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Aula 11-11-02

Sumário (manhã): Max Weber e a "sociologia compreensiva". O conceito de "acção


social" e de "tipo-ideal". A ética protestante e o espírito do capitalismo.

Sumário (tarde): A teoria da estratificação social em Max Weber. Virtualidades e


lacunas. A importância do género na hierarquia social.

MAX WEBER
1- Dados biográficos
2- A sociologia "compreensiva".
3- A teoria do "tipo-ideal".
4- A Ética protestante e o espírito do capitalismo (exemplo da aplicação do método).

1. Dados biográficos:
Max Weber (1864-1920). Sociólogo alemão. No entanto, Weber dificilmente se via a si
próprio apenas como sociólogo. A amplitude e a profundidade dos seus conhecimentos
históricos eram verdadeiramente fenomenais. No fim da sua vida, quando aceitou uma
cátedra de sociologia em Munique, comentou "Parece que agora, nos termos da minha
promoção, sou um sociólogo".,
Escreveu livros sobre as companhias do comércio da Idade Média e a história agrária de
Roma antes de escrever os primeiros artigos sociológicos, designadamente o ensaio A
objectividade nas ciências sociais, onde apresenta a sua teoria do tipo-ideal (1904) e o
ensaio em dois capitulos de A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo (1904 e
1905).

2. A sociologia "compreensiva"
Para Weber, a sociologia é uma ciência que procura compreender a acção social. A
compreensão da acção social implica a percepção do sentido que cada actor social atribui
à sua própria conduta. Weber quer atingir uma compreensão dos sentidos subjectivos. A
análise sociológica deve partir do sentido subjectivo que os actores conferem à sua
própria conduta (individualismo metodológico weberiano).
De acordo com Weber, a explicação de um fenómeno encontra-se essencialmente no
significado que os indivíduos dão aos seus actos. Daí que seja necessário ter em conta os
princípios e os valores que orientam os comportamentos. As condutas humanas são
intencionais e inspiradas por um conjunto de representações mentais, uma certa imagem
da vida, da sociedade ou uma certa imagem que se tem dos outros actores sociais. Weber
quer também compreender o contexto cultural no qual participam os actores.
Para a sociologia interpretar (dar conceptualmente conta da acção), compreender
(apreender o sentido) e explicar (estabelecer relações de causa e efeito) necessita de
conceitos, que devem ser elaborações teóricas sujeitas a verificações empíricas. As
ciências sociais exigem uma construção de conceitos que lhe sejam próprios. Propõe
assim a noção de tipo-ideal.
O cientista não consegue compreender a acção dos outros de um modo imediato, tem que
haver investigação e provas. A ciência de Weber define-se como um esforço destinado a
compreender e a explicar os valores aos quais os homens aderiram. Como os homens
puderam viver em sociedades diversas em função de crenças diferentes.
A compreensão da acção social exige uma abstracção a partir da complexidade infinita da
realidade.

A acção é toda a conduta humana sempre que o sujeito ou os sujeitos da acção lhe dêem
um sentido subjectivo. A acção é social quando o sentido pensado pelo seu sujeito ou
sujeitos está referido à conduta dos outros, orientando-se por esta no seu
desenvolvimento.

Há uma relação social quando existe uma reciprocidade por parte de dois ou mais
indivíduos, cada um dos quais relaciona a sua acção em relação aos actos previsíveis dos
outros. P. ex, na nossa sociedade estendemos a mão a uma pessoa na expectativa que ela
corresponda. O que não implica necessariamente que os significados inerentes à relação
social sejam iguais para ambos os participantes nele: p. ex., uma relação amorosa em que
um ama e o outro se deixa amar. No entanto, nessa relação, há significados que definem
aquilo que cada um espera do outro.
Nem todos os tipos de contacto entre indivíduos constituem uma relação social: se dois
homens desconhecidos chocarem na rua um com o outro, essa interacção não é uma
situação social. Seria uma acção social se começassem a discutir.
A sociologia deve basear-se em técnicas fixas de interpretação do significado, que
possam assim ser comprovadas de acordo com os cânones convencionais do método
científico. A análise científica da acção social terá de recorrer à elaboração de tipos-
ideais.

Tipos de acção

Acção racional com relação a um objectivo (ou racional instrumental). O actor concebe
claramente qual o seu objectivo, em função dos seus conhecimentos da situação e
combina os meios disponíveis para atingi-lo. P.ex. a acção do cientista, que quer
estabelecer relações de causalidade que sejam universalmente válidas).
Acção racional com relação a um valor o actor age racionalmente não para atingir um
resultado objectivo, mas porque aderiu a determinados valores (p.ex., o actor age para
permanecer fiel à sua ideia de honra)
Acção afectiva : ditada pelo estado de consciência do momento.
Acção tradicional: ditada pelos hábitos, pelos costumes e crenças. O actor não concebe
um objectivo, ou obedece a um valor ou é impelido por uma emoção, obedece a reflexos
criados por uma longa prática.

A validade universal da ciência exige que o cientista não projecte os seus próprios juízos
de valor na investigação. Mas as suas preferências orientam a curiosidade do cientista. A
validade universal das ciências históricas e sociológicas são respostas universalmente
válidas a questões orientadas pelos nossos interesses e valores.
3.Teoria dos tipos-ideais
O tipo-ideal é um quadro de pensamento construído pela acentuação de um ou mais
aspectos da realidade.
Selecção de determinadas dimensões da realidade. Não se pode encontrar empiricamente
na realidade esta construção mental. À pesquisa cabe a tarefa de determinar para cada
caso singular em que medida essa construção ideal se aproxima ou diverge da realidade.
O tipo-ideal não é ideal num sentido normativo, isto é, não implica que a sua realização
seja desejável. Podemos construir um tipo ideal de assassinato ou de prostituição.

