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TANATOLOGIA FORENSE

AULA 4

CONTINUAÇÃO À ENTOMOLOGIA FORENSE

Na aula passada aprendemos sobre a Entomologia Forense e os principais


insetos aplicados nessa área do conhecimento.

Na aula de hoje veremos alguns casos concretos em que essa ciência foi
utilizada a favor da justiça e os fenômenos de variabilidade da data estimativa da morte.

Quando aprendemos sobre as fases de decomposição vimos que eles levam


determinado período de tempo para começarem a acontecer, mas essas estimativas são
encontradas com base em uma média de tempo calculada no Brasil, em um clima fresco
e aberto.

Mas nem sempre os cadáveres encontram-se expostos às mesmas temperaturas,


espaços e ambientes.

Por exemplo, a decomposição de um cadáver dentro de uma residência fechada


em uma cidade fria do Rio Grande do Sul seguirá fases e manifestações totalmente
diferentes da decomposição de outro cadáver que se encontre na beira de um rio em
uma cidade quente como o Rio de Janeiro, por exemplo.

Essa diferença acontece porque para determinar o IPM não basta somente
conhecer o ciclo de vida dos insetos. Devemos também considerar a influência dos
fatores ambientais como a temperatura, a umidade relativa, a latitude e a altitude da
área que se encontra o corpo de delito analisado.

É necessário também considerar se o corpo está coberto com roupas e se


ocorreu a presença de substâncias ingeridas ou se sobre o corpo há algum produto como
combustíveis, lubrificantes ou tintas.

Tudo isso irá influenciar na chegada dos insetos até o cadáver e a proliferação
dos mesmos na carcaça.

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Veremos a seguir uma coletânea de casos onde a entomologia forense foi


utilizada e aplicada juntamente com os métodos conservadores de uma investigação
criminal.

Caso 1

Em 06 de julho de 1999, o corpo de uma mulher foi encontrado em um imóvel


residencial.

As portas e janelas estavam lacradas e o corpo estava coberto por várias colchas
e lençóis. Esses tecidos formaram uma espécie de barreira para o acesso dos insetos ao
cadáver.

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O corpo estava inchado, a língua estava protusa e exalava um odor fétido.

O relatório de investigação indicou que a mulher teria sido vista viva pela
última vez, três dias antes da data em que o corpo foi encontrado.

Apenas alguns ovos de mosca foram localizados atrás da orelha e eclodiram em


laboratório.

Essas larvas foram criadas até o estágio adulto. O grau dia acumulado foi
calculado baseado no tempo de desenvolvimento para essa espécie sob condições de
laboratório.

O GDA foi calculado para eclosão dos ovos resultando em um intervalo pós-
morte menor que um dia.

Esses resultados não coincidiram com a estimativa obtida pelos médicos


legistas através de critérios usuais como aparência física, lividez, rigor mortis e
principalmente o relatório da investigação.

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Essa discrepância entre a estimativa alcançada pela análise das moscas e larvas
e o resultado obtido através do relatório da investigação provavelmente aconteceu pelo
atraso na chegada dos insetos ao corpo, porque as portas e janelas estavam fechadas e
o copo estava coberto, criando uma barreira.

Se o corpo estivesse em um ambiente externo seria imediato o início do


desenvolvimento entomológico e várias espécies de insetos estariam presentes,
possibilitando os cálculos pela comparação de seus ciclos de vida, aumentando a
acuidade do método.

Caso 2

Em 06 de julho de 1999 em um terreno baldio com piso de terra batida foi


encontrado um cadáver masculino em avançado estágio de decomposição, já
apresentando as características compatíveis com o estágio enfisematoso. Esse cadáver
estava coberto por vegetação.

O relatório da investigação indicou que o homem havia sido visto pela última
vez a quatro dias atrás. Através da estimativa da morte e reconstruindo os últimos
lugares e pessoas visitados pela vítima a polícia conseguiu chegar até a autoria daquele
crime.

No cadáver a equipe de entomologia forense encontrou espécimes adultos dos


insetos Chrysomya megacephala, Chrysomya macellaria e Sarcophaga ruficornis.
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Quanto aos insetos imaturos, muitas larvas em terceiro ínstar foram


encontradas, especialmente na região craniana.

A temperatura da massa larval foi medida em 31 graus célsius.

Em 14 de julho, depois de 141 horas, alguns espécimes de Chrysomya


megacephala emergiram.

O grau dia acumulado foi calculado e o intervalo pós-morte mínimo foi


estimado em 4 dias, o que coincidiu com a estimativa obtida pelos métodos usuais de
investigação.

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Caso 3

Em 9 de agosto de 1999, o corpo de um homem foi descoberto no meio


de uma floresta.

