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A Cultura da Convergéncia e a Narrativa Transmidia na Educacado a Distancia Paulo Roberto Montanaro, 1, Introdugao (1) A convergéncia esta chegando e é bom vocé se preparar; (2) A con- vergéncia é mais dificil do que parece; (3) Todos sobreviveréo se todos trabalharem juntos (JENKINS, 2013, p. 111). Convergéncia.' Nao nos € estranho © conceito que fomenta uma grande articulagao entre diferentes contetidos, espagos, tempos e, principalmente, pessoas em torno de um Unico ponto, mediado por dispositivos digitais. Todavia, 6 um tema ainda cheio de nuances, em que varias ideias se somam e, por vezes, se confrontam. Principalmente quando se aborda o campo da educagao e, mais especificamente, da Educagao a Distancia — ou sim- plesmente EaD -, em que as tecnologias educacionais de comunicagao informagdo sao elementos inerentes € praticamente indissocidveis da moda- lidade. No contexto atual, em que se presencia ativamente uma verdadeira transformagao na forma como nos relacionamos com 0 outro, com as tecno- logias, com a informagao e com o conhecimento, é fundamental que se pos- sa refletir sobre as potencialidades — e também sobre os desafios - que esse novo panorama social traz para os processos de ensino e aprendizagem. fem seu livro Cultura da Convergéncia, define 0 termo como “[.] fluxo Itiplas plataformas de midia, relacionado @ cooperagio @ 20 comportamento migratério dos publicos dos jase qualquer parte em busca das experiéncias de 1 Henry Jenkins, de contetidos através de mul entre multiplos mercados midiaticos meios de comunicagao, que va0 a qu entretenimento que desejam” (JENKINS, 2009, p. 29). agencias 0 | Educagdo a Distancia, Qualidade e Conversene 20 | Educagdo a Distancia, nao € so tratar de questées tecnicag : aqui a Sad pelos aparelhos ou softwares, mas =a a Stone a cultura participa: stica balizada dentro de um Pp: Pativa qh bem de uma nova esteth regue caracteristicas © Va lores da narrative e agreg! les a gamificagao de contetidggs e icas, dentre sivo' do sujeito ativo na constry. Desta forma, 2 propost assuntos pedagogicos medi. convergéncia midiatica 94 transmidia’ a praticas pedagégi 4 to imer: e estratégias didaticas, © engajamen PU tao as uie ses nereine iat a onhecimento & 40 colaborativa do c meio das multiplas linguagens, plataformas da a ia. Se 6 verdade que estamos em um pleno es oe se moe algo maior do que © surgimento de novas cr ee os digitais de acesso & informagao. A real Beste Peeeieale ea dado, principalmente, no modo como nos apropriam: Para pote! el mi n mundo. Assumind namos com o mundi 0 forma como nos relacio! ° $ | po da educagao, em suas diferentes é ue o cam| esse pressuposto, éessencial q| pet dimensées, possa também se renovar e incorporar o que de melhor ha nessa chamada sociedade em rede. : : Pode-se dizer que esses paradigmas socials emergentes tém se susten- tado nas diferentes ferramentas que surgem @ cada dia, seja na forma de novos dispositivos, seja como aplicativos ou softwares. Contudo, esta ané- lise sugere que as mudangas ou as Novas virtudes e problemas decorrem da tecnologia em si. Portanto, 6 importante que se busque compreender o fendémeno social que tange a criagao destas tecnologias e & rapida incorpo- ragao de vérias delas nas nossas tarefas pessoais e profissionais. Ultrapas- sou-se 0 momento em que o chamado Letramento Digital era diretamente 2 Anarrativa transmidia trata de uma construgdo narrativa que permeia a criagdo de um universo em diferentes linguagens, midias e plataformas, criando um sistema imersivo para uma relagao entre contetido, produtores e interlocutores mais proxima e envolvente. Ao longo do texto, 0 termo sera melhor desenvolvido. 