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Titulo I – Acção Ex: um automobilista que por causa de um movimento defensivo relativo a um

insecto que entrou pela janela orientou, subitamente o carro numa outra direcção e
1. Acção provocou um acidente. Temos aqui um processo global, cujo acto inconsciente é
explicável por processo de experiência comum, pelo que existe aqui uma acção.
. Trata-se de um comportamento humano dominado ou dominável pela vontade. Ex: A fica sem sentidos, desfalece e parte quatro jarras. Estado de inconsciência
Mesmo comportamentos negligentes, apesar de não relevarem do sujeitos e se não hávendo acção.
assumirem como desvios indesejados de uma direcção inicial, não deixam de ser
comportamentos voluntários controláveis, por assunção de uma posição diligente 3. Omissão
(art. 15.º CP).
O Prof. Roxin apela à Teoria Pessoal de Acção: expressão da personalidade, . Como diz o Prof. Eduardo Correia quando a negação de valores supõe a
abarca nela tudo aquilo que pode ser imputado a um homem como centro de acção produção de certo resultado, interessam as actividades que o produzem e as que o
anímico-espiritual. deixam ter lugar. Contudo, só deve ser equiparada à acção onde se possa fundar
uma relação de domínio ou de responsabilidade social institucionalmente
2. Comportamentos inconscientes e automáticos. indiscutível como bem jurídico.
. Em primeiro nível cabe distinguir acção de omissão:
. Posição do Prof. Strantenwerth: admite a existência de acção nos automatismos, a) Casos de compreensão natural das coisas.
independentemente de ai se encontrar uma intervenção da consciência, desde que
o processo global em que o acto se enquadra, seja explicável pela experiência e Ex: a mãe que mata o bebé administrando veneno no leite é um comportamento
acessível a uma dirigibilidade consciente. activo; por oposição a mãe que deixa o bebé morrer à fome traduz um
. Posição da Profa. Maia Palma: necessidade de se trata elemento ou estimulo de comportamento omissivo.
um processo global, imprevisível nos seus motivos externos, nas circunstâncias em
que o agente empreende a sua conduta (depende pois do grau de previsibilidade). b) Casos de duplo significado. Aqui a distinção entre acção e omissão
dependerá como diz o Prof. Stratenwerth da forma de criação do perigo
para os bens jurídicos tutelados pela norma: é acção sempre que ele criou

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o perigo com o seu comportamento e omissão sempre que com ele não a) Crimes impuros: resultam da fórmula do art. 10.º, n.º2 CP: «dever
haja diminuição do perigo. jurídico que pessoalmente o obrigue a actuar». Para se enquadrar aqui
uma omissão há que identificar um dever de garante sobre um sujeito,
Ex: A aconselha B a deixar de prestar auxilio necessário, nos termos do art. 200.º; que permite uma equiparação da omissão à acção, uma vez que a primeira
caso de comparticipação activa em delito omissivo. Trata-se de uma omissão. não está inscrita no tipo legal de crime. É pois necessário identificar e
Ex: Um nadador salvador embriaga-se para não salvar uma criança na sua praia; catalogar em concreto os deveres de garantia:
omissio liberare em causa. Trata-se de uma omissão. - Possibilidade física de acção: é necessário possibilidade física, técnica.
Ex: O pai de uma criança vai buscar um barca para salvar o filho que se afoga mas - Exigência de que, se a acção esperada tivesse ocorrido, o resultado não
desiste a meio; caso de tentativa interrompida de cumprimento de uma se teria seguramente produzido (comportamento lícito alternativo). O
imposição legal. Aqui o processo de salvamento ainda não atingiu a esfera da Prof. Jescheck afirma que se existe um dúvida razoável sobre se a acção
vitima e por isso é um omissão. evitaria o resultado, então teremos sempre que afirmar a não existência de
Ex: Um médico desliga a máquina de respiração de um doente; caso de imputação objectiva, ficando ressalvada a punição a título de tentativa. O
interrupção de técnica de tratamento. Aqui o processo de salvamento já está na Prof. Stratenwerth afirma por sua vez que só haverá imputação se a acção
esfera da vitima e temos uma acção. tiver pelo menos o potencial de diminuir o perigo para o bem jurídico. O
Ex: Um desconhecido desliga a máquina de respiração de um doente; aqui Prof. Roxin afirma que só não haverá imputação objectiva se a
estamos na presença de uma acção pois não existe em relação ao desconhecido um diminuição do risco aparece como possível num juízo ex ante, mas se
dever de tratamento que pessoalmente o obrigasse e que tenha sido violado. num juízo ex post também se afirmar essa consideração, então o resultado
já será imputado.
. Temos de distinguir entre crimes puros e impuros. O crime de omissão resulta de Se houver uma dúvida razoável sobre se o comportamento licito
uma violação de uma imposição legal de actuar, pelo que temos de determinar alternativo evitaria o resultado, então deve ser negada a imputação para o
quais os agentes que estão vinculados, ou seja, sobre quais recai um dever jurídico Prof. Figueiredo Dias (in dubio pro reo).
de levar a cabo a acção imposta. - Posição de garante: tem de assentar numa relação de confiança
susceptível de produzir efeitos jurídicos; tem de tratar-se de um concreto
dever que ligue o garante à protecção de bens jurídicos; tem de ser

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praticada a acção necessária ao evitar do resultado. Pode derivar da lei ou encontrem em relação de dependência. Também casais que vivam em união de
de contrato (teoria formal); de uma situação criada pelo omitente através facto têm dever de garante mútuo.
de acto ilícito ou lícito (ingerência); de situações de comunidade de vida e Ex: o nadador-instrutor que vêm substituir aquele que se obrigou a dar as licções,
de perigos; de situações de guarda de um bem jurídico concreto passa a ter dever de garante para com os alunos de natação, por assunção fáctica
(protecção contra todos os perigos) e situações de vigilância sobre uma de relação de confiança.
fonte de perigo (fiscalização de fonte de perigo determinada). Essencial é Ex: o alpinista que dirige uma missão na montanha assume deveres de garante
a ideia solidariedade social e de situações de esforço mínimo ou de para aqueles que nele confiam para os proteger e guiar pela montanha.
monopólio de meios de salvamento. Ex: o policia tem dever de garante, para com os bens do cidadão que necessita de
protecção.
Ex: o pai paralítico que vê o filho afogar-se na piscina, não tem capacidade física Ex: o médico que não pertence ao hospital está a passar no corredor, vê um doente
de actuar. com a máquina de respiração desliga, etm dever de garante, por especial estatuto
Ex: os pais que vêm o filho padecer de uma doença grave (com altas taxas de social e por a sua acção implicar um esforço mínimo.
mortalidade) e que não chamam o médico porque a possibilidade de este a salvar é Ex: não assume posição de garnte aquele que com a acção praticada se mantém
incerta. Neste caso, se se provar, ex ante, que o chamar do médico teria obstado à dentro dos limites do risco permitido, ou aquele ultrapassa esse risco, mas cuja«o
morte da criança em momento e circunstâncias idênticas, então o cumprimento do resultado não é consequência da sua acção, ou ainda aqueles casos em que a acção
dever teria servido para diminuir o risco e o comportamento seria imputável. A não cabe na esfera de protecção da norma (dever de obstar ao resultado por
menos que num juízo ex post se prove que o comportamento licito alternativo, em força de conduta anterior perigosa).
nada alteraria a situação. Ex: o empresário tem o dever de conservar as instalações da sua fábrica em
Ex: uma baby-siter que se obriga por contrato inválido a cuidar de um bebé, condições de segurança para os seus trabalhadores (dever de fiscalização de
assume posição de garante, não podendo invocar o fim do horário de trabalho, ou a fontes de perigo no âmbito de domínio próprio), só não sendo responsável em
invalidade do contrato para abandonar a vigia da criança. casos de auto-responsabilização.
Ex: Os pais têm dever de garante, contra todas as fontes de perigo em relação aos Ex: um passeante solitário num parque deve puxar uma criança que caiu num lago
filhos (art. 1874.º CC). Mas os filhos também o têm em relação aos pais que se e corre risco de se afogar, por ter o monopólio dos meios de salvamento.

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Ex: os pais ou os professores têm dever de garante perante fatos praticados pelos Titulo II – Tipicidade
filhos ou alunos, por deles emanar um sentido de auto-responsabilidade limitada.
Ex: Na sequência de um conflito de vizinhança, A incendeia, com intenção de 1. Imputação objectiva
destruí-la, e sabendo que ninguém lá se encontrava a casa de B. B ao chegar a
casa, tenta salvar os seus haveres e morre no incêndio. Temos neste caso uma . Trata-se de saber em que situações se pode considerar que certo dano é
omissão de B, que resulta em homicídio, no mínimo negligente. objectivamente imputável à acção que uma outra pessoa praticou.
. Cabe elencar as três teorias que permitem fazer a imputação objectiva:
b) Crimes puros: resultam da referência à omissão como forma de a) Teoria sine qua non: se eliminarmos mentalmente a conduta do agente e o
integração típica. Assim os arts. 200.º, 284.º e 190.º, n.º1 CP. resultado permanecer não haverá imputação objectiva.
b) Teoria da causualidade adequada: consiste em colocar mentalmente um
homem médio na posição do agente e ver se o resultado se mantém.
c) Teoria do risco: a imputação acontece em função do perigo para os bens
jurídicos. É o criar ou aumentar de um risco proibido que se materialize
num resultado que determina a imputação. A natureza do risco tem de ser
aferida ex ante, e o resultado ex post.
. O problema da teoria da causalidade adequada é que não consegue identificar o
concreto critério de previsibilidade, deixando nas mãos do julgador a definição do
grau de conhecimento do observador médio. Não distingue uma previsibilidade do
resultado em abstracto de uma previsibilidade em concreto relacionada com
deveres especiais do agente ou capacidades de prognóstico.
. As estruturas de imputação jurídica no Direito Penal não se determinam pela
eficácia do Direito sobre eventos, mas pela eficácia relativamente à não violação
de normas pelos cidadãos.

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Ex: Durante uma briga de namorados, B atinge A com um soco, pondo-a automóvel ganho por ela num sorteio publicitário, finge não ouvir os seus apelos e
inconsciente. Transportado ao hospital de emergência, A morre na sequência de deixa-a afogar. Pode a morte de B ser imputada à conduta de Abel e/ou Carlos?
um despiste provocado por óleo na estrada. a) haveria imputação; b) não haveria Caso de interrupção do nexo causal.
imputação; c) não haveria imputação. Quanto a A seria sempre imputado; e quanto a B também. Assim, a intervenção de
Ex: A dispara sobre C com o fim de matá-lo provocando-lhe ferimentos graves B interrompe o nexo de casualidade em relação a A, o qual seria punido a título de
susceptíveis de causar a morte. C é internado no hospital, vindo a morrer na tentativa. De realçar que se Carlos não tivesse posição de garante estaríamos
sequência dum acidente que lá deflagra. a) haveria imputação; b) não haveria perante uma omissão imprópria, a qual para o Prof. Silva Dias não interrompe o
imputação; c) não haveria imputação, contudo, haveria punição a título de nexo de casualidade.
tentativa de homicídio. Caso de causualidade hipotética. Ex: A e B, separadamente, deitam no café de C doses letais de veneno. C bebe o
Ex: A atropela B, que atravessava a passadeira, sendo certo que metros à frente ele café e morre. Imagine:
iria ser morto por uma derrocado de um prédio. Imputação objectiva a A pelo a) O veneno de A actuou em primeiro lugar; Para o A imputação objectiva
princípio da legalidade. Caso de causa virtual, que se distingue dos casos de (homicídio consumado), para o B tentativa de homicídio;
comportamento lícito alternativo, porque aqui a conduta que ultrapassa o risco b) Produzem os dois o efeito pretendido; Imputação objectiva aos dois por
permitido explica o resultado típico, e no comportamento alternativo, somente homicídio doloso consumado em autorias paralelas;
haveria imputação por força de uma causa virtual que relacione o comportamento c) Não se consegue determinar qual dos dois obteve o efeito pretendido (sabendo
com o resultado.. que foi uma dose que o matou); O Tribunal não conseguiria provocar qual dos dois
obteve o efeito, por isso deviam ser acusados os dois por tentativa de homicídio
Ex: A quer matar B. Para isso dissolve uma aspirina no interior da chávena de chá (princípio da inocência); Caso de causas paralelas.
que lhe servia. B acaba por morrer na sequência de uma raríssima alergia Ex: A e B planeiam separadamente, e desconhecendo cada um as intenções do
(desconhecida de A e de B) ao astil-salcídio. a) haveria imputação; b) não haveria outro, matar Carlos, usando o veneno X, do qual são necessários 4 gramas para
imputação; c) não haveria imputação, pois o risco criado pelo deitar da aspirina é provocar a morte. Abel ministra a Carlos 3 gramas. Horas depois Berta ministra
insignificante. um grama. Carlos morre. a) haveria imputação; b) não haveria imputação; c) não
Ex: Com intenção de afogar B (de 10 anos), filha do seu inimigo Carlos, A fura a haveria imputação, pois o risco criado não era passível de produzir o resultado
bóia com que aquela flutua no mar. Carlos que pretende suceder à filha num morte, pelo que haveria tentativa para ambos.

