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MODOS DE MORAR NO BRASIL DURANTE O SÉC.

XIX: E AS
TRANSFORMAÇÕES ARQUITETÔNICAS COM A CHEGADA DA
CORTE AO BRASIL.
TIPO DE TRABALHO: Ensaio

Integrantes do Grupo:
ALBRECHT, Betina
ARAÚJO, Tainá
DIAS, Kamilla
ESPOSTO, Larissa
FURTADO, Francisco Farley

Turma B; 2020.2
Profa. Priscilla Peixoto
taina.araujo@fau.ufrj.br
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Departamento de História e Teoria
Arquitetura no Brasil 2

INTRODUÇÃO E CONTEXTO HISTÓRICO

O presente trabalho tem como tema principal os modos de morar no Brasil do século XIX, tomando
como base de estudo o texto Quadro da Arquitetura no Brasil (1970) de Nestor Goulart Reis Filho.
Entende-se que a Arquitetura reflete um período histórico e o pensamento de sua classe
dominante, gradativamente assimilado pelos demais segmentos sociais. Nesse sentido, torna-se
fundamental traçar um breve panorama do contexto histórico do recorte temporal em análise.
Após analisar o texto de Goulart, escolhemos nos aprofundar na chegada da Corte portuguesa ao
Brasil, em 1808, através da análise de iconografias da época. Esse fato foi catalisador de diversas
transformações sociais e econômicas ao elevar a cidade do Rio de Janeiro momentaneamente a
capital do Reino de Portugal.

Os modos, ou as condições, de morar vão ser influenciados pelo traçado da cidade, pelo
planejamento e pela gestão urbana, pelos mais diferentes interesses econômicos, mas, por outro
lado, pelas necessidades cotidianas, pelos desejos de bem viver. Os estilos arquitetônicos
habitacionais vão mudar conforme a sociedade do século XIX se complexifica e novas classes sociais
vão surgindo. As edificações vão se diferenciando das construídas no período inicial do Brasil
colônia, se afastando dos moldes europeus.

NESTOR GOULART E SUA OBRA

Nestor Goulart Reis Filho, nascido em São Paulo, capital, em 1931, é arquiteto, urbanista, sociólogo,
historiador e atual professor de Arquitetura da Universidade de São Paulo1. Formado em
arquitetura pela FAU em 1955 e em ciências sociais pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras,
em 1962. Sua carreira de professor se inicia em 1956, como assistente na FAU/USP, atuando
também como pesquisador onde contribui, a partir de seus estudos, para o entendimento das
cidades brasileiras e seus problemas, analisando-as a partir dos séculos.

Como bibliografia deste trabalho, será usada a sua obra o Quadro da Arquitetura no Brasil (1970),
onde o autor aborda de forma clara as mudanças ocorridas no espaço urbano brasileiro e na
sociedade ao longo dos anos, desde o período colonial até o século XX. Nestor Goulart, faz uma
análise social, urbana e arquitetônica do passado histórico, o que faz com que seja possível traçar
paralelos entre o que se tem hoje na sociedade brasileira e o que já existiu no passado, assim como
as permanências do passado no hoje. Em resumo, são abordados pelo autor alguns pontos
principais sobre o desenvolvimento dos estilos arquitetônicos, como: neoclassicismo, ecletismo,
romantismo, neocolonialismo, entre outros. Assim como o autor trata, dentre outros temas, de
como eram feitas as representações nas edificações e sua forma urbana e como as mudanças na
sociedade refletem no modo de morar e na construção da cidade.

CRITÉRIOS E QUESTÕES DE ANÁLISE

O texto aborda em destaque, acontecimentos do século XIX que trouxeram as mudanças na


sociedade brasileira e no espaço urbano ao longo do tempo. Goulart traz uma análise urbana,
arquitetônica e principalmente social sobre como resultou a formação da cidade e dos costumes
de hoje. Além disso, o autor tem como objetivo relacionar as diferentes relações criadas entre os
modelos arquitetônicos e o cenário urbano ao qual estão inseridos, e fala sobre as complexidades
em relação aos espaços públicos e privados e entre propriedades e interesses coletivos.