3 Gomticasto & uma mancira de estruturar contetidos e dinmicas entre diferentes Su- jeitos a partir de conceitos presentes 5 3 hipertextual de meterais didticos, entre outras postiolidaddes ee eee 7 ‘as possibilidades. Em outr é uutras palavras, é uma forma de planejar um conteddo de forma a convidar o seu 9 seu desejo em se aprofundar naquilo, na vontade de ir além do que the é oferecido, 5 Segundo Santaella (2013), a ubiquidade sencialidade em diferentes es; z perene. Ou seja, e 'Pagos — fisicos ou virtuais — A Cultura da Convergéncia e a Narrativa Transmidia na Educacdo a Distancia | 21 relacignado a0 teinamento tecnico da utilizago de computadores e outros uispesitivos oriundos das tecnologias digitais. Mais do que saber como fun- ciona, tem-se que Se Preocupar com o porqué fazer funcionar. Para alem de uma simples compreensao tecnicista, 0 processo pelo ual a sociedade stual passa esta muito mais conectado as novas dinémicas WIS Que SuTgeM 28 partir do fendmeno da convergéncia, que nos leva a desenvolver outras formas de acesso a informagao e a criagdo compartithada do cenhecimento em rede potencializada pelo didlogo. Como em nenhum outro momento da historia, o poder de acesso e de construgao do conheci- mento esta se diluindo nos mais diversos espacos da sociedade. Neste caso, as bs nologias digitais $40 muito mais um sintoma do que uma causa do fendmeno, como afirmam Castells e Cardoso (2005) Nas sabemos que a tecnologia nao determina a sociedade: é a sociedade. A sociedade é que dé forma a tecnologia de acordo com as necessida- des, valores e interesses das pessoas que utilizam as tecnologias. Além disso, 3s tecnologias de comunicagao e informagao so particularmente sensiveis a08 efeitos dos usos sociais da propria tecnologia (CASTELLS; CARDOSO, 2005, p. 17). Qu seja, mais do que nos preocuparmos com a forma como as Tecno- togias Digitais de Informagdo e Comunicagao tém influenciado as dinamicas sociais, é essencial pensarmos nos processos que tém gerado a necessidade de desenvolvé-las e utiliza-las em nossas atividades individuais e coletivas, em especial no que tange aos processos educacionais. Se esse fluxo migratério — em que cada vez mais as pessoas se encontram nos espagos digitais — passa por uma mudanga comportamental, que se desenvolveu ao longo dos ultimos anos (principalmente a partir da popularizagao da internet no final do século passado), ele se expande exponencialmente ao explorar as caracteristicas da mobilidade e de um novo formato de nomadismo, transgredindo a forma como definimos a presencialidade para além da localizagao fisica e temporal. Como colocado, portanto, o simples acesso a computadores, internet, smartphones, tablets, oculos de realidade aumentada ou qualquer outra nova tecnologia nao significa, em si, grandes alteragdes ou mudancas em nossas relagdes. A inclusao digital, inexoravelmente, ndo esté relacionada somente a usar ou nao determinado equipamento ou recurso. Ainda que se possa iden- tificar um potencial educacional latente no acesso rapido e quase ilimitado a informagdes na velocidade e dinamicidade do didlogo e da comunicagao e nas diferentes linguagens possiveis pelos meios digitais, é preciso criar joa Distincia, Quatidade € © ‘onvergencias s esses elementos para Se atingir obje. ue exph 7 5. com 0 atual contexto, 4 plorem suag aprendizage™, 9 imersao € a participacgo Este é, possivelmente, o maior desafio que diferentes Ooese apres bres da educagao tem diante St compreender as neces pate riage convergencia & estabelecer estrategias G0 peda. es aspectos, 4 fim de comportar uma dialogici. rada pelas midias tradicionais, sempre Utilizadas cessariamente Como meio de estratégias de articulago ent? todo twos de aprendizagem coerente caracteristicas @ QUE favorecam 2 do conceito da e incorporem est explo nformagoes @ 40 Ne gogica qui dade até ent&o pouco como transmissao de | criago colaborativa do conhecimento Explorar esse potencial inerente na lagico, nem mesmo treinamento tecnico. Equipar escolas, centros culture universidades e outros espagos com computadores de ultima gerac3o e rita velocidade nao representa, em si, nenhuma sso a ser dado para garantir igualdade blico. Mas a inclusao digital, de feto, de algo para além da tecnologia e, desta forma, é fundamental que le fomentar uma leitura critica e criativa das lizagao das ferramentas de informagao e | que as estratégias de trabalno rincipalmente as mu- 0 é somente oferecer acesso tecno. conectados em redes de transformacao, ainda que seja um Pa de condigées estruturais para 0 seu PU carece se persiga 0 objetivo primordial d midias. As potencialidades da util cornunicacao sao inegaveis, mas é essencia aproveitem nao $6 essas especificagdes técnicas, mas P dangas sociais e comportamentais que as tornaram possiveis e presentes. E {ato que se tem presenciado uma grande revolugao social neste