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Ex: Abel quer matar Carlos e ministra-lhe para tal 3 gramas do mesmo veneno de uma estrita ligação entre descrição do facto pela norma e o facto verificado Caso
X. Sabendo da actuação de Abel, Berta que também se quer ver livre de Carlos, comportamento lícito alternativo.
ministra-lhe uma grama. Carlos morre. B sabia que para aquela pessoa, naquelas Ex: A e B andam de bicicleta de noite, desrespeitando o Código da Estrada,
condições era necessária apenas uma grama para matá-lo. Haveria para o A circulam de luzes apagadas. A, que vai à frente é colhido por um automóvel e
tentativa (= resposta anterior), e para o B homicídio consumado. Sabia B, e sabe morre. Pode B (que ia atrás) ser acusada de homicídio negligente porque se fosse
um observador médio que tivesse observado a mesma cena. Caso de causalidade de luzes acessas iluminaria A e tornava-o visível? A norma do Código da Estrada
cumulativa. é relativo à própria pessoa. Não é a norma em relação ao tipo incriminador. A
Ex: Um grupo de soldados fuzila ilicitamente em pleno teatro de guerra, um norma serve para evitar riscos ao próprio veículo e não riscos para terceiros. Não
companheiro por força do carácter intolerável do seu comportamento. Em sua há imputação objectiva. Caso de não inserção do resultado no âmbito da
defesa, invocam estes homens, que caso não tivessem actuado, outros teriam norma de protecção.
levado a acabo o fuzilamento. a) haveria imputação; b) haveria imputação; c) Ex: O condutor de um camião ao ultrapassar um ciclista não respeita a distância
haveria imputação. Caso de causa virtual. lateral de segurança aproximando-se até 75cm do ciclista. Durante a
Ex: O director de uma fábrica de pincéis importou peles de cabra a uma empresa ultrapassagem o ciclista que estava alcoolizado gira o volante para a esquerda por
chinesa. Apesar de saber que os mesmos carecem de desinfestação, utilizou logo causa do álcool, caindo sob as rodas traseiras do reboque. Comprova-se que o
para fabricar pincéis. Em consequência disso, quatro trabalhadores foram acidente teria possivelmente acontecido mesmo que se tivesse guardado a
infectados com um bacilo. Segundo o relatório pericial, os procedimentos de distância lateral de acordo com as normas rodoviárias. a) haveria imputação; b)
desinfestação prescritos, teriam sido ineficazes contra esse bacilo, sendo certo que, haveria imputação; c) para o prof. Roxin como não se sabe se o cumprimento da
mesmo que os mesmos houvessem sido observados, os trabalhadores teriam sido distância seria ou não inútil, e o agente não cumpriu com deveres de cuidado, não
infectados à mesma. Os procedimentos eram ineficazes, porque aquele bacilo era diminui o risco portanto há imputação. Caso de causa virtual do comportamento
desconhecido na Europa. a) haveria imputação; b) haveria imputação; c) não licito alternativo, ou de processo causal acidental, alheio ao domínio da
haveria imputação, pois apesar de com a não desinfecção ter criado um risco vontade..
proibido, a verdade é que se tivesse adoptado o comportamento correcto, ainda Ex: A esfaqueia B, com intenção de matá-lo, provocando ferimentos ligeiros. B
assim, o resultado se teria verificado. Repare-se que a dúvida razoável exclui a não consulta um médico e resguarda-se em casa onde acaba por morrer meses
imputação na medida que a censura penal tem necessariamente como fronteira

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depois vítima de uma infecção provocada por esses ferimentos. Caso de 2. Imputação subjectiva
interposição da vitima através de autocolocação em perigo.
Ex: A aconselha B a atravessar um lago com gelo quebradiço. B, amante de . Trata-se da representação de uma situação objectiva na mente do agente
emoções fortes, aceita o desafio. B, ao atravessar o lago, o gelo cede sobre os seus (consciência e conhecimento da situação objectiva tal como ela se verifica). Trata-
pés e B mergulha na eternidade das águas geladas. Caso de auto-colocação em se da questão do dolo (“intenção de”). Para saber se um pessoa que matou
perigo, não havendo imputação objectiva, pois este caso está claramente fora do objectivamente outra o fez dolosamente, é preciso saber: se tinha conhecimento
tipo incriminador do homicídio. A resposta já não seria idêntica se B não soubesse que havia uma pessoa no sitio onde disparou; e se tinha a intenção de matar
que o gelo estava quebradiço, pois já não havia auto-colocação em perigo; (elemento volitivo).
Ex: A quer que B, barqueiro, o leve a atravessar o rio, durante uma tempestade. O . Elemento intelectual: necessidade do agente saber, representar como correcto a
barqueiro desaconselha-o, aludindo ao perigo, mas, perante a insistência do sua actuação. Pode ser uma representação errónea da realidade sobre um facto
cliente, A acaba por empreender à arriscada missão. Na viagem, o barco volta-se e típico ou sobre a punibilidade:
A afoga-se. Caso de hetero-colocação em perigo consentida (Prof. Costa
Andrade). Estamos fora do tipo incriminador do crime de homicídio; não há a) Erro sobre o facto típico
imputação objectiva, porque A entrou porque quis e sabia bem as condições em
que se encontrava (tempestade), havendo responsabilidade conjunta da decisão. . a1) Erro-ignorância: art. 16.º, n.º1, 1.ª parte; o desconhecimento tem como
Ex: A provoca por descuido, um incêndio em sua casa. B, bombeiro, ao tentar consequência o excluir do dolo, e eventualmente a punição a título de negligência
apagar as chamas, cai-lhe uma viga em cima e morre. Âmbito de responsabilidade se houver crime negligente previsto no CP (art. 16.º, n.º3 e 15.º).
alheia; não há imputação objectiva, pois estamos fora do tipo incriminador do
homicídio; Cai no âmbito da responsabilidade própria da actividade profissional Ex: A dispara sobre um homem mas pensa que é uma boneco. A desconhece a
do bombeiro; mutadis mutandis para outras categorias profissionais (ex: polícia). qualidade homem, pelo que será punido a título de negligencia, se o erro é
censurável.
Ex: A leva para casa um sobretudo do seu colega pensando que era seu (que é
igual). Trata-se de um erro ignorância. A desconhece que a coisa é alheia. O
elemento do tipo é desconhecido ou conhecido do agente. Artigo 16º/1 aplica-se.

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Não é punível pelo artigo 16º/3. Não há punição de furto negligente. (não há tipo seja, grau máximo de conhecimento (ex: conceito de notação técnica do art. 255.º,
incriminador). al. b)). Existem casos em que esta exigência é menor, bastando ao agente conhecer
Ex: Abel quer matar o cão de Carlos, seu vizinho, já que o bicho lhe dá conta das os pressupostos materiais do tipo (ex: conceito de ascendente do art. 132.º, n.º2, al.
galinhas. Como vê mal de longe dispara sobre o próprio Carlos, julgando tratar-se a)). Tudo depende da valoração aparecer como evidente.
do cão. Carlos morre – artigo 212º, n.º2 e 23º, n.º1. Erro de suposição quanto ao . Erro sobre a pessoa ou sobre o objecto: para ser excluído o dolo o erro tem de
cão e erro de ignorância quanto ao Carlos – artigo 16º, n.º1 e 3, 13º. Há norma incindir sobre o tipo. A individualidade não é, por regra, elemento do tipo de
incriminadora para o homicídio negligente – art. 137º. Tinha-se que ver se o erro crime, ou seja, se o objecto tem tipicamente as mesmas características então o erro
era censurável ou evitável ou não. O Prof. considerou que não era punível na não releva (ac. STJ 19/09/1985).
medida do art. 23º n.º3.
Ex: A mata B (ignorância) pensado que se trata de C(suposição). Erro sobre a
. Conhecimento dos elementos normativos: O tipo de ilicito é portador de um identidade do sujeito. O Erro não é sobre o elemento do tipo portanto não se aplica
sentido de ilicitude, pelo que o agente tem de representar sempre factos valorados o artigo 16º/1. É um erro sobre a identidade do objecto (da vítima). Não é um erro
em função daquele sentido de ilicitude. Quanto aos elementos descritivos do tipo relevante, logo é homicídio doloso.
não parece haver problemas (ex: mulher no art. 168.º; corpo no art. 143.º). Já Ex: Abel quer matar Carlos a tiro. Na verdade, julgando disparar sobre este, acaba
quanto aos elementos normativos, aqueles que só podem ser representados e por provocar a morte de D, irmão gémeo de Carlos e E, seu próprio pai. Quanto ao
pensados por referência a normas jurídicas se levantam problemas. Não se exige a primeiro há homicídio doloso consumado. Quanto ao segundo temos de ver se é
exacta subsunção jurídica dos factos na lei que os prevê. O agente tem de conhecer crime qualificado ou não. Tem que se submeter isto ao crivo do artigo 132º. Neste
o conteúdo do elemento, pelo que o desconhecimento da sua qualificação caso também há erro 16º, n.º1. Ele desconhece que a vítima era seu ascendente –
normativa (erro-subsunção) é irrelevante. Basta que o agente apreenda o sentido artigo 132º(2ª). De qualquer maneira, havia homicídio doloso simples.
ou significado correspondente, no essencial, ao resultado da subsunção (ex:
carácter alheio da coisa numa série de crimes patrimoniais dos arts. 203.º, 204.º, . Erro sobre o processo causal: trata-se de saber se qualquer divergência entre o
209.º, 212.º; pela qualidade de funcionário nos crimes cometidos no exercício de risco criado pelo agente, e aquele do qual deriva o resultado, deve conduzir a que
funções públicas no art. 372.º). Existem casos em que esta exigência é maior, no o evento não seja imputado ao agente e este só deva responder por tentativa. Este é
sentido de que o agente conheça os critérios determinantes da qualificação, ou o caso de interrupção do processo causal na imputação objectiva, tendo aqui

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relevância quando o acontecimento é imputado à conduta do agente. Assim uma
de duas: ou o tipo de ilícito é de execução vinculada e então o erro sobre o Ex: A pretende matar Carlos a tiro. Para dificultar as buscas aos polícias enterra o
processo causal é um mero erro sobre a factualidade e é claramente relevante; ou é seu cadáver. Na verdade, o tiro deixa Carlos moribundo. Este morre asfixiado
de execução livre e torna-se extremamente difícil figurar uma hipótese em que a quando A que julgando que o matou, o enterra. Só mata no 2º momento, pelo que
imputação objectiva, comandada pela conexão de risco, deva ser afirmada e, há acção dolosa no 1º momento (tentativa possível de homicídio) e no 2º momento
todavia, o dolo do tipo deva ser negado. há homicídio por negligência (Prof. Aguilar).
Ex: A planeia matar Carla, simulando o seu suicídio atordoando-a com uma
Ex: A dispara sobre B, representando a sua morte imediata, mas B vai para o pancada na cabeça e enforca-o para o afixiar. Carla morre logo com a pancada e é
hospital e só ai vem a morrer (há imputação objectiva). Se B viesse a morrer de já o seu cadáver que Abel a pendura. No primeiro momento temos homicídio
um acidente na ambulância, então não havia imputação objectiva, não tendo doloso consumado (dolo eventual). No segundo momento temos tentativa
relevância um hipotético erro sobre o processo causal. Imagine-se agora que A impossível por inexistência do objecto;
quer matar B e empurra-o de uma ponte abaixo para que ele morra de afogamento,
mas B alcança a margem do rio e vem a morrer por uma derrocada. O Prof. Roxin . Abratio ictus vel impetus: trata-se de um erro na execução, onde vem a ser
afirma que existe imputação subjectiva pelo palno do agente; já o Prof. Jescheck atingido objecto diferente daquele que estava no propósito do agente. A forma de
afirma que à imputação subjectiva por retroacção da vontade de A sobre o mundo distinguir as situações de erro percepção pois ai existe um só objecto em perigo,
das suas representações. ao passo que aqui existem dois objectos em perigo.

