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2020 46 5 3374 Portugues
2020 46 5 3374 Portugues
2020;46(5):e20180353
https://dx.doi.org/10.36416/1806-3756/e20180353 ARTIGO ORIGINAL
ventilatório obstrutivo (relação VEF1/CVF < LIN, com quando pelo menos dois dos três seguintes critérios
CVF ≥ LIN), distúrbio ventilatório restritivo (relação foram observados: FC > 90% da máxima predita
VEF1/CVF ≥ LIN, com CVF < LIN) e distúrbio ventilatório para a idade (220 − idade); coeficiente respiratório >
misto (relação VEF1/CVF < LIN, com CVF < LIN).(19) 1,10; e variação no VO2 entre o penúltimo e o último
A força muscular periférica foi estimada com o uso estágio de exercício < 2,1 mL/kg por min. No caso de
de um dinamômetro eletrônico (Power Din Standard; o indivíduo entrar em exaustão antes do término do
CEFISE, São Paulo, Brasil) para os grupos musculares estágio, a VO2máx foi calculada pela seguinte equação:
dos seguintes movimentos: flexão de ombro, flexão VO2pico = Ecom + (t/180) × I
de cotovelo, abdução de ombro, extensão de joelho e
onde Ecom é o último estágio completo; t é o tempo
flexão de joelho.(20) Cada teste foi realizado três vezes,
de permanência na última carga incompleta (sendo a
com cabos específicos do dinamômetro ligados à célula
duração de cada estágio de 180 s); e I corresponde
de carga e ao computador. Entre uma tentativa e
ao incremento da intensidade (0,5 km/h).
outra, havia um intervalo de 1 min. Foram mensurados
valores de força de pico e força média (em kgf). Para
Análise estatística
cada variável e cada segmento, os maiores valores
obtidos foram registrados para as análises. Os dados foram submetidos ao teste de normalidade
de Shapiro-Wilk; como não se enquadraram no modelo
A composição corporal foi avaliada através do
de distribuição normal, esses foram apresentados em
aparelho InBody 720 (InBody, Cerritos, CA, EUA)
mediana e intervalo interquartil (IIQ). Foi avaliada
para calcular o peso, IMC, porcentagem corporal de
a relação da carga tabágica com as covariáveis
gordura, massa muscular, massa gorda, circunferência
marcadores inflamatórios, marcadores metabólicos,
abdominal e relação cintura-quadril. O aparelho tem
composição corporal, força muscular e capacidade
oito eletrodos, sendo dois em contato com a palma
cardiorrespiratória, com transformação logarítmica
(E1 e E3) e polegar (E2 e E4) de cada mão e dois em
para diminuir a variabilidade das variáveis não
contato com a parte anterior (E5 e E7) e calcanhar
paramétricas, exceto para dados qualitativos, como sexo
(E6 e E8) de cada pé.(21,22) Todos os indivíduos foram
e comorbidades. Para tanto, foi utilizada a correlação
orientados a permanecer em jejum por 12 h antes
de Pearson e correlações parciais ajustadas por idade,
da avaliação e não realizar exercícios moderados ou
sexo, IMC e comorbidades. Para a interpretação da
vigorosos 24 h antes da avaliação.
magnitude de resposta do coeficiente de correlação foi
Foram coletadas amostras de 14 mL de sangue venoso adotado o seguinte critério de classificação: correlação
periférico, respeitando o jejum de 12 h. As coletas fraca (< 0,4), moderada (≥ 0,4 e < 0,5) e forte (≥
foram sempre realizadas por um profissional habilitado 0,5).(24) Após a realização das correlações, foi aplicado
utilizando materiais descartáveis e esterilizados. As o teste de regressão linear ajustada para os mesmos
amostras foram depositadas em três tubos a vácuo, fatores de confusão.