Exemplo de tipo-ideal: a ética calvinista. Este conceito foi extraído de escritos de várias
figuras históricas, e os componentes das doutrinas calvinistas a que Weber deu relevo são
seleccionadas em função da sua importância na constituição do espírito capitalista.

A utilidade de um tipo-ideal deve ser avaliada em relação a um problema concreto e a sua


finalidade é facilitar a análise de questões empíricas.

4.A Ética protestante e o espírito do capitalismo (exemplo da aplicação do método).

Weber quis demonstrar que a conduta dos homens nas diversas sociedades só pode ser
compreendida dentro do quadro da concepção geral que esses homens têm da existência,
distinguindo-se de Marx que se propõe analisar as sociedades pela produção material dos
homens.
Os dogmas religiosos são partes integrantes dessa visão do mundo e influenciam a
conduta dos indivíduos, nomeadamente o seu comportamento económico. Weber quis
provar que as concepções religiosas determinam a conduta económica e, por isso, são
uma das causas das transformações económicas das sociedades.

Segundo Weber, o capitalismo é definido pela existência de empresas, cujo objectivo é


produzir o maior lucro possível utilizando uma organização racional do trabalho e da
produção.
O traço singular do capitalismo ocidental é a união entre o desejo de lucro e a disciplina
racional do trabalho (previsões de um mercado regular, separação entre o espaço de
residência e do trabalho, utilização das técnicas desenvolvidas pela ciência com vista à
rentabilidade).Weber associa o surgimento do capitalismo ocidental ao nascimento da
classe burguesa ocidental.
Weber não quer provar que as concepções religiosas determinem o êxito económico, mas
sim quer saber se as crenças religiosas não exercem uma influência sobre os homens e os
grupos, nomeadamente no que respeita às atitudes em relação ao trabalho.

O calvinismo criou uma determinada atitude em relação ao trabalho que favoreceu o


aparecimento do capitalismo ocidental.

Princípios do calvinismo que Weber afirma que condicionaram a actividade económica:


- Existe um deus transcendente que não pode ser percebido pelo espírito finito dos
homens.
- O deus absoluto predestinou cada um de nós para a salvação ou para a condenação.
- O homem, que será salvo ou condenado, tem o dever de trabalhar para a glória de deus.

Na perspectiva de Weber, esta visão religiosa impede qualquer tipo de misticismo, pois a
comunicação do homem com deus está interdita. É assim uma concepção anti-ritualista, e
por isso favorável ao desenvolvimento da ciência.

O crente deve trabalhar na obra de deus. Mas não sabe se vai salvar ou se vai ser
condenado. Weber sugere que por uma inclinação psicológica certas seitas calvinistas
vêem no êxito económico uma prova da escolha de deus. Logo, o indivíduo é conduzido
a dedicar-se ao trabalho para vencer a angústia provocada pela incerteza da salvação.
A ética protestante convida o crente a desconfiar dos bens materiais, a não gozar os bens
materiais. Ora, trabalhar tendo em vista o lucro e não gastá-lo, mas sim poupá-lo é uma
das condições imprescindíveis ao desenvolvimento do capitalismo. Na perspectiva de
Weber, a ética protestante incita a procurar o lucro não para gozar a vida mas para atingir
a satisfação de produzir cada vez mais.

O estudo de Weber permite compreender a influência das crenças e dos valores nas
condutas humanas.

Traços do capitalismo ocidental:


- possibilidade pacífica de lucro com vista à rentabilidade
- acção orientada segundo um cálculo de capital (existência
de uma contabilidade moderna)
-organização racional do trabalho livre
-separação entre a família e a empresa
-desenvolvimento técnico da ciência
-aparecimento da administração e do direito racionais

A recusa da salvação sacramental administrada pela igreja (enquanto no catolicismo o


cumprimento dos sacramento permitem alcançar a graça divina) é um dos aspectos do
calvinismo que marca o grande processo histórico-religioso de desencantamento do
mundo (fim da crença na magia).

A Estratificação social em Max Weber

Como é que se estabelecem as desigualdades sociais? Como se formam, numa


determinada sociedade, as diferentes classes sociais?
A teoria das classes sociais de Max Weber encontra-se na sua obra Economia e
Sociedade (1919-1922). Influenciou directamente teóricos funcionalistas europeus e
americanos (Parsons, Mills, Dahrendorf etc.) mesmo no período actual.
A teoria da estratificação social de Max Weber centra-se na sua noção de Poder, já que
este autor entende a estratificação social como o resultado de uma desigual distribuição
de poder no seio de uma comunidade.
Weber define o poder como:
"a possibilidade que um homem ou uma pluralidade de homens tem de fazer prevalecer a
sua própria vontade numa actuação comunitária, mesmo contra a resistência de outros
intervenientes" (Weber, op. cit., p. 737)

Segundo este autor, as desigualdades sociais manifestam-se essencialmente de três modos


diferentes: a hierarquia económica, que define a "classe" em sentido restrito; a hierarquia
social propriamente dita, que forma grupos de status e a hierarquia política, originando a
formação de "partidos", aqui entendidos como uma pluralidade de indivíduos associados
com vista a manter ou alcançar a liderança política.

Weber entende que cada uma desta dimensões de estratificação social apoia-se num tipo
concreto de poder. Assim, a formação da classe baseia-se no poder económico,
exercitado no mercado; os grupos de status assentam no poder social, surgindo o status de
um indivíduo em função da avaliação que os outros fazem dos seus atributos pessoais,
concedendo-lhe um certo grau (positivo ou negativo) de prestígio, ou do que Weber
chama "honra". Por fim, os partidos correspondem à distribuição do poder político e a
hierarquia política opõe dominantes e dominados.
Weber faz notar que é necessário distinguir conceptualmente estas três dimensões de
hierarquização social. Contudo, a nível empírico, estas três formas de poder e respectivas
hierarquias podem surgir relacionadas, de forma estreita e variada. É o caso do status, que
nas sociedades modernas surge muitas vezes associado à filiação política e apoiado e
derivado da condição económica.