. Dolo generalis: o agente erra sobre um dos diversos actos em conexão de acção; Ex: A dispara sobre B mas, por imperícia atinge Cristóvão que circulava por entre
cronologicamente há dois momentos, penso produzir certo resultado com a minha a multidão na mesma rua. Ele tentou matar B mas mata C. Deve ser resolvido com
acção, mas ele não se produz; depois fruto de uma nova actuação este vem a concurso ideal de tentativa possível de homicídio e homicídio negligente. Há uma
realizar-se. O Prof. Jackobs resolve estes casos com atribuição de tentativa no identidade de objectos. Há concurso efectivo porque não se pode ficcionar o dolo
primeiro acto e negligência no segundo acto. A Prof. Maria Fernanda Palma quanto ao objecto atingido.
afirma que temos de saber se o quadro de riscos criados no segundo acto pode
reconduzir-se aos riscos do primeiro, e nesse caso teremos um crime doloso.

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. a2) Erro suposição: suposição errónea de aspecto que são elementos do tipo. Ex: Adolfo pretende matar um cavalo e apesar de apontar na sua direcção, mata o
Neste caso há que aplicar o art. 23.º da tentativa. tratador. A supõe que é uma pessoa e mata um cavalo logo temos, tentativa
impossível de dano e homicídio negligente (131º,16º, n.º1 e 3).
Ex: A quer matar B. Vendo um arbusto que se agita e, supondo que se trata B, Mas e se A supõe que é um cavalo e mata uma pessoa. Aqui teríamos tentativa
dispara na direcção do arbusto que se agita e que supõe ser B, tendo a bala se possível de dano e homicídio negligente; Como é possível o artigo 23º/3 não se
perdido no vácuo. Trata-se de um erro de suposição. O agente supõe erradamente aplicar? Houve aqui uma falha de execução.
a existência de uma pessoa. Inexistia a pessoa – se for manifesta a existência, a
tentativa não era punível. Se não for manifesta a inexistência de B a tentativa era b) Erro sobre a punibilidade/ proibição legal
punível de acordo com o artigo 23º/2 – artigo 73º/1 (atenuação especial
obrigatória). . b1) Erro-ignorância: art. 16.º, n.º1, 2.ª parte e 17.º. O conhecimento da
Ex: A vai o quarto de B com uma pistola com o objectivo de o matar. A dispara punibilidade do facto é necessário.
quatro tiros. Contudo, B já tinha morrido cinco minutos antes. Tentativa - Casos em que a relevância axiológica da conduta não é evidente: art.
impossível punida. 16.º, n.º1, o qual exclui o dolo (é o caso do crime de mera actividade),
Ex: A leva a sua pasta pensado que se trata da pasta do vizinho. Supõe o carácter excepto se o agente possui conhecimentos especiais, caso em que se deve
alheio da coisa, logo é erro suposição. Tentativa impossível de furto. aplicar o art. 17.º.
Ex: Abel quer matar Celso (erro-suposição). Na verdade, julgando disparar sobre - Casos em que a relevância axiológica da conduta for de tal modo
esse, dispara sobre a estátua de Cutileiro, destruindo-a. Ele pensa que está lá uma relevante que aparece como evidente aos olhos do agente, aplica-se o art.
pessoa – erro de suposição, logo é tentativa de homicídio impossível por 17.º (é o caso dos crimes materiais). Este é o erro sobre a ilicitude (não
inexistência do objecto – 13º, n.º3 e 131º. Ele não sabe que a estátua está lá – erro exclui o dolo).
de ignorância que contêm elementos do tipo (16º, n.º1) – exclui-se o dolo (art, 16º,
n.º3). Não há crime de dano negligente previsto no código portanto não se discute. Ex: Abel coloca à venda no seu recém adquirido supermercado, frango a um preço
Aqui há concurso de erros que não é claramente de erros (seria um concurso por kg não permitido por tabela legal cuja recente actualização é conhecida de
efectivo, porque decorreu da mesma acção) – mas não existe porque não há dano todos. Pode ser punido por especulação previsto no 35º/1 do DL 28/34 de 20 de
negligente portanto não há este tipo de concurso. Janeiro. Trata-se de um erro sobre a punibilidade, aplicando-se ou o art. 16º, n.º1,

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2ª parte ou o art. 17º. Ver se o desvalor axiológico resulta já da conduta Ex: A admirador de Picasso, rouba o quadro que está na leiloeira.
(independentemente de ser criminalizada ou não) ou se resulta esse desvalor do Ex: A mata o vigilante B como única forma de poder assaltar um banco
facto de esta ser criminalizadora. Neste caso é preferível aplicar o artigo 16º, n.º1, (homicídio dolodo intencional). Basta a conexão entre o facto prévio (matar o
2ª parte. vigilante) e o fim último da conduta (roubar o banco).
Ex:
b) Dolo necessário: a realização do facto sureg não como pressuposto
. b2) Erro-suposição: suposição de que um comportamento é punível e na para alcançar uma finalidade, mas como consequência necessária ou inevitável ao
realidade não o é. Crime putativo. fim da conduta.

Ex: B entrega a A um anel para ele guardá-lo. A apodera-se do anel e é acusado de Ex: A, agente da CI, tem como missão eliminar B. Para isso, coloca uma bomba
abuso de confiança (205º). A afirma julgar que praticou crime de furto (204º). no avião onde este se desloca, a qual vem a provocar a morte de B e a de 50
Pode ser condenado pelo primeiro? Trata-se de um erro que o agente faz na passageiros e tripulantes do voo, bem como de 450 passageiros e tripulantes de um
qualificação do crime que pratica. Não é um erro sobre o elemento do tipo de outro avião atingido numa turbina por um estilhaço proveniente do primeiro um
confiança – não é erro do artigo 16º, nem do artigo 17º (porque ele sabe que avião. Quanto a B temos dolo directo em 1º grau; Quanto às pessoas do avião
pratica um ilícito). temos dolo directo em 2º grau; Quanto às pessoas do outro avião não há dolo
directo nem mesmo dolo eventual (depende do agente se ter conformado com a
. Elemento volitivo: traduz-se na vontade dirigida à acção. Pode assumir ocorrência desse dano). Não há tão pouco negligência consciente. Assim teríamos,
diferentes configurações. de aplicar o art. 15º, n.º1, al. b) – negligência inconsciente (porque não exige
representação do agente.
a) Dolo directo: a realização do ilícito é o fim da conduta ou surge como
necessário para o objectivo. Nunca são necessários ao dolo quaisquer actos de c) Dolo eventual: caracterizam-se em primeiro pela circunstância do
consciência reflexa (não é necessário eu pensar em cada momento, basta uma ilícito aparecer ao agente como consequência possível da conduta. Difícil é a
consciência marginal, “o saber premamente acompanhante”). distinção da negligência consciente, pelo facto de também nesta figura se supor
uma representação da realização típica como consequência possível da conduta

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(art. 15.º, al. a)). O Prof. Eduardo Correia vê o dolo eventual como facto do Ex: A tem sida e mantém relações sexuais com B sua mulher. A representa a
agente não actuar confiando em que o resultado não se verificará. É uma ideia transmissão do vírus como possível (ofensa à integridade física ou mesmo
errada por consistir em privilegiar os optimistas. Para distinguir este da homicídio). Medicamente existe um probabilidade de infecção de 1% em cada
negligência usa-se o critério do tomar seriamente me conta a possibilidade de risco contacto sexual. O Prof. Figueiredo Dias diz que não existe aqui dolo eventual
para o bem jurídico, ou seja, que o agente entre com ele em conta (confromação). porque o agente não toma a transmissão como possibilidade real, mas como mero
perigo abstracto.
Ex: A, faquir pretende demonstrar a um mundo céptico e cínico, a excelência das
técnicas de faquirismo. Para tal, enterra Eva, sua mulher esperando que ela viva, . Dolo eventual/alternativo Vs abratio ictus:
fazendo uso da sua ancestral sabedoria. Quando Eva é desenterrada consta-se que
já é cadáver. Quanto à morte de Eva tarta-se de Negligência consciente (a vida da Ex: A dispara contra B a uma curta distancia. B vai com a namorada C, a qual é
mulher fica secundarizada perante o objectivo) - FDias “teoria da conformação”. morta invés de B. Ora aqui, dado a curta distância é fácil perceber que o agente
Para a Prof. Fernanda Palma haveria dolo eventual pois A tem de levar seriamente terá de ter representado a morte de C como possibilidade da sua acção, e
em conta a lesão do bem vida da mulher. conformou-se com isso.
Ex: A aposta que consegue atingir a medalha que C, criança tem na mão, sem a Ex: mando uma caixa de bombons envenenados para casa de R, para a matar. No
atingir. A está consciente de que pode errar mas espera que isso não aconteça. primeiro caso, B carteiro, que faz a entrega, come-os. No segundo, R recebe os
Mesmo que A sinta como errado a sua actuação, ele considerara-a um mal menor, bombons e dá a todos os familiares que tão em casa, e morrem todos. Na primeira
que se dispõe a aceitar. versão é claramente abratio ictus, mas no segundo é dolo eventual.
Ex: A e B decidem roubar C, apertando-lhe o pescoço com uma corrente de couro Ex: A tem um pato e um homem à sua frente e dispara:
para ele desmaiar. Propondo-se evitar a morte de C, que representaram como a) Acertou no homem - homicídio doloso consumado;
possível, resolveram golpeá-lo na cabeça com um saco de areia que no entanto b) Acertou no pato – há dano;
rebenta. Assim, voltam a usar a corrente de couro e matam C, procedente depois a c) Acertou em ambos – há dolo alternativo;
uma tentativa de reanimação. A morte de C não era o objectivo, mas isso não os d) A bala passou no meio de ambos – há dolo alternativo.
impediu de usar a corrente, pelo que A e B levaram seriamente em conta a
possibilidade de matar C, pelo que existe dolo eventual.

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Deve aplicar-se por analogia o regime da tentativa (art. 38.º, n.º4). Repare-se
Titulo III – Ilicitude aplica-se não a pena da tentativa (com o facto a ser punido mas com pena
especialmente atenuada) mas o regime da tentativa em bloco (art. 23.º só sendo
. A unicidade da ordem jurídica deve ceder perante normas que permitem uma punido se a pena é maior de três anos). Assim A seria condenado com a pena
conduta, como por exemplo, uma causa de justificação da ilicitude. A justificação aplicável ao homicídio doloso (art. 131.º)
é concedida perante interesses juridicamente preponderantes.
. Exige-se sempre a existência de pressupostos subjectivos e objectivos para a Este regime não deve ser aplicado às causas de justificação onde a
presença de um causa de justificação. justificação seja constituída somente pela prossecução de um fim
determinado. Nestes casos a ilicitude constitui-se logo que a conduta
a) Elementos subjectivos: pergunta-se se uma situação de justificação seja levada a cabo sem que sem que esteja motivada pela prossecução
deve estar na dependência de um certo estado de vontade e de do fim. Faltando esta não pode sequer falar-se em substrato objectivo
conhecimento. Uma perspectiva puramente objectiva é afastada pela que esteja na sua base.
própria lei uma vez que a doutrina e a jurisprudência tem requerido
um animus defendendi. Estes servem essencialmente para Ex: deve ser punido com sequestro o policia que detém um mero suspeito com
caracterizar, a falta do desvalor da acção. outra intenção que não seja a identificação (art. 29.º, n.º3, al. g) CRP).
Quem desconhece a situação objectiva que conduz à justificação
actua com um desvalor de acção em tudo equivalente, do lado b) Elementos objectivos: apresentam a virtualidade de excluir o
subjectivo, ao autor de um facto típico relativamente ao qual não se desvalor do resultado. Tomamos aqui a hipótese inversa do que
verifica qualquer situação de justificação. dissemos acima, havendo elementos subjectivos mas não os
objectivos, ou seja, um caso de justificação putativa ou erro sobre os
Ex: A mata B, mas não sabe que B está a apontar uma arma a C e que por isso está elementos justificadores. Será que o agente deve ser punido a título
em legitima defesa. Temos um desvalor de acção, sem desvalor de resultado. O de dolo ou negligência. Devemos aplicar o art. 16.º, n.º2 e em
Prof. Figueiredo Dias afirma que esta é um situação em tudo idêntica à da princípio exclui o dolo. Mas fica fundada a punição a título de
tentativa: nesta persiste um desvalor de acção mas falta um desvalor de resultado.