centrifugadas por 15 min a 3.500 rpm para separar
A regressão logística com modelo ajustado para
o produto a ser avaliado e, posteriormente, foram
idade, IMC e tempo de tabagismo foi utilizada para
determinados os níveis de triacilglicerol, colesterol total,
identificar a influência do histórico de tabagismo
HDL, LDL e glicose. O material biológico foi coletado e
sobre as comorbidades pré-existentes. Para isso, os
armazenado a −70°C, de acordo com as orientações do
indivíduos foram divididos em grupos que fumavam
fabricante. As determinações de glicose e perfil lipídico
≤ 20 cigarros/dia (n = 12) e > 20 cigarros/dia (n =
foram feitas em um espectrofotômetro SpectraMax
53), e as comorbidades foram separadas em presentes
Plus 384 (Molecular Devices LLC, San Jose, CA, EUA).
(1) ou ausentes (0). O aumento do risco relativo foi
Hemograma completo e a contagem de plaquetas foram
calculado usando a fórmula (Exp(B) – 1) × 100. Todas
determinados através do analisador COULTER STKS
as análises foram realizadas por meio do software
(Coulter Eletronics of Canada, Burlington, Canadá)
Statistical Package for the Social Sciences, versão 15.0
em um laboratório especializado.
(SPSS Inc., Chicago, IL, EUA), e o nível de significância
Para a avaliação da capacidade funcional máxima, os adotado foi de 5% para todos os testes.
indivíduos foram submetidos a um teste cardiopulmonar
em esteira com velocidade inicial de 5,0 km/h, inclinação
RESULTADOS
constante de 1% e incrementos de 0,5 km/h a cada
2 min. O teste foi realizado até a exaustão voluntária Na Tabela 1 encontram-se as características gerais
(VO2máx).(23) Foram monitoradas continuamente as da amostra (N = 65), incluindo características
variáveis FC, SpO2 e percepção subjetiva de esforço pela demográficas, antropométricas, histórico de tabagismo
escala de Borg. Além disso, as variáveis ventilatórias e dados de função pulmonar. Com base no LIN, o
foram determinadas respiração a respiração por meio padrão espirométrico era normal, em 57 indivíduos
do sistema Quark PFT (Cosmed, Roma, Itália), que (88%); distúrbio ventilatório obstrutivo, em 2 (3%);
foi calibrado previamente a cada teste, conforme as distúrbio ventilatório restritivo, em 4 (6%); e distúrbio
especificações do fabricante. ventilatório misto, em 2 (3%).
O VO2máx foi assumido como a maior média do Na Tabela 2 são apresentados os resultados de
consumo de oxigênio dos últimos 30 s de exercício, marcadores inflamatórios e metabólicos, força
r2 = 0,100 r2 = 0,095
2,6 3,4
Monócitos (células/mm3)
3,2
2,4
TAG (mg/dL)
3,0
2,2
2,8
2,0
2,6
1,8 2,4
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0
anos-maço anos-maço
r2 = 0,090
2,2
2,1
2,0
CA (cm)
1,9
1,8
1,7
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0
anos-maço
Figura 2. Correlação de Pearson da carga tabágica com nível de triacilglicerol (TAG), contagem de monócitos e
circunferência abdominal (CA).
Na Suíça, em uma população de caucasianos nesse caso, o cigarro é um fator de risco modificável,
tabagistas e não tabagistas (idade: 35-75 anos), assim como o IMC e as comorbidades; e o sexo e a
foi observada uma tendência de dose-resposta idade são fatores de risco não modificáveis.(33)
entre o número de cigarros fumados e o tamanho A inexistente relação da carga tabágica com variáveis
da circunferência abdominal.(29) No presente estudo do perfil lipídico (colesterol total, HDL e LDL) corroboram
observou-se uma correlação positiva fraca entre a o estudo de Rom et al.,(34) no qual também não se
carga tabágica e a circunferência abdominal. Isso observou tal correlação. No entanto, Chelland Campbell
pode estar associado com um aumento de resistência et al.(6) evidenciaram em seu estudo de revisão que
à insulina e ter relação indireta com a obesidade, essas variáveis apresentam índices superiores em
já que o aumento da circunferência abdominal é fumantes quando comparados com indivíduos não
um marcador para o desenvolvimento de diabetes, tabagistas. Em contraste com os achados do nosso
hipertensão, síndrome metabólica, aterosclerose e estudo, Marano et al.,(35) observaram um aumento dos
doenças cardiovasculares.(30, 31) marcadores inflamatórios em tabagistas comparados
Segundo um estudo de revisão sistemática com com não tabagistas, o que pode ser justificado pelo
meta-análise,(32) o acréscimo de um cigarro por dia tamanho da amostra do seu estudo.
