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A rede social Facebook e o contrato eletrônico de prestação de serviços celebrado com

seus usuários

*Por Fabricius Assumpção.


Macaé/RJ, 20 de fevereiro de 2021.

O Facebook, que no Brasil é registrado como Facebook Serviços Online do


Brasil Ltda (BRASIL. REDESIM. Disponível em:
<http://servicos.receita.fazenda.gov.br/Servicos/cnpjreva/Cnpjreva_Comprovante.asp>. Acesso em 20 fev.
2021), pessoa jurídica de direito privado, que exerce essa atividade de forma organizada,
profissionalmente e, via de regra com fins econômicos, ao disponibilizar e armazenar, em
seus servidores, informações criadas por terceiros em sua rede social (tais como os textos,
áudios, vídeos e imagens inseridos pelo titular/usuário em página pessoal ou por
criador/administrador em grupo/comunidade) é considerado, genericamente, Provedor de
Aplicações de Internet (PAI), tal qual se infere dos incisos VI e VII do art. 5° c/c art.
15, caput, ambos da Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014 (Marco Civil da Internet)
[BRASIL. Lei nº 12.962, de 23 de abril de 2014 Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965.htm>. Acesso em: 20 fev. 2021].

Quem realiza o tratamento de dados pessoais dos usuários em nome do Facebook


Serviços Online do Brasil Ltda, responsável pelas decisões inerentes (controlador), é a
sua matriz norte-americana, o “Facebook, Inc.”, ou seja, o operador, tal qual se verifica
nos incisos VI e VII, art. 5º, da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 (LGPD) [BRASIL.
Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/L13709.htm>.
Lembrando que o “Facebook, Inc.” oferece outros produtos e serviços
Acesso em: 20 fev. 2021].
além de sua plataforma de rede social, incluindo “Facebook Messenger”, “Facebook
Watch” e “Facebook Portal”, tendo adquirido recentemente o “Instagram”, o “WhatsApp”,
dentre outros serviços e participações societárias [WIKIPEDIA. Facebook Inc. Disponível em:
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Facebook,_Inc.>. Acesso em 20 fev. 2021].

Quando da abertura de uma conta na rede social Facebook, se a adesão às políticas


deste por parte do inscrito e a consequente utilização dos serviços oferecidos previamente
descritos se dá de forma e para fins licitamente permitidos (não há proibição por lei); se a
pessoa inscrita nesta conta presumidamente não pretende praticar atos contrários à lei, a
moral ou aos bons costumes; e se ela é considerada capaz para abertura de tal conta e fazer
uso do pertinente perfil ou grupo/comunidade daquela forma (seja pela idade ou outras
caraterísticas que, contudo, em caso de incapacidade relativa podem ser supridas por
representante legal etc.), tem-se as condições para um contrato válido.

E se o Facebook é considerado um prestador de serviço de provisão (provedor) de


conteúdo, aliado ou não à hospedagem, ao dispor informações editadas por ele ou por
terceiro, bem como quando procede ao armazenamento e controle dessas informações
(dados) em sua rede social, o contrato celebrado com quem abre a conta é de prestação
de serviços (ou, conforme o caso, de serviços e produtos).

Como todo contrato, e particularmente em razão do celebrado com o Facebook se


amoldar como de adesão (tipo), vez que as cláusulas estabelecidas nas políticas da empresa
(“Termos de Serviços” - FACEBOOK. Termos de Serviço. Disponível em:
<https://www.facebook.com/legal/terms/plain_text_terms>. Acesso em 21 fev. 2020 e “Padrões da Comunidade” -
FACEBOOK. Padrões da Comunidade. Disponível em: <https://www.facebook.com/communitystandards/>. Acesso em 20 fev. 2021)
aderem ao mesmo, ele está sujeito a ser dissolvido. Essa dissolução, em consonância com
os arts. 472 e 473 do Código Civil (distrato, ou resilição unilateral), quando de
iniciativa do titular/usuário da conta (ou contratante) se dá simplesmente pelo acesso às
configurações da página e realização do procedimento de exclusão de tal conta. (BRASIL. Lei nº
10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm>. Acesso em 20 fev.
2021)

Todavia, quando de iniciativa do Facebook a dissolução, apesar de nem sempre


esse comunicar de sua intenção ao titular/usuário e em razão de uma violação ou mais
daquelas políticas da empresa, a exclusão da conta deve ter fundamento nessa(s)
violação(ões), sob pena (o que comumente acontece) desse titular/usuário, assim não
concordando, ao se ver frustrado em sua tentativa administrativa da reativação de sua
conta, requerê-la judicialmente.

