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Trajetória missionária do Pastor Sebastião Lúcio Guimarães como fonte de ensino de história

de Moçambique.

Jaíse Sousa Teles Falcão1


José Jorge de Melo Neto2
Introdução:

O presente resumo aborda a trajetória de vida missionária do Pastor Sebastião Lúcio


Guimarães e trata da possibilidade de utilizá-la como fonte de ensino de história de
Moçambique no tempo presente. Ressaltamos que o Pastor Sebastião Lucio Guimarães foi
biografado por Orlando Gomes da Silva, essa biografia foi apresentada como trabalho no
Centro Integrado de Missões em outubro de 2012.  O objetivo do presente artigo é lecionar as
missões em Moçambique através da vida do Pastor Sebastião Guimarães e esta dividido em
partes, na parte inicial é apresentado um breve histórico da vida do Pastor Sebastião, nascido
em Colatina no Estado do Espírito Santo em 15 de abril de 1952. A trajetória de vida
missionária se passou em diversas cidades do Brasil como Rio de Janeiro e Recife e também
no exterior, sobretudo, Moçambique e África do Sul onde passou 12 anos. Para, além disso,
ele é doutor em teologia e professor em escolas e seminários de Missões como o Centro
Integrado de Educação e Missão (CIEM) situado no Rio de Janeiro. O que evidencia que além
de vivenciar as missões

Pastor Sebastião Guimarães foi criado em um lar onde havia divergências religiosas, seu pai,
Eugênio Guimarães era espírita kardecista e sua mãe, Francisca Guimarães era católica.
Sebastião Guimarães por sua vez passou pelos processos que competem aos fiéis da Igreja
Católica e apesar de completar a comunhão e a crisma aos 14 anos ainda não tinha lido a
Bíblia. Nesse contexto, ele nunca tinha ido a uma Igreja Evangélica e segundo o autor:

[…] uma pessoa lhe perguntou se queria ler a Bíblia. Recusou a oferta, mas
se sentiu curioso por ela. Foi perguntar ao padre da igreja católica se deveria
ler a bíblia, e ele foi muito diretivo em sua resposta dizendo que ele não
deveria ler aquele livro, porque quem o lesse sem um preparo teológico
poderia até mesmo ficar louco. Aquele era um livro que exigia muito estudo
1
Discente do VIII semestre em História na Universidade do Estado da Bahia, Campus XVIII
Eunápolis. Endereço de e-mail: jaiseteles@hotmail.com. Bolsista de IC do projeto: Evangelizando o
interior da África: As missões batistas brasileiras na África do Sul (1974-2018), cuja orientadora é a
professora Drª Joceneide Cunha.
2
Discente do VIII semestre em História na Universidade do Estado da Bahia, Campus XVIII
Eunápolis. Endereço de e-mail: jjmeloneto@yahoo.com.br Bolsista de IC do projeto: Evangelizando o
interior da África: As missões batistas e assembleianas em Angola (1974-2018), cuja orientadora é a
professora Drª Joceneide Cunha
para compreendê-lo e que não lhe era recomendável. Poucos dias depois ,
passando uma rua, ficou decepcionado ao ver o padre com um grupo de
jovens em uma rodada de cervejas. Na sua ingenuidade perguntou a si
mesmo “porque ele poderia ler a Bíblia e compreendê-la e eu não, mesmo
estando cursando o ultimo ano do ensino fundamental? Saiu dali e foi direto
ao evangélico que havia lhe oferecido um exemplar da Bíblia. Recebeu o
livro e foi direto para casa com o objetivo de lê-lo. 3

Diante do ocorrido citado acima se pode compreender que o comportamento do padre que lhe
advertiu não ler a Bíblia alertando-o de não entendê-la lhe causou alguns questionamentos o
que fez com que ele retornasse ao evangélico que lhe oferecera a leitura da Bíblia. No
decorrer da leitura da biografia, pode-se afirmar que a conversão do Pastor Sebastião se
iniciou através das leituras bíblicas que realizava com o passar do tempo e que existe uma
determinada ênfase na propaganda da sua fé atual:

Por meses seguidos lia a Bíblia, até que chegou as palavras de Paulo que
declaram que temos que confessar com nossa própria boca o nome de Jesus
Cristo. Era madrugada e estava em seu quarto sozinho. Ajoelhou-se ao pé da
cama e declarou em voz alta que recebia Jesus Cristo como seu Salvador
pessoal e Senhor da sua vida. Pediu que o ajudasse a compreender melhor a
Bíblia para que pudesse viver como um verdadeiro Cristão. No momento
nem pensou em pertencer a uma igreja evangélica, mas logo depois muitas
dúvidas começaram a inundar seu coração e reconheceu que precisava
procurar alguém que conhecesse a Bíblia e pudesse lhe orientar. 4

Após as leituras ele, Sebastião procurou uma igreja evangélica no intuito de saber “como é ser
um cristão protestante” e até encontrar resposta coerente com o Pastor David Pereira Braga,
que posteriormente seria o seu discipulador, os pastores com quem tentava dialogar só lhes
dizia o que um Cristão pode ou não pode fazer, o que não era suficiente. No decorrer da sua
conversão a Igreja Batista ele começou a pregar nas praças, prisões e evangelizar na escola
em que estudava, contudo, tinha dúvidas sobre o seu futuro, foi quando em um culto de
missões um missionário falou sobre a consagração de vida para o ministério missionário, o
que lhe causou interesse em se tornar um missionário, a partir desse desejo ele procurou
orientação com o seu Pastor na época que investiu em seu desenvolvimento missionário:

Começou a servir como evangelista, trabalhando com congregações da igreja


enquanto se preparava para os estudos ministeriais. Terminou o segundo
grau e foi enviado para estudar no Seminário Teológico Batista do Sul do
Brasil, no Rio de Janeiro, onde se formou em 1976, ano em que também foi
ordenado ao ministério pastoral.5
3
SILVA, Orlando Gomes da. Biografia do Pastor Sebastião Lúcio Guimarães Um Servo a Serviço
de Deus. Rio de Janeiro: CIEM, 2012. p. 2.
4
SILVA, Orlando Gomes da. Biografia do Pastor Sebastião Lúcio Guimarães Um Servo a Serviço
de Deus. Rio de Janeiro: CIEM, 2012. p. 2-3
5
Ibid, p. 4.
Para, além disso, ele ainda investiu em se filiar a Junta de Missões Mundiais da Convenção
Batista Brasileira (CBB) e foi em suas funções ministeriais além de missionário, professor do
Instituto Teológico Batista de Maputo e do Instituto Teológico de Moçambique. Começando a
desenvolver os processos de missão na Igreja Batista de Nampula em Moçambique no ano de
1984-1985 sendo transferido para a Igreja Batista de Tete localizada também em
Moçambique, mas desta vez pastoreando por dois anos (1986 a 1988).

A fonte utilizada para desenvolver o presente artigo intitula-se O Jornal Batista, nele é
apresentada na matéria de 1986 a participação do Pastor Sebastião Lúcio Guimarães no
desenvolvimento das missões batistas em Moçambique neste período, e nesta matéria ele
aborda sobre a quantidade de pessoas batizadas no ano anterior e relata sobre a falta de
material humano, sobretudo em Maputo. Isso indica a necessidade dos pastores responsáveis
por desenvolver missões batistas no continente africano.

Por conseguinte no mesmo ano de 1986 o Jornal relata que o Pastor Sebastião Lúcio
Guimarães tem êxito em batizar novos membros, contudo a igreja de Moçambique passava
por uma crise doutrinária onde:

A Igreja Batista do Dondo, por exemplo, tomou a decisão em assembleia de


torna-se uma igreja pentecostal, estando disposta a ensinar aquilo que crê em
suas missões e outras igrejas. A igreja está incrementando o falar em línguas,
curas, profecias, aspersão de óleo. Nesta cidade trabalham nossas
missionárias Noêmia Gabriel da Silva e Raquel Barcelos, que com a ajuda
do Pr. Sebastião Lúcio Guimarães, luta para reorganizar o trabalho. 6

Priscila Rodrigues dos Santos em 2017 defendeu a dissertação intitulada Retratos da


evangelização batista: as relações entre os missionários brasileiros e a diversidade de
saberes em Moçambique (1970-2010) que tem por objetivo principal “analisar as relações dos
missionários brasileiros batistas junto a diversidade de saberes moçambicanos durante as
missões realizadas pela Junta de Missões Mundiais da Convenção Batista Brasileira (JMM).

Existem diversas narrativas das experiências históricas que perpassa pelo território
moçambicano em se tratando, sobretudo de religião, não existia homogeneidade e com isso os
missionários batistas tiveram que se adaptar no decorrer das missões com hábitos e costumes
daquele povo, havendo na maioria das ocasiões algumas negociações que determinavam as
relações entre eles.