O poder está vinculado à pessoa: o indivíduo é o seu portador e instância determinante. O


poder refere-se ao sentido, à orientação subjectiva de um de um determinado tipo de
acção individual: a acção de impor a sua própria vontade.
Existem três formas de poder: económico, social e político. Estes são três maneiras
diferentes de impor a vontade ao próximo.
Um indivíduo pode impor-se no mercado criando uma situação económica favorável para
a aquisição de bens materiais. Pode impor-se ao próximo através do prestígio ou estima
que a sua conduta e qualidades possam inspirar. Pode também impor-se influenciando
directamente a acção dos outros ao adquirir autoridade. A escolha de uma ou outra
maneira de impor a vontade aos outros, a posse de uma ou outra forma de poder, depende
por um lado, das disposições individuais e da orientação que o indivíduo dê à sua conduta
e, por outro lado, das disposições, orientações, interesses e valores dos indivíduos a quem
o poder é imposto.
O conceito de poder permite aprofundar a noção de relação social. A acção é social,
segundo Weber, quando "o sentido pensado pelo seu sujeito ou sujeitos está referido à
conduta dos outros, orientando-se por esta no seu desenvolvimento". Ora a acção de um
indivíduo orienta-se para outro indivíduo, porque este representa um obstáculo, e a
realização de um indivíduo depende da sua capacidade de se impor apesar dessa
resistência. As relações sociais são assim relações de poder, uma relação conflitual entre
indivíduos que pretendem realizar a sua vontade. O objecto da competição é o controlo
das condições que permitam realizar os objectivos e os interesses. Mas a competição é
uma luta pacífica, regulada por leis e usos da "ordem social legítima". A ordem social
tem como função tornar previsíveis os actos dos actores sociais. A ordem social implica
um consenso, uma cooperação estável entre os diferentes indivíduos, assegurando que a
luta permanente entre os indivíduos conduza ao êxito dos mais dotados-----função de
selecção positiva, efectuada com base na "competência".
A estratificação social é o resultado de um processo de selecção social, que por meio da
competência, revela e consagra a superioridade dos que possuem as qualidades pessoais
essenciais para o êxito. A "ordem legal" associada ao estado é a que melhor assegura a
regulação pacífica da competição entre os indivíduos e os grupos, assegurando a
previsibilidade e estabilidade das acções dos indivíduos que se encontram em interacção.
A estratificação, como resultado da distribuição de poder na comunidade, manifesta-se
numa tripla hierarquia. Cada uma das três espécies de hierarquia apoia-se num tipo
concreto de poder e por isso forma grupos de natureza diferente.
Weber afirma que há que manter uma clara distinção teórica e analítica entre os três
modos de hierarquia social. Apesar de nas sociedades modernas o poder económico
condicionar a posição social e a posição política, não se pode considerar o económico
como a base única e determinante da estratificação social: segundo Weber, nisto reside o
erro da teoria marxista. O carácter determinante do factor económico aparece numa
conjuntura concreta e não estabelece uma relação geral e universal. Em outros contextos
históricos, por exemplo, nas sociedades feudais, o status, o prestígio justificavam o poder
económico e o poder político. Por outro lado, na sociedade moderna existem excepções à
regra do determinismo do poder económico: por exemplo, o caso dos novos-ricos, cuja
fortuna não basta para aceder ao prestígio social de que gozam as "famílias tradicionais".
Ou o caso do professor universitário, cujo prestígio social não está associado ao um
elevado poder económico. O poder económico não pode assim explicar de um modo
universalmente válido as desigualdades sociais.
Weber defende por isso que a nível conceptual se distingam as três bases de poder e que a
nível empírico se estude as diferentes correlações entre os três tipos de poder.

As classes:
A distribuição desigual de poder económico é determinada pelas leis objectivas e naturais
da economia e que se manifestam no mercado. A situação de classe é o efeito da situação
do indivíduo no mercado. E essa posição vai condicionar a possibilidade de adquirir bens
ou de alcançar outros objectivos de natureza económica. A classe é assim o resultado da
manifestação do poder especificamente económico do indivíduo. Esse poder económico
está condicionado em grande medida pela posse de propriedade. Os que dispõem de
propriedade podem aproveitar melhor as ocasiões de mercado. A distribuição desigual de
poder económico corresponde, em última instância a uma desigual distribuição de
propriedade. O tipo de propriedade que os indivíduos dispõem afecta, igualmente, a sua
situação de classe. Para os que não possuem propriedade e apenas possuem o seu trabalho
ou os seus serviços para trocar no mercado, a sua situação de classe é determinada pelo
tipo de serviço que podem oferecer.
A hierarquia económica tem assim duas dimensões: o mercado dos bens e o mercado do
trabalho. E Weber desenvolve uma tipologia complexa das classes sociais.
As classes de propriedade (diferenças de património):
- Classes positivamente privilegiadas (os que vivem dos seus rendimentos).
- Classes negativamente privilegiadas (os que não têm rendimentos, escravos, pobres,
endividados)
- Entre ambas existem as classes médias, abrangendo camadas de todo o género, que
providas de património ou de aptidões adquiridas por instrução, tiram daí o seus sustento.

As classes de produção (a situação de classe é determinada pela colocação e valorização,


no mercado, de bens e serviços).
A hierarquia das classes sociais constitui uma espécie de síntese do duplo fundamento do
poder económico: propriedade e serviços (ou trabalho). Weber estabelece assim a
seguinte tipologia das classes sociais:
- operariado
- pequena burguesia
- intelectuais e os peritos profissionais que não possuem bens
- as classes dos proprietários e dos que têm acesso privilegiado à educação.

