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SOCIEDADE DE EDUCAÇÃO DO VALE DO IPOJUCA

FACULDADE DO VALE DO IPOJUCA – FAVIP


COORDENAÇÃO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
CURSO DE JORNALISMO

MARIANA FEITOZA PRAUN

UM PASSADO SEMPRE PRESENTE OU ENQUANTO ESPERO,VIVO:


Um álbum sobre as memórias fotográficas da velhice

CARUARU

2012
2

MARIANA FEITOZA PRAUN

UM PASSADO SEMPRE PRESENTE OU ENQUANTO ESPERO,VIVO:


um álbum sobre as memórias fotográficas da velhice

Relatório de Trabalho de Conclusão de


Curso (TCC) apresentado ao curso de
Comunicação Social – Habilitação em
Jornalismo da Faculdade do Vale do
Ipojuca (FAVIP), como requisito
obrigatório à obtenção do título de Bacharel
em Jornalismo. Professora Orientadora:
Camila Leite de Araujo.

CARUARU

2012
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Catalogação na fonte -
Biblioteca da Faculdade do Vale do Ipojuca, Caruaru/PE
P918p Praun, Mariana Feitoza.
Um passado sempre presente ou enquanto espero, vivo: um
álbum sobre as memórias fotográficas da velhice. / Mariana
Feitoza Praun. – Caruaru: FAVIP, 2012.
44 f.: il
Orientador(a) : Camila Leite.
Trabalho de Conclusão de Curso (Jornalismo) -- Faculdade do
Vale do Ipojuca.

Inclui apêndice.

1. Fotografias pessoais. 2. Memória. 3. Velhice. I. Praun,


Mariana Feitoza. II. Título

CDU 070 [13.1]

Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário: Jadinilson Afonso CRB-4/1367


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Mariana Feitoza Praun

UM PASSADO SEMPRE PRESENTE OU ENQUANTO ESPERO,VIVO:


um álbum sobre as memórias fotográficas da velhice

Trabalho de conclusão de curso


apresentado à Faculdade do Vale do
Ipojuca, como requisito parcial para
obtenção do título de Bacharel em
Comunicação social com Habilitação
em jornalismo.
Orientadora: Professora Camila Leite
de Araujo

Aprovado em:

________________________
Orientador

________________________
Avaliador(a)

_________________________

Avaliador(a)

CARUARU
2012
5

Dedicatória
Dedico este trabalho, primeiramente, ao meu pai Rossini e à minha avó Maria
Alice, pela confiança que sempre depositaram em mim e por todas as oportunidades que
me deram de concretizar mais uma caminhada da minha vida. Sei que nunca mediram
esforços para que esta conquista se realizasse, e sem a compreensão, a ajuda financeira e a
confiança deles, nada disso seria possível. A eles, além da dedicatória desta conquista,
dedico a minha vida.
Dedico este trabalho também à memória do meu segundo pai e avô Ivan, que
infelizmente não pode estar de corpo presente neste momento, mas que não poderia deixar
de ser lembrado e homenageado, já que tanto devo a seus ensinamentos e valores passados.
Obrigada por tudo! Saudades eternas dos momentos que passamos quando eu era pequena
e cuidávamos juntos do meu hamster.
Ao meu noivo Orlair, que em muitos finais de semana me proporcionou seu carinho
e sorriso tão lindo, ajudando-me a sentir menos ansiosa e aliviando minhas angústias. Pela
paciência, compreensão e ombro amigo que muitas vezes enchi de lágrimas. Por todas as
vezes que você me ajudou a encontrar as soluções quando estas pareciam não improváveis.
Você é a pessoa que compartilha comigo os momentos de tristezas e alegrias. Além deste
trabalho, dedico todo meu amor a você.
A minha família mais próxima, dedico este trabalho e todo meu carinho. E, é claro,
a minha mãe Jacqueline, que me deu a vida, e que apesar da distancia sempre me ajudou
com suas palavras, confiança e paciência, já que em muitos finais de semana não pude vê-
la para me dedicar a este trabalho. Te amo, mamãe!
Dedico, em especial, este trabalho aos idosos da Casa dos Pobres São Francisco de
Assis por tudo que aprendi com eles, por suas memórias e a força com a qual superam as
duras superações da vida.
A estes dedico meu trabalho, sem a ajuda, confiança e compreensão, todo este meu
trabalho não teria se realizado. Vocês são tudo pra mim! Muito Obrigada por tudo!
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Agradecimentos

Agradeço, primeiramente, a Deus, não só por esse trabalho, mas por toda a minha
vida. Sem a convicção de seu amor e proteção enfrentar muitas das dificuldades que
encontrei durante minha vida teria sido muito mais difícil.
Aos profissionais da Casa dos Pobres que tão bem me receberam, por terem
permitido o desenvolvimento do projeto e principalmente pelo acolhimento, cuidado e
paciência que eles dedicam aos idosos.
E a cada um dos idosos que tive o prazer de conhecer no Instituto. Por terem aberto
suas memórias, suas vidas, suas dores e reflexões a mim e a todos que tiverem contato com
essa pesquisa.
A minha orientadora Camila, por exigir de mim muito mais do que eu supunha ser
capaz de fazer. Agradeço por transmitir seus conhecimentos, por fazer do meu trabalho
uma experiência positiva e por ter confiado em mim. Ela sempre esteve ao meu lado me
orientando e dizendo “não desista agora!”. Por ter dedicado parte do seu tempo a mim.
Aqui é muito pequeno para agradecer tamanho afeto. Muito Obrigada por tudo, pela
paciência, pela amizade e pelos ensinamentos que levarei para sempre.
Não poderia deixar de mencionar alguns amigos de trabalho que me apoiaram e
estiveram ao meu lado durante esta longa caminhada. Em especial, menciono Águeda e
Vera, amigas fundamentais em minha vida, com as quais compartilhei momentos de
tristezas, alegrias, angústias e ansiedades, mas que sempre estiveram ao meu lado me
apoiando e me ajudando. Sem vocês o que seria dos meus textos?