1
Nestor Goulart Reis Filho. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras, 2020. Disponível em:
<http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa1949/nestor-goulart-reis-filho>. Acesso em: 31 de abr. 2021.

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Já ao destacar a relação entre a arquitetura urbana e o tipo de lote, o autor caminha para um tópico
importante que é a relação com a tradição arquitetônica europeia. Podendo até mesmo ser fixada
nas Cartas Régias ou em posturas municipais, as edificações eram construídas seguindo o
alinhamento das vias públicas e paredes laterais dos terrenos, com dimensões e números de
aberturas e alturas dos pavimentos iguais. A finalidade era garantir a semelhança com as cidades
portuguesas. Além disso, Goulart afirma que a arquitetura será mais facilmente adaptável a
transformações sociais e econômicas do que o lote urbano em si, pois para que este sofra
alterações também deve haver alteração no traçado urbano.

O autor aponta que a arquitetura residencial urbana era baseada em um tipo de lote e suas
características eram bem específicas. As tradições urbanísticas sofreram fortes influências da corte
Portuguesa, as vilas e cidades eram conformadas de maneira uniforme, sem exceções as
residências eram construídas sobre o alinhamento das vias públicas e as paredes laterais sobre os
limites do lote. Os jardins e casas recuadas foram concebidos mais para o final do século XIX. Essas
características aparecem principalmente nas cidades do Rio de Janeiro e Recife e são encontradas
casas térreas e sobrados até hoje nestas cidades.

Assim como o próprio autor cita em seu texto, a produção e o uso da casa baseavam-se no trabalho
escravo e com isso não haviam motivos aparentes para a mudança do layout colonial já existente,
onde a parte de serviços ficava aos fundos da casa ao passo que o ambiente social ficava voltado
para a fachada. Para ilustrar essa situação, o autor ressalta que a abundância de mão de obra
resultava em pouca revolução nos sistemas da moradia, dado que o abastecimento de água, o
escoamento de esgoto e o despejo do lixo, soluções de baixo nível tecnológico, eram
completamente baseadas no trabalho escravo.

A implantação das habitações no terreno se assemelhava com as casas coloniais do século anterior,
que apresentavam laterais avançadas até o limite do lote e com a fachada sobre o alinhamento da
rua. Elementos como telhados elementares, balcões de ferro batido e paredes grossas ainda eram
vistos nas edificações. Em suma, a habitação desse período tinha por característica a hierarquia
bem definida dos espaços entre o social e o privado, como nas casas coloniais.

Existiam dois principais tipos de habitação, os quais podem ajudar a descrever a relação do modelo
econômico com a arquitetura habitacional, sendo eles o sobrado e a casa térrea. As casas térreas
possuíam acomodações graduais entre a permanência e uso dos espaços, onde abrigavam,
respectivamente, os salões para o contato social, as alcovas, que eram espécies de aposentos
pessoais dos moradores, e as áreas de serviço banheiro e cozinha - que possuíam um acesso
totalmente restrito aos escravizados, todos entrelaçados e ligado por um corredor único e,
geralmente, centralizado cruzando toda a edificação. Não era diferente nos sobrados, onde os
salões térreos promoviam o espaço do comércio - ligação direta entre a fachada e a rua - alocando
as alcovas na parte superior da edificação. Apesar de poucas, uma das diferenças entre os dois tipos
de habitação consistia no tipo de piso, pois, enquanto o sobrado era coberto por assoalho, a casa
térrea era feita de “chão batido”. Esse detalhe diferenciava também os estratos sociais naquele
momento, dado que o “chão batido” representava pobreza. Ainda, como mencionado, o sobrado
reserva o nível térreo para lojas ou para os escravos, demarcando novamente uma outra diferença
econômica.

Um outro tipo característico de habitação do período colonial era a chácara. Situada na periferia
dos centros urbanos, utilizada pela população abastada, a tipologia solucionava a problemática do
abastecimento devido a monocultura brasileira, com a criação de animais e o cultivo próprio de
certos alimentos, algo que na cidade tornava-se cada vez mais difícil. A partir da segunda metade
do século XIX, as chácaras adquirem, cada vez mais, um caráter urbano, com a expansão da cidade.