6
O Jornal Batista. Rio de Janeiro. Jun. 1986. p. 6.
Para desenvolver a sua dissertação, Priscila Rodrigues utiliza-se de entrevistas com alguns
missionários batistas brasileiros bem como a analise da trajetória de vida missionária deles,
Pastor Sebastião Lúcio Guimarães faz parte da sua pesquisa com uma contribuição
significativa através da sua entrevista, nos informando que:

Sebastião Lúcio Guimarães chegou em Moçambique na década de 1980 para


consolidar o trabalho de evangelização iniciado pelas missionárias Valnice e
Noemia. Como os outros missionários, ele também se formou em teologia
pelo Seminário Teológico Batista do Sul em 1976 e durante os anos de 1984
e 1988 foi enviado pela Junta Mundial de Missões (JMM) para plantar
igrejas no interior moçambicano. Voltou ao Brasil em 1990 e foi enviado a
África do Sul nos anos de 1993 a 1996 e 2005 a 2008.7

No decorrer da leitura é possível entender o contexto social e político em que o Pastor


Sebastião estava inserido bem como suas ações mediante a isso, tendo como principal
objetivo o desenvolvimento da missão em território moçambicano.

O artigo das autoras Katani Maria Monteiro e Natalia Pietra Méndez intitulado Gênero,
biografia e ensino fundamentam o uso da biografia e o estudo do gênero no ensino de história,
nos primeiros pontos da escrita elas apresentam as aproximações e semelhanças entre esses
conteúdos atrelados com a participação dos professores de história.8

Os professores de história possuem relativa autonomia em relação ao conteúdo que é passado


na história ensinada. Essa autonomia faz com que eles se tornem agentes produtivos dos
saberes do passado tornando-se assim um facilitador da apreensão dos conhecimentos
passados para seus alunos. Por isso que ao utilizar o livro didático, que por sua vez, apresenta
uma lógica de transmissão especifica e pronta, cabe ao professor, segundo as autoras:

Romper com a lógica da transmissão, do currículo “pronto” definido pelo


uso do livro didático é dos mais importantes desafios para o ensino de
história, que não será alcançado enquanto a escola permanecer como um
lugar de transmissão.

É válido ressaltar que a utilização dos Parâmetros Nacionais Curriculares (PCN’s) de história
auxilia o professor no desenvolvimento de cada conteúdo, e pode ser considerado um
elemento norteador do ensino de história:

7
SANTOS, Priscila Rodrigues dos. Retratos da evangelização batista: as relações entre os
missionários brasileiros e a diversidade de saberes em Moçambique (1970-2010). 2017.
Dissertação (Mestrado em História Social da Cultura) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro, 2017. p. 40-41.
8
MONTEIRO, Katani Maria Nascimento; MÉNDEZ, Natalia Pietra. Gênero, biografia e ensino de
História. Aedos.11 vol. 4 – Set. 2012
Devemos considerar que os PCN’s são diretrizes orientadoras da ação
educativa, constituídas através da intersecção de diversos interesses, não
apenas do Estado, mas de especialistas da área, professores e movimentos
sociais. Como documento norteador, oferece possibilidades amplas de
construções curriculares.9

É necessário chamar atenção para o período em que a missão é retratada, pois o cenário
político era conflituoso por conta da guerra civil moçambicana que predominava no contexto,
a guerra se desenvolveu por conta da nova política colonial portuguesa, tais mudanças
levaram a várias reformas políticas e econômicas nas colônias, como no caso de Moçambique.
A nova forma do colonialismo português introduziu formas que impediam o desenvolvimento
da população negra.

Nesse contexto, diversas manifestações contra o domínio colonial foram feitas por parte da
população moçambicana no país e elas tomaram proporções maiores e mais radicais com o
desenvolvimento dos movimentos nacionalistas armados: Frente de Libertação de
Moçambique (FRELIMO).

Com o crescimento das missões batistas em Moçambique as instalações das igrejas


aumentaram significativamente, sobretudo em locais em que o Estado estava ausente e não
atendia a população em suas necessidades básicas bem como: educação, saúde, moradia etc.

Para desenvolver a pesquisa, Rodrigues realizou algumas entrevistas com missionários


enviados pela JMM, sendo eles, Noemia Sesito e Sebastião Guimarães. Para desenvolver as
entrevistas ela aplica o método de analise do discurso analisando assim a narrativa de alguns
missionários.

