesso nos negócios, isto é, na qualidade, na produtividade
e na redução de custo.
Considerando que, a competição no ambiente dos negócios é um fato; que para se manterem
competitivas, sobreviverem e progredirem as organizações precisam melhorar seu
desempenho; que a competição estimula a melhoria; que a taxa de melhoria determina os
ganhadores e os perdedores; que o pensamento estatístico ajuda a encontrar oportunidades de
melhoria; que o pensamento estatístico age em sinergia com os métodos estatísticos para
alcançar a melhoria; que a melhoria do desempenho é o objetivo central do PQSS, então, os
fundamentos e argumentos apresentados neste trabalho dão indicativos substanciais para
esclarecer que o sucesso do PQSS está fortemente associado à utilização dos princípios que
regem a filosofia do pensamento estatístico.
Referências Bibliográficas
BAJARIA, H. J. (1999) Six sigma quality: beyond hype. Multiface Publishing. Garden City, Michigan.

ENEGEP 2004 ABEPRO 1432


XXIV Encontro Nac. de Eng. de Produção - Florianópolis, SC, Brasil, 03 a 05 de nov de 2004

BEHARA, R. S.; FONTENOT, G. F. & GRESHAM, A. (1995) Customer satisfaction measurement and analysis
using six sigma. International Journal of Quality & Reliability Management. Vol.12, n.3, p.9-18.
BJERKE, F. & HERSLETH, M. (2001) Introducing statistical thinking to the food industry: facilitating and
inhibiting factors. QMJ. Vol.8, n.3, p.49-60.
BRITZ, G. C.; EMERLING, D. W.; HARE, L. B.; HOERL, R. W.; JANIS, S. J. & SHADE, J. E. (2000)
Improving performance through statistical thinking. ASQ Quality Press. Milwaukee.
CHANCE, B. L. (2002) Components of statistical thinking and implications for instruction and assessment.
Journal of Statistics Education. Vol.10, n.3.
CORONADO, R. B. & ANTONY, J. (2002) Critical success factors for the successful implementation of six
sigma projects in organisations. The TQM Magazine. Vol.14, n.2, p.92-99.
DALE, B. G.; WILLIAMS, R. T. & WIELE, T. (2000) Marginalisation of quality: is there a case to answer? The
TQM Magazine, Vol.12, n.4, p.266-274.
ECKES, G. (2001) A revolução seis sigma. Campus. Rio de Janeiro.
FINN, G. A. (1999) Six sigma in the engineering design process. Prescient Technologies, Inc.
HAHN, G.; DOGANAKSOY, N. & HOERL, R. W. (2000) The evolution of six sigma. Quality Engineering,
Vol.12, n.3, p.317-326.
HAN, C. & LEE, Y. (2002) Intelligent integrated plant operation system for six sigma. Annual Reviews in
Control, Vol.26, p.27-43.
HARE, L. B.; HOERL, R. W.; HROMI, J. D. & SNEE, R. D. (1995) The role of statistical thinking in
management. Quality Progress. Feb. p.53-60.
HARRY, M. J. & SCROEDER, R. (2000) Six sigma: the breakthrough management strategy revolutionizing the
world’s top corporations. Doubleday. New York.
ISHIKAWA, K. (1985) What is total quality control? The Japanese way. Prentice-Hall. Englewood Cliffs, New
Jersey.
LEITNAKER, Mary G.; SANDERS, Richard D. & HILD, Cheryl (1996) The power of statistical thinking:
improving industrial processes. Addison-Wesley Publishing Company. Massachusetts.
LINDERMAN, K.; SCHROEDER R. G.; ZAHEER, S. & CHOO, A. S. (2003) Six Sigma: a goal-theoretic
perspective. Journal of Operations Management. Vol.21, p.193-200.
MITCHELL B. (1992) The Six sigma appeal. Engineering Management Journal. Feb. p.41-47.
MOORE, D. S. (1990) Uncertainty, on the Shoulders of Giants. National Academy Press, p.95-173.
PANDE, P.; NEUMAN, R. P. & CAVANAGH R., R. (2001) Estratégia Seis Sigma. Qualitymark. Rio de
Janeiro.
PEREZ-WILSON, M. (1999) Seis Sigma: compreendendo o conceito, as implicações e os desafios.
Qualitymark. Rio de Janeiro.
PORTER, T. M. (1986) The rise of statistical thinking. Princeton University Press. New Jersey.
QUALITY PRESS (1996) Glossary and Tables for Statistical Quality Control. Quality Press. Milwaukee, WI.
ROTONDARO, R. G. (2002) Seis Sigma: estratégia gerencial para melhoria de processos, produtos e serviços.
Atlas. São Paulo.
SCHROEDER, R.; LINDERMAN, K.; LIEDTKE, C. & CHOO, A. S. (2002) Six sigma: old wine in new
bottles? (no prelo).
SNEE, Ronald D. (1990) Statistical thinking and its contribution to total quality. The American Statistician,
Vol.44, n.2, p.116-121.
TADIKAMALLA, P. R. (1994)The confusion over six-sigma quality. Quality Progress. Nov. p.83-85.

ENEGEP 2004 ABEPRO 1433

View publication stats

Você também pode gostar