“Algumas pessoas marcam a nossa vida para sempre, umas porque nos vão ajudando na
construção, outras porque nos apresentam projetos de sonho e outras ainda porque nos
desafiam a construí-los”. Autor desconhecido.
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“Nosso amor pela pessoa velha não deve ser uma opressão, uma tirania a inventar cuidados
chocantes, temores que machucam. Façam o que bem entendam, cometam imprudências,
desobedeçam conselhos. Libertemos os velhos de nossa fatigante bondade” Paulo Mendes
Campos, 1922, p.24.
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Resumo

Este trabalho objetiva discutir a fotografia como instrumento das memórias


pessoais e de re-significação de identidade. Para isso, essa pesquisa encontrou na
Assistência aos mendigos de Caruaru, mais conhecida como: Casa dos Pobres São
Francisco de Assis, um espaço para discutir a importância da imagem como memória e
esquecimento.
Propõe-se assim uma reflexão acerca das fotografias íntimas, com o intuito de
verificar as memórias dos idosos, que sofrem a separação conjugal e familiar e como re-
significam essas imagens que carregam sobre seus passados a partir dessa experiência de
reflexão sobre suas vidas.
Composto por duas oficinas fotográficas, cada uma contem a seleção de 36
fotografias, que representam os dois aspectos da pesquisa: um ensaio fotográfico em preto
e branco voltado para a reflexão do passado dessas pessoas, suas memórias pessoais
alavancadas por suas fotografias, imagens materiais e imateriais, quase todas já perdidas; e
outro, colorido, que se centra na produção de um álbum atual, com a seleção de alguns
momentos escolhidos pelos próprios idosos que retratam seus cotidianos, as atividades
institucionais e os novos laços afetivos que atualmente estabelecem na Casa dos Pobres
São Francisco de Assis.
Pretende-se que a essência deste fotodocumentário ultrapasse os limites geográficos
da Academia e sirva como arquivo de uma parte da memória imagética da Casa dos Pobres
São Francisco de Assis. Neste sentido, propõe-se construir um álbum que conta a história
de algumas pessoas que lá habitam.
No esforço de oferecer princípios de uma reflexão metodológica em torno da
memória de pessoas idosas, essa pesquisa parte do suporte verbal (oriunda de entrevistas) e
visual (a partir das fotografias sobre seus passados). Esses dois suportes comunicacionais
nos permitiram acesso à vida e à memória dos idosos.

Palavras chave: Fotografias Pessoais. Memória. Velhice.


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Abstract

This research aims to discuss photography as an instrument of personal memories and re-
signification of identity. Therefore, this research found in “Casa dos Pobres São Francisco
de Assis”, in the city of Caruaru, a place to discuss the importance of the image as memory
and forgetting issues.

We propose a study about the private photographs with the intention of verifying the
memories of the elderly who suffer the separation of the family and marriages and how
these images re-signify in time as reflecting about the past allow us to experience it in a
different way.

Compound by two photographic essays, which each shows a selection of 30 photographs


that represent the two aspects of this research: the first faces the past these people, their
memories by leveraging their personal photographs, which are almost all lost, and the other
focuses on the production of a current album, depicting the everyday activities and new
institutional bonding that the elderly lay in “Casa dos Pobres São Francisco de Assis”.

The concepts that were developed in this research relate to the memory of a past, family
separation, but also to identity, the present record of daily life and about the experience the
elderly chose to save in a photograph and experience this action.

It is intended that the essence of these photo essays go beyond the geographical limits of
the Academy and be used as a file memory imagery of “Casa dos Pobres São Francisco de
Assis”. We propose to build an album which tell part of the story of some people who live
there.

In an effort to provide a methodological tool to think about the memory of the older
people, part of this research is supported by verbal research (derived from interviews) and
visual research (from the photographs on their past). These two communication supports
allowed us to access the life and memory of the elderly.

Key words: Intimacy Photograph. Memory. Elderyhood.

SUMÁRIO
10

1.Introdução.................................................................................................................p.12

2. Justificativa..............................................................................................................p.13

2.1 A Velhice................................................................................................................p.15

2.2 Fotografia e Memória.............................................................................................p.19

3. Objetivos...................................................................................................................p.21

3.1 Objetivo Geral........................................................................................................p.21

3.2 Objetivos Específicos.............................................................................................p.21

4. Público Alvo.............................................................................................................p.22

5. Procedimentos Técnicos Metodológicos..................................................................p.23

6. Produtos Jornalísticos...............................................................................................p.25

6.1 Um passado sempre presente..................................................................................p.26

6.1.1 Sra. Elvira............................................................................................................p.26

6.1.2 Sra. Luzinete........................................................................................................p.27

6.1.3 Sra. Helena...........................................................................................................p.28

6.1.4 Sr. José Bezerra...................................................................................................p.30

6.1.5 Sr. José Marques..................................................................................................p.31

6.1.6 Sr. Severino.........................................................................................................p.32

6.2 Enquanto espero, vivo............................................................................................p.34

6.2.1 Sra. Elvira............................................................................................................p.34

6.2.2 Sra. Luzinete..........................................................................................................p.35

6.2.3 Sra. Helena..........................................................................................................p.36

6.2.4 Sr. José Bezerra..................................................................................................p.37

6.2.5 Sr. José Marques.................................................................................................p.38

6.2.6 Sr. Severino.........................................................................................................p.39

7. Cronograma..............................................................................................................p.41

8. Recursos...................................................................................................................p.42
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9. Conclusão.................................................................................................................p.43

10. Referências.............................................................................................................p.44
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1.Introdução

Quem visita a Casa dos Pobres São Francisco de Assis, na cidade de Caruaru,
depara-se com reflexões relativas à passagem do tempo, ao esquecimento e certo
distanciamento com o passado e com o núcleo familiar enfrentados pelos idosos que lá
residem. Neste sentido, é comum a comoção frente a tantas histórias pessoais guardadas,
evocadas ou sufocadas.
O propósito central desta pesquisa é oferecer uma reflexão sobre a memória pessoal
e propor um espaço para tais reflexões no meio acadêmico. Nesse sentido, teremos como
polo de acesso a tais informações a partir de suportes verbais e visuais. Estes instrumentos
da comunicação permitem o acesso às reflexões e informações necessárias para o
desenvolvimento de dois momentos marcantes desta pesquisa: um centrado sobre o que as
fotografias guardam do passado, do que foi vivido e do que se guarda dessas experiências
vividas; e do presente que se escolhe registrar e lembrar em um futuro.
O tempo que os participantes se encontram separados de suas famílias constitui
uma importante variável com o intuito de averiguar se há uma variação significativa
quanto à percepção de mudança ao longo do tempo.
Durante as entrevistas tentamos verificar como os idosos do asilo se relacionam
com suas famílias e com objetos do passado, em especial a visualidade e a verbalidade a
respeito desse passado, bem como as expectativas que possuem em relação à vida na
Instituição, os amigos e funcionários agora sempre presentes em seus cotidianos.
No primeiro eixo dessa pesquisa, partimos de entrevistas com seis idosos da Casa
em torno de duas perguntas norteadoras: “Quais fotografias você tem ou já teve?”,
avaliando o visual como elo da memória e de histórias de vidas. A partir dessa pergunta
temos acesso a essas imagens (materiais ou não) que despertam o trabalho da memória,
como uma espécie de percurso visual a partir do qual os idosos relembram suas
experiências vividas e suas histórias pessoais. O primeiro ensaio desse estudo objetiva
retratar tais momentos, as emoções, dores e indiferenças frente às memórias suscitadas,
passado que é recriado a cada relembrar.
O segundo momento, de forma inversa da questão a qual nos propomos no primeiro
ensaio, visa construir novos registros fotográficos a partir de reflexões a respeito dos
momentos em que os idosos gostariam de registrar, pistas visuais sobre seus novos amores,
amigos, dificuldades, aprendizados, solidões e etc. Esse ensaio foi resultado de outra
pergunta central: “dos momentos que hoje você vive no seu cotidiano, quais situações e
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instantes gostaria de ter fotografado para guardar na lembrança?”, explorando o verbal e o