principio de sculo XXI. © passo seguinte é compreender essa realidade e converté-ia recursos educacionais, nos mais variados aspectos, tais como produgéo em de material didatico, atuagdo docente, gestao do ambiente educacional e estratégias para se alcangar objetivos de aprendizagem. Assim, a questao nado é como chegar & sociedade em rede, um autopro- clamado estagio superior do desenvolvimento humano. A questio @ neoriee 0s cantornos do nosso novo terreno histérico, ou sie omundo eager ate sera possivel identificar 0s meios através dos quas sjelse alee ind em contextos especificos, podem atingir os seus goede oe oli | valores, fazendo uso das novas oportunidades (CASTELIS; CARDOSO, 2005 ee tecnolégica da humanidade~ A grande questa sto, afinal, ndo é d " €a revoluga ‘i . dentemente de nossas vontades ou nsforgoesc Orns! = que ocorre indsPo maxi mM. re MO para nossos objetivos, Compreende: priieaeg aproveita-l 7 r as relacdes entre conteudos A Cultura da Convergéncia @ a Narrativa Transmidia na Educa a Distancia | 2 espagos e linguagens significa se apropriar delas para potencializar as for- mas de se ensinar e, principalmente, de se aprender. Nao é a listagem destes elementos, nem a centralizagao deles em um unico lugar fisico ou virtual, mas sim suas conexées, sua dindmica de funcionamento interno, sem perder de vista a participacao direta dos diferentes atores envolvidos, seus espacos e tempos. Uma cultura de convergéncia, portanto, nao & a reuniao de muitas coisas em um Unico lugar ou a aglomeragao de conteudo e informagdoes em um sujeito, mas sim o trabalho de mediacao entre tudo o que se coloca disponivel e os objetivos 3 serem alcancados. Isso significa transformar, portanto, o papel docente na educagao para algo além da transmissao de informa¢ées — isso se um dia ja foi assim -, para alguem com as habilidades de envolvimento e articulacao capazes de criar estrategias pedagégicas de media¢ao, a fim de uma meta estabelecida e que se aproprie, de fato, do potencial latente das tecnologias educacionais disponiveis, sejam elas digitais ou nao, para estabelecer sistemas dialdgicos e transversais de criag&o e construgao com seus alunos. Com cada vez mais recursos em dife- rentes suportes, espacos ¢ linguagens, é possivel planejar metodologias de ensino enriquecidas com os mais diversos elementos midiaticos, entre eles: filmes, animagées, jogos, imagens, simuladores, audios, aplicativos e tantas outras ferramentas de mediagao a serem utilizadas dentro e fora da sala de aula — inclusive a virtual, ampliando seu alcance e possibilitando uma reconfi- guracao do espaco de aprendizado, sem com isso sobrecarregar 0 aluno, pelo contrario, explorando capacidades e fungdes psiquicas que ele tenha desen- volvido ao longo de sua histéria, de sua trajetéria de vida, para surpreendé lo, envolvé-lo, promover o seu engajamento na propria experiéncia de aprendi- zagem e na construg3o do conhecimento. Em outras palavras, permitir que as caracteristicas especificas de cada linguagem, bem como a convergéncia de todas elas, potencializem forma e conteudo de materiais e orientagdes criados em consonancia com os objetivos de aprendizagem. 2. Midias na educacao e os novos paradigmas da convergéncia ‘adas na utilizagdo de diferentes objetos audiovisuais, interativos ou nao, em atividades curriculares dentro da sala de aula (seja ela presencial ou virtual) tem se tornado cada vez mais constan- tes. O uso de tais ferramentas nao é algo que possa ser considerado novo, j@ que, desde o surgimento do livro impresso, do telefone, do cinema, da internet e de tantos outros meios de comunicagao, ha indicios e relatos de Nos ditimos anos, iniciativas paut: pistancia, Qualidade e Convergencias 24 | Educagio af ais. Tampouco é dificil encontrar esty. dos acerca do tema dentro dos diferentes campos de pesquisa. Em 2001, Pfromm Neto ja relatava experiéncias audiovisuais no campo da educacao que datam do final do século XIX, coma introdugao da tecnologia cinemato. grifica no pais, passando pelo uso do rédio ja nos anos 1930 ¢ da televisio a partir, principalmente, dos anos 1970. A relagao, segundo ele, sempre pare- ceu bastante dbvia quando se ponderava 0 uso de objetos de aprendizagem em diferentes linguagens midiaticas na educagao sua utilizag3o em espagos educacion: [..] 