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Até a metade do século XIX, observam-se poucas mudanças na produção habitacional brasileira.
No entanto, com a Missão Artística Francesa e o aumento da imigração europeia, existe uma
disseminação de costumes europeus. Com o progresso econômico e o avanço em cargos de
importância, os projetos encomendados serão diferentes dos da primeira metade do século XIX,
por incorporarem agora elementos da arquitetura neoclássica (em sua maioria, nos interiores, com
a adição de colunas falsas, pinturas nas paredes e objetos importados). Essa mudança é mais
percebida nas casas rurais, enquanto na cidade as alterações são mais observadas no ambiente
social agora no térreo. Ainda, observa-se o afastamento dos limites dos lotes, criando jardins
laterais e frontais, sob uma perspectiva sanitarista. A existência da Academia Imperial de Belas
Artes do Rio de Janeiro (1826) teria influenciado diretamente na adoção de padrões menos rígidos
de construção.

Percebe-se, então, o surgimento da casa de porão alto, que representa uma transição entre os
velhos sobrados e as casas térreas. Com o afastamento dos limites dos lotes, a entrada é transferida
para a fachada lateral e conservava-se uma pequena altura em relação a rua, provendo mais
intimidade para o andar térreo, agora com funções sociais. Apesar das mudanças, a divisão dos
ambientes permanece semelhante. As salas de visitas e almoço no térreo voltam-se para a parte
da frente, ficando as áreas de serviço para trás.

ICONOGRAFIAS

Como dito anteriormente, diversos acontecimentos históricos contribuíram para uma expressiva
mudança nos modos de morar e construir habitações no século XIX. A chegada da Corte portuguesa
ao Brasil, em 1808, foi escolhida por ser catalisador de diversas transformações sociais e
econômicas ao elevar a cidade do Rio de Janeiro momentaneamente a capital do Reino de Portugal.
Apesar de muitos terem retornado a Portugal após 18212, foram assinados diversos tratados
comerciais, como o tratado de Abertura dos Portos às Nações Amigas (1808), possibilitando a
chegada de produtos estrangeiros, antes não possível pela exclusividade com Portugal. A
importação de diversos equipamentos contribuiu para a alteração da aparência das construções,
principalmente nos centros urbanos litorâneos, ainda que respeitando o primitivismo das técnicas
tradicionais3. Mudanças estruturais e sociais também foram observadas, ao passo que se dá a
formação de um novo público com novos costumes, frequentador de exposições e eventos
culturais. As novas classes sociais, replicando costumes europeus, vão requerer novos edifícios que
condizem com seus novos estilos de vida.

Como citado por Goulart no texto utilizado como base para o presente trabalho, até o final da
primeira metade do século XIX, as cidades brasileiras, em especial a capital Rio de Janeiro e Recife,
seguiam os moldes europeus e portugueses4. De maneira generalista, a gravura pode ser
representativa de diversas cidades brasileiras nessa primeira metade do século, com suas
edificações alinhadas às vias públicas e fixadas, lateralmente, às construções vizinhas. Dimensões
e números de aberturas, assim como pé direito dos pavimentos eram frequentemente
padronizados. Como dito anteriormente, essas diretrizes seguiam os moldes das cidades europeias,
em especial as portuguesas. Característica essa que vinha sendo reforçada desde o início da
colonização em território brasileiro.