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negligência se o agente podia ter procedido a uma comprovada por um desvalor do incumprimento por acção e desvalor do resultado. Para se
comprovação dos factos (art. 16.º, n.º3). excluir a ilicitude é necessário compensar o desvalor da acção (através do
elemento subjectivo) e o desvalor do resultado (através do elemento objectivo).
Ex: A aponta um arma a B e diz, a vida ou a bolsa!!! B saca da sua arma e mata A, Logo temos de aplicar analogicamente o regime da tentativa.
verificando-se depois que A é um pândego que gosta de pregar partidas. Caso de b) E se A tivesse atingido B ao limpar a pistola na janela. Crime de homicídio
erro intelectual. negligente (137º). O desvalor da acção do crime negligente é diferente do valor da
Ex: o médico interrompe a gravidez de A por haver uma doença que lhe põe em acção do crime doloso (não é tão intenso no primeiro). Aqui o desvalor da acção é
perigo a vida em conjunto com a gravidez. Vem-se a descobrir que tinha sido um o incumprimento do dever de cuidado. Aqui o agente ficaria impune (compensado
falso diagnóstico. Caso de erro intelectual. o valor do resultado deixa de haver matéria punível). Temos objectivamente
Ex: A pensa que a eutanásia é uma causa de justificação e por isso põe fim à vida legítima defesa e subjectivamente não temos.
de B, doente em estado terminal. Caso de erro valoração (falta de consciência do c) E se A conhecer da iminência de agressão de B a Colombo, tivesse aproveitado
ilicito). O Prof. Figueiredo Dias parece aqui apontar a aplicação do art. 17.º? da situação para se desembaraçar da primeira. Objectivamente e subjectivamente
há legítima defesa. Basta o conhecimento da situação justificante (como elemento
. Efeito das causas de justificação: exclui a ilicitude do facto, permite ao agente subjectivo) – não é necessário a intenção de defesa, porque é difícil determinar o
actuar dentro de um espaço livre de direito. Por outro lado uma causa de exclusão “animus” de qualquer pessoa – legítima defesa está preenchida 32º.
da ilicitude comunica-se aos demais comparticipantes.

Ex: Tendo o paciente dado ao médico o consentimento para a doação de um órgão,


a exclusão da ilicitude vale para o médico e para a equipa de cirurgia.
Ex: a) Da janela do seu quarto, A alveja com intenção de matar B, sua vizinha da
frente e velha resmungona. B morre efectivamente atingida instantes antes de, por
sua vez, chegar a disparar sobre Colombo com intenção de matá-lo A desconhece
esse facto. Legítima defesa de terceiro? É necessário elemento subjectivo nas
causas de justificação? É porque é um fundamento misto: o ilícito é constituído

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I - Legitima defesa (artigo 32.º) para efeitos do art. 32.º (ex: A vê uma escola pública ser assaltada, e detém o
assaltante com recurso às suas próprias mãos; ex: A está embriagado, pelo que B o
. a) Agressão de interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiros: impede de conduzir, com recurso à força, podendo mesmo afirmar-se que B é um
agredido, enquanto membro da comunidade).
. a1) Agressão: ameaça derivada de um comportamento humano a um bem - Prof. Fernanda Palma: Limita a defesa aos bens pessoais ou patrimoniais
juridicamente protegido. essenciais à manutenção e desenvolvimento da dignidade da vida humana.

Ex: Adolfo dispara sobre um doberman que o ataca.; A dispara sobre um . b) Agressão actual: A agressão é iminente quando o bem jurídico se encontra já
doberman que o ataca por ordem do dono do cão; existe agressão e por isso é imediatamente ameaçado. Por outro lado a defesa pode ter lugar até ao último
legitima defesa; A dispara sobre um doberman que o ataca após ter pedido momento em que a agressão se verifica, e que por isso a defesa é susceptível de
infrutiferamente a Eva (dona do cão) que o parasse. R: Omissão por parte de E por fim à agressão.
(imprópria).
Ex: A tem um acidente na vila de Sintra. B pretende forçar C a transportá-lo para Ex: A lê num diário intimo do seu sobrinho B que este pretende matá-lo. Idoso e
o hospital mais próxima recorrendo à violência para isso (omissão pura de C). A paralítico sabe que quando o momento chegar terá pouca defesa. Daí espera a
resposta deve ser a de que existe legitima defesa de B (O prof Figueiredo Dias chega de B armado com uma caçadeira, e quando B chega a casa dispara e mata-o.
equipara estas situações às de uma omissão impura, na medida em que também Não há legítima defesa (art. 32º); Não há actualidade da agressão. Eventualmente
aqui está em causa um perigo para bens jurídicos, individuais e supra-individuais). poder-se-á recorrer à figura do Direito de necessidade defensivo, pois se o agente
esperasse pelo momento da mesma, seria tarde demais e já não se podia defender
. a2) Interesses protegidos do agente ou de terceiro: Tem de ser um bem protegido (causa de justificação supralegal ou não para quem entende que ainda cabe no art.
juridicamente não necessariamente protegido a nível penal. 34.º).
Quanto a bens supra-individuais põe um problema que é resolvido de forma Ex: A desfere um muro em B, mas nem por isso ele está impedido de responder
diferente: em legítima defesa aos muros seguintes.
- Prof. Figueiredo Dias: aceita legitima defesa destes bens, pois o ilícito nunca
deve prevalecer sobre o licito, para além do que vê na comunidade um terceiro

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Ex: A dispara sobre B para o impedir de fugir com o produto de um roubo. É actos de autoridade). Por outro lado, exige-se que existindo vários meios se
legitima defesa se o disparo teve lugar logo a seguir à subtracção e enquanto o escolha o menos gravoso para o agressor mas ainda assim idóneo a afastar a
ladrão não tiver logrado a posse pacífica da coisa. agressão (necessidade do meio).
Assim, quanto ao meio, a necessidade é aferida ex ante tendo em conta a dinâmica
. c) Ilicitude: não necessita de ser uma ilicitude penal. Mas não me posso defender global do acontecimento (por exemplo, o recurso às autoridades deve ser o meio
de uma agressão licita. Será que pode haver legitima defesa contra acções levadas privilegiado de defesa, por ser o menos gravoso para o agressor). A possibilidade
a cabo com diligência e cuidado devido, mas de onde resulta todavia uma lesão ou de fuga, não deve ser vista como um meio de defesa normal (sob pena de
um risco iminente de lesão de bens jurídicos, ou seja, condutas, em relação às prevalecer sempre a lei do mais força). Será que deve exigir-se vontade de defesa?
quais não pode haver imputação objectiva por não ter sido ultrapassado o limite do O prof. Taipa de Carvalho diz que não, mas a jurisprudência diz que sim,
risco permitido. Assim, o Prof. Figueiredo Dias nega a possibilidade de haver acentuando uma vontade em tudo equivalente ao dolo directo. Repare-se que a
legitima defesa nestes casos. Por outro lado, posso defender-me de agressões ideia exposta pelo Prof. Figueiredo Dias é parecida com o Prof. Taipa de
dolosas e negligentes. Carvalho: «existindo conhecimento de uma situação de legitima defesa, não
deverá fazer-se uma exigência adicional de uma co-motivação». Por fim o
Ex: A pode impedir pela força que B leve o seu colar de pérolas para uma festa agredido deve ser defendido contra a sua vontade (salvo se a agressão incide sobre
sem a sua autorização (furto de uso não punível penalmente). um bem jurídico indisponível do agredido)
Ex: A quer dormir durante a noite, mas o bar de hip-hop em debaixo de sua casa
está a fazer barulho, logo A pode actuar ao abrigo de legitima defesa. Ex: A tem uma arma e vendo B avançar com uma catana na sua direcção, deve
gritar para ele parar, disparar para o ar e só em último caso disparar contra o
. Acção de defesa: a acção é caracterizada pelos meios nela utilizada. Exige-se que agressor.
a defesa seja necessária (só há legitima defesa se for necessário salvar um bem à Ex: A vê um assaltante apertar o pescoço ao seu marido, e correndo em seu auxilio
custa de outro – aqui engloba-se agressão que não importa uma ofensa socialmente dá-lhe uma paulada no braço deixando-o incapacitado. Neste caso não houve meio
intolerável, como é o caso das agressões não culposas por inimputáveis e as excessivo.
agressões provocadas de forma pré-ordenada, engloba-se a desproporção do Ex: E e F trouxeram uma prostituta de uma casa de alterne, sendo que esta se
significado da agressão e da defesa, engloba-se situações de posição especial e de recusava a voltar para lá. B seu chulo foi à procura dela a casa de E e F, e perante

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as ameaças do chulo E e F chamam a policia. A policia intervém e manda o chulo disparar (33º) – limites do direito do agredido em relação aos direitos do agressor.
ir embora, mas assim que a policia sai do local, o chulo volta a casa de E e F Caso de crassa desproporção do significado da agressão e da defesa.
determinado a levar a prostituta. F dispara então um tiro contra o chulo que vem a Ex: A, inimigo de B e conhecedor da sua irascibilidade insulta este último com o
morrer. Neste caso também se considerou o meio como necessário. intuito de, após este bater-lhe, lhe infligir uma valente sova. Provocação de
Ex: numa discussão entre vizinhas, A entra em casa de B com uma faca na mão, e legitima defesa através de um acto ilícito. A agressão de defesa decorre de um acto
B dá-lhe com uma enxada na cabeça. É um caso de excesso porque bastava dar-lhe pré-concebido, pelo que não há legitima defesa. Caso de agressão provocada.
com a enxada na mão. Caso de excesso de meio. Ex: A está constantemente a agredir B seu marido. B deve sempre que possível
Ex: A é atacado por B, portador de anomalia psíquica. Podendo fugir, confronta o evitar a agressão e renunciar a uma defesa que ponha em perigo a vida ou
seu agressor, esfaqueando-o e causando-lhe a morte. Há agressão, é actual e ilícita. integridade física de A.
Há um requisito não preenchido: o meio não é necessário (podia ter adoptado um Ex: A policia luta contra B, campeão de boxe. A levanta a sua arma contra B, que
meio menos gravoso). Contudo, o meio era idóneo (acabava com agressão), deste depois de o ter espancado avança sobre C, sua ex-namorada que treme de medo. A
modo há um excesso de legítima defesa (33º) – desproporção da defesa. Caso de dispara sobre B. Não estamos num caso de desnecessidade de defesa, pois a
agressão não culposa. actuação do policia foi de modo a respeitar o princípio da proporcionalidade.
Ex: B, velho inimigo de A, reparando na presença deste corre ameaçadoramente
na sua direcção dizendo “desta não escaparás”. A, campeão nacional de
halterofilismo utiliza um jarro (único ao seu alcance e propriedade de Carolina)
contra B partindo na sua cabeça. Há agressão iminente, que é ilícita. O meio é
necessário? Admite-se que este é um meio necessário de acordo com o artigo 32º.
A destruição do jarro seria ao abrigo do artigo 34º (estado de necessidade) e não
ao abrigo do artigo 32º (legítima defesa). Se o jarro fosse do agressor nada haveria
a justificar porque ela partia um jarro dele. Só não há legítima defesa quanto à
jarra porque é de terceiro.
Ex: A está a subtrair ½ dúzia de maçãs do pomar de B. Este à distância só pode
disparar sobre A. Este morre. Manifesta desproporção entre o roubo das maças e o

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II – Estado de necessidade justificante (artigo 34.º) Ex: A vai fazer esqui mesmo depois de avisado do perigo de deslizamento de
neve. Este deslizamento vem a ocorrer, e A penetra na cabana de B sem
. Situação de necessidade: autorização para ai chamar socorro por telefone. A está em estado de necessidade.
. a) Os bens (interesses) jurídicos conflituantes: pode ser protegido pelo direito de Ex: Se B em Estado de embriaguez, corta a sua própria orelha e não tem ninguém
necessidade qualquer bem jurídico. que o leve ao hospital deverá abster-se de conduzir para ir ao hospital. B está em
estado de necessidade.
Ex: A e seu flho B estão presos no 9 andar, e está um incêndio a decorrer nesse Ex: A cria um perigo de incêndio em casa de B e posteriormente arrepende-se,
andar. A atira o seu filho para cima de uma lona gigante dos bombeiros e salva-o, pelo que pode louvar-se do estado de necessidade para sem autorização entrar em
lesando a sua integridade física. casa de B e chamar os bombeiros.
Ex: A ministra a B uma dose letal de veneno. Arrependendo-se dirige-se à
. b) O perigo que ameaça o bem jurídico: também aqui o perigo tem de ser actual, farmácia. Encerrada ela parte a montra e leva o antídoto. Carlos dono da mesma
mas com algumas correcções que resultam em alargamento: deverá ser actual o dá-lhe um soco. Quanto a A temos tentativa de homicídio de B; Quanto à farmácia
perigo ainda não eminente, mas o adiar do salvamento seria uma potenciação do há estado de necessidade (art, 34º). Mas a al. a) está preenchida? Está porque é
risco; e ainda no caso dos perigos duradouros. para proteger o interesse de B, apesar de ter sido A quem o pôs em perigo.
Quanto a Carlos: Ofensa à integridade física, mas Carlos não conhece a história de
Ex: Existe um edifício em perigo de desmoronamento, se bem que não possa A com B. É um erro sobre elementos situacionais (16º/2) e há então exclusão de
determinar-se se e quando tal ocorrerá. dolo.