6 fécil constatar a identidade existente entre educacéo e fundamentos da tecnologia da educa¢3o. Num primeiro nivel, essa identidade repousa no emprego de mais do que a presenga viva de ume pessoa que ensina = isto 6, a utilizagdo de registros impressos, sonoros € (ou) audiovisuais, de informacées, bem como equipamentos que, de um lado, possibilitam a multiplicagao das mensagens e, de outro, garantem a sua conservacao @ uso muito além do momento em que foram criadas. Num segundo nivel, algo mais sutil se incorpora a identidade aqui referida, pois o que se tem em conta ndo é apenas 0 acesso a meros registros documentais, mas @ exposigdo a materiais deliberadamente elaborados pars ensinar e aprender, obedientes a principios psicolégicos e pedagégicos de aprendizagem-ensino (PFROMM NETTO, 2001, p. 51). A novidade, reitera-se, nao é a expansao das tecnologias digitais como ferramentas dentro da sociedade nas mais diferentes atividades de cada um de nés, nem a utilizacao de materiais em texto, audio e video em processos de ensino e aprendizagem, nem mesmo a questo da conectividade e o estado permanente em rede. Tudo isso, em maior ou menor grau, ja foi visto, estuda- do e percebido em diferentes momentos. A questao primordial esta, funda- mentalmente, no fator de convergéncia e nas caracteristicas de imersividade inerentes as novas estruturas narrativas transmidiaticas, em que verdadeiros universos multifacetados podem ser desenvolvidos em diferentes midias, ar- ticulados de forma organica entre si e que possam fomentar a participagao ativa de seu publico, se apropriando da ubiquidade, da conectividade e do estado ndmade no qual nos encontramos. Entende-se convergéncia, portanto, como uma dinamica — linear ou nao ; = de contetidos por meio de diferentes plataformas, sisternas e dispositivos, definida pelo fluxo de circulagdo de seu publico por meio destes canais de comunicac3o e informacao. E importante entender, sobretudo, que a con- vergéncia nao se trata da estrutura tecnoldgica, mas sim de conexdes muito Mais complexas e profundas, criadas em um nivel cognitivo da percep¢a0 ACultura da Convergéncia e a Narrativa Transmidia na Educagao a Distancia | 25 da audiéncia, considerando seu estado ubiquo de acesso e navega¢ao den- tro de diferentes espacos fisicos e virtuais de modo intenso e participativo GENKINS, 2013, p. 111), Tao importante quanto a articulagao planejada e estruturada de conteudos nos mais diversos formatos e aspectos é a par tcipaseo, ativa de todos os diferentes sujeitos de forma imersiva nas suas relagdes com esse contetdo, ja que, nas palavras de Jenkins (2013, p. 111), “a convergéncia nao ocorre por meio de aparelhos, por mais sofisticados que venham a ser. A convergéncia ocorre dentro dos cérebros de consumidores individuais e em suas interagdes sociais com os outros” Desta forma, a convergéncia é uma caracteristica emergente das pro- Prias relagGes humanas e seu dinamismo social. Pressupée, portanto, o de- senvolvimento de habilidades e capacidades diferentes e complementares as que ja estao estabelecidas historicamente. Se, como dito, s6 0 acesso a essas novas tecnologias nao basta, é importantissino que se adquiram novas competéncias, que se desenvolvam novas fungdes psiquicas que pos- sibilitem, a cada um de nés, criar essas conexées no uso das mais diferentes ferramentas para nosso beneficio. A convergéncia, assim, se constitui em um novo recurso que transforma, e é transformada na nossa rela¢aéo com © mundo e, exatamente por isso, permite estabelecer novas competéncias e formas diferentes de lidarmos com o mundo a nossa volta. Desta forma, as questdes que surgem sao: Quais habilidades sao exigidas ¢ quais so igno- radas dentro dos processos de ensino e aprendizagem hoje na Educagao a Distancia (EaD)? Essas novas competéncias desenvolvidas a partir da conver- géncia e dos novos paradigmas sociais estao, de fato, sendo consideradas? E inegavel que, hoje, podemos encontrar diferentes tipos de leitores nos mais diferentes espacos sociais. A questéo € que, muitas vezes, ainda insistimos em planejar e estruturar cursos para um tipo deles, 0 mais seguro, aquele que Santaella (2013) chamou de leitor contemplativo, que fixe o seu lugar passivamente diante do contetido, seja ele textual, imagético, ou mesmo