visual na constituição de panoramas existenciais e experiências vividas.
Quanto à metodologia, trata-se de uma pesquisa de abordagem descritiva. A coleta
de dados foi realizada através de entrevistas semi-estruturadas e com o uso de fotografias.
Imagens estas que em um primeiro momento tentam criar uma experiência visual em
lembranças de um passado que os idosos carregam consigo, e em um momento posterior
aparecem como uma nova produção visual realizada na Casa dos Pobres São Francisco de
Assis a partir dos momentos expressados pelos idosos nas entrevistas como os momentos
importantes e marcantes dessa nova etapa de suas vidas.
O sofrimento foi um sentimento presente, independente do gênero, muitos dos
olhares presentes nesse projeto mostravam tamanha tristeza, ficando assim, evidente
algumas justificativas quanto à superação desses sentimentos.
Desta forma, a investigação se justifica na avaliação da importância da imagem
fotográfica como instrumento da memória, ora como um elo visual que permite relembrar e
recriar experiências pessoais e ora como ferramenta de registro e de criação de um presente
que, avesso a tendência do mundo contemporâneo de abandonar e esquecer aqueles que já
não mais “contribuem socialmente ou economicamente”, também merecem ser lembrados,
inventados, investidos e vistos.
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2. Justificativa

A relação entre as sociedades ocidentais e a velhice sempre foi complicada e


complexa, tanto em um contexto demográfico, social e econômico ou no que se refere aos
processos biológicos, psicológicos e valorativos. Tal complexidade se agrava na
contemporaneidade com os padrões e estilos de vida que impõe e supervalorizam o jovem,
o ritmo alucinante da vida urbana e a desvalorização do velho, da tradição, daqueles que
não são vistos como pessoas que são vistas muitas vezes como um fardo para a economia,
para a sociedade e para suas próprias famílias. E ao mesmo tempo, ressalta-se que o Brasil,
considerado até a década de 60 como um país jovem, abre novas perspectivas de
longevidade para seus cidadãos tornando ainda mais imperativo uma reflexão sobre a
velhice em nossa sociedade. (BRUNO, 2003)
As questões referentes à situação como os velhos são tratados e esquecidos em uma
situação de invisibilidade passaram a me incomodar quando fui ela primeira vez ao
Instituto Casa dos Pobres São Francisco de Assis. Foi em uma visita com os alunos do 9º
ano do Colégio Atual de Caruaru, em 2011 e, novamente em 2012, quando estes
desenvolveram um projeto e foram entregar cestas básicas e presentes que haviam
arrecadado juntos à comunidade para os idosos. Tal projeto serviu de base para a “Criação
Atual”, uma espécie de feira de ciências. Assim, me envolvi profissionalmente e
afetivamente, e desejei poder fazer alguma coisa por alguns idosos que lá conheci, mesmo
que fosse só ouvir o que eles tinham a dizer.
Desta forma, pretendo com meu trabalho de conclusão de curso criar vias de
acesso, de visibilidade, de reflexão, simplesmente tornar as vozes da velhice audíveis e
alguns de seus rostos visíveis. Mesmo sem muita certeza sobre o alcance social da minha
pesquisa, espero que ela alcance meus jovens colegas de faculdade, meus professores e que
supere os limites da Academia permitindo que pelo menos na cidade de Caruaru, em que
vivo, e em que se encontra a Casa dos Pobres São Francisco de Assis, algumas dessas
vozes sejam ouvidas e que os instantes visuais registrados precariamente pela minha
câmera permitam que suas invisibilidades sejam diminuídas.
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2.1 Velhice:

A primeira impressão ao se tentar definir o conceito de velhice é que isto se


configuraria em uma tarefa simples, já que o termo parece ser subentendido por todos.
Logo se percebe que este conceito se tornou um “lugar-comum”, e que a ele não é
dedicado a atenção e a reflexão necessária, uma vez que a velhice é cada vez mais um
imperativo em nosso país que desde a década de 60 começa a envelhecer (BRUNO, 2003).
Para Bruno (2003), há trinta anos percebeu-se um aumento na quantidade de
estudos sobre a velhice no Brasil, o que contribui para se chegar a novos parâmetros
mercadológicos, econômicos e na elaboração de políticas públicas. Nesse sentido, ressalta
que o Censu Demográfico de 2000 apontou que os idosos, pessoas acima de 60 anos,
representam 11% da população do país e que nos próximos 50 anos a população de idosos
crescerá cerca de 275% em relação à 19971. Lembrando que no primeiro ano do século XX
esta população se reduzia à apenas 1,2% da população nacional.
A relação entre as sociedades ocidentais e a velhice sempre foi complicada e
complexa, tanto em um contexto demográfico, social e econômico ou nos processos
biológicos, psicológicos e valorativos. Tal complexidade se agrava na contemporaneidade
com os padrões e estilos de vida que impõe e supervalorizam o jovem, o ritmo alucinante
da vida urbana e desvalorizam o velho, a tradição, e que condenam aqueles que não são
vistos, muitas vezes, como um fardo para a economia, para a sociedade e para suas
próprias famílias.
No entanto, ressalta, a velhice apresenta varias abordagens muito complexas, exigindo
um aprofundamento teórico em termos biológicos e psicológicos, e, por outro lado,
demandam uma reflexão cultural, econômica, política e sociológica, e só assim poderemos
chegar à conceituação que melhor expresse sua realidade.
Ainda para a autora, um dos problemas a cerca da velhice é que esta se configura no
período ao qual menos se dispõe de conhecimentos e só recentemente, vem se constituindo
em objetos de estudos sistemáticos, não podendo pensar a velhice apenas como dados
estatísticos. Para a antropologia ficar velho é uma questão de tempo, um período que todos
potencialmente viverão, e as memórias pessoais são demarcadas pelas experiências
travadas em um tempo e um espaço durante a vida.
O que é velhice? Quando a pessoa se torna velha? De que realmente se fala quando se
fala da velhice? A complexidade que gira em torno de como tratamos os nossos velhos é
1
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE e da Organização das
Nações Unidas - ONU.
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pouco discutia. Simone de Beauvoir (1990), na tentativa de romper o silêncio que envolve
esse período da vida que um dia todos nós viveremos, quer dizer, todos os que viverem o
suficiente para tal, faz uma reflexão sobre como a sociedade ocidental trata os idosos como
“párias”, condenando-os à miséria, à solidão e ao esquecimento.
Segundo Beauvoir (1990), o desinteresse e o desprezo às necessidades e bem estar
dos idosos faz parte de uma construção social que autoriza seus cidadãos mais jovens e
adultos ao desinteresse em relação às felicidades e cuidados dos velhos. Sendo, portanto,
reflexo da forma como as relações são construídas nas sociedades capitalistas, em que cada
pessoa é vista como aquilo que ela tem e aquilo que ela pode oferecer em troca. Ou seja,
nos relacionamos de forma a priorizar sempre nossos desejos e aquilo que podemos ganhar
aos nos relacionarmos com alguém. Nesse sentido, as relações que os jovens traçam com
idosos, mesmo que respeitosa, é cercada por um sentimento de que estes são seres
inferiores que não compreendem a vida e as relações da atualidade e que os sobrecarregam
de obrigações.
Elzimar Guimarães (2007) afirma que todos da sociedade têm direitos e deveres de
algo, mas que quando esse discurso parece contrariado pelas informações fornecidas por
economistas e legisladores quando estes falam dos idosos. E que a sociedade ainda não
criou um meio de fazer valer os direitos dos idosos, de os permitirem ser ativos e
produtivos.
Para a autora, tal situação é reflexo do fato de que os sujeitos em sua incessante
busca pela juventude não enxergam com nitidez o suficiente o futuro que os aguardam. E
que se essa conscientização fosse feita, os adultos de hoje lutariam e construiriam algo
melhor para os idosos de amanhã.
Nesse sentido, ficar velho é uma das mais difíceis etapas da vida das pessoas, já
que estas não se preparam para verem seus próprios corpos envelhecidos. Mas, além de
rugas, existe uma história de vida e resultados com os quais os velhos deveriam podem
contar, através de suas experiências.
A partir do estudo de Marcelo Antonio Salgado em “Velhice, uma nova questão
social” ao inverso das sociedades ocidentais contemporâneas, na Na Terra do Fogo, de
modo geral, a velhice era considera digna, de modo que os mais jovens respeitavam aos
mais velhos devido aos seus conhecimentos e experiências, e que estes chegavam a ter suas
posições cobiçadas. Por outro lado, em tribos esquimós, quando os idosos chegavam a um
período em que não mais pudessem suprir suas próprias necessidades, eles eram
culturalmente motivados a se suicidarem. Em certos grupos japoneses, os idosos eram
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sacrificados ao serem levados para lugares distantes para esperar pela morte. (BRUNO,
2003).
Elzimar Guimarães (2007) acredita que quando uma pessoa diz que tem sessenta
com mentalidade de vinte, quer dizer que está pronta para diversas coisas na sociedade sem
se limitar a nada por ser idosa, ou seja, partindo de tal afirmação e disposição esses sujeitos
deveriam ser aproveitados em projetos, que dispensem as limitações físicas, mas que os
permitem usar seus conhecimentos e experiências. Sendo grande parte da tristeza com a
qual eles convivem é pelo fato de serem abandonados à margem da sociedade, de não se
sentirem úteis e de serem subjugados socialmente.
Assim, o problema da velhice é uma questão cultural e caso essa linha de
pensamentos estiver certa, a representação que velhice tem no imaginário ocidental só vai
mudar a partir de um esforço político e social. Segundo Annateresa Fabris (2011), hoje
vivemos um poder político que mudou de natureza, que declarou sua impotência diante dos
mercados e que esta transformou a democracia e um procedimento estético enraizado e
mediado pelos meios de comunicação de massa. Assim, para a autora, na contramão dessa
tendência, o artista contemporâneo deve reaproxima-se das vertentes modernas que
pregavam a integração da arte com a vida.
Segundo Guimarães (2007), o homem existe partir de suas realizações,
profissionais e pessoais, elas lhe dão sentido à vida, mantendo-o motivado para usufruí-las.
O problema que mais agride aos idosos é a solidão e principalmente se o cônjuge ou
pessoas muito próximas a eles morrerem. Com isso, a preocupação e a sensibilidade ao
perigo podem causar depressão, o que afeta ainda mais o quadro de sentimento de solidão.
Nesse sentido, essa luta deve ser travada em nível individual, pessoal e a partir de uma
organização social e coletiva.
Mirian Goldenberg (2011), diz por meio de entrevistas e estudos que as mulheres
brasileiras que estão envelhecendo estão felizes por conquistar a profissão, a
independência, e a condição financeira, mas que o que mais as preocupam é o excesso de
peso, a vergonha em relação aos seus corpos e o medo da solidão. Em sua pesquisa, a
autora constata que esse é um problema social ao entrevistar mulheres alemãs, que por sua
vez se percebem mais seguras ao dizer que aos 60 anos se sentem no auge de suas vidas
produtivas, enfatizam em suas respostas as riquezas dessa fase da vida, não demonstram
haver preocupações relacionadas às preocupações das brasileiras, mas com viagens e
programas culturais. Conclui, assim, que a possibilidade de envelhecer de maneira bem
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sucedida depende da história de vida e da forma como cada um entende o processo de


envelhecimento e a velhice.
A autora acrescenta um ponto relevante em relação às preocupações das brasileiras
em relação à velhice, é o foco destas na figura do marido, no medo em ficarem feias e
sozinhas, e por isso fazem sacrifícios para parecerem mais jovens. Algumas falam que
durante a juventude foram muito paqueradas e quando fizeram 50 anos tornaram-se
invisíveis. Ao estudar a sexualidade na velhice, destaca que para as mulheres idosas, a
sexualidade não é uma prioridade, já o companheirismo e o carinho se configuram como
aspectos fundamentais.
Ressalta, apesar disso, que em algumas entrevistas o contrário também foi
afirmado, que na velhice existem muitos ganhos, e não só perda, mulheres que
demonstraram em suas falas uma relação entre velhice e felicidade, maturidade, prazer e
liberdade. Algumas dessas mulheres, divorciadas e com idade acima dos 50 anos,
afirmavam já terem cumprido todas as obrigações sociais e familiares e que agora podem
cuidar de si mesmas, fazer o que gostam sem ter que dar satisfação para seus
companheiros.
Para Bruno (2003), refletir a respeito da velhice é dar espaço para que o velho se
reconheça em sua trajetória de vida, experiências coletivas e individuais, reconhecendo as
marcas do tempo em seu próprio corpo, e que transmitam um pouco de suas experiências
sentindo-se úteis socialmente.
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2.2 Fotografia e Memória