. c) A provocação do perigo: aqui em primeira analise, não se passará como na . Princípio do interesse preponderante
legitima defesa em que o acto intencional do agente, que cria a situação para . a) A lei exige que se pondere o valor dos interesses em conflito. É relevante a
depois se livrar dela à custa de bens alheios, afasta a legitima defesa. A própria hierarquia dos bens jurídicos em confronto. Pode recorrer-se à medida da moldura
provocação intencional não deverá servir para negar a justificação por estado de penal, à intensidade da lesão do bem jurídico (ideia de proporcionalidade que não
necessidade quando se trata de proteger interesses de terceiros. deixe o bem jurídico ser aniquilado em função de outro), ao grau de perigo que

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ameaça os interesses em jogo e o respeito pela autonomia da pessoa, para Ex: A médico, não pode retirar um rim a B, homem másculo e cheio de saúde,
determinar a hierarquia. mesmo que esta seja a única forma de C sobreviver, e que B viva bem com um só
rim. A isso se opõe a autodeterminação de A (apesar do bem vida de B ser
Ex: A, bombeiro, empurra B, mirone, contra uma parede causando-lhe uma superior ao bem integridade física de A).
luxação no braço, ou lhe provoca uma curto curta privação da liberdade para Ex: A pode ser forçado a dra sangue (sem nenhum prejuízo grave para si) por ser a
assegurar um rápido ou mais seguro apagar do incêndio no centro comercial. única pessoa com sangue compatível com B.
Ex: A omite o salvamento de um desconhecido num acidente de automóvel porque
se afastou do lugar do acidente por necessidade inadiável de participar numa . d) Deve-se dar relevância ao princípio da imponderabilidade da vida para efeito
importante reunião de negócios, porque a sua falta acarretaria gravíssimos de estado de necessidade.
prejuízos patrimoniais, para ele ou para terceiros.
Ex: A médico no regime nazi manda matar alguns doentes mentais, porque se não
. b) O grau de perigo apresenta-se aqui como muito importante. Posso criar um o fizesse, outro médico viria que mandava matar todos os doentes mentais. Não é
perigo de pequena medida se for para salvar um outro bem. direito de necessidade, seria no máximo exclusão da culpa.

Ex: a corrida de uma ambulância que ponha em perigo de algum modo os Ex: A, um dos montanhistas de uma excursão, cai no precipício, de tal modo que é
transeuntes, sob a forma de negligência, pode porventura justificar-se se ela impossível iça-lo e a corda vai partir-se arrastando todos; por isso e porque A se
transporta um ferido grave, cujo tratamento é urgentíssimo, mas já não se o ferido encontrava no extremo da corda, B corta-a matando A e salvando os demais. Neste
só tem umas escoriações pequenas. caso o acto surge como adequado ao afastamento do perigo que sobre todos os
Ex:A conduz o seu carro com 1.2 de álcool, porque transporta um ferido companheiros de A pesava. Aqui não há uma escolha de quem vive e quem morre,
gravíssimo ao hospital. simplesmente A estava marcado pelo destino.
Ex: um ferry boat com crianças vai-se afundar se não forem mandadas borda fora
. c) Autonomia do lesado: deve ser levada em conta na medida em que existe uma as mais gordas. Assim o piloto do barco manda as crianças com mais de 40 quilos
lesão do bem de um agente e ainda uma lesão da sua autodeterminação. borda fora e salva as demais. O que pode haver aqui é uma causa de exclusão da
ilicitude. O pilo não pode escolher quem vive e quem morre.

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. Requisito subjectivo: não exige que o agente tenha vontade de defender o
. Sensível superioridade do interesse salvaguardado: é necessário que o bem interesse preponderante.
jurídico salvaguardado prepondere sobre o sacrificado. No estado de necessidade,
a acção de afastamento do perigo atinge em regra interesses de terceiros, no Ex: A salva a vida de B, destruindo uma montra nesse processo. A não tinha
sentido de estranhos à situação de necessidade. O que se trata aqui é de selecionar vontade de salvar B, mas simplesmente de aparecer na Tv que nesse momento
factores de ponderação que não são estritamente de ordem (interesses do registava o grande perigo que B corria.
legislador) mas de normal sensibilidade aos valores. Repare-se que a lei fala no
superior interesse e não do bem jurídico. . Estado de necessidade defensivo: é diferente do art. 34.º (ai o agente ofende um
bem jurídico de terceiro não implicado para salvar um bem jurídico seu ou de
Ex: Não pode um médico recorrer ao estado de necessidade para fazer uma outra pessoa). Aqui o agente se defende de um perigo que tem origem na pessoa
cirurgia que salvaria o paciente, mas que este recusa porque está disposto a que vai ser vítima da acção necessitada. Temos aqui como pressupostos: uma
morrer. situação de defesa à qual falta um dos pressupostos indispensáveis para configurar
Ex: A comete uma falsa declaração por ter recebido ameaças de morte se dissesse uma situação de legitima defesa; impossibilidade para o agente de evitar o perigo e
a verdade. necessidade do facto para o repelir, desde que o bem lesado pela defesa não seja
Ex: um piloto de helicóptero, que está em alto mar numa missão de salvamento, muito superior ao bem defendido.
não tem de suportar o risco de fazer subir um passageiro, se esta subida pode fazer
cair o helicóptero. Mas se essa subida determina apenas um perigo acrescido para Ex: C, a quem B roubou uma bicicleta, encontra-o com ela, e ofende levemente a
o piloto então deve aceitar-se que tem o dever de suportar esse acréscimo. sua integridade física recuperando essa bicicleta.
Ex: A, em pleno ataque epiléptico vai quebrar uma jarra de B, se não for afastado
. Adequação do meio: o facto não está coberto por direito de necessidade se o à força.
agente utilizar um meio que segundo a experiência comum e uma consideração
objectiva é inidóneo para salvaguardar o interesse ameaçado.

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III – Conflito de deveres de actuar justificante (art. 36.º) Titulo IV – Culpa

. Sucede aqui que tem de existir dois deveres de acção em conflito, não . Culpa: dimensão de censurabilidade do autor do facto que não resulta
funcionando este instituto quando existe um dever de acção e um dever de automaticamente da voluntariedade ou da ilicitude. É expressão do autor e não de
omissão de não ingerência em bens jurídicos. O dever cumprido deve ser pelo factos que o rodeiam.
menos igual ao sacrificado, devendo resultar de uma ponderação global dos . Os pressupostos positivos da culpa (conhecimento ou possibilidade de
interesses em conflito conhecimento da ilicitude e da liberdade de decisão) são avaliados através de
causas de exclusão da culpa.
Ex: A pai de B e C vê os dois filhos a afogarem-se. Escolhe salvar A.
Ex: um acidente na auto-estrada. A vê-se envolvido. Tem dever geral de auxilio a) Inimputabilidade: qualidade de uma pessoa como transposição linguística
sobre todos os feridos, mas deve prevalecer o dever de garante que tem em relação da capacidade para praticar comportamentos. Tudo se passa ao nível da
ao filho. decisão do agente e da sua capacidade de compreensibilidade para agir de
Ex: Se temos dois incêndios, um dos quais põe em perigo mais bens ou é de maior acordo com a norma. Pode ser em razão de anomalia psíquica (psicoses,
proporção os bombeiros devem apagar esse. oligofrenia ou debilidade mental, psicopatias, neuroses e anomalia sexual
Ex: Urgência no hospital. Entram lá dois pacientes. O segundo (B) tem mais de e perturbações profundas) ou em razão da idade (lei tutelar educativa
100 anos, C está na flor da idade e grávida. A é médico e dispondo apenas de uma 166/99 – entre 12 e 16 anos e um regime para os jovens adultos – DL
máquina cardio-pulmonar, liga-a a B porque estava traumatizado e com 401/82 e art. 9.º CP). É avaliada ao momento da acção. Por fim há quem
preconceitos resultantes do divórcio. C morre. Tem de se aplicar o art. 36.º. fale em imputabilidade diminuída para designar uma capacidade ainda
Subhipótese: E se posteriormente desse entrada no hospital um doente carenciado subsistente mas em grau sensivelmente diminuído, ou para o Prof.
da mesma máquina, o senhor E, Prémio Nobel da Medicina que no dia a seguir ia Figueiredo Dias, imputabilidade duvidosa como sendo pouco clara a
revelar a cura para a diabetes. Ele já ligou a máquina a B. Pode ele agora desligar a compreensibilidade das conexões objectivas.
máquina a B para ligar a D? Conflito de deveres entre omissão e acção. Assim A este nível se integram as actio liberae in causa: responsabilidade do
recuava-se para o art. 34.º e tínhamos de ver se havia sensível superioridade dos agente que se coloca dolosamente num estado de falta de consciência (art.
bens em jogo, o que não parece haver. 20.º, n.º4 – só se aplica quando o agente se coloca nesse estado de forma

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pré-ordenada cumprindo assim as exigência dos princípio da culpa). Se Figueiredo Dias fala na crassa desproporção dos bens lesados nos casos dos bens
esse estado advém de um facto não pré-ordenado (negligência ou dolo sacrificados serem superiores aos salvos, devendo os demais casos ser resolvidos
eventual) o agente não pode ser punido pelo facto praticado, mas é punido ao nível da cláusula de inexigibilidade do comportamento. Dever-se-ia exigir que
pelo simples facto de se por nesse estado (art. 295.º). Pretende-se apenas o agente actue com intenção de salvar o bem jurídico ameaçado, pois aqui estamos
significar uma antecipação do cometimento do facto típico, que se inicia na presença de actos ilícitos, contudo basta que o agente pratique a acção para
quando o agente se põe em inimputabilidade. determinar com ela a preservação do bem ameaçado..

Ex: A pretende matar a sua mulher que lhe foi infiel, e, para ganhar coragem, sem Ex: A soldado da guerra é sujeito a sevicias por um superior. Pode queixar-se a B,
embriaga até à inimputabilidade momento em que mata a mulher. mas ao invés disso foge. Não há estado de necessidade.
Ex: A sujeito a sevicias repetidas por parte do cônjuge não pode mata-lo , se puder
b) Erro não censurável sobre a ilicitude: exclui a culpa (art. 17.º). queixar-se às autoridades.
Ex: quando A produz em B uma ofensa grave à sua integridade física para afastar
Ex: vejo o meu filho a afogar-se mas penso que não tenho dever de garante. de si o perigo de um leve ferimento.
c) Causas de exclusão da ilicitude em sentido restrito:
. Erro sobre um dos pressupostos do estado de necessidade implica a exclusão do
. c1) Estado de necessidade desculpante (art. 35.º): manifestação do princípio da dolo e uma eventual punição a título de negligência (art. 16.º, n.º2 e 3). Contudo,
inexigibilidade que supõe uma colisão de direitos. Aqui estão em causa bens se apesar do erro em que o agente incorre lhe era exigível outro comportamento,
inferiores, iguais ou não sensivelmente superiores ao bem jurídico. A actualidade então deve ser punido a título doloso.
do perigo deve ser entendido de forma ampla, ao contrário da não possibilidade de
remoção do perigo de outra maneira. Os bens susceptíveis de serem lesados, nesta Ex: Um naufrago agarra-se a uma tábua e afasta o seu companheiro, porque está
figura que se baseia na ideia de não ser exigível ao agente outro comportamento, convencido que a tábua só suporta o peso de um.
só podem ser bens jurídicos elementares. Por outro lado certos agentes têm o dever
de suportar perigos acrescidos (policias, bombeiros etc). A desculpa também deve . c2) Excesso na legitima defesa desculpante (art. 33.º): sempre que o agente
ser negada quando a agente cria a situação para depois se livrar dela. O Prof. ultrapassa a medida do meio necessário. É normal que perante uma agressão a