Sobre a questão dos contratos firmados via Internet, aliás, tem-se admitido que uma
de suas inegáveis características é o da chamada “desterritorialização das relações
humanas”, especialmente quando a relação jurídica entre usuário e provedor, ainda que
regida por lei especial, que no Brasil é o Marco Civil da Internet, seria essencialmente uma
relação de consumo, inclusive pela existência de uma “remuneração indireta” (LÔBO, Paulo
Luiz Netto. Condições gerais do contrato e o novo código civil. AZEVEDO, Antonio Junqueira de; TORRES, Heleno Tavera;
CARBONE, Paolo. Princípios do novo código civil brasileiro e outros temas. 2 ed. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 553) .
O
principal fundamento para a existência dessa remuneração indireta do provedor de
aplicações é que ele se vale dos dados inseridos pelos usuários para lhes oferecer
publicidade dirigida (LONGHI, João Victor Rozatti. Responsabilidade Civil e redes sociais: retirada de conteúdo, perfis
falsos, discurso de ódio e fake News. Indaiatuba, SP: Editora Foco, 2020, p. 49).

Tal remuneração seria aquela que se extrai da primeira e segunda partes do §2º,
art. 3º, do Código de Defesa do Consumidor, relacionada à prestação de serviços:
Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante
remuneração (...) [BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm>. Acesso em 20 fev. 2021] . Sendo a remuneração como
principal ponto que identifica o fornecedor de produtos e serviços, pertinentes ser traçada a
distinção entre remuneração direta e a remuneração indireta.

A primeira aproxima-se aos moldes do negócio jurídico oneroso do direito civil, e a


segunda, apesar de aparentar gratuidade, há oferecimento de publicidade ou algum outro
ônus implícito ao consumidor (LONGHI, ibidem, p. 52). Se antes o fato era apenas baseado na
possibilidade de acesso, por terceiros interessados, ao banco de dados do provedor, hoje a
exploração da publicidade nos sites de relacionamento é explícita (Ibidem).

Contudo, as experiências têm demonstrado que as políticas adotadas pelo


Facebook não têm inibido a prática de diversos crimes na rede social, a exemplo de
calúnia, difamação e injúria proferidos dentro e a partir de perfis e grupos/comunidades
verdadeiros ou falsos, prevalecendo na maioria dos casos ataques a direitos da
personalidade como a honra e à imagem, respaldados num disfarçado (pretenso) direito de
liberdade de manifestação de pensamento, de expressão e de informação. Nesse sentido, a
consequência de um conflito entre direitos da personalidade e o eventual abuso no
exercício, por exemplo, (do direito) da liberdade de manifestação do pensamento, e não
obstante direitos esses de índole constitucional [incisos IV, V, IX e X, art. 5º e art. 220 -
BRASIL. Constituição Federal (1988). Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em 21 fev. 2021],
nasce e se resolve
no âmbito da responsabilidade civil (essa inserida no Direito Privado, mais
especificamente no Direito Civil).

Do mesmo modo, em caso de violação, por parte de um usuário contra outro,


daquelas políticas de forma manifesta, grave ou recorrente, a empresa podendo suspender
ou desativar permanentemente o acesso do violador a sua conta não o faz, bem como ao
proceder alguma medida, a faz em destempo de evitar ou de tornar irreparável ou de difícil
reparação o dano causado, diante de direitos e garantias do consumidor (inciso I, art. 7º,
Marco Civil da Internet - Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014, Ibidem, e incisos I, IV e IV, CDC- Lei nº
8.078, de 11 de setembro de 1990, ibidem.).

*Fabricius Assumpção é advogado, Master of Business Administration (MBA)


em Administração Pública, Pós-graduado em Direito Público, Pós-graduando em
Direito Digital e Diretor do CEPEDASO.

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