O mercado representa o lugar por excelência da racionalidade, o lugar onde a busca


racional do interesse individual se pode realizar sem dificuldades. Por isso, o poder
económico é fundamentalmente o poder da razão, manifestado no mercado e a
racionalidade individual constitui a capacidade para impor-se através da acção
económica. A desigualdade na distribuição de propriedade é uma manifestação da
desigualdade de aptidões individuais necessárias para a aquisição de propriedade.
A longo prazo, a posição das classes proprietárias produz fenómenos de "usurpação" do
poder económico, que se traduz em privilégios "não merecidos", "não adquiridos". Mas
as causas deste fenómeno não se podem situar na esfera do mercado, que constitui a
localização por excelência da racionalidade. As causas devem ser procuradas no domínio
do "irracional" da honra, do prestígio, do estatuto social.

Consciência e acção de classe


A classe social é um grupo de pessoas com a mesma situação económica, definida do
ponto de vista da propriedade e dos recursos colocáveis no mercado. Weber rejeita a ideia
de que as classes económicas formem grupos reais. A classe constituiria um grupo real se
representasse para o indivíduo um valor susceptível de orientar a sua acção. Uma situação
semelhante de classe não constitui a base de uma acção concertada de vários indivíduos.
Quando muito, ocorrem reacções semelhantes, uma "acção de massa", que não é mais do
que uma actividade semelhante de várias pessoas, que reagem do mesmo modo a um
estímulo idêntico. Por exemplo, o pânico na bolsa, não representa uma reacção devido a
um interesse colectivo, mas sim uma presença simultânea de interesses individuais da
parte de pessoas que ocupam uma situação de classe semelhante.
Weber admite que em determinadas circunstâncias particulares possa ocorrer uma acção
de classe, mas isso não constitui um fenómeno universal. A vontade de mudança exige a
existência de condições intelectuais específicas, e é preciso que os indivíduos
compreendam as relações entre as causas e os efeitos da sua condição de classe.

Os grupos de status
A distribuição do poder social entre os membros de uma colectividade produz uma
hierarquia de grupos com fronteiras imprecisas, "amorfas". Enquanto a "situação de
classe" é determinada por critérios puramente económicos, o status de um indivíduo é
condicionado por uma avaliação social, positiva ou negativa, a "honra". Esta avaliação
implica uma relação inter subjectiva: por um lado, as qualidades da pessoa avaliada, por
outro lado a subjectividade dos restantes membros da comunidade, em particular, os seus
valores, ou que eles honram e respeitam. O "estilo de vida" é o aspecto mais
característico do prestígio e engloba muitos elementos como a instrução e cultura, o tipo
de trabalho, os costumes, os gostos. O status pode ser adquirido em primeiro lugar, por
um modo de vida próprio, estando associado em particular à natureza da profissão; ou
status de nascimentos, ou carisma hereditário (condição de origem).
O contraste entre classe e grupos de status é também um contraste entre a produção e o
consumo. Enquanto a classe expressa relações envolvidas na produção, os grupos de
status expressam relações envolvidas no consumo, na forma específica de "estilos de
vida".
As classes e os grupos de status tendem a estar intimamente ligados através da
propriedade: a posse de propriedade é um determinante essencial da situação de classe,
como também pode fornecer a base para que se siga um determinado estilo de vida.
O êxito económico é um dos atributos mais importantes do prestígio, mas não é o único.
Por outro lado, o prestígio não tem o carácter automático e objectivo próprio das leis do
mercado.
Mas a simples posse de qualidades socialmente valorizadas não é suficiente para adquirir
prestígio. Para Weber, o status significa a "reivindicação eficaz da estima social" e o
indivíduo com prestígio é aquele que conseguiu obter o reconhecimento das suas
qualidades pessoais, é o que conseguiu obter a honra e a dignidade (no sentido de "boa
sociedade") através de um determinado modo de vida. A verdadeira base do status não é
o estilo de vida, mas o poder social, ou seja, a capacidade de se impor através de um
determinado estilo de vida.
Os grupos de status são grupos reais (ao contrário das classes) porque a acção dos
indivíduos que os compõem está subjectivamente orientada para a acção dos outros. Os
membros de um grupo de status são as pessoas que os outros membros do grupo
reconhecem como pertencendo a este.
O status dificulta a acção das leis de mercado, cujo efeito é recompensar
automaticamente as condutas racionais. Mesmo quando os grupos de status se constituem
com base no poder económico, só se podem manter impedindo o funcionamento normal
do mercado. Quando a lógica do status prevalece totalmente, a classe social transforma-se
em casta. O que é um caso-limite raro.
Segundo Weber, uma sociedade e uma época podem caracterizar-se pelo tipo de
estratificação social dominante. A superioridade da estratificação económica está
directamente relacionada com o grau de desenvolvimento da economia de mercado;
enquanto uma sociedade de status corresponde a sociedades feudais, religiosas e
patriarcais, em que a actividade económica não está submetida a princípios racionais.
Weber afirma que o estabelecimento de um novo modo de produção costuma modificar a
hierarquia dos grupos de status, provocando uma nova distribuição do poder económico.
Mas uma vez estabelecida a hierarquia de classes, tende a cristalizar-se numa hierarquia
de status.
Na sua perspectiva, a estratificação puramente económica, baseada nas qualidades
racionais dos indivíduos tende a impor-se com o desenvolvimento e consolidação da
economia capitalista. A distribuição de prestígio na sociedade moderna é cada vez mais
difícil de dissociar da posição de classe, e por outro lado, o poder económico constitui
cada vez mais, o factor decisivo de desigualdade.
Com o triunfo do capitalismo, a racionalidade será o princípio básico de constituição da
ordem social. O problema da reprodução de posição social não se deverá por, pois as leis
infalíveis do mercado asseguram uma distribuição desigual do poder, que corresponde
perfeitamente ao mérito individual, impedindo a cristalização de posições adquiridas por
recurso a elementos irracionais.
Os partidos
Estratificação baseada no poder propriamente político, e que está mais ou menos
associada ás duas outras formas de estratificação social. A desigual distribuição de poder
político forma "partidos". A noção de partido deve ser entendida num sentido geral, como
uma associação de indivíduos com vista a alcançar fins políticos. O campo de actuação
dos partidos é, por excelência, o Estado, mas Weber afirma que se pode falar de partidos
em sentido amplo, podendo-se falar de partidos sempre que há uma disputa pelo poder,
por exemplo, num clube, numa igreja, etc. O partido envolve uma socialização dos seus
membros, na medida em que exige uma certa concertação racional das acções de
diferentes indivíduos com vista à obtenção de poder. Para Weber, o exercício burocrático
do poder e a hierarquia correspondente constituem a forma ideal de desigualdade política.
AULAS DE 18-11-02
Sumário (manhã): As desigualdades sociais e a mobilidade social - definição de
conceitos.
As teorias da estratificação social na actualidade: o caso do estrutural-funcionalismo, Erik
Olin Wright e Pierre Bourdieu.