2 CAVALCANTI, Nireu Oliveira. A reordenação urbanística da nova sede da Corte. Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro, [s. l], n. 436, p. 149-199, jul. / set. 2007. Disponível em:
https://docs.google.com/file/d/1iwf0ZqxRFrcFmWAVH4hT6fhEqywpJoVMP2EqTWLyFULFAJwuei99R69qgPCz/edit.
Acesso em: 04 jun. 2021
3 REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2006. p.37
4 REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2006. p.34

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Alguns elementos explicitados por Goulart podem ser identificados na imagem (figura 1) em
análise. Os sobrados, tipologias comuns nos núcleos urbanos, que Goulart trata em seu texto,
possuíam tradicionalmente de dois a quatro andares. Entretanto podemos ver pela gravura que na
rua de Pernambuco retratada, alguns sobrados chegavam a até 5 pavimentos. As casas mais altas
possuíam aberturas laterais, mas, em sua maioria, por se encostarem no limite vizinho, apenas
possuíam aberturas na frente e atrás, característica negativa do ponto de vista higienista. As
aberturas laterais podem ser observadas em primeiro plano na segunda construção ao lado
esquerdo.

As alcovas eram planejadas nos pavimentos superiores, enquanto o andar térreo era reservado
para o comércio, para a loja dos animais ou para os escravos. Essa divisão demonstra ainda uma
forte dependência com o sistema escravocrata. Pela característica comercial no andar da rua, já
começam a ser observados sinais de infraestrutura urbana, com estreitos passeios que permitem a
circulação de pedestres de um comércio ao outro5. Outro elemento que começa a ser
implementado são marquises ou coberturas também estreitas, possibilitando a compra e venda de
mercadorias. Em primeiro plano percebem-se homens com trajes refinados que conversam na
calçada com alguém na entrada do sobrado., demonstrando uma possível atividade comercial no
térreo.

Outro elemento brevemente citado por Goulart e que pode ser identificado na imagem é o telhado,
e a evolução da quantidade de águas que pode ser percebida ao longo do século. Por se tratar de
uma ilustração da metade do século XIX, já se observam telhados de quatro águas, principalmente
em casas térreas, mas ainda predominam os telhados de duas águas, característicos dos sobrados
encostados nos limites do lote6.

Vale ressaltar, no entanto, que em seu texto, Nestor Goulart foca sua análise nos maiores centros
urbanos, em especial no Rio de Janeiro7. Dessa maneira, é difícil perceber diferenças visuais entre
as habitações do Rio e de Recife, por exemplo. A escolha da imagem, retratada na cidade de Recife,
Pernambuco, busca ressaltar essa lacuna, como, por exemplo, o fato de que os sobrados do Recife,
geralmente, eram mais altos que os do Rio de Janeiro. Sabe-se que essas duas cidades estavam em
regiões portuárias, sendo as influências estrangeiras semelhantes, porém, em se tratando de

5 REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2006. p. 42
6 REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2006. p.37 - 38
7 ARAGÃO, Solange. A casa, o jardim e a rua no Brasil do século XIX. Brasília: Em Tempo de Histórias,2008. p.155

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particularidades construtivas regionais, o texto de Goulart deixa um pouco a desejar. Atenta-se


também para o fato de o texto do Goulart não entrar em detalhes acerca da dinâmica interna
desses sobrados. Apesar de fazer algumas ressalvas sobre essas tipologias no Rio de Janeiro, pouco
é falado sobre como elas funcionavam em outras regiões do país.

Um dos aspectos que Goulart trata em seu texto diz respeito às casas de famílias abastadas que se
localizavam em áreas mais afastadas dos centros urbanos. Por isso, o trabalho busca uma imagem
(figura 2) que representa o surgimento de novos núcleos urbanos, que ocorre devido às diversas
mudanças estruturais ocorridas durante o século XIX. Dessa forma, o sobrado Solar Aguiar de Valim,
construído em meados de 1850 e localizado no antigo largo municipal do município Paulista de
Bananal8, representa uma nova tipologia que surge na transição entre a cidade e o campo. Um fato
não muito detalhado no texto de Goulart diz respeito ao isolamento das residências semi-urbanas
em relação ao lote e o cercamento destas por áreas ajardinadas que acabavam por qualificar a
paisagem9, o que pode ser notado na imagem analisada.