O método utilizado é o chamado Método de Análise do Discurso construído por Fiorin


(2011), bem como o Capítulo Fontes Impressas do livro Fontes Históricas de Carla Pinsky.
Esses autores nos auxiliaram a utilizar uma metodologia que desenvolve a analise e a escrita
de maneira critica levando em consideração todo o contexto.10

Através do Método de Análise do Discurso, foi possível investigar as matérias e colunas


publicadas no Jornal Batista de uma forma analítica e sucinta, pois, através disso pude

9
MONTEIRO, Katani Maria Nascimento; MÉNDEZ, Natalia Pietra. Gênero, biografia e ensino de
História. Aedos.11 vol. 4 – Set. 2012. p. 85.
10
FIORIN, José Luiz. Elementos de Análise do discurso. São Paulo: Contexto. 2005.
identificar os itens que compunham os processos de desenvolvimento das missões e os
objetivos de cada fala publicada na fonte utilizada.

Através do capítulo Fontes Impressas, foi possível compreender sobre a história e origem das
fontes, bem como, jornais, despertando dessa forma o desenvolvimento do processo de
pesquisador. Nos ajuda a pensar sobre a importância das fontes impressas e suas
especificidades.

Esperamos que a partir dessa biografia, possamos pensar ao mesmo tempo os fatores que
levaram a conversão do personagem central de nosso estudo, e assim, as estratégias que o
Protestantismo utilizou nos anos sessenta e início dos setenta no processo de conversão. Bem
como as estratégias empreendidas pelo mesmo que foram instrumentos para a conversão dos
nativos, e os locais que o mesmo desenvolveu o seu ministério pastoral e missionário. E como
essa trajetória nos ajuda compreender esses locais e as relações sociais lá existentes.

Refletir sobre a fenomenologia da religião e a consequente transformações sofridas pelos


indivíduos que atestam terem passado por esse processo chamado de “conversão” e quais as
implicações que a mesma demanda sobre a vida dos mesmos, haja vista que gera
transformações culturais, sociais e religiosas.

Discutir o que podemos apreender a partir do estudo da biografia de um homem negro,


protestante, que desempenhou boa parte do seu trabalho catequético em outro continente e
país, haja vista que o estudo de uma biografia, não apenas nos aponta para os grandes feitos
do indivíduo, mas nos leva a podermos vislumbrar a realidade da sociedade onde o mesmo
está inserido. Sendo assim por meio do estudo dessa biografia podermos compreender ao
mesmo tempo as redes de relações que o mesmo teve que manter a fim de o seu trabalho
viesse frutificar. Bem como refletir como a sua história de vida, pode servir para um ensino de
história não colonizador e ao mesmo tempo em que empreende uma educação de caráter
antirracista.

Portanto entendemos ser de grande importância pensar nessa biografia como estratégia de
ensino, a fim de que em dias de tanta intolerância religiosa, possamos colaborar com a
reflexão de uma educação de caráter ao mesmo tempo antirracista, inclusiva e disposta a
desenvolver um diálogo inter-religioso a partir da vivência escolar.

Referências Bibliográficas:
ALVES, Rubem. O que é religião? , São Paulo: Loyola, 6ª ed. 2005.

FIORIN, José Luiz. Elementos de Análise do discurso. São Paulo: Contexto. 2005.
LUCA, Tania Regina de. . Fontes Impressas. História dos, nos e por meio dos periódicos.
In: PINSKY, Carla Bassanezi. (Org.) Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2008, pg. 111
a 154.
MONTEIRO, Katani Maria Nascimento; MÉNDEZ, Natalia Pietra. Gênero, biografia e
ensino de História. Aedos.11 vol. 4 – Set. 2012.

SANTOS, Priscila Rodrigues dos. Retratos da evangelização batista: as relações entre os


missionários brasileiros e a diversidade de saberes em Moçambique (1970-2010). 2017.
Dissertação (Mestrado em História Social da Cultura) – Pontifícia Universidade Católica do
Rio de Janeiro, 2017.

SILVA, Orlando Gomes da. Biografia do Pastor Sebastião Lúcio Guimarães Um Servo a
Serviço de Deus. Rio de Janeiro: CIEM, 2012.

TEIXEIRA, Faustino. O diálogo inter-religioso ontem e hoje. Disponível em:


www.missiologia.org.br. Acessado em 10 Ago. de 2020.

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