Os investigadores verificaram que o homem teria sido visto pela última vez seis
dias antes do corpo ser encontrado.

O corpo estava em recente estagio de decomposição e os espécimes adultos


Calliphoridae e Sarcophagidae estavam presentes.

Quanto aos insetos imaturos, larvas de terceiro ínstar estavam no corpo e


pupários escuros foram encontrados no solo perto do corpo.

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Em 13 de agosto de 1999, após 92 horas alguns espécimes de Cochliomya


macellaria emergiram em laboratório.

O grau dia acumulado foi estimado em 5,5 dias, em conformidade com o


intervalo obtido nas investigações.

Caso 4

Em 19 de abril de 2004, os corpos de 26 homens foram encontrados na floresta


da reserva indígena do Parque Nacional Aripuanã, no estado da Rondônia.

Segundo a investigação da Polícia Federal os garimpeiros teriam sido mortos


durante um conflito com os índios por causa da extração ilegal de diamantes na reserva
em abril de 2004.

Os corpos dos 29 garimpeiros foram achados pela Polícia Federal já em estado


de decomposição. Na ocasião, helicópteros foram usados para retirar os cadáveres,
colocados em 13 sacos de diferentes tamanhos.

Numa região de floresta densa e chuvosa. Os homens foram identificados como


garimpeiros envolvidos em confronto com índios Cinta Larga.

Os corpos estavam em diferentes posições, 23 juntos e três isolados, numa


distância de 1000 metros dos outros.

Os corpos estavam vestidos com camisetas, shorts ou calças e em diferentes


condições.

Os estágios de decomposição eram de saponificação e Esqueletização.

A necropsia indicou que a maior parte das mortes foi causada por traumatismo
cranioencefálico.

Não havia patologistas nem entomologistas presentes na cena do crime.

Não foram coletados insetos, nem verificada a temperatura em umidade do


local. Os corpos foram removidos e transportados de helicóptero para a cidade de Porto
Velho, localizado a 500 quilômetros do local do crime.

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Em 20 de abril, 2004, durante a necropsia foram coletadas 320 larvas dos


corpos. As larvas foram imediatamente refrigeradas e encaminhadas para a
Universidade de Brasília onde foram identificadas como Paralucilia fulvinota.

No laboratório as larvas que estavam em terceiro instar evoluíram para pupas


em 58 horas e em adultos em 110,5 horas.

O tempo total de desenvolvimento para Paralucilia fulvinota foi mensurado em


experimentos realizados em Manaus dentro da floresta usando carcaça de porcos.

A idade estimada das larvas e o intervalo pós-morte mínimo foi de 5,7 dias.

O dia o mais provável que possa ter ocorrido o massacre foi no dia 15 de abril
de 2004.

O que esses casos concretos nos mostram é que como o Brasil é um país que
possui uma grande diversidade de climas e ambientes, é possível observar diferentes
espécies entomológicas e diferentes estágios e ciclos de desenvolvimento desses
insetos.

Por mais que na maior parte das vezes a estimativa do IPM obtida através da
análise dos insetos irá coincidir com as informações e as provas investigativas, existem
circunstâncias que podem alongar ou reduzir a estimativa do IPM.

Dinâmica de trabalho da equipe de trabalho da entomologia forense

A equipe pericial que trabalha em campo no atendimento de diversos locais de


crime é normalmente composta por um perito criminal e um fotógrafo técnico-pericial,
podendo ser incrementada com um desenhista técnico-pericial e um auxiliar de
papiloscopia.

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Compete ainda ao perito criminal o exame Peri necroscópico do corpo humano


envolvido em morte violenta ou em morte suspeita, ainda no local onde foi encontrado
sendo, portanto, o primeiro agente do Estado a proceder o exame do cadáver, buscando
relacionar as circunstâncias em que o corpo foi encontrado e suas eventuais lesões, com
a cena do crime.

Esse profissional irá complementar seu laudo mencionando aspectos imediatos


à consumação do crime como os atos preliminares, sua execução e os vestígios
remanescentes do crime. Uma análise criteriosa desses vestígios poderá fornecer os
elementos de convicção indispensáveis ao julgador.

É nesse campo que a Entomologia Forense ganha espaço, porém a sistemática


para sua execução deve se adequar às peculiaridades, limitações e dificuldades
enfrentadas pela equipe pericial, sob pena do seu potencial investigativo ser ignorado.

Encerramos a aula de hoje alunos. Espero que tenham aprendido bastante sobre
esse universo da biologia e dos insetos necrófagos. Continuaremos na próxima aula
com mais alguns casos práticos de como a perícia e os insetos são fundamentais em
uma investigação criminal! Até a próxima aula

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