Além disso, destinavam-se seus salões a receber autoridades do império e à vida social da família
Valim, a quem pertencia o sobrado. Exibindo uma imponente frontaria com uma rigorosa simetria
na fachada principal, composta por dois corpos laterais margeando o corpo principal no eixo da
construção, e o ritmo repetitivo dos vãos e portas enfileiradas, a composição já sugere um gosto

8 Referência da Casa Senhorial


9 ARAGÃO, Solange. A casa, o jardim e a rua no Brasil do século XIX. Brasília: Em Tempo de Histórias,2008. p.156

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pelo neoclássico. Em seu interior o sobrado conta com um grande hall e murais feitos pelo artista
catalão José Maria Villaronga10.

Nestor Goulart foca sua análise nas tipologias dos centros urbanos e, apesar de descrever as
chácaras como tipo de transição entre a cidade e o campo, deixa uma lacuna em habitações de
pequenos núcleos no interior do país. Da mesma maneira, tendo em vista nosso enfoque nos
efeitos da chegada da corte portuguesa na produção habitacional, a falta de uma diversidade
regional em sua análise torna difícil o reconhecimento dessas transformações em edifícios, não só
nos centros urbanos, como já mencionado anteriormente, mas também naqueles que se
configuram fora desse contexto.

Construído em 1872, o Solar do Jambeiro, localizado na cidade de Niterói, apresenta características


das mudanças trazidas pela chegada da corte e é um exemplar notável da arquitetura residencial
urbana burguesa da segunda metade do século XIX11.

Essa imagem (figura 3) retrata uma residência da elite urbana carioca e podemos identificar
elementos citados por Goulart que aparecem no contexto brasileiro na segunda metade do século
e têm relação direta com a presença da corte na então capital do Brasil, Rio de Janeiro. Na imagem
nota-se que o acesso à residência é dado por uma pequena escada que soluciona o desnível entre
o interior da habitação e o exterior12, e também marcado por um pórtico ornamentado de ferro
fundido, o que demonstra a utilização desse novo material na arquitetura. Suas fachadas são
inteiramente revestidas por tapetes de azulejos portugueses que trazem diferentes padrões e
estampas. A fachada principal apresenta diversos ornamentos, de influência portuguesa como os
azulejos que emolduram as aberturas, janelas e portas, seus beirais que são constituídos por telhas
de louça pintadas à mão, provenientes do Porto13. Os guarda-corpos das sacadas e varandas, os

10 Referência da Casa Senhorial


11 REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2006. p.48
12 REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2006. p.40
13 A Casa Senhorial: solar do jambeiro. Solar do Jambeiro. S.D. Disponível em:
http://acasasenhorial.org/acs/index.php/pt/casas-senhoriais/pesquisa-lista/176-solar-do-jambeiro. Acesso em: 04 jun.
2021.

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pendentes, que circundam as varandas foram importados da Europa e refletem a influência da


Revolução Industrial inglesa no Brasil deste período14.

As janelas apresentam folhas de vidro com ornamentos com padrões de curvas nas bandeiras com
vidros nas cores verde e vermelho15, o que demonstra mais uma vez a substituição da madeira pelo
ferro que vinha ocorrendo na arquitetura do final do século XIX. Importante destacar também que,
diferente da imagem anterior, que também retrata uma residência de elite, o Solar do Jambeiro
apresenta na sua fachada principal janelas com peitoril alto e baldrames, o que permite uma maior
privacidade para aqueles que se encontram no interior da casa.

Apesar da imagem ilustrar os elementos identificados por Goulart em seu texto, questiona-se como
funcionavam esses tipos de moradia em outras regiões do Brasil que não contavam com a presença
física da Corte, mas que certamente sofreram algum tipo de influência tanto na sociedade quanto
na propagação de novas técnicas construtivas.

CONCLUSÃO

Como consideração final, é importante destacar que a chegada da Corte ao Rio de Janeiro pode ser
considerada como o grande motor para diversas mudanças que ocorrem no Brasil no século XIX,
desde econômicas a sociais, e que acabam refletindo diretamente nos modos de morar. A primeira
metade do século observa um mimetismo dos costumes habitacionais europeus, no que tange os
métodos construtivos, tecnologias, costumes e o planejamento das habitações. As vilas buscam a
semelhança com as cidades portuguesas. Em uma sociedade ainda profundamente ligada ao
sistema escravocrata, não se alteram as práticas antigas, ao manter hábitos de baixo nível
tecnológico e pouca eficiência.