expositivo em uma sala de aula, ¢ que se relaciona com ele em uma dimensao primordialmente cognitiva. Pouco se explorou, inclusive, a audiéncia movente © aquele que possibilta o trnsito dentro de varias fontes de conhecimento -e a imersiva - que evolui das anteriores, em um movimento mais ativo e hiper- textual que prevé um fluxo nao linear por entre os diversos contetidos -, ambas resultantes das transformagées sociais que surgem a partir da revolu¢aéo industrial e do amélgama de estimulos audiovisuais cada vez mais presentes ‘em nosso cotidiano. No atual contexto, é preciso atentar-se a um novo com- portamento desse sujeito: a ubiquidade (ou a audiéncia ubiqua), capacidade 26 | Educacdo a Distancia, Qualidade e Convergencias entes sinais semidticos, sejam eles em espa. haver uma distinga0 clara entre uma coisa bilidades, novas capacidades nomadismo dessa nova de transitar por entre os difert g08 fisicos ou virtuais, sem mais e outta, fruto do desenvolvimento de novas hal psiquicas, que incorporam © ‘estado conectado e 0 sociedade em rede. in Com as novas dinamicas pelas quais Noss sociedade esta amie nos nci Ultimos tempos, essas novas habilidades - a se notar @ experiéncia do jogo e iquidade, 0 trabalho colabora- da performance, a navega¢ao nao linear, a ubiquidss Fee : tivo, 0 nomadismo, a inteligéncia coletiva, a cognicao distribuica, a atuagao multitarefa, entre outras — tem sido pouco ou nada aproveitadas nas relagdes educacionais tradicionais ou mesmo na Educagao a Distancia. S30 Ce cias que favorecem uma cultura participativa, segundo Jenkins (2009): ry student needs to acquire basic social g which reflect the demands and oppor- tunities of living in a participatory culture. (By 2 participatory culture, | mean one where most people have the capacity to take media in their ‘own hands and shape the circulation of ideas and images. We do not yet live in a fully participatory culture, to be sure, but our culture as a whole is now much more participatory than it was before the rise of networked computing.) UENKINS, 2013, p. 111).° At the most general level, eve skills and cultural competencie Reafirmando 0 papel essencial da mediag3o nos processos de ensino e aprendizagem, destaca-se, mais uma vez, a atuagao docente no desenvolvi- mento de estratégias, materiais didaticos e dinamicas de mediagdo capazes de satisfazer e até mesmo intensificar essa imerso. Na Educagao a Distancia, os fatores de tempo e espago, como amplamente desenvolvido nas pesqui- sas relacionadas a esse campo nas Ultimas décadas, sao obviamente deter- minantes no que tange a relagao entre os diferentes sujeitos envolvidos. Mas nao sao, definitivamente, os elementos que definem a modalidade. A forma de atuagdo de professores e tutores (nas suas mais variadas dinémicas que se diferenciam de acordo com a instituicao, a organizagao interna do curso e tantas outras particularidades) é determinante para que a EaD se estabeleca & De modo geral, cada aluno precisa adquirir habilidades sociais bisicas e competancias culturais que refletem as demandas e oportunidades de viver em uma cultura participa- tiva. (Por uma cultura participativa, quero dizer, aquela onde a maioria das pessoas tem 2 capacidade de ter a midia em suas préprias maos e moldar a circulagao de idelas € imagers. Ada nbs vivemos em uma cultura totalmente participativa, para ser sincero, gi sfeees curs cbmo um todo, é agora muito mais participativa do que era antes putacao em rede) (tradugo minha). ‘A Cultura da Convergéncia e a Narrativa Transmidia na Educagao a Distancia | 27 como uma forma viavel de se ensinar e se aprender, de se criar um campo linguistico comum a todos, para que essas relacgdes funcionem no maximo de seu potencial. Cabe agora a reflexdo sobre como criar condigées de fomento a esse envolvimento sinérgico dos diferentes sujeitos, do conteudo e dos objetivos de aprendizagem desejados. 