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vitima experimente um estado de afecto que o leva a reagir de forma exacerbada o Titulo V – Tentativa
que conduz a uma atenuação da pena (art. 72.º e 73.º). Contudo esta desculpa só
funciona se o excesso resulta de afecto asténico, isto é perturbação, medo ou susto . O processo que conduz ao crime é longo. A decisão de realizar um ilícito ainda
e não censurável, ou seja, que o homem médio fiel ao direito não consiga suportar, não é punível. Também a preparação do ilícito e os actos a que isso conduz não
pois se for esténico não afasta a culpa (cólera ou raiva). são puníveis, salvo disposição em contrário (art. 21.º). Não são punidos actos
preparatórios que não se inserem nos tipos legais ou que não violem o bem
Ex: A mulher elegante está a ser galanteada por Z, conquistador de mulheres nas jurídico ou ataquem a ordem social (por exemplo os crimes de perigo que são
noites do Algarve. A que tem tendência a ver em cada galanteador um tarado materialmente autónomos são puníveis). Por vezes pune-se então actos
sexual atinge-o com um bastão. Aqui se verifica que há excesso de legitima preparatórios enquanto tais (ex: art. 271.º e 274.º)
defesa.
Ex: comprar uma caçadeira quem vem a servir para matar um homem, não faz
. Por outro lado, até à pouco tempo apenas se considerava como excludente da parte de matar outra pessoa.
culpa o excesso intensivo (excesso dos meios), não o extensivo (ultrapassagem de Ex: a contrafacção de moeda é um acto preparatório de violação do ordenamento,
outros elementos na legitima defesa – essencialmente o requisito da actualidade). que só se dá quando a moeda entra em circulação (art. 262.º).
Como afirma Taipa de Carvalho o excesso extensivo é incompatível com o teor do
art. 33.º. . A tentativa: à perfeição do tipo de ilícito subjectivo, corresponde a imperfeita
realização do tipo de ilícito objectivo, ou seja, trata-se da prática de actos de
execução de um tipo de crime. A tentativa viola já a norma jurídica de
comportamento que está na base do tipo de ilícito. Os actos de execução também
podem ser como os preparatórios, punidos como crime autónomo.
. Os arts. 22.º a 25.º valem em princípio apenas para comportamentos que não
atingiram a consumação. Contudo, a lei considera como consumados delitos, que
em perspectiva funcional, não passam de delitos tentados, e daí se fazer a distinção
entre:

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a) Consumação formal: logo que o comportamento preenche a totalidade do além do que o agente pode representar somente como possível a
tipo de ilícito. realização, e conformar-se.
b) Consumação material: realização completa do conteúdo do ilícito em
vista do qual foi erigida a incriminação. Dá-se nos crimes de resultado, Ex: não é tentativa apreciar se estão reunidas as condições necessárias para um
com a verificação do resultado que interessa ainda à valoração do ilícito assalto.
por directamente atinente aos bens jurídicos tutelados e à função de Ex: A dispara sobre B seu inimigo, todavia colocado a uma distância tão grande
protecção da norma. que leva A a representar a verificação do resultado como meramente possível, mas
. Esta distinção assume relevo na desistência da tentativa, como o comprova a conformar-se de forma plena com o resultado, no entanto falha o tiro que atinge
circunstância de uma tal distinção ser pressuposta pelo art. 24.º, n.º1. Mas também uma arvore perto de B. É tentativa com dolo eventual.
na comparticipação em que esta deve ocorrer antes da consumação.
b) Prática de acto de execução: expressão externa da decisão de cometer um
. O fundamento da punibilidade da tentativa tem variado: hoje têm relevância as ilícito. A lei portuguesa consagra as teorias objectivas para o início da
teorias da impressão: tem por base a dignidade penal do facto tentado, como execução da tentativa. A al. a) representa a teoria formal-objectiva e as
punibilidade da vontade exterior manifestada em contrário da norma de als. b) e c) representam as teorias materiais-objectivas. Tudo isto deve ser
comportamento, mas só se esta se revelar como intervenção significativa no adicionado o elemento subjectivo traduzido no plano concreto de
ordenamento jurídico (pôr em causa a confiança da comunidade no ordenamento). realização do agente.

. Elementos da tentativa: nos termos do art. 22.º, n.º1 e 2 tem de haver: . A não consumação do crime: a tentativa cessa quando se verifica a consumação
formal.
a) Decisão de cometer um crime: exige-se dolo dirigido à realização
objectiva e eventualmente especiais elementos subjectivos. Não existem . Pode distinguir-se entre tentativa acabada (aqui o agente pratica todos os actos de
tentativas negligentes: quem tenta alguma coisa é porque decidiu realizar execução mas a consumação não tem lugar) e inacabada (aqui o agente não chega
uma acção. Mas a tentativa é compatível com dolo eventual: a decisão a a praticar todos os actos de execução).
que se refere o art. 23.º é a mesma que vale para o ilícito doloso, para

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. Tentativa punível (art. 23.º, n.º1 e 2): dois critérios para a sua punição: a pena . Impossibilidade em função do autor: não aparece no art. 23.º, n.º3, mas é também
aplicável e a seriedade do ataque à ordem jurídica. configurável como possível, que o agente pense erradamente que possui uma
específica qualidade.
. Tentativa impossível (art. 23.º, n.º3): esta fórmula significa que em princípio a
tentativa é punível apesar de a realização estar irremediavelmente destinada a não Ex: A arrumador de carros, que ganha a vida com poucos euros, , arruma carros
se consumar. Contudo, sempre que o meio seja manifestamente inidóneo ou haja num parque. Pensando erradamente que isso faz dele um funcionário tenta abusar
carência de objecto, não há punição; e ainda sempre que ao autor faltem da sua suposta autoridade. Neste caso só quem tem o dever especial de funcionário
qualidades típicas exigidas. é que pode violar esse mesmo dever.

Ex: tentativa de abortar com ingestão de paracetamol ou com irrigação vaginal de . Hipóteses especiais:
sabão (meio inidóneo). Tentativa de matar alguém que acabou de morrer (carência
de objecto). Tentativa de prevaricação por parte de alguém que falsamente se julga a) Crimes de mera actividade: sempre que a consumação não se verifica
juiz (qualidade de autor). logo através da própria actividade, mas se exige um lapso de tempo (ex:
quando se iniciou mas não se terminou a prestação de um falso
. Impossibilidade em função dos meios ou do objecto: usa-se a teoria da depoimento); seja sob a forma de tentativa impossível, nos casos de
impressão. Como ponto de partida temos que a tentativa apesar de impossível deve aceitação errónea da verificação de um dos elementos da factualidade
ser punida se abalar a confiança comunitária na validade de uma norma de típica (ex: tentativa de abuso sexual de pessoa que falsamente o agente
comportamento. Só haverá no entanto punibilidade se um observador colocado no crê menor de 14 anos).
momento da execução e sabedor de todas as circunstâncias conhecidas poder b) Crimes de omissão: podem acontecer tentativa, bastando que a
deduzir ex ante que a tentativa era possível ou não manifestamente impossível. inactividade do agente seja acompanhada do conhecimento do aumento
do perigo e da resolução de não lhe por cobro (ex: A pai de B vê o seu
Ex: A bruxa mística lança um feitiço sobre B, desejando que este morra. É uma filho a afogar-se e dolosamente nada faz, no entanto, aparece C que salva
tentativa cujo meio é manifestamente impossível. B). A preparação verifica-se quando o perigo ainda está numa fase

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longínquo mas o agente já resolveu não intervir. A tentativa dá-se a partir . Desistência da tentativa: a ideia fundamental é a da reparação das consequências
do momento do conhecimento do aumento do perigo, sendo que se nocivas da conduta, tendo em conta o interesse da vitima.
considera a tentativa acabada quando o agente tem a última possibilidade
de intervir e, todavia, a realização típica não chega a consumar-se. . Relação entre a tentativa e a desistência: é pressuposto do art. 24.º que a
c) A.L.IC.: para o Prof. Figueiredo Dias a tentativa começa logo quando o consumação material, incluindo o resultado que a ela pertença, não chegue a ter
agente dolosamente se põe num estado de incapacidade. lugar, e que isso se fique a dever à acção do próprio agente. Se o agente com a sua
d) Crimes qualificados pelo resultado: actuação não criou ainda todas as condições da consumação (tenativa inacabada)
- O agente por força da tentativa do delito fundamental produz já por basta que interrompa a realização típica (ex: basta que o agente não dispare, sobre
negligência o evento agravante: aqui a tentativa do delito agravado é a vitima que se propunha matar, um segundo tiro mortal). Se ele já criou todas as
admissível se o resultado se liga à acção (ex: deve punir-se por tentativa condições de realização típica (tentativa acabada), torna-se necessário uma
de violação agravada se já da violência usada para lograr a violação intervenção activa (ex: chamar a ambulância para levar o ferido ao hospital). O
resultar a morte da vitima, embora a violação não tenha sido consumada) Prof. Jackobs que a tentativa considera-se acabada com cada acto de execução
e inadmissível se ele se liga ao resultado do delito fundamental (ex: não considerado isoladamente (ex: A tenta matar B a tiro, mas não atinge a vitima, a
deve punir-se por tentativa de incêndio agravado se a morte resultar não tentativa está acabada, apesar de no carregador da arma ainda haverem balas). O
do incêndio que não se logrou atear, mas de intoxicação por produto Prof. Jescheck e Figeuiredo Dias apelam antes à teoria global, ou seja, não se
usado para o efeito). atende à menor ou maior autonomia de cada acto; a tentativa considera-se acabada
- O agente tenta ou consuma o delito fundamental mas não logra a quando o agente, ao tempo do último acto de execução, considera possível a
verificação do evento agravante com a qual se conformou: a punição por execução; até esse momento é possível a desistência (ex: a grávida tem uma
tentativa de crime agravado deve ser admitida na medida em que não cateter aplicado para lhe causar aborto, mas este salta antes do tempo, haverndo
possa sobrevir a punição por um tipo doloso (ex: alguém sequestra tentativa inacabada se a grávida o não colocar de novo; ex: quando o agente não
outrem de modo a privá-lo da liberdade, para que não possa estar num deixa de apertar o pescoço da vitima até contar com a possibilidade de que morra
julgamento que teria lugar dentro de três dias, mas a vitima vem a ser há tentativa acabada)
libertada ao fim de algumas horas de cárcere: punição por tentativa do Decisivo é sempre a desistência voluntária, ou seja, ou o agente desiste
crime do art. 158.º, n.º2, al. a) e não pelo art. 158.º, n.º1). voluntariamente ou essa desistência não teve lugar ou não já não é possível (ex: A

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carteirista, dá-se conta de que a vitima nada traz consigo e abandona o lugar: ex: o por impulso próprio (ex: não é impulso próprio o deixar de roubar o banco porque
autor de uma tentativa de violação não consegue a cópula porque está muito o alarme toca).
excitado).
. Erro sobre a idoneidade da desistência: é em princípio indispensável que a
. A desistência da tentativa inacabada (art. 24.º, n.º1, 1.ª parte): exige-se um factor consumação não se verifique na desistência da tentativa inacabada. Esta exigência
objectivo, que o agente deixe de prosseguir na execução do acto. Não se entende é problemática porque sobre a consumação deve decidir o mundo das
que o agente desistiu nos casos em que este renuncia à pratica de actos futuros representações do agente (ex: pode o agente, sem saber, já ter dado veneno
porque já alcançou o seu objectivo (ex: não desiste da violação aquele que deixa suficiente vitima na altura que se dispõe a desistir, na convicção de que ela não
de usar a força, porque a vitima consente na copula) ou quando o agente renuncia morrerá). Nestes casos a relevância da desistência deve ser excluída quer a
a actos de continuação por já ter alcançado a finalidade extra-tipica da sua consumação se verifique antes do que o agente esperava, ou mesmo depois do
actuação (ex: quando o agente, com dolo eventual de homicídio, espeta uma faca abandono do prosseguir da acção (neste último caso ou não existe imputação
na cara da vitima, para a deixar desfigurada, e depois a larga apesar de «apenas» a objectiva ou existe erro sobre o processo causal o que exclui o dolo e conduz à
ter ferido). Não há desistência relevante quando o agente renuncia, num processo punição a título de tentativa).
global, por pouco tempo a alcançar a finalidade (ex: a pára durante algum tempo
com as violências sobre B tendentes a ter cópula porque a vítima lhe pediu para a . A desistência da tentativa acabada: o agente tem de abandonar o plano e impedir
deixar acalmar-se para terem relações). a consumação. É necessário que a não verificação da consumação possa ser
imputada à sua actividade e que esta, por conseguinte, seja dirigida àquela. Se,
. Voluntariedade da desistência: é o factor subjectivo. A desistência é voluntária apesar da actividade do desistente, a consumação tem lugar ele deve ser punido
sempre que é recondutível a uma motivação autónoma ou auto-imposta. A por crime consumado (não basta não querer tem de ser comportamento activo). A
desistência não é voluntária se o agente foi obrigado a interromper a execução. É desistência releva ainda quando o agente fez o que devia para impedir o consumar
irrelevante a qualidade moral dos impulsos à desistência (ex: não deve ser negada mas esta foi evitada por factores externos (ex: A, tendo abandonado B, por ele
a desistência a A que interrompe os actos destinados a roubar B porque se gravemente ferido com intenção de matar, volta atrás para o conduzir ao hospital,
apercebe que B ainda é mais pobre que ele) O agente tem de abandonar a acção mas entretanto C encontrara B e já o levara ao centro de saúde.). Se o agente se

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esforça seriamente, mas a consumação tem lugar ele deve ser punido por crime desistência implica que o agente em vez da acção imposta, pratique, com êxito,
consumado. uma outra acção destinada a salvar o bem jurídico.