Para Barthes (1984) a memória é entendida como, lembrança vaga, coisa que
se guardou e mal se lembra, uma recordação ou lembranças que nos atingem e que os seres
humanos são essencialmente compostos por lembranças, pela capacidade de relembrar os
fatos já vivenciados.
De acordo com Larissa de Albuquerque (2010), na contemporaneidade o uso da
fotografia tem contribuído para algumas transformações culturais e sociais, fazendo com
que a fotografia na contemporaneidade seja muito mais do que uma ferramenta de registro,
e sim meio de reconhecimento social e do próprio autoconhecimento individual.
Processo este que se deu paralelamente ao desenvolvimento das câmeras
fotográficas, que ao terem saído da mão do profissional, passaram a fazer parte do
cotidiano familiar e individual, tornando-se uma ferramenta de expressão, de memórias e
de ficcionalização das vidas.
Lembramos, contudo, que olhar uma fotografia é ver uma criação, um processo que
se dá por escolhas subjetivas do fotógrafo, por meio de pontos de vistas, ângulos,
composição, enquadramento e que o próprio olhar dessa imagem que varia de pessoa para
pessoa. Fotografar é reunir um processo racional e o mundo da imaginação.
Ou seja, a fotografia alia imagem e imaginação, tendo a função de, ao mesmo
tempo, de servir como uma prótese, um gancho, para alcançar lembranças do passado; e
também para permitir que ao relembrar do passado que criemos a partir dele imagens
ideais. Assim, muitas vezes usada como uma prova sobre esse passado, sobre como já se
foi jovem, bonito, saudável e feliz. Um passado que se reconhece sempre presente e que a
cada relembrar se modifica ao ponto de não termos uma imagem tão realista sobre o que se
passou.
Barthes (1984) em sua reflexão sobre a relação entre a imagem e a morte, afirma a
fotografia como uma possibilidade de acesso às coisas e pessoas que o tempo já levou,
sobre quem já fomos e não somos mais. Nesse sentido, a fotografia se afirma como um
reflexo sobre aquilo que nos é mais sagrado, a representação de uma magia, e também de
uma loucura. A fotografia como um acesso ao passado e, ao mesmo tempo, como
impossibilidade de acessar a esse passado como ele de fato se deu. Ainda assim, a imagem
nos permite ora ultrapassar e ora nos atentarmos às dores e feridas que carregamos pela
dura separação que vivemos entre o passado e o presente.
20

A ligação entre memória e fotografia vem do descompasso existente entre a


presença e a ausência, entre a distância e a proximidade, entre o reconhecimento e a
lembrança do fato ou pessoa fotografada.
Nesse sentido, também, o autor nos fala que nossos tesouros mais precisos são os
rostos das pessoas amadas que carregamos conosco, ao longo da vida por meio das
fotografias.
De acordo com André Rouillé (2009) quando olhamos uma imagem fica mais fácil
alcançar determinada lembrança, mas que são lembranças não apenas de uma
documentação de um passado, mas que expressam a subjetividade daquele que fotografou,
por meio dos ângulos, do enquadramento, da composição e do instante que se escolhe
registrar, e também daqueles que se postaram frente à câmera posando para o fotógrafo e
que cada espectador verá essa imagem de uma forma diferente.
Para o autor, o ato de fotografar representa uma ação de descobrir novos pontos de
referência no espaço, sendo, portanto, tanto imaginário como real. São maneiras de ver, e
de inventar novas visibilidades, tornar visível o que é encontrado no percurso pela vida.
Fotografar é aprender a ver, designar, constatar, captar, descrever, registrar, e também se
relacionar e representar com as imagens produzidas ao longo de nossas vidas.
Para Larissa Albuquerque (2010) apesar de a vida contemporânea ser
essencialmente interpelada pela visualidade, as fotografias está perdendo o encanto de
serem vistas com prazer, já que as quantidades de fotografias tiradas descompensadamente
acabam sendo guardadas e esquecidas de serem impressas de seus arquivos digitais.
Apesar de hoje se produzir muito mais fotografias do que em qualquer outra época, a
produção de álbuns fotográficos materiais vem diminuindo. Isto torna ainda mais
imperativa à reflexão a cerca das memórias fotográficas que estamos produzindo e
mantendo sobre o século XXI.
A autora ressalta as novas questões referentes à memória interpelada pelos
processos tecnológicos da contemporaneidade sempre tem dois lados. Apesar de o digital
ter libertado a prática das mãos dos profissionais e ter tornado a fotografia um ato mais
vivo e intimo das pessoas, estas se acomodam ao pensar que estão constantemente
produzindo visualidades dos seus cotidianos e acabam por não tomarem os devidos
cuidados com seus arquivos imagéticos.
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3. Objetivos:

3.1 Objetivo geral

- Investigar a importância da fotografia como instrumento para provocar e construir


memórias pessoais

3.2 Objetivo específico

- Caracterizar as memórias evocadas;

- Identificar os eventos que os idosos consideram mais significativos e que desejam


registrar como uma memória de suas vidas na Casa dos Pobres São Francisco de Assis;

- Discutir a relação afetiva dos idosos com a memória evocada;


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4. Público Alvo:

Este trabalho esta voltado à sociedade em geral. Objetivando tornar visível e


possível a reflexão sobre a velhice e construção da memória e da ficção fotográfica no
interior de Pernambuco à população, às pessoas ligadas especificamente à “Casa dos
Pobres São Francisco de Assis” e a todos que tem a consciência que vão envelhecer e que a
invisibilidade com a qual tratamos nossos idosos não é correta. Este trabalho destina-se,
também, a todos os apreciadores e profissionais da fotografia, destacando a essência e
importância dessa arte na vida das pessoas comuns e das instituições. Além de servir como
objeto de estudo para os universitários dessa Instituição de Ensino Superior, a FAVIP.
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5. Procedimentos técnicos metodológicos:

-Tipo de estudo: de abordagem descritiva.