3. Desafios e potencialidades da convergéncia na educagao Trabalhar com novos conceitos e dinamicas demanda do professor, tam- bém, uma nova abordagem na construgo de sua metodologia de ensino (ou na reconstru¢ao daquela ja existente). Adquirir novas percepcées de presen- cialidade e participagao dentro do ambiente virtual de aprendizagem, bem como formas criativas de se produzir e se apresentar os conteUdos didaticos, é sempre um desafio instigante. A ja citada gamificagao em processos de ensino e aprendizagem, por exemplo, trata da possibilidade de articulagao transversal de contetidos pautada na experiéncia de jogos, em que 0 avango do interlocutor esta diretamente relacionado ao seu envolvimento direto com co contetido e seus objetivos, pautando-se em sistemas de regras e de busca acompanhados de tensdo e recompensa. Se ha o potencial evidente e mais direto de premiar e criar sistemas de evolug3o, hd uma dimensao ainda mais complexa — e talvez mais proficua — de criagao narrativa ativa dentro do univer- s0 apresentado, apoderando-se das estruturas sofisticadas de engajamento e imersdo, inclusive no seu potencial nao linear e nas suas dinamicas de interagao. e cooperagao para alcangar metas, resolver problemas e superar obstéculos. Em outras palavras, trabalhar com um ensino gamificado nao ¢ simples- mente adotar sistemas de pontuagao, classificagao e de conquistas (ainda que esses elementos sejam bastante titeis se utilizados da forma correta). Sobre- tudo, é somar criativamente as potencialidades tecnoldgicas de convergéncia midiética em um desenho de mundo imersivo e os desafios para se superar as dificuldades impostas ao sujeito, a ponto de apoderé-lo dos instrumentos e capacidades de alcangar objetivos que Ihe sao, de fato, caros. Assim, 0 foco nao esté exatamente no desempenho académico, mas no empoderamento da responsabilidade de superar obstaculos. Para Massarolo e Mesquita (2013, p. 40), “[.] a gamificag3o segue regras que ajudam nas experiéncias que envolvam emocionalmente e cognitivamente o sujeito na construgao de sua identidade e posicionamento social diante de desafios cotidianos”. Ha, portanto, uma nova perspectiva de criagdo de estratégias ludicas e interessantes que envolvam o sujeito de forma mais agradavel, possibilitando e Convergéncias 28 | Educacio a Distancia, Quatidade e Conversene ancia direta de sua atua¢ao no desenyo}, que ele perceba uma importanc! rear Viren daquele universo, agindo diretamente com das estratégias narrativas 024) i bl : iS onista na solugao dos problemas impostos. a. cae Pe ee figuragso social de novos concuige diante dos desafios de uma nova configures: i ONCitos a, a 30, diante das novas estratégias de mediags, comnunicgsee ent id de novas tecnologi: vena novas fungées psiquicas se configurando, © : : Sis € lingua. lemandas so : gens que emergem como uma resposte ie a5 Socials dos pre, icacd le, a questao prios processos de comunicag3o da ace g GUE Se Coloca, mais uma vez, é a seguinte: as instituigoes escolares e equipes docentes estdo prontas para estabelecer pontes € serem partes efetivas e atuantes da sociedade em rede? iH ‘final, se 6 possivel afirmar que vivemios uma revolugao nas formas coma nos relacionamos uns com os outros e todos com a informagao € 0 conhe. cimento, como 6 que nossas j enraizadas metodologias de ensino estao preparadas para uma nova realidade? Estamos preparados dentro de um novo campo linguistico, onde as diferentes midias se relacionam transver. salmente e consideram a participacao ativa de sua eudiéncia? E imperative que as instituigées de ensino, nos mais diferentes niveis, sobretudo as que se fazem valer da Educagao a Distancia, estejam preparadas para, em esséncia, dialogar com seu publico. Bakhtin (1987) jd afirmava que, se os diferentes en- volvidos nao partilham de uma mesma base linguistica, 0 didlogo é inviével e certamente perde muito de seu potencial: Com efeito, é indispensavel que 0 locutor e 0 ouvinte pertengam a mes- ma comunidade linguistica, a uma sociedade claramente organizada. E mais, é indispensavel que estes dois individuos estejam integrados na unicidade da situag3o social imediata, quer dizer, que tenham uma relacdo de pessoa para pessoa sobre um terreno bem definido. € ape- nas sobre este terreno preciso que a troca linguistica se torna possivel; um terreno de acordo ocasional nao se presta a isso, mesmo que haja comunhdo de espirito (BAKHTIN, 1987, p. 70-71) Em outras palavras, o que esté sendo colocado é a necessidade de se trabalharem formas de didlogo e comunicagao entre os diferentes agen- tes dos mais variados processos de ensino e aprendizagem que diminuam quaisquer resisténcias ou obstaculos linguisticos e que