. Desistência nos casos de consumação formal: como se disse pode haver . Inicio da tentativa: será que vale a teoria restrita (só conta a acção individual) ou
consumação formal e não material (quando não teve ainda lugar o resultado a teoria alargada (deve olhar-se à totalidade dos intervenientes).
atípico – art. 24.º, n.º1, 3.ª parte – que a lei, no entanto, teve em vista em último
termo evitar quando construiu a incriminação e que, por isso, faz ainda parte da a) Na autoria mediata: a tentativa começa com a conduta de influência ou só
realização completa do ilícito). Necessário se torna que o agente impeça a começa quando o instrumento começa a actuar (1ex: A médico deixa a seringa
verificação do resultado atípico mas ainda relevante para a caracterização do preparada para B, enfermeiro, dar a injecção a C, mas descobre-se e a seringa é
conteúdo material do ilícito. Se a consumação material vem a ter lugar por facto inutilizada; 2ex: A entrega a seringa a B, mas esta escorrega nas escadas e parte a
independente da conduta do desistente bastará no entanto que o agente se tenha seringa; 3ex: A entrega a seringa que cai no chão e se parte; 4ex: D prepara uma
esforçado seriamente (art. 24.º, n.º2). bebida para E, esperando que este se depare com ela e a beba, mas o copo quebra-
se com uma rajada de vento; 5ex: F comerciante já foi assaltado diversas vezes
. Efeitos: a desistência conduz à impunidade da tentativa, sendo por isso englobada deixa uma bomba que explode quando o assaltante G, como ele sabe, for actuar).
como pressuposto da punibilidade. Se a execução da tentativa se traduz já na Só há tentativa quando o instrumento começa a actuar, mas nos casos 1, 3 e 5 o
prática de um crime consumado (ex: uma ofensa à integridade física como acto de autor mediato já praticou actos de execução pelo que aqui já há tentativa por haver
execução de um roubo) então esse crime-meio continuará a ser punível apesar da já perigo iminente.
eventual desistência do crime-fim (caso de tentativa qualificada).
b) Na Co-autoria: basta que um co-autor actue ou tem de se ver a actuação
. Desistência na omissão: na tentativa inacabada a desistência existe logo que o separadamente. Conceição Valdágua diz que é só na actuação de cada um e não no
agente diminua o perigo de surgimento do resultado (ex: o pai da criança doente estágio da decisão conjunta e que isso não viola o princípio da culpa. A co-autoria
que decidiu não a levar ao hospital acaba mais tarde por conduzi-la lá, se bem que exige um contributivo significativo de cada um e isso funda a solução individual.
em momento posterior ao devido, e a criança salva-se). Na tentativa acabada a

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c) Na Instigação: só quando há começo da execução pelo instigado, pois a conduta Titulo VI – Comparticipação
do instigador só se torna imediatamente perigosa se o instigado actuar.
. Comparticipação: actuação de vários agentes:

a) Encobridor: não releva como comparticipante pois seria dar relevância a


uma participação ex post facto, tratando-se de um crime autónomo (arts.
231.º e 367.º).
b) Autores: são o centro pessoal do ilícito típico; repare-se que podem ser
autores paralelos, no caso de actuação que não é conjuntamente realizada.
c) Participantes: estes não realizam o tipo de ilícito mas participam de um
tipo de ilícito realizado por outrem (cúmplice é o exemplo máximo).
d) Instigadores: aquele que determina dolosamente outrem à pratica do
facto. O Prof. Figueiredo dias diz que pode ser figura autónoma ou pode
ainda ser comportável por uma de duas figuras.

. Distinção de autoria e participação:

a) Teoria material objectiva: o autor é o que dá a causa, o que participa


essencialmente; o cúmplice é aquele que não dá causa; este é o critério
usado pela jurisprudência nacional até 1980 e pelo Prof. Eduardo Correia.
b) Teoria do domínio do facto: é autor aquele que tem a possibilidade de
fazer ir até ao fim, ou em certo momento para o processo criminoso
(posso dominar fisicamente ou dominar um executante). Este critério não
funciona nos seguintes casos:

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- Crimes negligentes: o agente aqui não tem um controlo ab initio da - Crimes específicos: em que sobre o autor recai uma qualidade ou
vontade. Aqui o autor é aquele que viola deveres de cuidado, pelo que o relação especial. Aqui o critério do domínio do facto acresce a violação
critério do domínio do facto é inaplicável (ex: dois automobilistas, A do dever típico específico por quem dele é titular.
incita B condutor a circular a uma velocidade excessiva, e uma criança - Crimes de mão própria: só é autor aquele que detendo o domínio do
acaba por ser colhida pelo carro). Autor é aquele que, com a sua actuação facto leva a cabo pessoalmente a acção.
violadora do dever de cuidado, contribui para o perigo que se concretiza
no resultado. Na co-autoria trata-se da criação conjunta de um risco não . Autoria imediata (art. 26.º, 1.ª parte): aquele que executa o facto com as suas
permitido que se exprime na realização típica (ex: A e B decidem fazer próprias mãos, preenchendo a totalidade do ilícito.
rolar umas pedras até ao rio onde deviam saber que havia pescadores; um
pescador morre, mas não se consegue determinar qual das pedras matou; . Autoria mediata (art. 26.º, 2.ª parte): aquele que executa o facto por intermédio
deve haver um homicídio negligente conjunto porque o comportamento de outrem. Existe um homem de trás (ou autor mediato) e o homem da frente (o
criou um risco não permitido). executor ou autor imediato). O homem da frente é um símbolo do homem de trás,
que com a sua vontade é responsável pelo acontecimento.
- Crimes de omissão: na autoria imediata: aqui o omitente não intervém
no acontecimento e por isso não por isso dominá-lo. Assim é autor aquele . A distinção da instigação faz-se na base da ideia de auto-responsabilidade que
que possuía a possibilidade de intervenção no acontecimento e, apesar de conduz a que do âmbito da autoria mediata sejam excluídas todas as situações em
sobre ele recair um dever jurídico de acção não faz uso de tal que entre a conduta do homem de trás e o delito se interponha uma actuação do
possibilidade (ex: o pai e a mão que não chamam a ambulância quando o homem da frente plenamente responsável (actuando com dolo).
seu filho está gravemente doente). Na co-autoria: não é necessário
recorrer a esta ideia, podendo-se ficar só pela autoria imediata por a) Actuação atípica do instrumento:
omissão, salvo nos casos em que a actuação conjunta afasta o perigo (ex:
é necessário duas chaves para abrir o cofre, onde uma pessoa ficou a1) por não praticar uma acção: o instrumento não chega a praticar uma
fechada). acção, mas é utilizado por outrem como corpo ou forma de acção, pelo
que o homem de trás é o autor imediato (ex: no decurso de uma luta, A

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campeão de boxe, pega em B e atira-o para cima de C; neste caso A é com B que conseguia acertar; A dispara sem se conformar com a
autor imediato). possibilidade de acertar na criança, mas acerta, enquanto B, se conformou
com a possibilidade de A acertar. Assim B é autor mediato, pois serve-se
a2) por intervir uma causa de exclusão da ilicitude: o instrumento pratica da inconsideração de alguém para a realização de um facto que também o
um a acção que, se cometida pelo homem de trás, constituiria um ilícito, orienta e domina). Repare-se que a autoria mediata existe quando o
mas cometida por aquele, surge como atípica (ex: A serve de B, por homem de trás provoca o erro do executor ou simplesmente explora ou
coacção para que este penetrando furtivamente em casa de C, verifique se dele se serve (ex: a, apercebendo-se de que B gostaria de atirar sobre
está lá certa obra de arte, no entanto C convida B a entrar em sua casa; A aquilo que julga ser um veado mas é um camponês, C, não o adverte do
é autor mediato da violação de domicilio). engano e dá-lhe a caçadeira para a mão; ex: A substitui às escondidas um
a3) Por ser a própria vitima: a acção é atípica por ser o instrumento a medicamente por um veneno mortal, que a enfermeira E, não suspeitando
vitima dessa mesma acção. Nestes casos o homem de trás é considerado da troca, dá a beber a H; ex: A dando-se conta que G pensa, erradamente,
autor, ou não em virtude do princípio da auto-responsabilização (ex: A que o Ferrari amarelo estacionado à sua porta é o seu e que por isso o
convence B de que desligou a corrente eléctrica e que este pode reparar o pode destruir – querendo também A ver o Ferrari destruir porque tem
candieiro; A é autor da morte por electro-choque). Se o homem da frente ciúmes – lhe passa para as mãos um machado, que G utiliza para destruir
tem o domínio do facto então o homem de trás é somente instigador, se o o Ferrari – em todos estes casos a contribuição do homem de trás ligada
determinou a actuar (art. 26.º, 4.ª parte). ao desconhecimento do homem da frente, serve para fundar o domínio do
a4) Por actuar sem dolo do tipo: o homem da frente preenche o tipo facto por parte daquele)
objectivo mas não o subjectivo, por lhe faltar o dolo por força de erro
sobre o tipo, dolosamente explorado pelo homem de trás (ex: A serve-se b) O instrumento actua licitamente: o agente instrumentalização preenche,
de B para entregar a C um pacote que diz ser de leite com chocolate, mas com a sua actuação o tipo incriminador, mas actua licitamente (ex: o juiz
na verdade são bombas que determinam a morte de C). Também se o A, por sentimento de vingança contra C, manda B policia que proceda à
homem da frente actua com negligência inconsciente se tem esta solução. detenção daquele, sabendo que não estão presentes os pressupostos de
Mas já não se o homem da frente actua com negligência consciente (ex: A detenção de C – temos conhecimento da situação pelo homem de trás e
dispara contra uma criança que segura uma moeda na mão, tendo aposta domínio da vontade de B que actua de acordo com o direito).

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Também se o homem de trás provoca uma situação de legitima defesa e o mediato relativamente ao delito qualificado; ou não exclui e homem de
homem da frente (coagido ou enganado) pratica um facto justifica, a trás só deve ser instigador, cúmplice ou eventualmente autor paralelo.
autoria mediato do homem de trás deve ser afirmada (ex: A convence
falsamente B que está a ser agredido por C, pelo que B campeão de boxe e) Estruturas organizadas de poder: organização com estrutura hierárquica
actua em legitima defesa putativa). cuja actução é quase automática, pelo que o executante se apresenta como
elemento fungível em que mesmo que actue com culpa dolosa, quem
c) O instrumento actua sem culpa: também aqui se apela ao domínio do fato domina o facto é o topo hierárquico (a prof. Valdágua – diz que o
para se afirmar a autoria mediata do homem de trás. Seja pelo homem da executor se subordina voluntariamente à decisão do autor mediato, e
frente ser inimputável (ex: um agente imediato de 15 anos não pode ser aproxima estes casos da co-autoria, no sentido de que o homem de trás
responsabilizado e deve ser visto como instrumento do homem de trás); tem a consciência de que as suas ordens são cumpridas e o homem da
por actuar sem consciência do ilícito, ou seja, se o homem da frente actua frente tem a consciência de pertencer à organização).
com erro valoração não censurável, pois se o erro é censurável então o . Co-autoria (art. 26.º, 3.ª parte): trata-se de tomar parte directa na execução por
homem da frente responsabiliza-se com essa actuação, podendo no acordo ou em conjunto. O co-autor domina o facto em conjunto com outro. A sua
máximo haver instigação do homem de trás, se este determinou o homem contribuição funcional não é mero favorecer do acto alheio é um (con)domínio da
da frente a actuar; por actuar em estado de necessidade desculpante, ou acção, ou seja, é um momento parcial essencial. Temos um elemento subjectivo,
seja, se alguém dolosamente, lança outrem, por coação ou engano, numa traduzido na decisão conjunta, mas isso também existe na cumplicidade, e por isso
situação do art. 35.º, então esse alguém é autor mediato. se exige também um elemento objectivo, traduzido no incidir sobre todos da
função dos demais (ex: assalto a um banco, em qua A paralisa os empregados com
d) Casos de erro sobre o sentido concreto da acção: o homem da frente uma arma e B retira o dinheiro da caixa). Se a acção de um dos co-autores vai
conhece as circunstâncias para a sua responsabilização dolosa, mas erra mais longe que o planeado, só responde quem toma parte na acção, pelo menos
sobre outras circunstâncias juridicamente necessárias para aquele ilícito; com dolo eventual, sem prejuízo de ficar ressalvada um punição por negligência
ex: A diz a B para roubar o C, A pensando tratar-se de um furto simples (ex: A e B decidem roubar C, mas B vai mais longe e mata-a, só o roubo é
actua, mas na bolsa vem um diamante (art. 213.º, n.º1, al.a)). Aqui ou o cometido em co-autoria). A participação directa basta-se com o domínio do facto
erro do home da frente exclui o dolo do tipo e o homem de trás é autor (ex: A, B, C e D assaltam um banco; A rouba, B ameaça, C segura a porta e D