aumenta em 0,14% a circunferência abdominal mesmo Também não houve correlação da carga tabágica com
com um IMC constante, ou seja, há uma preferência a força muscular e a capacidade cardiorrespiratória,
de redistribuição de adiposidade central associada ao o que corrobora os achados de Wüst et al.,(36) que
maior consumo de cigarros; isso também pode explicar observaram que, na ausência de DPOC, os tabagistas não
o fato de a circunferência abdominal ter apresentado apresentaram fraqueza muscular, perda ou alterações
uma correlação positiva com a carga tabágica, pois o nas propriedades contrácteis do músculo quadríceps,
número de cigarros promove uma maior modificação mas apresentavam maior fadiga. Essa correlação
na área abdominal. provavelmente não foi observada, pois nossa amostra
Não foram observadas correlações com a contagem foi composta de indivíduos sem DPOC; porém, pode-se
de monócitos, nível de triacilglicerol e circunferência prever que esses indivíduos podem apresentar riscos
abdominal quando esses foram ajustados por sexo, para o desenvolvimento dessa e de outras doenças,
idade, IMC e comorbidades; portanto, tais fatores com consequente perda de massa muscular tanto
podem estar interferindo nessa relação além da carga relacionada com a inflamação sistêmica que a DPOC
tabágica. Isso ocorre porque há vários fatores que causa, quanto com o consumo de cigarros, que ativa
podem desencadear o desenvolvimento de doenças; vias de degradação de proteínas.(11,37)
Como limitações podemos citar o tamanho amostral, dia, além da importância de realização de atividades
o fato da falta de realização de dosagem de citocinas e físicas e do controle da alimentação com uma dieta
a falta de um grupo controle, o que poderia auxiliar a mais balanceada.
compreender de forma mais consistente os resultados Em resumo, conclui-se que entre tabagistas a carga
apresentados. Desta forma, sugerimos novos estudos tabágica se relacionou positivamente com os níveis de
prospectivos a fim de observar a relação da carga triacilglicerol, contagem de monócitos e circunferência
tabágica com o possível desenvolvimento de doenças abdominal. A prevalência de doenças metabólicas foi
metabólicas, comparando tabagistas com indivíduos maior em tabagistas que fumam mais de 20 cigarros/dia.
saudáveis sem comorbidades, além da comparação
entre indivíduos com peso normal e sobrepeso.
CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES
Tabagistas apresentam riscos aumentados no
desenvolvimento de doenças, principalmente Cada autor contribuiu individual e significativamente
metabólicas, que, quando instaladas, podem favorecer para o desenvolvimento do manuscrito. TSG, IBT, CPS,
o surgimento de outras. Na prática clínica, profissionais MP e DR contribuíram com a concepção e desenho da
devem se atentar com esse acúmulo de gordura na pesquisa; TSG e CPS realizaram a obtenção de dados;
região abdominal e o número de cigarros/dia fumados TSG, IBT e BSAS participaram da análise e interpretação
pelos tabagistas com o intuito de promover a cessação dos dados; IBT realizou a análise estatística; TSG, IBT,
do tabagismo, conscientizando essa população e CPS, MP e DR obtiveram o financiamento; e todos os
instruindo que, mesmo não havendo a cessação, é autores participaram da redação do manuscrito e de
importante pelo menos diminuir o número de cigarros/ sua revisão crítica quanto ao conteúdo intelectual.
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