Apesar de a abolição da escravatura ocorrer apenas no ano de 1888, a partir da metade do século
XIX já se percebe um declínio do trabalho escravo. Com a chegada de mão de obra europeia
assalariada, novas dinâmicas econômicas e sociais vão surgindo. A chegada da Missão Francesa e a
criação da Academia Imperial de Belas Artes, que surgem com a presença da Corte portuguesa em
solo brasileiro, possibilitaram também o surgimento de uma mais estética nacional, se afastando
levemente da arquitetura mímica europeia.

Como pode-se perceber, o presente trabalho tenta traçar um panorama geral dos modos de morar
no Brasil do século XIX seguindo o texto de Nestor Goulart como base. Entretanto, mesmo sendo
uma das principais referências em relação à Arquitetura Brasileira do século XIX, Goulart acaba se
prendendo a determinados aspectos em seu escrito, ao apresentar uma visão mais engessada de
análise do movimento, dando enfoque, mesmo que subjetivamente, à cidade do Rio de Janeiro.
Nesse sentido, o ensaio busca complementar as análises feitas por Goulart, dando um maior
destaque para como a presença da Corte portuguesa afetou a dinâmica e os costumes, não só no
Rio de Janeiro, onde se instalou, mas na maior parte do território brasileiro, de forma a melhor
entender como tais mudanças refletiram nos modos de morar.

14REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2006. p.37
15 A Casa Senhorial: solar do jambeiro. Solar do Jambeiro. S.D. Disponível em:
http://acasasenhorial.org/acs/index.php/pt/casas-senhoriais/pesquisa-lista/176-solar-do-jambeiro. Acesso em: 04 jun.
2021.

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REFERÊNCIAS

DE ARAGÃO, Solange. A casa, o jardim e a rua no Brasil do século XIX. Em Tempo de Histórias, [S. l.], n. 12,
2011. DOI: 10.26512/emtempos.v0i12.20061. Disponível em:
<https://periodicos.unb.br/index.php/emtempos/article/view/20061>. Acesso em: 6 jun. 2021.

DE ARAGÃO, Solange. Ensaio sobre a casa brasileira do século XIX. São Paulo: Blucher, 2011.

DOS SANTOS, Suellen. A casa brasileira do século XIX e seus desdobramentos na produção residencial de
Belo Horizonte: influência dos antecedentes coloniais e o papel do neoclassicismo e do ecletismo. Escola
de Arquitetura da UFMG, Brasil, 28 fev. 2011. Disponível em: <http://hdl.handle.net/1843/BUOS-8GKMUQ>.
Acesso em: 6 jun. 2021.

REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2006.

Nestor Goulart Reis Filho. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras, 2020. Disponível em:
<http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa1949/nestor-goulart-reis-filho>. Acesso em: 31 de abr. 2021.

Pernambuco Nº. 5. Rua do Crespo. In: Brasiliana Iconográfica, São Paulo: Brasiliana Iconográfica, 2017.
Disponível em: <https://www.brasilianaiconografica.art.br/obras/20168/pernambuco-n-5-rua-do-crespo>.
Acesso em: 01 de mai. 2021.

Salão de Baile no Solar Valim. In: A Casa Senhorial, Brasil-Portugal: A Casa Senhorial, Portugal, Brasil e Goa,
2010. Disponível em <http://acasasenhorial.org/acs/index.php/pt/casos-de-estudo/casosdeestudo/550-
salao-de-baile-solar-valim>. Acesso em: 01 de mai. 2021.

Solar do Jambeiro. In: In: A Casa Senhorial, Brasil-Portugal: A Casa Senhorial, Portugal, Brasil e Goa, 2010.
Disponível em <http://acasasenhorial.org/acs/index.php/pt/casas-senhoriais/pesquisa-lista/176-solar-do-
jambeiro> .Acesso em: 04 jun. 2021.

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