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espera dentro do carro, todos eles são co-autores, pois a repartição de tarefas paralela negligente), e neste sentido há quem fale em duplo dolo (dolo no
persiste no estádio da execução). Não chega para a co-autoria actuar na fase determinar o instigado e dolo no facto por este cometido). Assim, se o instigado
preparatória: ou o planeador dirige a operação (co-autor) ou não (cúmplice ou com a sua acção ultrapassa o dolo do instigador, a este não lhe deve ser imputado
instigador). esse excesso (ex: o instigador só responde por eventos agravantes quando estes lhe
possam ser imputados a título de negligência. Assim o fato do instigador surge
. Instigação (art. 26.º, 4.ª parte): trata-se de dolosamente determinar outrem à nestes casos como determinação dolosa do instigado ao crime fundamental e como
pratica do facto. Instigador é aquele que cria de forma cabal no executor a decisão autoria paralela negligente para o evento agravante).
de atentar contra o bem jurídico, inculcando-lhe a ideia, revelando as vantagens do Por outro lado o dolo diz respeito ao ilícito e não ao modo de o executar, e abrange
ilicito. O instigador aparece como senhor da decisão do instigado. Não existe também a tentativa e não só a consumação. A instigação em cadeia também é
instigação naquele que já está determinado a praticar o ilícito. punível, basta que se afirme em cada elo da cadeia uma determinação do
Instigador não é aquele que incentiva, aconselha, sugere ou reforça o propósito de executante à prática do ilícito típico (ex: A amante de B, convence este a
outrem cometer um crime; nem é tão aquele que simplesmente ajuda a ultrapassar determinar C que mate o seu marido).
resistências físicas ou intelectuais (no máximo é cúmplice).
E se o agente já estava determinado a cometer um ilícito mas um instigador cria- . Autoria paralela: acontece quando vários participantes no facto,
lhe a vontade de cometer outro, ou seja, ex: quem instiga a um roubo, estando o independentemente uns dos outros actuam em vista da realização típica (ex: A e B
agente já determinado a fazer um furto, não se pode dizer que ele só instigou a sem saberem um do outro, corrompem o funcionário C porque ambos estão
violência, antes determinou uma unidade global, que se traduz no roubo. interessados na mesma autorização; ex: A deixa o seu sobretudo no bengaleiro da
O Prof Figueiredo dias faz assim a seguinte divisão: em sentido amplo instigação faculdade, no qual se encontra uma arma carregada; B brincalhão descobre a arma
abrange: instigação-determinação, que é um forma de autoria (art. 26.º); e pensa que está descarregada disparando sobre C, que vem a morrer; temos
instigação-auxílio moral que é cumplicidade (art. 27.º), ou seja, aqui o homem de autoria paralela no crime negligente).
trás é simples indutor.
Exige-se que a instigação seja feita com dolo, ao contrário do que sucede com as . Cumplicidade (art. 27.º): esta constitui colaboração no facto do autor e, por
outras forma de autoria, ou seja, um domínio da decisão não é compatível com a conseguinte, a sua punibilidade supõe a existência de um facto principal (doloso)
produção no executor de uma decisão por negligência (aqui fica aberta autoria cometido pelo autor. O cúmplice não é autor, não pratica acção típica. A lei alarga

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assim a punição a formas de comportamento que, sem ele, não seriam puníveis. participação nele segundo o princípio da acessoriedade limitada, é também
Cada comparticipante é punido pela sua culpa, pelo que a ratio de punição é a da punível. A pena do cúmplice merece uma dupla atenuação: em função da
contribuição para a realização de um facto ilícito típico. Só existe cumplicidade se cumplicidade e da tentativa (art. 27.º, n.º2 e 23.º, n.º2).
aumentar as hipóteses de realização típica, traduzindo-se no potenciar de um risco
não permitido caso contrário é tentativa de cumplicidade, a qual não é punida (ex: Ex: Adolfo quer matar Bento. Para tal:
A vendedor de ferragens vende um machado a B, e sabe que este vai usá-lo para a) Convence-o a agarrar um cabo de alta tensão assegurando-lhe que o mesmo
matar C sua mulher – existe aqui uma relação de sentido delituosa). não representa qualquer risco. A é autor mediato, e B o autor imediato – a vítima
. Acessoriedade qualitativa: trata-se de determinar a medida mínima de elementos é o próprio instrumento.
constitutivos do facto do autor: prevalece a acessoriedade limitada, ou seja para b) Pede a Carlos que espete uma forquilha num monte de feno sob o qual Bento
que a cumplicidade seja punida o facto do autor tem de ser típico e ilícito. se encontra a dormir (facto desconhecido por Carlos). Aqui aplicamos o artigo
. Acessoriedade quantitativa: necessidade do facto atingir um certo estádio de 16º, n.º1 (dolo de C é afastado) e quanto a A será autor mediato. Contudo, se A
realização, exigindo-se que haja inicio de execução do autor, mas isso não julga que C conhece o local onde B descansa, ele seria subjectivamente instigador
significa que a tentativa não seja punível. e seria punido como tal (art. 16.º, n.º1).
. É necessário dolo, ou seja, só se o cúmplice presta auxilio a um facto doloso. O c) Convence Carlos que Bento irá entrar em casa, dentro de momentos, de arma
dolo do cúmplice tem de ter uma dupla referência: tem de se dirigir por um lado ao em punho, pronto a disparar sobre si com o intuito de lhe provocar a morte. Trata-
auxílio e por outro à própria acção dolosa (ex: quem satisfaz o pedido de outrem se de um erro sobre causa de justificação (16º/2) que é provocado pelo A. Logo A
para que lhe entregue uma arma deve ser punido como cúmplice ainda que não é autor imediato e C punido por negligência.
possua informações mais pormenorizadas sobre a forma, o lugar ou o tempo em d) Convence Carlos, jovem muito prestável mas com uma evidente oligofrenia, a
que se vai realizar o assalto). esfaquear Bento em troca de dez rebuçados de mentol, sendo A autor imediato.
Se Carlos fosse imputável, então A era instigador e C autor imediato.
. Espécie de cumplicidade: material () ou moral (psíquico ou fortalecimento do e) Dá uma faca a Carlos dizendo-lhe que tem um minuto exacto para matar Bento,
autor da decisão). que se encontra no quarto ao lado. Se o não fizer, Adolfo disparará um tiro na testa
. Cumplicidade na tentativa: no caso de existir cumplicidade, mas o facto do autor de Daniel, filho de Carlos, que mantém preso. Aqui A é auto mediato por coação
se ficar pela tentativa punível, e constituindo este já em si um ilícito típico, a “vis relativa”.

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f) Assina uma "ordem de serviço" na sua qualidade de "padrinho" de um "sindi- objecto).
cato" de actividades criminosas. Também aqui A é autor mediato, porque a Ex: Bento, ao passar de noite por uma rua, vê que Adolfo espanca violentamente
dependência do homem da frente, em relação ao homem de trás é de tal ordem Colombo que está prestes a perder os sentidos. Bento espera, escondido, que a
que a autoria mediata deve ser afirmada. vítima fique inanimada e o agressor se afaste para, então, subtrair o dinheiro a
g) Empurra Carlos, que segura, naquele preciso momento, um estilete afiadíssi- Colombo. No decurso da execução, Bento verifica que a vítima não traz consigo
mo, na direcção de Bento. A é autor imediato. Quanto a C não há acção, mas sim dinheiro. Ambos são autores paralelos (mas não há co-autoria). Quanto a B
coação física (vis absoluta). haveria tentativa falhada.
Ex: E se, no caso 1, alínea d), Carlos acabasse por matar, não apenas Bento, mas, Ex: Adolfo e Bento concebem o plano de matar Colombo, ministrando, ao longo
também, toda a sua família, de modo a conseguir mais uns "saborosos rebuçados de determinado período de tempo, cada um deles, em dias alternados, uma dose de
de mentol". Haveria uma situação de excesso. A seria autor mediato relativamente veneno, em bebidas a tomar pela vítima. O plano é descoberto logo depois de
ao que encomendou. Quanto ao resto não tinha nada a haver; Adolfo ter ministrado a primeira dose prevista. A e B são co-autores logo que um
Ex: Adolfo prepara uma chávena de chá envenenado e ordena a Bento - que comece inicia-se a tentativa para todos.
desconhece o plano criminoso - que se encarregue de a servir a Carlos. Bento Ex: Abel e Berta são dois terroristas que querem matar um político. Sabem que
confunde Carlos com Daniel, servindo a bebida a este último. Daniel morre. A é este, de visita a uma cidade de província, utilizará um de dois caminhos para nela
autor mediato; Erro sobre a identidade (é irrelevante) o que equivale para o autor entrar. Cada um situa-se num lugar de cada caminho de onde poderá com grande
mediato com uma situação de erro de execução. Assim como solução temos um probabilidade atingir o seu alvo. O político entra na cidade pelo caminho onde
concurso efectivo ideal de tentativa e homicídio. está Abel, que dispara, limitando-se, no entanto, a feri-lo com gravidade. Ambos
Ex: Adolfo e Bento pactuam roubar Colombo, mantendo Adolfo a vítima em res- são co-autores diz Roxin.
peito, sob a ameaça de uma pistola, enquanto Bento retira, dos seus bolsos, o Ex: Abel e Berta são dois terroristas que querem matar um político. Sabem que
dinheiro. No decurso da execução, Bento verifica decepcionado que Colombo não este, de visita a uma cidade de província, utilizará necessariamente determinado
traz consigo dinheiro. A e B actuam em co-autoria (existe elemento subjectivo e caminho para nela entrar. Como o local é de difícil visibilidade combinam, para
objectivo, ou seja, a decisão e execução). Isto pode ser tácito (ex: troca de aumentar a probabilidade de sucesso, disparar ambos, simultaneamente, sobre o
olhares). seu alvo, o que fazem. O político morre atingido por uma única bala, mas não
Tentativa falhada, logo não pode haver desistência (há uma inexistência do consegue provar-se qual deles a disparou. Trata-se de um caso de causalidade

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alternativa, onde ambos são co-autores e são ambos punidos por tentativa de assim faz, deixando o embrulho em casa de Carlos. Na verdade, não se tratava de
homicídio doloso consumado; um presente, como Berta julgou, mas de uma bomba-relógio que explodiu à hora
Ex: Adolfo, Bento e Carlos costumam realizar, em conjunto, uma série de assaltos. programada, matando Carlos.
Neste contexto: R: A . autor mediato; B – erro de ignorância – artigo 16º/1 exclui-se o dolo nas
a) Adolfo, cérebro do "gang", ordena a Bento e Carlos, a realização de um assalto não negligência 16º/3 – autoria imediata;
a uma instituição de crédito, tarefa que estes últimos prontamente executam. A
seria instigador porque para ser co-autor teria de haver uma acção em conjunto
com os restantes (ex: controlo à distância), sendo que D e C são co-autores.
b) Adolfo encomenda um plano a Daniel, conhecido estratega "doutorado" em
ciências criminólogas, para a realização de um assalto e, uma vez na posse do
mesmo, ordena, a Bento e Carlos, a execução do plano. Aqui temos que A é
instigador, B e C co-autores e D simples cúmplice material.
c) Imagine que, no âmbito da sub-hipótese anterior, Adolfo telefona, durante o
assalto, a Bento, de modo a explicar-lhe como colocar o explosivo no cofre-forte
do banco. Aqui já teríamos A, B e C como co-autores.
Ex: Adolfo, Bento, Carlos e Daniel planeiam a realização de um assalto a um
banco.
Nos termos do mesmo, Adolfo ficará à porta encarregue da vigilância do edifício,
Bento ameaçará os funcionários e clientes com uma arma de fogo, Carlos encherá
os sacos com dinheiro e Daniel esperará, no passeio em frente, com o motor do
carro ligado, pela fuga dos seus companheiros. Em princípio C e B são co-autores;
A e D são cúmplices. O acto de execução de cada um dos co-autores têm que ser
essenciais à obtenção do resultado.
Ex: a) Abel pede a Berta que entregue a Carlos um presente de aniversário. Berta

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