possam impedir que esse agenciamento ocorra em sua forma plena. A interacao social mediada por meio das mais diferentes linguagens ~ sejam elas verbais ou nao — e SUas virtudes semidticas faz emergir todo um potencial semidtico enriquecedor “publico, ‘A Cultura da Convergéncia e a Narrativa Transmidia na Educagio a Distancia | 29 e absolutamente produtivo nas nossas. relagdes educacionais, desde que se consiga estabelecer um parametro comum para que o envolvimento dialégico se desenvolva, j& que “a linguagem nao resulta da diferenga semidtica, que nao pode gerar uma nogao satisfatéria de significado. Ao contrario, a lin- guagem so tem significado em razao das propriedades iniciais do seu uso” (BECK; GIDDENS; LASH, 1997, p. 234), A mediagao encontra na tecnologia digital (e seus multimeios de transi- tar) um espago infinito de caminhos dialégicos, que usufruam do potencial de envolvimento imersivo das novas estruturas narrativas a0 mesmo tempo em que tomem proveito dessa nova forma de nomadismo social. A informagao ea forma como ela percorre essas vias estabelecem atalhos que tém o poder de diminuir distancia tempo-espaciais, a0 ponto de dar-thes leituras diferen- tes das tradicionais. Nossos limites, portanto, nao so mais estabelecidos pela geografia ou pelo momento em que vivemos, mas sim pela capacidade de nos apropriarmos dos recursos existentes a fim de torné-los ferramentas de transformacao social Isto posto, o trabalho docente na EaD precisa romper com as tentativas de emulacao da sala de aula tradicional - que também ja nao consegue aten- der os diferentes tipos de leitor possiveis — e deve expandir 0 universo a ser tratado, buscando, na convergéncia de dispositivos, espagos e linguagens, seus meios para envolver seus alunos em sistemas de construgao colabora- tiva, imersiva e ativa do conhecimento. O potencial da ubiquidade em uma era de mobilidade traz consigo desafios que, ainda que estremegam alguns dos alicerces mais estaveis da atividede de se ensinar e se aprender, podem significar um grande salto pedagégico como nunca antes visto na historia da educagao. Os cuidados para que isso ocorra, entretanto, nao s40 poucos. Conhecer o seu publico e suas nuances torna-se ainda mais nevralgico no momento em que se planeja e se criam contetidos que sigam esse paréme- tro de convergéncia e a base linguistica a ser adotada. O campo da Educagao a Distancia, nesse sentido, apresenta certa vantagem se comparado a outras areas, visto que ha diferentes formas ja existentes de mapeamento e circunscrigéo dessa audiéncia, uma vez que, normalmente, as instituigdes de ensino, privadas ou publicas, possuem va- rios dados desses alunos, ou ainda instrumentos de coleta bastante efica- zes, Pode-se determinar, por exemplo, formagao escolar e académica deste faixa(s) etéria(s), conhecimentos prévios técnicos ou de contedo especializado, formas de acesso a contetidos digitais, infraestruturas fisica @ tecnolégica disponiveis, interesses coletivos e particulares, entre tantas i wergencias 30 | Educagio a Disténcia, Qualidade e Converts ibilitem 20 professor estruturer 948 dinmica dg para quem se destina esse planejamento, Dames. a se apoderar de tais informagoes e se Permitir um movimento de aproximagao, recon. realidade linguistica de seus alunos Uciobuehoegtpel a sae em diferentes niveis de outras informagoes Ue possi ‘ensino de forma coerente ma forma, o docente precis influenciar por elas, exatamente em ° figurando sua didatica, adequando-s0 4! : adaptando-se as especificidades 9 a conteidos e dinamicas que contemple™ rofundidade e desafio. ; i. © potencial de se criar e expandir conteudos por meio de diferentes po : tecnologias e linguagens 6, como defendido neste trabalho, enorme. Nag é surpreendente, portanto, que varias areas da cultura e do entretenimento sehen ; idades inerentes a essas caracteristicas ossibili tenham se aproveitado das pi e : da convergéncia e da mobilidade na criacao de narrativas cada vez mais com- plexas e distribuidas. Também nao é dificil, em um exercicio rapido de busca ha meméria (ou em outras bases de dados externas), encontrar exemplos de contetdos dinamicos, criados com base em televisdo, cinema, quadrinhos, literatura, videogames, sites e tantos outros espagos, direcionando partes desse universo narrativo