Sumário (tarde): Construções conceptuais da hierarquia social, com base na propriedade,


qualificações e autoridade. As classes sociais na sociedade portuguesa. Exemplos
práticos.

1 - Estrutural-funcionalismo

Talcott Parsons (1902-1979) foi a figura de proa do estrutural-funcionalismo, que de


finais dos anos 30 a meados dos anos 60 foi a Sociologia dominante nos EUA. Trabalhou
em Universidades Europeias e desde 1927 em Hravard.
Vai começar a desenvolver uma teoria cuja primeira formulação aparece em 1937 - A
Estrutura da Acção Social (The Structure of Social Action). Publica em 1951 O Sistema
Social (1951). Para uma Teoria Geral da Acção (1957), tornando-se a figura dominante
da Sociologia Americana.

Parsons pensava que a América precisava de uma teoria (criticando assim o empirismo
americano). Propõe-se construir uma grande teoria, que fosse uma síntese de ideias de
autores como Durkheim e Max Weber. Além de se propor combater o empirismo, quer
também combater o marxismo. Está pois contra as teorias que põem a tónica no conflito.
Parsons tem em vista uma teoria que imponha o consenso e a ordem.
Parsons considera que numa sociedade muito dinâmica, com muita desigualdade e
conflitos, como é a sociedade americana de finais dos anos 30, onde impera o
individualismo e o êxito económico, se podem vir a criar graves dificuldades ao seu
funcionamento. Por isso, Parsons dá prioridade ao social, interessando-lhe o indivíduo
socializado. Por outro lado, apresenta uma alternativa ao marxismo, ao afirmar que o que
governa uma sociedade são os valores, as crenças, as normas, a cultura e não o
económico (Parsons gostava de pensar em si próprio como um determinista cultural).
Influência de Durkheim: Parsons retira do autor francês a importância da moral, da
interiorização, por parte de cada indivíduo, dos valores dominantes na sociedade. Não se
trata então de um constrangimento de ordem física.
De Weber retira a importância concedida aos valores.

Aspecto estruturalista da teoria de Parsons:


Para este autor, a sociedade é um sistema social , um conjunto duradouro de elementos
interdependentes, ligados entre si de um modo de interacção recíproca, que se um se
modifica, modificam-se todos os outros, e portanto todo o conjunto se modifica, por
efeito de "feed-back".
Parsons, faz corresponder o conceito de estrutura a uma componente "estática" e a função
a uma componente "dinâmica".
Aspecto funcionalista:
Para Parsons, a acção humana desenvolve-se em quatro contextos analiticamente
diferenciados: cultural, social, psicológico e biológico. Cada contexto forma um sistema
integrante do sistema geral da acção.
Todo o sistema comporta quatro funções: adaptação ao meio exterior (biológico);
realização dos objectivos (psicológico), integração (sistema social) e estabilidade
normativa (sistema cultural).

A TEORIA FUNCIONALISTA DA ESTRATIFICAÇÃO SOCIAL

"Some principles of stratification" (1945). Rapidamente se tornou um clássico das


explicações sociológicas das desigualdades sociais
Kingsley Davis e Wilbert Moore (discípulos de Parsons)