-Local: O estudo foi realizado em uma instituição asilar de longa permanência situada na
cidade de Caruaru, a Casa dos Pobres São Francisco de Assis. A instituição filantrópica foi
criada em 10 de março de 1948 e é mantida pelo Governo do Estado de Pernambuco. A
Casa dos Pobres São Francisco de Assis recebe pessoas a partir dos 65 anos de idade.
Mantendo uma média de 95 internados, estes permanecem na Instituição de forma integral,
mas podem sair acompanhados pela família a qualquer dia desde que retornem até as 19
horas. Na Instituição os idosos realizam inúmeras atividades como fisioterapia, aulas de
desenho, oficinas de artesanato e a integração social por meio de alguns jogos, como
dominó e jogos de baralhos.
O espaço físico da Instituição consiste em quatro partes: a capela, onde são
realizadas as missas nas quartas-feiras e cujo terraço é espaço para os velórios dos idosos
que falecem e não tem mais família; as salas de coordenação, da assistente social, do
diretor do asilo e a farmácia; o bloco dos quartos, dispostos um ao lado do outro, perto de
um pequeno jardim; e a quarta parte é uma sala grande de socialização dos idosos na qual
acontecem as visitas de colégios, igrejas, etc., e na qual encontramos sofás e cadeiras de
balanço.
-Período: Agosto – Novembro de 2012.
-População: O estudo foi feito com idosos de ambos os sexos que permaneciam na
instituição escolhida. Como critério de inclusão os idosos deveriam ser capazes de manter
comunicação verbal e demonstrar capacidade de memória suficiente para responder as
questões norteadoras.
- Procedimento de coleta de dados: O material foi coletado a partir de encontros com os
idosos. Inicialmente se apresentava ao idoso, explicando a idéia do projeto e perguntando
se eles aceitavam colaborar com exposição de suas fotografias. Os encontros se davam em
torno de duas perguntas norteadoras: “Quais fotografias você tem ou já teve que foram
importantes para você?”; “Que fotografias você gostaria de ter da sua vida de hoje para
guardar de lembrança?”.

- Aspectos éticos e administrativos: O estudo foi feito em concordância com a direção e


coordenação do Instituto. Na pesquisa eles tiveram a identidade preservada pelo uso
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apenas de seus primeiros nomes e todos os participantes manifestaram concordância para


participar e permanecer no estudo.
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6. Produtos Jornalísticos:

Fotodocumentário: Um Passado sempre presente ou Enquanto espero, vivo: uma


álbum fotográfico da velhice.
Fotografia e entrevistas: Mariana Feitoza Praun
O ensaio contém 72 fotos, sendo 36 coloridas e outras 36 em preto e branco, este
serão expostos em exposição montada na sala de defesa do TCC. No ensaio e nas
pesquisas demos prioridade aos sujeitos que mais se mostraram capazes e à vontade de
fazer uma reflexão sobre suas vidas, presente e passado. Tentando por meio da visualidade
e da verbalidade reconhecer e visualizar as imagens que carregam sob forma de traços e
vestígios que marcaram suas vidas. Na esperança de emprestar ao espectador desses
ensaios olhos e ouvidos atentos às reflexões sobre a velhice.
Estes ensaios poderão ser utilizados como um álbum e parte de um arquivo da Casa
dos Pobres São Francisco de Assis, expressando alguns pontos de vista sobre algumas
estórias de alguns de seus moradores.
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6.1 Um passado sempre presente:

Este ensaio consiste em 30 fotografias em preto e branco que foram feitas durante a
entrevista com seis idosos da Casa dos Pobres São Francisco de Assis no momento em que
estes refletiam e respondiam a primeira pergunta da entrevista e que motivo este ensaio:
“Quais fotografias você tem ou já teve?”.
Muitos dos entrevistados já não carregavam seus álbuns e fotografias de seus
passados por acharem que não valia mais apenas andar com tais preciosidades ou por terem
perdido-os em suas mudanças, outros, ainda, nunca tiveram fotografias. Mas, de uma
forma ou de outra, todos convivem com imagens de seus passados, imagens da memória e
do coração, lembranças que deixaram marcas em suas reflexões e corpos.
O fator determinante para esse ensaio foi a intenção de preservar esses vestígios e
marcas do tempo, recortes de um passado sempre presente que a cada relembrar se
transforma e se modifica, fazendo com que muitas vezes não saibamos mais se essas
imagens estão na perspectiva do ontem ou do hoje. Nesse sentido, o preto e branco parece
ajudar a percorrer esses “traços”, “marcas” e “manchas” daquilo que já foi, mas que ainda
está tão presente em seus corpos, pensamentos e falas. O enquadramento foi pensado na
tentativa de ressaltar ao acesso dessas memórias, que nunca nos dão a uma compreensão
clara ou total, mas em fragmentos.

6.1.1 Sra. Elvira:

Dona Elvira perdeu os pais muito cedo, e desde então foi trabalhar “em casa de
família”. Lá ficou muito tempo, cuidava da comida, da limpeza da casa e, especialmente,
das crianças. Passaram-se os anos e as crianças cresceram.
Interrompida a história sobre família a qual trabalhava e questionada sobre sua
própria família. Ela responde que sua família são seus seis irmãos, já que nunca casou ou
teve seus próprios filhos. Será que ela tem alguma imagem de sua família? Ela responde
que as fotos que teve ficaram com seus irmãos, e que estas se perderam, já que não tem
mais contato com eles, e que nem mesmo sabe onde estão.
Sra. Elvira não apresenta nenhuma imagem mental sobre seus irmãos ou a respeito
dessas fotografias. Então, volta às lembranças sobre a família para a qual trabalhou,
percebe-se, assim, que essas são as imagens de família que ela carrega em suas memórias.
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Nas imagens que Sra. Elvira guarda de sua vida, percebe-se um álbum de família.
Uma família da qual também fazia parte. Assim, quando uma das crianças cresceu e se
casou, ela foi junto. Cuidou da casa dele e de seus filhos.

6.1.2 Sra. Luzinete:

Sra. Luzinete, não sabe sua própria idade, mas sabe que há dois meses mora no
asilo. Diz lá encontrar pessoas que a escutam, que lhe dão atenção e carinho.
Antes de vir para a Casa dos Pobres São Francisco de Assis teve um derrame e foi
morar com a filha. Sua vida que nunca foi fácil complicou ainda mais. Dona Luzinete se
sentiu mal tratada pelos netos e genro. Foi, então, morar com a irmã, com quem deixou
suas fotos, mas que apesar disso não se lembrava de nenhuma imagem, fixa ou não, de
algum momento bom da vida para se relembrar.
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Seu passado foi difícil, marcado por muitos esforços e trabalhos. O único
detalhamento sobre esse passado se evidenciou quando afirmou que não teve muito estudo
e que trabalhou de garçonete em um bar.