sem necessariamente repeti-los em todas essas linguagens. Ao mesmo tempo, os desenvolvedores criam estratégias de interagdo ativa e constante de seu ptiblico com seu objeto em uma dinamica que possibilita a colaboracao direta e/ou indireta de suas comunidades com 0 canone estabelecido. Jenkins (2013) vai chamar essa estrutura multifaceta- da de narrativa transmidia. Em suas palavras, uma narrativa transmididtica € aquela que se desenrola através de mil- tiplas plataformas de midia, com cada texto contribuindo de maneira distinta e valiosa para o todo. Na forma ideal de narrativa transmidia, cada meio faz 0 que faz de melhor, a fim de que uma histéria possa ser introduzida num filme, ser expandida pela televisdo, romances e quadri- nhos; seu universo seja explorado em games ou experimentado como atracdo de um parque de diversées. Cada acesso a franquia deve ser au- ténomo, Para que néo seja necessério ver o filme para gostar do game, € vice-versa. Cada produto determinado 6 um ponto de acesso 3 franquia como um todo (JENKINS, 2013, p. 111). ih perie transmidia, portanto, nao é simplesmente a criagdo de contel ue é que podem ser reproduzidos e consumidos em dispositivos diferentes. A roposta é ~eta i : rE posta é outra —e téo mais interessante quanto complexa -, de se estruturat lentro de uma franquia de mi : idia um mosaico de contetidos independents: A Cultura da Convergéncia e a Narrativa Transmidia na Educacao a Distancia | 31 que se interconectam Por um universo multifacetado, mais amplo e rico, cada qual funcionando como uma engrenagem individual que, se conectada as demais, estabelece uma forma mais profunda de se experimentar 0 mundo criado. E um formato muito mais complexo de se criar e de se administrar, e que pressupde uma participagao direta e proativa de seu publico. Para se apropriar e vivenciar uma narrativa transmidiatica, 6 fundamental que 0 sujeito — individual ou coletivamente - assuma o ponto de vista de um verdadeiro investigador, procurando, escavando, problematizando e recrian- do a histéria em diferentes midias e plataformas e em uma reflexao critica problematizadora do contetido em suas mais diversas formas e em cons- tante movimento de troca com todos os envolvidos. A dialogicidade nada mais 6 do que o fator central na organizagao e na gesto de intrincadas e sofisticadas linguagens que possam encurtar as distancias espacotemporais. Mais uma vez, nao é na tecnologia, mas no movimento de transformagao do contetdo e do conhecimento que esta a transversalidade das narrativas. Como um exemplo dessa nova dinamica na criag3o midiética, podem ser citadas varias experiéncias no campo da cultura digital e do entreteni- mento. No seriado televisivo “Lost”,’ exibido nos EUA de 2004 a 2010 (e posteriormente no Brasil), por exemplo, havia varias camadas narrativas sendo exploradas. A série em si, dividida em seis temporadas e cerca de 100 episédios, tinha uma regularidade estabelecida e se tornou um fendmeno mundial pelos mistérios e pela organizagao nao linear de como a historia foi contada. A proposta do produto, portanto, j4 se pautava na criagdo de mistérios, na provocagao do puiblico, abrindo espacos para teorias e elucu- bragées. Criava uma relacao de desafio para a sua audiéncia. Em um mo- vimento consequente, 0 puiblico ndo demorou a criar féruns de discusséo, blogs, teorias e textos colaborativos sobre o que se passava na tal ilha mis- teriosa. Cada novo elemento previamente planejado que fora apresentado durante a série, desde uma equacao famosa até 0 livro que um dos perso- nagens estava lendo, todos eles poderiam ser aprofundados em pesquisas nos mais diferentes canais, mas principalmente na internet. Nao demorou que sites criados especificamente para o programa ~ com autoria da prépria produ¢o ou dos fas - surgissem aos montes pela rede. Logo apés a primeira 7. “Lost” foi um seriado de televisdo que consistia em um grupo de pessoas estranhas ‘entre si que se veem presas em uma ilha aparentemente deserta e que logo se encon- tram em meio a mistérios e segredos que vso sendo revelados ao puiblico aos poucos, ‘no £6 por meio de informagées presentes na exibicao dos episédios, mas também em ‘outros contetidos complementares presentes em diferentes midias.

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