- A desigualdade social é universal, pois não há sociedade que não esteja estratificada,
não há sociedades sem classes
- a desigualdade social é necessária e cumpre uma função: recompensar os que ocupam
posições mais importantes, reconhecendo-os como superiores na hierarquia social
- a desigualdade social assenta em dois princípios básicos: a importância funcional das
posições sociais e a escassez de mão-de-obra capaz de as ocupar.
- Adoptam uma perspectiva estrutural ao considerar que os eixos de determinação das
desigualdades sociais estão enraizados nas sociedades, são supra-individuais. Através dos
mecanismos de socialização e de interiorização, os indivíduos incorporam o sistema
normativo, as estruturas vitais para o funcionamento da sociedade (aspecto
exemplarmente desenvolvido por Parsons ).
- Adoptam uma postura funcionalista (Durkheim)pois colocam a ênfase nas interligações
orgânicas dos elementos do sistema (indivíduos, grupos, instituições), pressupondo que
estes ao cumprirem os respectivos papéis estão a cooperar para o funcionamento global
da sociedade. Daí que partam da noção de que a interiorização do sistema normativo seja
essencialmente consensual.
- A perspectiva estrutural funcionalista parte dos pressupostos essenciais do seguinte
paradigma: as desigualdades sociais encontram-se na sociedade e cumprem a função de
satisfazer os indivíduos que as compõem, para os motivar a cumprirem o seu dever e para
os situar.
- Importância funcional diferencial (procura) das posições sociais: diferentes profissões,
tarefas, actividades, representam uma importância variável para a vida em sociedade (as
tarefas de regulação política são importantes em todas as sociedades). A sociedade deve
dar recompensas suficientes para assegurar que as diferentes posições sejam preenchidas.
Se uma posição é com facilidade preenchida, não precisa de ser muito recompensada,
ainda que importante. Por outro lado, se além de importante é difícil de preencher, a
recompensa deve ser alta o suficiente para assegurar o seu preenchimento.
- Escassez diferencial de pessoal (oferta): Todas as posições exigem alguma forma de
qualificação ou capacidade para o seu desempenho. As qualificações de um indivíduo
manifestam-se de duas maneiras: aptidão natural e treino adequado. Algumas posições
exigem aptidões naturais para o seu desempenho, outras exigem largo tempo de formação
e treino. Por isso a sociedade tem de recompensar de um modo diferente as diferentes
posições sociais, para assegurar encontrar indivíduos para ocuparem todas as posições
sociais necessárias.
- A criação das desigualdades sociais assenta num mecanismo "inconsciente" da
sociedade: é o seu funcionamento espontâneo que leva à diferenciação entre os
indivíduos.
- A estratificação social é um conjunto de recompensas diferenciais. São as diferentes
recompensas (materiais e/ou simbólicas) que as sociedades atribuem aos indivíduos em
função da posição que ocupam que os vai situar na escala de estratificação.
- Não se pode deduzir a importância de uma posição social pelo salário que lhe está
inerente. O facto de determinada posição ser importante é que irá ser correspondida por
uma elevada remuneração.
- As formas de estratificação social variam de sociedade para sociedade devido à
"importância funcional" das posições em cada sociedade. Apesar da variabilidade,
algumas funções sociais ocupam lugares elevados na escala da estratificação social em
todas as civilizações: as actividades dos governos.
- Estes autores inspiraram-se em Max Weber. No entanto, enquanto Weber afirma que a
conjugação dos três tipos de estratificação social pode variar, os funcionalistas fazem
equivaler a estratificação social a posições de status, ou estratos. O status representa para
os funcionalistas uma síntese equivalente às "classes", para os marxistas: lugares
estruturais, nos quais os indivíduos se integram e que vão determinar em larga medida os
seus comportamentos e modos de vida. Na perspectiva dos funcionalistas há uma
aceitação mútua de posições, e a ambição dos menos privilegiados é subir na escala
social.

A necessidade universal da estratificação:


A estratificação social é um facto universal e necessário, pois é um factor indispensável
para a sobrevivência e funcionamento adequado dos sistemas sociais.
A estratificação define-se como um conjunto de diferenças de prestígio entre os
diferentes membros de uma sociedade. As diferenças de prestígio estão associadas às
diferentes posições que os indivíduos ocupam numa estrutura social.
As sociedades têm que assegura que as tarefas e funções necessárias para a sua
sobrevivência sejam desempenhadas. E que sejam desempenhadas pelos indivíduos mais
capazes de o fazer. E que os indivíduos cumpram a sua função o melhor possível. Para
isso, a sociedade deve instituir um método eficaz de distribuição das tarefas pelos seus
diferentes membros. E deve também motivar os indivíduos a cumprir as suas funções de
modo adequado. As sociedades devem por isso instituir um sistema de estratificação
social, através da criação de um sistema estável de recompensas: que possam servir de
incentivo para os indivíduos cumprirem as suas funções e que possam servir para
assegurar a correcta distribuição das recompensas.
O sistema de distribuição de recompensas é parte integrante do sistema social. As
recompensas estão estritamente associadas à posição ocupada pelo Indivíduo e consistem
em privilégios necessários para o cumprimento adequado das tarefas correspondentes à
posição e também constituem fonte de motivação e satisfação para o indivíduo que ocupa
determinada posição social.
As recompensas são de três tipos: 1) as que contribuem para a subsistência e conforto do
indivíduo; 2) as que contribuem para o seu prazer e entretenimento; 3) as que contribuem
para o auto-respeito e expansão do ego (semelhança com a hierarquização das
necessidades de Maslow, pelo qual os indivíduos têm um quadro evolutivo de
crescimento marcado por patamares sucessivos e hierarquizados de interesses e
motivações: fisiológicas. Segurança, pertença, auto-estima e auto-realização).

Estas recompensas são manifestações de estima e de prestígio concedidas ao indivíduo


pela colectividade como reconhecimento da contribuição deste, através da posição que
ocupa, para a sobrevivência e funcionamento da sociedade.

Não é o salário em si que são a fonte de status, mas sim o status de determinada posição,
atribuído pela sua importância, que determina o salário.

A posição de um indivíduo na hierarquia do prestígio é uma manifestação social do seu


valor pessoal: a sociedade recompensa o indivíduo segundo a sua aptidão para cumprir
adequadamente uma função e segundo a eficácia que confere ao cumprimento da sua
função.

A função universal da estratificação social é a de assegurar que haja uma coincidência


entre as qualidades pessoais do indivíduo e a posição que este ocupa na sociedade.
A desigualdade social é um mecanismo estabelecido de um modo inconsciente pelas
sociedades de modo a assegurar que as posições importantes sejam ocupadas pelos
indivíduos mais competentes.

As posições que estão na esfera mais elevada da hierarquia social são a) as que têm mais
importância para a sociedade. A importância de uma posição depende do grau de
unicidade dessa posição, depende do facto de haver ou não uma outra posição social que
possa cumprir adequadamente a função a que esta corresponde. Depende também do grau
de dependência e de subordinação de outras posições em relação a ela b) as que exigem
mais treino ou talento.
Exemplo da profissão médica (é muito importante e exige longo treino).
Uma posição não traz poder e prestígio porque proporciona um elevado salário, mas
proporciona um elevado salário porque é funcionalmente importante e o pessoal
disponível por alguma razão é escasso.
Desemprego das profissões de nível superior, resulta de uma queda de prestígio das
mesmas, devido a um excesso de oferta. Pelo contrário, uma escassez de oferta tende a
aumentar as recompensas. Uma especialização muito grande do trabalho tende a criar
especialistas sem alto prestígio, se o treino for curto e a capacidade inata exigida
relativamente pequena.