6.1.3 Sra. Helena:


Um retrato pequeno expõe o corpo de um jovem, o papel fotográfico é grosso com
algumas dobras e marcas do tempo. A moldura branca da imagem foi ampliada em papel
fotográfico brilhante que mostra um homem de seus vinte e cinco anos em uma praia da
cidade de Recife. Este é Ednaldo, um dos nove filhos de Sra. Helena.
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Dona Helena é conhecida por ser uma senhora simpática e bastante esquecida. Será
que é esquecida porque sabe que tem como se lembrar? Que o acesso ao passado, aos
rostos de alguns de seus queridos estão guardados nas fotografias que carrega consigo?
Das imagens de seu passado, possui uma 3X4 de seu falecido marido, com quem se
casou aos dezenove anos. Ele que era doze anos mais velho do que ela, é descrito como um
homem forte, alto, porém muito rude, vindo da zona rural.
Uma fotografia chama atenção: é uma imagem que guarda um pedaço da visão da
juventude de Dona Helena. Ela aparece em pé, vestindo um vestido branco com bolinhas
azuis, na casa onde morava quando casada. Seu corpo, ainda com trinta e cinco anos, ao
lado da filha, que por motivos de brigas pessoais entre as duas, Dona Helena prefere não
mencionar o nome. Entretanto, o que o que mais chama a atenção nessa imagem é que esta
parece representar mais uma relação de amigas ou de irmãs do que mãe e filha. Que
momento foi esse? Que lembranças essa imagem permite? Ela fita a imagem e se cala.
Apenas diz que aquela era a casa de seu marido, onde criou seus filhos. Continua
falando da doença de seu marido, que ele sofreu com muitas dores de cabeça quando
chegou a falecer.
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6.1.4 Sr. José Bezerra:


José Bezerra é conhecido por ser um dos idosos mais brincalhões, inteligentes e
lúcidos do Asilo Casa dos Pobres São Francisco de Assis, apesar de ter os movimentos do
lado esquerdo de seu corpo comprometidos por causa de um derrame sofrido há seis anos
não se deixa abater e constantemente faz brincadeiras sobre suas debilitações físicas.
Nascido na cidade de Bezerros, lá trabalhou de dia como eletricista e de noite como
músico. Brinca que quando jovem era boêmio e trocava o dia pela noite, apesar de nunca
ter faltado seu emprego diurno.
Quando perguntado sobre as fotografias de sua vida, respondeu-me que ficaram
com sua nora, já que ele optou por não levá-las ao asilo. De todas, as que lhe são mais
preciosas são as de seu casamento.
Com os olhos cheios de lágrimas, lembrou-se desses instantes eternizados ou pela
câmera fotográfica ou pela sua memória mais íntima, momentos que o ligam a sua esposa,
de quem ainda sente muitas saudades. Descreve em suas reflexões uma imagem na qual os
convidados dançavam ao som da banda que tocou na recepção da cerimônia de seu
casamento. Outra lembrança é da época em passava a noite fora de casa, e que de manhã
era recebido por sua mulher que com a mesa posta, ao abrir a porta de casa, o
cumprimentava: “Bom dia, Nelson Gonçalves!”.
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6.1.5 Sr. José Marques:


José Marques é analfabeto e tem uma “memória de elefante”. Suas lembranças são
repletas de datas meses e anos de suas viagens do passado e dos aniversários de seus
colegas, “ninguém tem amigos, apenas colegas”, afirma. Zé Preto, como é conhecido no
asilo, diz que já se acostumou com o lugar, “que é o jeito ficar por lá”.
Apesar de não mais possuir fotografias que retratem seu passado, já que estas
ficaram com seus familiares que nunca mais foram visitá-lo, recorda-se de algumas delas,
todas feitas durante sua infância.
Das poucas fotos que teve, a que ele mais se lembra e mais gosta de relembrar é
uma fotografia 3x4 que fez para sua carteira reservista. O motivo de gostar tanto dessa
fotografia é que ela foi feita em um dia em que ele havia passado o dia com o tio, e,
principalmente, por ser novo na época da foto, tinha vinte e quatro anos. A fotografia que
foi feita no quartel de Caruaru o imobilizou novo e forte. “Na época em que comia
comidas fortes: buchada, rabada, sarapatel, mão de vaca...”
Quando questionado sobre qual imagem gostaria ainda de ter do seu passado, pois
“era bonito quando novo”, José Marques respondeu que essa seria a melhor imagem que
poderia ter de sua vida. Que também teve outra que gostou muito, uma fotografia de
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quando foi para São Paulo pela primeira vez, mas que “estava feio, já estava velho, com
trinta anos”.

6.1.6 Sr. Severino:


Sr. Severino Francisco tem 75 anos e seis filhos. Não tem mais contato com
nenhum deles, nem mesmo sabe onde eles moram. Ele é, em suas palavras, sozinho.
Nasceu em Brejo da Madre de Deus e trabalhou a vida toda como pedreiro. Há 16
anos é viúvo e há quatro anos mora no asilo e diz não gostar de lá.
Perguntado sobre suas fotos e ele responde não mais a possuir, já que quando sua
mulher morreu os filhos já eram casados e herdaram as fotos para constituir seus próprios
álbuns de família.
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6.2 Enquanto espero, vivo:

Nesse ensaio, todo em cor, foram produzidas 36 fotos que se centram na construção
de um álbum que busca retratar o presente dos seis idosos entrevistados na Instituição Casa
dos Pobres São Francisco de Assim.
A partir da pergunta norteadora “Que fotografias você gostaria de ter da sua vida de
hoje para guardar de lembrança”, foram selecionados alguns momentos escolhidos por eles
para retratar seus cotidianos, as atividades institucionais e os novos laços afetivos que
atualmente estabelecem na Casa dos Pobres São Francisco de Assis. Muitos alguns
momentos escolhidos não aconteceriam em suas vidas, pelo menos no momento em que
estes foram pronunciados. Para estes momentos desejados ora optamos por ficcionalizá-los
e ora registramos o momento em que tais desejos foram pronunciados.

6.2.1 Sra. Elvira:

Os anos continuaram passando, mas Sra. Elvira não foi a única que envelheceu. Seus
patrões, já idosos não puderam cuidar dela e a levaram para o asilo. Ela diz gostar de viver
no asilo, e dos momentos que mais gosta, e que gostaria de registrar são os dias de quarta-
feira, o dia da missa. Mas, que apesar de sua vida ter se acostumar com o lugar, já que tem
certeza que seu patrão ainda virá buscá-la.
Perguntei por que ela gosta da missa. Ela respondeu que sua religião é catolicismo,
desde pequena e que lá reza por seus queridos, principalmente pelo ex-patrão.
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6.2.2 Dona Luzinete:

A respeito da nova vida que diz adorar, Dona Luzinete não soube dizer algum
momento especial que gostaria de registrar, mas que gosta muito das seções de fisioterapia
e que o jardim interno seria um bom local para representar o novo estágio de sua vida.
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6.2.3 Dona Helena:

Suas fotografias foi o que sobrou de seu passado. As fotos e alguns móveis, que
vendeu para juntar dinheiro e fugir para o asilo. Foi o que sobrou depois da repartição de
seus bens entre suas sobrinhas, que cuidaram dela quando foi internada no hospital por 2
meses. Depois de 3 anos hospedada na casa de alguns parentes, Dona Helena voltou para
casa e percebeu que a maioria de seus objetos pessoais foram levados, já que seus vizinhos
e suas sobrinhas pensaram que ela iria falecer. Ela se sentiu roubada e decidiu vender o
pouco que sobrou e fugir.
Apesar de suas irmãs não a procurarem, pois sentem vergonha dela optar por viver
na Casa dos Pobres São Francisco de Assis, Dona Helena diz ter encontrado paz no asilo.
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6.2.4 Seu José Bezerra:

Sr. José Bezerra carrega consigo apenas imagens em seu coração que marcam
instantes, “clichês” que marcam uma vida á dois. Mas um dia, seis anos atrás suas vidas se
foram. José Bezerra se viu viúvo. No dia seguinte ao enterro de sua esposa, seu único filho
o levou para o Asilo Casa dos Pobres São Francisco de Assis, já que não havia mais
ninguém que pudes\se cuidar dele. “Me enterram vivo aqui”, afirmou ele ao deixar claro
seu desgosto pelo rumo que sua vida tomou. O passeio com a família aos fins de semana
iluminam os seus dias e horas que passa na “Casa dos Pobres” momentos que segundo ele
não valem a pena registrar. Como o momento mais feliz de sua semana é quando ele se
arruma para esperar o filho buscá-lo para passear, optou por esses momentos de espera e de
expectativas para registrar.
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6.2.5 Sr. José Marques:

Quando questionado sobre qual momento de sua vida no Instituto ele gostaria de
registrar em uma foto, ele respondeu que a foto que ele mais gostaria de hoje poder fazer
seria de uma dele indo embora, “dando tchau para o asilo”. Optou-se, então, por registrar o
momento em que esse desejo foi pronunciado, suas feições, suas falas, suas esperanças e
desesperanças.
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6.2.6 Sr. Severino

Ao ser questionado a respeito sobre as boas imagens do seu presente no asilo, Sr.
Severino não soube dizer se gostaria de registrar fotograficamente alguma atividade que
realiza por lá, nenhuma experiência e nenhuma das pessoas que hoje fazem parte do seu
cotidiano. Só pediu que eu voltasse lá para conversar com eles outras vezes.
Falou então, que uma despedida da vida que lá teve seria um bom momento para
se registrar. Para realizar esse ensaio, Sr. Severino se propôs a viver um momento
ficcional: seu ultimo dia no asilo. Se vestiu com uma roupa especial para ir embora e
escolheu o caminho gostaria de percorrer pela última vez.
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7. Cronograma:

ETAPAS Agosto Setembro Outubro Novembro


Levantamento X
bibliográfico
Fichamento de X X
textos
Coleta de fontes X X
(fotos e
entrevistas)
Análise das X X
fontes
Montagem do X X
Projeto
(fotografias e
entrevistas)
Organização do X X X
projeto
Redação do corpo X X
teórico
Revisão X
Revisão da X
redação e entrega
final
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8. Recursos:

Materiais/ Permanentes Discriminação Valor (R$)


Câmera fotográfica NIKON (digital) Não se aplica, empréstimo
da Faculdade
Automóvel Não se aplica, recursos próprios
Computador Não se aplica, recursos próprios
Programa de Edição de Imagens Não se aplica, recursos próprios
Data Show Não se aplica, recursos próprios
Gravador de som Não se aplica, empréstimo
da Faculdade
TOTAL 0,00

8.2- Materiais/ de Consumo Discriminação Valor (R$)


Combustível (gasolina) 18,15
Alimentação Não se aplica, recursos próprios
Internet Não se aplica, recursos próprios
Livros de Pesquisa Não se aplica, empréstimo
da Faculdade
Revelação das fotografias 235,00
Impressão e encadernação do TCC 10,00
DVD´s para apresentação e entrega do 9,00
trabalho
Cadernos para anotações 10,00
Canetas para anotações Não se aplica, recursos próprios
Credito de celular Não se aplica, recursos próprios
TOTAL 282,15
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9. Conclusão:

Por meio deste trabalho tivemos a oportunidade de conhecer melhor seis moradores
do Instituto Casa dos Pobres São Francisco de Assis, suas angústias, marcas, memórias e
solidões. Conhecemos um pouco, também sobre a realidade da expectativa de vida e laser
deles com o intuito de provocar reflexões a cerca do idoso e da memória pessoal na
contemporaneidade.
Por meio dos ensaios objetivamos expor suas memórias passadas, suas marcas e
seus traços físicos provocados pelo fluir do tempo. Evidenciando seus corpos, seus
cotidianos e uma parte de suas nostalgias.
Através da construção do corpus fotográfico e teórico aqui traçado, tivemos como
resultado dois ensaios documentais denominados “Um passado sempre presente” e
“Enquanto espero, vivo”, na tentativa de produzir imagens que provocassem reflexões
sobre o passado e o presente que se escolhemos registrar e lembrar em um futuro.
Constatou-se que as imagens fotográficas são instrumento de recordações e janelas
de um acesso ao passado, imagens que alimentam as memórias pessoais e coletivas e que,
de certa forma, permitem que pela visualização ou nostalgia do passado se viva o presente.
Sendo assim, a fotografia alimenta uma dor, saudade de um tempo vivido, assim como, um
reconforto de poder reencontrar esse tempo que se foi. Permite, também, expressar
subjetivamente impressões de uma realidade e a ficcionalização desse passado.
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11. Referências:

ALBUQUERQUE, Larissa. O semblante da fotografia na contemporaneidade.


Campina Grande, 2010.

BEAUVOIR, Simone. A Velhice. Tradução de Maria Helena Franco Monteiro. Rio de


Janeiro, Nova Fronteira, 1990.

BENJAMIN, Walter. A Obra de Arte na Época de Sua Reprodutibilidade Técnica. São


Paulo, Brasiliense, 1987.

BRUNO, Fabiana. Retratos da Velhice. Um duplo percurso: metodológico e cognitivo.


Dissertação – Programa de Pós-Graduação em Multimeios do Instituto de Artes.
Universidade Estadual de Campinas, 2003.

FABRIS, AnnaTeresa Memórias em imagens. In: Anais do XXVI Simpósio Nacional de


História – ANPUH. São Paulo, 2011.

BARTHES, Roland. A câmara clara. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1984.

GUIMARÃES, Elzimar. Reflexão sobre a velhice. In: CES Revista, v.21, Juiz de Fora,
2007.

GOLDENBERG, Mirian. Corpo, envelhecimento e felicidade na cultura brasileira. In:


Civilização Brasileira. Rio de Janeiro, 2011.

ROUILLÉ, André. A Fotografia: entre documento e arte contemporânea. São Paulo:


Editora Senac São Paulo, 2009.

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