Para Davis e Moore, o essencial da cultura reside na comunidade de valores e de


objectivos que une os membros de uma sociedade. Esses valores e fins são subjectivos,
mas são compartilhados e impostos através das relações sociais, e asseguram a unidade e
o funcionamento da sociedade como sistema. O valor e o mérito do indivíduo,
reconhecido através do sistema de estratificação social, derivam da sua capacidade de
realizar e cumprir esses fins subjectivos "últimos". Mas o cumprir os objectivos e valores
do sistema social é percepcionado como uma realização de um ideal individual, o
conseguir ser o que deseja ser. Isto implica que o que o indivíduo deseja, cumpre e realiza
é o que é socialmente desejável, essencial e necessário. O sistema social de estratificação
apresenta-se como o meio essencial para assegurar que haja uma coincidência entre o
bem individual e o bem da sociedade. O indivíduo que alcança a recompensa que deseja é
aquele que através da realização dos seus valores subjectivos contribuiu para a
manutenção e funcionamento da sociedade, actualizando os fins e valores comuns.
O estrutural-funcionalismo sobrevaloriza os elementos de equilíbrio e de estabilidade da
realidade social, esquecendo o conflito, a tensão e a mudança. As instituições
representam a institucionalização dos desejos, fins e aspirações dos indivíduos: são meios
de assegurar que os indivíduos sejam o que querem ser. Esta corrente também afirma que
a coacção institucional deve ser utilizada sempre que necessário e afirma a superioridade
do sistema capitalista e do seu modo de estratificação, que produz uma multiplicidade de
posições sociais e de funções, aumentando com isso as possibilidades de realização
individual e maximizando a mobilidade.

Críticas ao estrutural-funcionalismo:
- Concepção de um indivíduo hiper-socializado
- Incapaz de explicar o conflito e a mudança
- E o problema da reprodução da condição de classe? Problema da transmissão da
condição de classe através da família, o que pode restringir o acesso a posições
privilegiadas por parte de indivíduos mais dotados.
- Faz supor que as desigualdades sociais equivalem as uma desigualdade de motivação.
Ou seja, faz acreditar que há uma igualdade de oportunidades para todos os indivíduos.

2- Teorias contemporâneas da estratificação social (abordagens multidimensionais do


conceito de "classe")

Erik Olin Wrigth


Este sociólogo americano define as classes a partir da articulação de três tipos básicos de
recursos: propriedade dos meios de produção, qualificações escolares ou profissionais e
recursos organizacionais (autoridade e poder de decisão).

Pierre Bourdieu
Este sociólogo francês define as classes a partir do capital económico (propriedade e
rendimentos); do capital cultural (escolaridade e cultura); capital social (relações e
influências) e capital simbólico (prestígio, que resulta da conjugação dos outros tipos de
capital).

3 - As classes sociais na sociedade portuguesa

Desde a década de sessenta do século XX que em Portugal se tem assistido a um


fenómeno intenso de recomposição social, caracterizado por altas taxas de mobilidade
social ascendente e descendente, que no entanto não esbateram o elevado peso
morfológico das categorias mais desapossadas.

As transformações sócio-económicas e sócio-profissionais profundas que influenciaram a


estrutura de classes em portugal, nas últimas décadas:

- mudança acentuada da distribuição sectorial do emprego


- crescente peso dos trabalhadores por conta própria
- crescente peso da participação das mulheres no mercado de trabalho
- altas taxas de feminização do sistema de ensino superior

A estrutura das classes sociais em Portugal é substancialmente diferente da que se


observa nos países centrais (nos quais domina o peso da classes médias).

Características dominantes da hierarquia social em Portugal:


a) Significativo peso da "pequena burguesia" devido à
(i) persistência do sector agrícola tradicional, apesar do seu evidente declínio (quadro 1),
do pequeno comércio e das actividades artesanais e familiares.
(ii) Crescimento do trabalho autónomo e das profissões liberais.
b) Os "proletários" detêm o maior peso percentual na sociedade portuguesa (em 1995,
constituiam 46,5% da população portuguesa), o que refelcte o desenvolvimento tardio do
país em termos económicos e tecnológicos.
(i) operariado indistrial desqualificado, mão-de-obra precarizada, com baixos níveis de
qualificação e sem autonomia e autoridade na esfera produtiva.
(ii) As situações laborais dotadas de autoridade são constituídas sobretudo por gestores e
supervisores não qualificados, combinado-se a autoridade com baixos recursos
educacionais.
c) Aparecimento de novos sectores de classe média que incorporam níveis elevados de
qualificação escolar.

3 - A mobilidade social em Portugal

A feminização acentuada da população activa e da escolarização de longa duração, além


do papel significativo do Estado como entidade totalmente distintos para os dois sexos.
Para as mulheres a estrutura social é bastante permeável (altas taxas de mobilidade social
relativa), enquanto que para os homens a probabilidade relativa de aceder a uma classe
social diferente da de origem é baixa.

AULA DE 25-11-02
SUMÁRIO: Teorias da estratificação e das desigualdades sociais (conclusão).

1- Conceitos

Classe social: categoria social cujos membros, em virtude de serem portadores de tipos e
volumes de recursos semelhantes, seja de propriedade económica, de qualificações
escolares e profissionais, de poder ou de prestígio social, tendem a ter condições de
existência também semelhantes e a desenvolver afinidades nas suas práticas e
representações sociais, ou seja, naquilo que fazem e naquilo que pensam.

Mobilidade social: transição de indivíduos ou grupos de uma classe social para outra.
Existem dois tipos de mobilidade social: intergeracional (analisa-se mais do que uma
geração, por exemplo comparando-se pais e filhos) e intrageracional (analisa-se
indivíduos do início ao fim da sua carreira social). Em termos de sentido, a mobilidade
social pode ser ascendente, descendente e estacionária.

Reprodução social: processo mediante o qual a sociedade através de diversos


mecanismos, reproduz a sua estrutura.

Desigualdade social: Fenómeno que traduz diferenças socialmente condicionadas no


acesso a recursos (bens, serviços e oportunidades) de que resulta uma situação
desvantajosa dos indivíduos, famílias e grupos.

Essa desigual distribuição de recursos é estruturada pelos mecanismos da sociedade e vai


influenciar os percursos de vida dos indivíduos.

As desigualdades sociais (podem ter várias vertentes, que podem estar ou não
interrelacionadas), em função do sexo, idade, categoria socioprofissional, etnia, raça,
genética, tipo físico.

Há muitos indivíduos que conseguem ultrapassar em larga medida os constrangimentos


sociais, embora haja uma forte tendência para a reprodução social de situações de
desigualdade

É difícil sintetizar os principais tipos de desigualdade:

Na perspectiva de Giddens, constituíram-se historicamente 4 tipos de estratificação


social:
-escravatura, castas (segregação entre grupos com base em critérios culturais, raciais ou
étnicos), ordens e classes.

Classes:

-sistema de estratificação típico das sociedades industriais


-sistemas fluidos
-componente importante de situação social adquirida
-assentam essencialmente em diferenças económicas

Daí que a análise das desigualdades sociais tenham assentado essencialmente em


desigualdades económicas, embora actualmente se atenda a outros tipos de desigualdade,
até que segundo alguns autores o trabalho e a economia têm perdido centralidade nas
sociedades avançadas o trabalho e a economia. O que acontece é que cada vez se nota
que mais factores influenciam na posição económica e profissional do indivíduo.

Factores invocados para o declínio da centralidade do trabalho:


-diminuição do tempo de trabalho e crescente aumento do consumo e tempo livre
-fim das lealdades clássicas entre trabalhadores com a terciarização da economia
-crescimento dos conflitos baseados não no trabalho, mas em solidariedades étnicas,
religiosas e nacionalistas.
-crescente heterogeneidade de situações sociais.

As desigualdades sociais podem ser estudadas em três dimensões de análise empíricas


principais:

Critérios objectivos: rendimento, escolaridade, categoria socioprofissional.

Critérios subjectivos: valores, interesses, estilos de vida, linguagem, identidade (em larga
medida condicionados pelos critérios objectivos).

2 - Pierre Bourdieu

A semelhanças de condições de existência dos membros de uma mesma classe leva ao


desenvolvimento de afinidades de práticas e de representações sociais (o que fazem, o
que pensam e o que gostam).
Exemplos: práticas culturais e de lazer, escolhas matrimoniais (endogamia de classe).

Pierre Bourdieu descreve a mediação entre a posição de classe e as práticas sociais


socorrendo-se do conceito de habitus.
"Sistema de disposições duradouras e transmissíveis que integrando todas as experiências
passadas, funciona a cada momento como uma matriz de percepção, de apreciação e de
acção." (Bourdieu, 1979).

O habitus é assim

Sistema de disposições duradouro e incocnsciente (estrutura) que é o resultado da


interiorização das condições de classe, seja pela socialização familiar, da escola e do
meio social (estruturada), mas também das trajectórias de classe (ascendente ou
descendente) e que vai condicionar as práticas e as representações (estruturante).

Exemplos de incongruências de classe: os "novos-ricos" e os estudantes de ensino


superior com origem social das classes populares.

Na perspectiva de Bourdieu, o "gosto" evidencia uma certa regularidade social, não


derivando unicamente (como se pensa a nível do senso comum) de factores de ordem
individual. Na sua obra La distinction (1979), Bourdieu estuda os estilos de vida da
população francesa, concluindo que as suas práticas e consumos em termos de
alimentação, vestuário, decoração, música, cinema, televisão, frequência de museus,
maneiras de falar, posições políticas e opiniões sobre a sexualidade dependem entre
outros factores, de pertenças de classe e de trajectórias sociais (Almeida, 1994).

- O gosto é definido como "fórmula geral que está na base do estilo de vida (conjunto
unitário de preferências distintivas)", "disposição dedicada a estabelecer ou marcar as
diferenças por uma operação de distinção" (Bourdieu, 1979: 543).
- O "bom-gosto" é o gosto "legítimo", é uma expressão distintiva duma posição
privilegiada na estrutura social e que decorre essencialmente da competência cultural dos
agentes sociais.

Definição de hexis corporal: "Modo global de manter o corpo, de o apresentar aos outros,
onde se exprime entre outras coisas, uma relação particular - de concordância ou de
discordância - entre o corpo real e o corpo legítimo" (Bourdieu, 1979: 54).

3 - Tipologia de classes

1 - Empresários e dirigentes (proprietários de grandes empresas; dirigentes de topo de


garndes empresas de que não são proprietários, membros dos corpos legislativos)
2 - Pequena burguesia intelectual e científica (profissionais científicos e técnicos de
habilitação superior que trabalham por conta própria ou que são assalariados -
professores, engenheiros, médicos, advogados)
3 - Pequena burguesia técnica e de enquadramento (profissionais que desempenham
funções técnicas e/ou de chefia intermédia, como chefes de secções administrativas,
gerentes comerciais ou chefes de equipas industriais).

4 - Pequena burguesia empresarial (pequenos empresários, por exemplo, comerciantes)

5 - Empregados executantes (trabalhadores assalariados do terciário: por exemplo,


empregados de escritório, de serviços, do comércio)
6- Operariado (trabalhadores assalariados da indústria)
7- Trabalhadores da agricultura
8 - Outros (domésticas, desempregados, reformados)

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